São Clemente Maria Hofbauer (Insigne propagador da Congregação

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A oração contínua, as meditações longas são um trabalho pesado, mormente no convento onde elas se repetem diariamente a vida inteira; e entretanto a oração não é o único trabalho das religiosas; no convento Maria deve muitas vezes ceder o lugar a Marta. Há religiosos que consomem o dia no confessionário a perdoar pecados, ou no púlpito a converter os pecadores, ou à secretária a cultivar as ciências, achando somente à tarde uma parcela de tempo para lançarem um rápido olhar para sua própria alma. Quantas religiosas, de manhã até à noite, cansam-se nas aulas instruindo as crianças, ou velam a noite inteira à cabeceira dos doentes nos hospitais, a combater o sono e o cansaço em seus membros entorpecidos pelas longas vigílias! quantas Esposas de Cristo por seus esforços heróicos e labutações aturadas em prol da humanidade sofredora, se têm lançado, na flor dos anos, aos braços da inexorável morte! E mesmo que uma Religiosa não tivesse de sujeitar-se a nenhum desses trabalhos físicos ou intelectuais, nunca poderia esquecer, sob pena de condenação, o mais penoso de todos: o trabalho da santificação própria: domar as paixões, combater os vícios, cultivar as virtudes. Esse trabalho aturado e penoso só pode ser feito por almas generosas e fortes, a quem Deus chamou a sua casa. A vida claustral exige abnegação e pressupõe grande energia espiritual e vigilância constante — não admira pois que uma ou outra alma, menos forte, se sinta esmorecer e abandone seu Deus voltando-lhe as costas. Outras, cansadas do combate, permanecem, sim, no convento, mas o coração vaga pelo mundo, caem na tibieza causando prazer a Satanás que em seus corações deposita os germes das imperfeições, da impaciência, hipocrisia, inveja, ciúmes, murmurações, loquacidade, apego às coisas do mundo, ao amor próprio, à vanglória etc. Embora o mundo não tenha direito de exprobrar coisa alguma a esses abusos que não o prejudicam, porquanto uma Religiosa tíbia é sempre melhor do que uma pecadora no mundo, todavia o Esposo divino contrista-se, subtrai muitas vezes sua luz divina, retira seu braço, diminui as consolações espirituais, das quais a Religiosa tíbia se torna indigna por suas imperfeições e infidelidades, e cheio de amargura lhe repete as palavras aterradoras: “Oxalá fosses quente ou fria!” (Ap 8,15). Abandonada pelo Esposo, a pobre Religiosa à beira do precipício, sem luz divina, sem o auxílio do céu, facilmente resvala para o abismo e precipita-se no pecado mortal. Nesse deplorável estado a mísera debate-se sem consolo, não tem as alegrias do mundo a que renunciou no dia da sua profissão, nem as consolações do céu, porque é infiel a seu Esposo. Como é triste uma Religiosa tíbia, suspensa entre o céu e a terra! Ela deve ser pobre, em virtude do voto, e nutre tantos desejos de possuir... deve ser pura, porém não goza as carícias do amor divino... deve obedecer, e não sente o fogo do céu... deve rezar e não sente consolação! pobrezinha, deve abnegar-se, porém sem merecimentos, vive sem esperança e morre se ma graça de Deus! Toda essas verdades eram expostas por São Clemente com animação e calor. No dia de sua nomeação para confessor das Ursulinas, foi felicitado por um Barão, pela honrosa colocação obtida, na qual lhe era dado fazer tanto bem às almas puras, às Esposas de Jesus Cristo. Clemente, porém, meneou a cabeça e respondeu com seriedade: “Vós me felicitais por um cargo que eu temo; quisera antes ouvir de confissão a metade do exército austríaco do que a dez religiosas tíbias”. Quanta verdade não encerra essa palavra! E de fato, entre 82 tantos milhares de soldados que perfazem o número da metade do exército austríaco, quantos blasfemadores, profanadores sacrílegos dos lugares santos, ladrões, libertinos, hereges, perjuros, beberrões! e por isso também quantos crimes e pecados, que reunidos num só muladar, talvez o tornassem mais alto do que a Torre de Babel!... e entretanto o Servo de Deus tinha mais esperança na salvação deles do que na de dez religiosas tíbias! E quando em um convento existem, ainda que poucas, religiosas tíbias, a comunidade inteira corre perigo de ser infeccionada pelo espírito mundano, que a porá a perder. É certo que o mosteiro das Ursulinas não estava em decadência completa, mas também é certo que lá penetraram, com o espírito da época, os bacilos do josefismo relaxando a disciplina claustral. São Clemente que em uma de suas expressões fortes disse: “Eu tenho um faro católico”, percebeu imediatamente o qual e descobriu sua origem e causa; pôs-se a agir com energia pouco se incomodando com as palavras, por vezes pesadas, que teve de ouvir dentro e fora do convento, e conseguiu restabelecer o antigo espírito, o amor a Jesus Cristo e a observância regular em todos os pontos. Por meio de numerosas conferências ascéticas às religiosas, o Servo de Deus procurava torná-las dignas do seu divino Esposo, e proporcionar-lhes alegrias e consolações em seu convento. Uma vez falando da vida humana, da sua brevidade e importância para a salvação, instou com elas a que aproveitassem o tempo... “porque o tempo, disse ele, é um tesouro infinitamente precioso, um bem inestimável; quem se aproveita bem do tempo, ganha o céu e o próprio Deus”. Embora seja o tempo uma criatura de Deus, que é o Senhor absoluto de tudo o e se acha infinitamente acima de todo criado, Clemente punha o próprio Deus em paralelo como tempo dizendo às Ursulinas: “O tempo vale tanto como o seu Autor divino, porque com ele podemos, por assim dizer, comprar o próprio Deus, se fizermos bom uso do tempo. Deus mesmo será a nossa recompensa no céu”. Homem eminentemente prático, não se perdia em teorias ou belas frases a que não corresponde realidade, e por isso explicava também às religiosas o modo de empregarem bem o tempo, e de usarem desse capital para dele perceberem os maiores juros possíveis, coisa que não é difícil no convento. A ordem do dia no claustro é a vontade de Deus, e executá-la com fidelidade é merecer copiosos juros de merecimentos e de virtudes, porque a vontade divina deve ser sempre a norma da nossa vida, a única guia do nosso procedimento; as religiosas não devem ter vontade própria por ser contrária à de Deus, que fala interiormente à nossa alma, ou exteriormente pela boca dos Superiores, que são para nós os representantes de Deus. E como as religiosas a isto se obrigam por um voto especial, o da obediência, Clemente repetia-lhes constantemente: “Não sejais voluntariosas, mas obedecei sempre em tudo!” “Até a morte, disse ele em outra ocasião, é mister obedecer; é preferível morrer a desobedecer. Se a uma Religiosa fosse dado escolher entre a morte e a desobediência a qualquer preceito do Superior, não deveria hesitar em sacrificar a própria vida, que é o melhor dos bens terrenos, para não ser infiel a Deus. A morte seria um sacrifício e holocausto agradável ao Eterno, a desobediência porém um pecado; ora é muito mais nobre sacrificar-se que pecar; a morte pela obediên-

cia é um martírio que abre as portas do céu. Não terá dificuldade em obedecer a Religiosa ao contemplar seu divino Esposo que não quis outro epitáfio sobre seu sepulcro senão a afirmação de que Ele foi obediente até à morte, sim até a morte da cruz”. Como a hera entrançada à estaca cresce viçosa arrostando os furacões e as tempestades, a alma obediente torna-se grande e forte, resistindo sem dificuldade aos vendavais das paixões, atirando-se, arrojada, para o alto da perfeição e cantando vitórias e mais vitórias, como o afirma o Espírito Santo; torna-se tão forte, que vence o coração de Deus, a fortaleza substancial. Um dia ordenou Clemente a uma das Irmãs que rezasse uma Ave-Maria pela conversão de um pecador que parecia obstinado. A Religiosa, achando que uma Ave-Maria seria pouca coisa para um efeito tão importante como é a conversão de um pecador, ofereceu-se a recitar mais Ave-Marias naquela intenção. Clemente porém respondeu-lhe: “As almas que pelo voto da obediência sacrificaram a vontade própria, rezam com mais fruto, obedecendo, do que fazendo a sua vontade e seguindo os seus caprichos”. Quem faz a vontade de Deus merece ser por Ele atendido mesmo que faça uma oração tão breve como é a Ave-Maria. Em Sta. Úrsula havia uma irmã de bom coração, de muito bom espírito e, em geral, de muito belas qualidades, mas geniosa, de sangue quente que não suportava a menor contradição nem opinião alguma contrária à sua; quando contradita por alguém, desfazia-se em palavras pouco edificantes. Entre ela e uma outra Irmã levantou-se, um dia, forte discussão, onde as palavras jorravam com eloqüência espantosa, tornando-se sempre mais altas e fortes. Nesse solene e animado bate-boca, entrou Clemente que não ficou nada edificado com tais desabafos contrários à caridade. As duas interromperam instantaneamente a batalha envergonhando-se do Diretor espiritual, que depois de indagar a causa, dirigiu-se à Irmãzinha nervosa, fez-lhe um sermão em regra, dando-lhe de penitência a proibição de comungar o dia seguinte, porque a ninguém é permitido receber Jesus com rancor e ódio no coração. A Irmã, longe de se irritar e perturbar com a repreensão, aceitou humildemente o castigo, de olhos baixos, sem proferir uma única palavra de queixa ou desculpa. O Santo edificado com a virtude heróica dirigiu um olhar complacente para a Irmã, perdoou-lhe tudo, tirou a proibição que acabava de fazer, e em recompensa de sua obediência, permitiu-lhe receber mais uma comunhão além das permitidas pela Regra. Clemente inculcava a obediência sobretudo às noviças, porque sabia que, de pequenino se torce o pepino. Aprouve-lhe dar uma vez às noviças o seguinte enigma em forma de pergunta: “Qual é a melhor noviça?” As respostas foram certamente edificantes e belas: “A que mais reza” — “a que melhor cumpre sua Regra” — “a que vive contente no convento” — “a que comunga muitas vezes” — “a que faz amiúde o exame de consciência” etc. Como nenhuma acertasse com a solução desejada, respondeu por elas o Servo de Deus: “A melhor noviça é aquela que, obedecendo com humildade se sente feliz quando, qual vassoura usada, é lançada a um canto da casa”. A uma pessoa pouco entendida em vida espiritual isso parecerá talvez um rebaixamento ignóbil e indigno; ser o homem comparado a uma coisa tão vil como é a vassoura, que se usa nos mais baixos serviços da casa. Entretanto 83 nada mais acertado do que essa comparação. A vassoura, antes de colhida e enfeixada, lá fora se elevava orgulhosa a receber as homenagens e os beijos dos zéfiros e os banhos de luz da aurora, e, depois de presa a um cabo, em um canto atrás da porta, jaz sem o direito de permanecer no salão mais nobre; e lá no canto tem de esperar até que a última das empregadas a tire da sua prisão, porque a dona da casa se acanha de tocar nela com medo de se manchar; e essa empregada dela não se serve para os mais nobres empregos, mas para recolher o lixo, varrer as imundícias, e executar outros serviços semelhantes; terminado o trabalho, a vassoura não recebe palavra de gratidão e reconhecimento, nem ninguém se lembra de lhe tributar louvores; a criada atira-a para o canto, onde antes se achava e ela não tem direito de se queixar, mas só de obedecer calada; quando já não pode mais prestar serviços, é lançada a um muladar ou atirada ao fogo. — Como a vassoura deve ser a noviça do convento, por mais nobre e elevada que tenha sido no mundo a sua dignidade ou ascendência sobre os outros; só assim poderá ser boa noviça e prestar para o convento. Clemente nessa comparação não quer que as religiosas sejam vis como as vassouras, mas que tenham intenção e desejo de ser tratadas como elas, com toda a submissão e humildade; — somente com esse desprendimento da vontade e do amor próprio é que a alma se sentirá verdadeiramente feliz na casa de Deus. “Se alguém quiser vir após mim, abnegue-se a si próprio” disse o divino Salvador. Isso naturalmente refere-se exclusivamente aos sentimentos e disposições das noviças, porquanto às Superioras impõe Deus o gravíssimo dever de tratar suas súditas com todo carinho e amor, de auxiliá-las com o desvelo de uma terna mãe, e de cuidar das suas necessidades temporais e espirituais. Convencido dessa importante verdade, o Servo de Deus não cessava de admoestar as Superioras a que estudassem seriamente as aptidões, o temperamento e as forças físicas e morais de cada Religiosa, e só então dessem as suas ordens. É em vista disso que muitas vezes dizia às irmãs: “Como é fácil e agradável obedecer, e quão difícil é mandar! a obediência dá plena segurança em todos os transes da vida; quem obedece não pode errar, mesmo que o Superior caia no erro e se engane”. Com a entrada no convento não cessam as dificuldades para a alma que teme a Deus, pois que diz o Sábio: “Filho, quando entrares no serviço de Deus, tem-te firme na justiça e no temor, e prepara a tua alma para a tentação” (Eccl. 2. 1). Clemente tratava suas noviças com toda a brandura e delicadeza. Se acontecia ver alguma delas entristecida ou cabisbaixa, procurava dissipar-lhe a tristeza e levantar-lhe o ânimo. Uma donzela, munida das melhores intenções abandonara o mundo e entrara no convento das Ursulinas, para lá glorificar a Deus e salvar a sua alma. O inimigo de todo o bem pôs-se logo a sussurrar-lhe aos ouvidos toda a sorte de tentações contra a vocação. “Tu não és chamada por Deus à vida religiosa, dizia-lhe, nunca poderás suportar os rigores do convento; vivendo na casa de Deus sem vocação expões-te ao perigo de condenação eterna; além disso não és digna absolutamente de ser Esposa de Jesus Cristo por causa dos teus muitos pecados”. Do outro lado o inimigo pintou-lhe o mundo como um templo

A oração contínua, as meditações longas são um trabalho pesado, mormente<br />

no convento onde elas se repetem diariamente a vi<strong>da</strong> inteira; e entretanto<br />

a oração não é o único trabalho <strong>da</strong>s religiosas; no convento <strong>Maria</strong> deve muitas<br />

vezes ceder o lugar a Marta. Há religiosos que consomem o dia no confessionário<br />

a perdoar pecados, ou no púlpito a converter os pecadores, ou à secretária<br />

a cultivar as ciências, achando somente à tarde uma parcela de tempo<br />

para lançarem um rápido olhar para sua própria alma. Quantas religiosas, de<br />

manhã até à noite, cansam-se nas aulas instruindo as crianças, ou velam a<br />

noite inteira à cabeceira dos doentes nos hospitais, a combater o sono e o<br />

cansaço em seus membros entorpecidos pelas longas vigílias! quantas Esposas<br />

de Cristo por seus esforços heróicos e labutações atura<strong>da</strong>s em prol <strong>da</strong><br />

humani<strong>da</strong>de sofredora, se têm lançado, na flor dos anos, aos braços <strong>da</strong> inexorável<br />

morte! E mesmo que uma Religiosa não tivesse de sujeitar-se a nenhum desses<br />

trabalhos físicos ou intelectuais, nunca poderia esquecer, sob pena de condenação,<br />

o mais penoso de todos: o trabalho <strong>da</strong> santificação própria: domar as<br />

paixões, combater os vícios, cultivar as virtudes. Esse trabalho aturado e penoso<br />

só pode ser feito por almas generosas e fortes, a quem Deus chamou a sua<br />

casa. A vi<strong>da</strong> claustral exige abnegação e pressupõe grande energia espiritual e<br />

vigilância constante — não admira pois que uma ou outra alma, menos forte, se<br />

sinta esmorecer e abandone seu Deus voltando-lhe as costas. Outras, cansa<strong>da</strong>s<br />

do combate, permanecem, sim, no convento, mas o coração vaga pelo<br />

mundo, caem na tibieza causando prazer a Satanás que em seus corações<br />

deposita os germes <strong>da</strong>s imperfeições, <strong>da</strong> impaciência, hipocrisia, inveja, ciúmes,<br />

murmurações, loquaci<strong>da</strong>de, apego às coisas do mundo, ao amor próprio,<br />

à vanglória etc. Embora o mundo não tenha direito de exprobrar coisa alguma a<br />

esses abusos que não o prejudicam, porquanto uma Religiosa tíbia é sempre<br />

melhor do que uma pecadora no mundo, to<strong>da</strong>via o Esposo divino contrista-se,<br />

subtrai muitas vezes sua luz divina, retira seu braço, diminui as consolações<br />

espirituais, <strong>da</strong>s quais a Religiosa tíbia se torna indigna por suas imperfeições e<br />

infideli<strong>da</strong>des, e cheio de amargura lhe repete as palavras aterradoras: “Oxalá<br />

fosses quente ou fria!” (Ap 8,15). Abandona<strong>da</strong> pelo Esposo, a pobre Religiosa à<br />

beira do precipício, sem luz divina, sem o auxílio do céu, facilmente resvala para<br />

o abismo e precipita-se no pecado mortal. Nesse deplorável estado a mísera<br />

debate-se sem consolo, não tem as alegrias do mundo a que renunciou no dia<br />

<strong>da</strong> sua profissão, nem as consolações do céu, porque é infiel a seu Esposo.<br />

Como é triste uma Religiosa tíbia, suspensa entre o céu e a terra! Ela deve ser<br />

pobre, em virtude do voto, e nutre tantos desejos de possuir... deve ser pura,<br />

porém não goza as carícias do amor divino... deve obedecer, e não sente o fogo<br />

do céu... deve rezar e não sente consolação! pobrezinha, deve abnegar-se,<br />

porém sem merecimentos, vive sem esperança e morre se ma graça de Deus!<br />

To<strong>da</strong> essas ver<strong>da</strong>des eram expostas por <strong>São</strong> <strong>Clemente</strong> com animação e<br />

calor. No dia de sua nomeação para confessor <strong>da</strong>s Ursulinas, foi felicitado por<br />

um Barão, pela honrosa colocação obti<strong>da</strong>, na qual lhe era <strong>da</strong>do fazer tanto bem<br />

às almas puras, às Esposas de Jesus Cristo. <strong>Clemente</strong>, porém, meneou a cabeça<br />

e respondeu com serie<strong>da</strong>de: “Vós me felicitais por um cargo que eu temo;<br />

quisera antes ouvir de confissão a metade do exército austríaco do que a dez<br />

religiosas tíbias”. Quanta ver<strong>da</strong>de não encerra essa palavra! E de fato, entre<br />

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tantos milhares de sol<strong>da</strong>dos que perfazem o número <strong>da</strong> metade do exército<br />

austríaco, quantos blasfemadores, profanadores sacrílegos dos lugares santos,<br />

ladrões, libertinos, hereges, perjuros, beberrões! e por isso também quantos<br />

crimes e pecados, que reunidos num só mula<strong>da</strong>r, talvez o tornassem mais alto<br />

do que a Torre de Babel!... e entretanto o Servo de Deus tinha mais esperança<br />

na salvação deles do que na de dez religiosas tíbias! E quando em um convento<br />

existem, ain<strong>da</strong> que poucas, religiosas tíbias, a comuni<strong>da</strong>de inteira corre perigo<br />

de ser infecciona<strong>da</strong> pelo espírito mun<strong>da</strong>no, que a porá a perder. É certo que o<br />

mosteiro <strong>da</strong>s Ursulinas não estava em decadência completa, mas também é<br />

certo que lá penetraram, com o espírito <strong>da</strong> época, os bacilos do josefismo relaxando<br />

a disciplina claustral.<br />

<strong>São</strong> <strong>Clemente</strong> que em uma de suas expressões fortes disse: “Eu tenho um<br />

faro católico”, percebeu imediatamente o qual e descobriu sua origem e causa;<br />

pôs-se a agir com energia pouco se incomo<strong>da</strong>ndo com as palavras, por vezes<br />

pesa<strong>da</strong>s, que teve de ouvir dentro e fora do convento, e conseguiu restabelecer<br />

o antigo espírito, o amor a Jesus Cristo e a observância regular em todos os<br />

pontos.<br />

Por meio de numerosas conferências ascéticas às religiosas, o Servo de<br />

Deus procurava torná-las dignas do seu divino Esposo, e proporcionar-lhes alegrias<br />

e consolações em seu convento. Uma vez falando <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> humana, <strong>da</strong> sua<br />

brevi<strong>da</strong>de e importância para a salvação, instou com elas a que aproveitassem<br />

o tempo... “porque o tempo, disse ele, é um tesouro infinitamente precioso, um<br />

bem inestimável; quem se aproveita bem do tempo, ganha o céu e o próprio<br />

Deus”. Embora seja o tempo uma criatura de Deus, que é o Senhor absoluto de<br />

tudo o e se acha infinitamente acima de todo criado, <strong>Clemente</strong> punha o próprio<br />

Deus em paralelo como tempo dizendo às Ursulinas: “O tempo vale tanto como<br />

o seu Autor divino, porque com ele podemos, por assim dizer, comprar o próprio<br />

Deus, se fizermos bom uso do tempo. Deus mesmo será a nossa recompensa<br />

no céu”.<br />

Homem eminentemente prático, não se perdia em teorias ou belas frases a<br />

que não corresponde reali<strong>da</strong>de, e por isso explicava também às religiosas o<br />

modo de empregarem bem o tempo, e de usarem desse capital para dele perceberem<br />

os maiores juros possíveis, coisa que não é difícil no convento. A ordem<br />

do dia no claustro é a vontade de Deus, e executá-la com fideli<strong>da</strong>de é<br />

merecer copiosos juros de merecimentos e de virtudes, porque a vontade divina<br />

deve ser sempre a norma <strong>da</strong> nossa vi<strong>da</strong>, a única guia do nosso procedimento;<br />

as religiosas não devem ter vontade própria por ser contrária à de Deus, que<br />

fala interiormente à nossa alma, ou exteriormente pela boca dos Superiores,<br />

que são para nós os representantes de Deus. E como as religiosas a isto se<br />

obrigam por um voto especial, o <strong>da</strong> obediência, <strong>Clemente</strong> repetia-lhes constantemente:<br />

“Não sejais voluntariosas, mas obedecei sempre em tudo!” “Até a morte,<br />

disse ele em outra ocasião, é mister obedecer; é preferível morrer a desobedecer.<br />

Se a uma Religiosa fosse <strong>da</strong>do escolher entre a morte e a desobediência<br />

a qualquer preceito do Superior, não deveria hesitar em sacrificar a própria<br />

vi<strong>da</strong>, que é o melhor dos bens terrenos, para não ser infiel a Deus. A morte seria<br />

um sacrifício e holocausto agradável ao Eterno, a desobediência porém um<br />

pecado; ora é muito mais nobre sacrificar-se que pecar; a morte pela obediên-

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