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do próprio Léry, da mesma forma como aparece naqueles, sobretudo quanto à<br />
exaltação à fertilidade da terra e a bondade do clima. E, sobre tais aspectos, diz<br />
Léry:<br />
(...) O que acima ficou dito é o resumo do que vi ser usado como pão pelos selvagens<br />
do Brasil. Entretanto, os espanhóis e portugueses atualmente estabelecidos em<br />
diversos pontos das índias Ocidentais provaram que não é por defeito da terra que os<br />
selvagens não possuem trigo e vinha. Esses colonos os têm plantado com muito bom<br />
resultado. Nós franceses, por ocasião de nossa viagem também levamos trigo em<br />
grão e cepas de vinha e verificamos, por experiência, que uma e outra coisa se dariam<br />
bem se os campos fossem tratados à moda da Europa. De fato a vinha que plantamos<br />
pegou, cresceu e enfolhou, evidenciando claramente a excelência do solo. Verdade<br />
que durante um ano quase que lá estivemos só produziu agraços 47 que não chegaram<br />
a amadurecer, emperrando e secando; mas sei agora, por vinhateiros que em geral as<br />
plantas novas só produzem no primeiro e segundo ano frutos secos e chochos; sou<br />
portanto de opinião que se os franceses ou os que nos continuarem, cuidarem da<br />
videira deixada, colherão boas e belas uvas nos anos próximos. Quanto ao trigo e ao<br />
centeio que semeámos, embora crescessem viçosos, as espigas não tinham grãos.<br />
Como entretanto a cevada granou e amadureceu multiplicando bastante, é de supor<br />
que a terra por ser muito forte tivesse apressado em excesso o trigo e o centeio (os<br />
quais pedem maior demora na terra para produzir, como vemos na Europa) o que não<br />
teria dado tempo à planta para formar o grão. Em França adubam-se os campos para<br />
torná-los mais férteis; nesta terra nova sou de opinião que seria necessário cansá-la e<br />
enfraquecê-la com alguns anos de cultura para que venha a produzir melhor trigo e<br />
outros cereais semelhantes.<br />
Como este país dos nossos tupinambás tem capacidade para alimentar dez vazes<br />
mais gente do que atualmente, posso gabar-me de ter tido às minhas ordens mais de<br />
mil jeiras de terras melhores que as de Beance. Pois se os franceses tivessem<br />
permanecido ali teriam sem dúvida tirado a mesmo proveito que colhem os<br />
portugueses; e isso o teríamos conseguido, e nela estariam talvez agora mais de dez<br />
mil pessoas se Villegagnon não se houvesse rebelado contra a religião reformada.<br />
Diga-se isso de passagem para satisfazer aos que perguntam se o trigo e o vinho<br />
podem prosperar no Brasil. (Idem, p. 89)<br />
Também a sua descrição do processo técnico e da divisão familiar do<br />
trabalho não apresenta grandes diferenças daquelas que foram descritas e<br />
ilustradas acima, especialmente quanto à preparação da bebida. A novidade<br />
desse discurso em relação aos demais é que Léry vai mostrar que o saber técnico<br />
sobre o preparo de bebidas pelos índios brasileiros assemelha-se muito àquele<br />
que era usado em seu país, ao assim dizer:<br />
(...). Cumpre, desde logo, notar que os homens não se envolvem de maneira nenhuma<br />
na preparação da bebida, a qual, como a farinha, está a cargo das mulheres. As<br />
raízes de aipim e mandioca, que servem de principal alimento aos selvagens, são<br />
também utilizadas no preparo de sua bebida usual. Depois de as cortarem em rodelas<br />
46 Espécie de milho graúdo.<br />
47 Suco de uva.<br />
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