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FEVEREIRO 1940 (com OCR).pdf

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NUMERO 58 . ANNO XVIII <strong>FEVEREIRO</strong> DE <strong>1940</strong> - PREÇO 5$000


f.<br />

NUMERO 58<br />

ANNO XVIII<br />

JUustroçõo<br />

Bcosíleícc*<br />

<strong>FEVEREIRO</strong><br />

DE <strong>1940</strong><br />

MENSARIO EDITADO PELA<br />

SOCIEDADE ANONYMA "O MALHO"<br />

Director — Oswaldo de Souza e Silva<br />

Redactor Chefe — Jorge Santos<br />

Director Gerente: Antonio A. de Souza e Silva<br />

Administração e escriptorios: Trav. do Ouvidor, 34<br />

Redacção e officinas: R. Visconde de Itauna, 419<br />

Tels.: 23-4422 e 22-8073 — End. TeL OMALHO<br />

Caixa Postal 880 — RIO — BRASIL<br />

PREÇO DAS ASSIGNATURAS :<br />

BRASIL, paizes das Amé-<br />

ricas e Hespanha<br />

12 mezes 60$000<br />

6 " 30$000<br />

Remessa sob registro postal<br />

DEMAIS<br />

PAIZES<br />

70$000<br />

35$000<br />

N U M E R O A V U L S O 5 ( 0 0 0


A BÖA IMPRENSA<br />

A URCA<br />

Chronica de D. Aquino Correa<br />

ILLUWCÂCAD<br />

R ASILEI<br />

Reportagem photographica — Redacção<br />

UNS OLHOS<br />

Conto de Osvaldo Orico<br />

CRYPTA IMPERIAL<br />

BERETÉ<br />

Redacção<br />

Poesia de Olegário Marianno<br />

SUMMARIO DOS<br />

PRINCIP A ES<br />

A S SUMPTO S<br />

DESTE NUMERO<br />

VISITA A CASA DE OSWALDO CRUZ<br />

Reportagem photographica — Redacção<br />

O RIO DE HOJE E DE HA 30 ANNOS<br />

Redacção<br />

HISTORIA DE LILIANA<br />

Chronica de Aloysio de Castro<br />

O VAGABUNDO<br />

Conto de Paulo Filho<br />

IGREJAS DE RECIFE<br />

Reportagem photographica — Redacção<br />

A DAMA DAS CAMÉLIAS<br />

Chronica de Jorge Santos<br />

SÃO FRANCISCO DE ASSIS E A ARTE<br />

MODERNA<br />

Chronica de Fléxa Ribeiro<br />

O CARNAVAL EM DECADENCIA ?<br />

Reportagem photographica — Redacção<br />

QUATRO OBRAS DO GOVERNO<br />

CATHARINENSE<br />

Chronica de Nené Macaggi<br />

ARTES E ARTISTAS<br />

Redacção<br />

TRICHROMIAS, DOUBLÉS E DESENHOS DE:<br />

Gilberto Trompowsky, Calmon Barreto, Osvaldo Teixeira<br />

Leopoldo Steinberg<br />

M o v e i s f i n o s<br />

A RENASCENÇA<br />

C a l o t e , o o «» 59<br />

IVÍRIADY<br />

MARC A'REGISTRADA<br />

Í-N SAO AS MELHORES<br />

BATERIAS E PILHAS<br />

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MARCA REGISTRADA<br />

FEIRA INTERNACIONAL DE AMOSTRAS<br />

i j j p z u ;<br />

p| ALLEM AN HA<br />

1040<br />

A Feira Geral estará aberta de 3 a 8 de Março de <strong>1940</strong>. Em 24 Palacios<br />

que occupam cerca de cem mil metros quadrados, V. S. verá as<br />

amostras de todos os artigos de consumo geral no mundo civi-<br />

lisado.<br />

A Feira Technica dura de 3 a II de Março de <strong>1940</strong>. Em 20 Pavilhões<br />

gigantescos sommando uma area de cem mil metros quadrados es-<br />

tarão expostas machinas para todos os fins. E' o mais imponente<br />

desfile da technica mundial. Metalurgia, electricidade, construcções<br />

de estradas de rodagem, exploração de minas, agricultura etc.<br />

Para mais informações — indicação de agentes <strong>com</strong>pradores, technicos<br />

na AUemanha etc. dirija-se ao Delegado Official da Feira de<br />

Leipzig para o Brasil, Rua da Assembléa, 104, sala 907, Caixa<br />

Postal 1597, Phone : 42-7135, Rio de Janeiro.


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RIO DE JANEIRO — AV. RIO BRANCO, 133<br />

ANNO DE 1904<br />

Dia I (segunda-feira) — Noticiam de Ires Corações que o serviço de abastecimento<br />

dagua a essa cidade mineira, <strong>com</strong> encanamento de 4", foi orçado em 97:640$840.<br />

Dia 2 — Sequndo a Mensagem do Governador do Paraná, a receita extraordinaria<br />

do Estado, em I902-I903, montou a I .372:947$487 e a despesa a 4.5I8:022$0I8.<br />

Dia 3 — E' posto á venda o romance humorístico "Barba Azul", ce J. Repórter<br />

(Gastão Bousquer) e Juiião Machado.<br />

Dia 4 — Sahe a lume o Annuario Commerciai do E. de S. Paulo". I.500 paqi-<br />

nas. Resenhas históricas dos 172 municipios que <strong>com</strong>põem a região bandeirante.<br />

Dia 5 — Conto A Platéa \ folha paulistana, que 85 senhoras de Araguary en-<br />

viaram ao Juiz de Direito local uma moção.\em que pedem lhes seja concedido o<br />

direito de voto. Uma das s ; gnaiarias é a jornalista Edfrido Goulart.<br />

Dia 6 — O scenographo Publio Marroig trabalha activamente na confecção do<br />

préstito carnavalesco do Club dos Prodigos<br />

Dia 7 — Desfilam pela rua do Ouvido*- o préstito do Club Carnavalosco dos Gua-<br />

nabarinos, <strong>com</strong> 14 carros, e o Grupo X. P. T. O., <strong>com</strong>posto de creanças.<br />

Dia 8 — O Deputado Nogueira apresenta á Assembléa Legislativa de Curítyba<br />

um projecto de lei. concedendo ao Chefe do Poder Executivo do Paraná o titulo<br />

de Presidente.<br />

Dia 9 — Os matutinos de São Salvador propalam a morte do inspirado poeta<br />

fcahiòno, F^anci^co Manqabeira. occorrida a 5, no Maranhão.<br />

Dia I0 — No Recreio, reprosenta-se. a pedido, a <strong>com</strong>edia de G. Lobato O <strong>com</strong>-<br />

missario de policia".<br />

Dia II — Inaugura-se em Petropolis o Palacio de Crystal. Estréa a Companhia de<br />

Variedades Juán Corona, em cujo elenco figuram músicos excentricos e cantores.<br />

Dia 12 — Informa a "Gazeta" que os colonos aliemães resídcnlcs no Rio Grande<br />

do Sul possuem 30 000 kilcmetros quadrados de terra.<br />

Dia I3 — Circula, em Manáos o l.° c ultimo numero de "A Escova". Em Ipu<br />

(Ceará), surge a "Cidade de Ipú".<br />

Dia 14 — Carnava'. Em Recife, são distribuídos "O Dedo", "O Espanador". "A<br />

Pá" e O Lenhador", jornaes redigidos por foliões.<br />

Dia 15 — O prestifo dos Democráticos, apresentado hontem,. <strong>com</strong>punha-se do 14<br />

carros : "Pega de cães", "Frilhante diamantino", "Carro <strong>com</strong> phantasias". "A<br />

questão Varella", "Incêndio" "As 8 horas do trabalho", "A Ventarola", A confra-<br />

ria do Avança". "A princesa russa", "Carnaval em S. Cosme", etc.<br />

Dia 16 — A imprensa divulga que na casa onde nasceu o Almirante Barroso, cm<br />

Lisboa. foi collocada uma lapide <strong>com</strong>memorativa do facto, occorricio a 29 de Se<br />

tembre de 1804, á rua Garrett n,° 17.<br />

Dia 17 — O Dr. Chriotiano Brasil, Chefe de Policia de Bello - Horizonte, <strong>com</strong>mu-<br />

nica ao do Districto Federal a prisão, em Pirapora, de Obed Cardoso.<br />

Dia 18 — A I kiiometro de Barra Mansa é descoberta uma jazida de mármore<br />

beüc e excellente.<br />

Dia 19 — As torças do Exercito, que se acham no Acre, os 15.°, 36.° e 23.° Ba-<br />

talhões de Infantaria e o 4.° de Artilharia, recebem ordem de regresso.<br />

Dia 20 — E' dada a denominação de "Rua Acre" á nova artéria, que liga á Ave-<br />

nida Central á Avenida Marechal Floriano.<br />

Dia 21 — O Cap. Domingos do Nascimento publica seu livro Pela fronteira'<br />

laureado em concurso pela Sociedade de Agricultura do Paraná.<br />

Dia 22 — Fica suspenso o acto da Camara Municipal de Nictheroy, que concedia<br />

ao Tcnente-Coronel Menezes o fornecimento de carnes verdes á visinha capital.<br />

Dia 23 — No Recreio, a Companhia Dias Braga faz representar "O Mestre do<br />

forjas". Ferreira de Souza e Lucília Peres nos protagonistas.<br />

Dia 24 — Veraneia em Rio Bonito (Estado do Rio) o pintor Antonio Parreiras, que<br />

vem de concluir seu quadro "Natal na roça".<br />

Dia 25 — As fregueiias do Município de São Paulo, não servidas pela illumina-<br />

ção a gaz, resolveram adoptar lampadas a álcool de 40 velas.<br />

Dia 26 — Cogita-se da organização de um syndicato de fabricantes de calçados.<br />

No Cartorio do tabellião Castro, acha-se a escriptura do contracto.<br />

Dia 27 — Para professor de piano dc Instituto Nacional de Musica é nomeado o<br />

Sr. Barroso Netto. I.° premio de harmonia e contra-ponto.<br />

Dia 28 — Oscar Lopes publica na "Gazeta" sua poesia "Hymeneu das Arvores",<br />

que se fecha <strong>com</strong> esta sentença : Cada flor fecundada é a nascente de um frueto.<br />

Dia 29 — O Club Militar estuda o projecto de um dirigível de guerra, o Condor<br />

Brasileiro", concepção do mecânico Faustd Pedreira Machado.<br />

THERMOMETROS PARA FEBRE<br />

oàjlLLcl - JLcnrvcLcnru<br />

HORS CONCOURS


PAGINAS DE UM DIÁRIO JAPONEZ<br />

KYOTO, 5 — 8 — 1938. Passára "Tsuyu", a estação chuvosa, c <strong>com</strong><br />

ella a romantica indolência que sobre mim pesára todo este tempo,<br />

durante o qual cahira dia e noite sem cessar a morna chuva<br />

de verão, gargarejando nas goteiras. Uma névoa branca passára<br />

em nuvens espessas atravez das arvores, subindo de montanha a<br />

cima e envolvendo a cidade inteira em denso e tristonho nevoeiro.<br />

Quando, por fim cessavam as torrentes constantes e o sol de<br />

Julho principiou a reinar em todo o seu esplendor, — em que profusão<br />

floresceram então minhas rosas ! Que extravagante syni<br />

phonia de côres enchia meu pequeno jardim ao desabrochar dos<br />

convólvulos ! O monotono e metallico chilrar dos grillos pairava<br />

sobre mattas e campinas, e no crepusculo o concerto estridente dos<br />

sapos fazia-se ouvir nos arrozaes visinhos.<br />

Chegára o momento das férias escolares; e, por uma linda manhã,<br />

encontrei-me á janella d'um carro de terceira classe, dando<br />

adeus a minha fiel empregada O-Katsue-san, que ficava para guardar<br />

a casa. "Maaaa", — exclamára ella perplexa (e provavelmente<br />

bastante revoltada) quando lhe <strong>com</strong>muniquei minha decisão de viajar<br />

em terceira classe. Nunca tinha se visto coisa semelhante, — uma<br />

"gaikokujin" (pessoa estrangeira) renunciar ao conforto e á distinção<br />

d'uma ac<strong>com</strong>modação de segunda, se não de primeira classe e<br />

misturar-se <strong>com</strong> o povo <strong>com</strong>mum ! Entretanto meu pendor er *<br />

todo para o "povo <strong>com</strong>mum", que segundo minha observação, representava<br />

no mundo inteiro justamente o povo "fóra do <strong>com</strong>mum".—<br />

O trem estava cheio; grande era o calor; e os bancos estofados de<br />

velludo verde tinham sido feitos para gente de estatura muito menor<br />

e, <strong>com</strong>o tal, apertados de mais para as pernas cumpridas da estrangeira.<br />

Em cada estação havia grande procura de sorvetes, hygienicamente<br />

acondiccionadas em caixinhas finas de madeira branca,<br />

ac<strong>com</strong>panhadas d'uma minuscula colherinha de páu. Nas rédes<br />

do waggon, junto <strong>com</strong> maletas occidentaes balançavam-se apetrechos<br />

de pesca, saccos <strong>com</strong> farnel, equipamento de alpinistas, trouxas<br />

embrulhadas em grandes lenços de seda, etc. Dahi a pouco a<br />

senhora idosa sentada defronte de mim cansou de deixar as pernas<br />

penduradas á moda européa, e, quasi imperceptivelmente, alçou-se<br />

sobre o assento, sentando-se então "confortavelmente !" sobre as<br />

suas pernas dobradas. "O jisan" (reverendo avô), n'este intérim,<br />

havia tirado e dobrado cuidadosamente seu kimono de sêda preta e<br />

sentára-se apenas <strong>com</strong> a roupa de baixo, aliás, immaculada, placidamente<br />

abanando-se <strong>com</strong> leque. Que differença entre esta simples<br />

naturalidade e o "exhibicionismo" da moda occidental ! —<br />

Indo eu para as frescas regiões dos Alpes do Norte, tive que fazer<br />

uma baldeação em NAGOYA e tomar uma linha auxiliar para<br />

MATSUMOTO. Nagoya é uma grande cidade industrial, dominada<br />

por um magnifico Castello historico.<br />

Que progresso notável !<br />

Desd- que o Doutor re<strong>com</strong>endou a Maizena Duryca<br />

<strong>com</strong>e alimento ideal para o preparo de prato* especiais<br />

para o bebê, seu apetite melhorou e<br />

ele mostra que realmente gosta de<br />

<strong>com</strong>er A Maizena Duryea é de grande<br />

valor nutritivo e de fácil digestão.<br />

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NOME<br />

RUA L -<br />

CIDADE ESTADO<br />

DORIS DREYES<br />

Trad, por M. L. Moiia Cunha Freire<br />

Nesta estação um grande numero de peregrinos tomou o trem; traziam<br />

em letras negras inscripções sagradas sobre suas vestes de algodão<br />

branco, grandes chapéos de palha nas suas cabeças raspadas<br />

e fortes cajados nas mãos.<br />

Viajavam elles para ZENKOJI, um dos mais populares e antigos templos<br />

buddhistas do Japão, situado nas proximidades de NAGANO<br />

Quizéra eu saber que carga, que desejo cada um d'elles levava ali<br />

consigo, para depositar aos pés de KWANNON-SAMA, o boddhisattva<br />

todo misericordioso ! — De vagarinho rastejava o trem sobre terreno<br />

sempre ascendente; as aguas inquietas do rio KISO serpenteavam<br />

atravez de rochedos cada vez mais ingrimes; pelas janellas abertas<br />

respirávamos uma brisa sempre mais pura e mais fresca. Nas estações<br />

intermediarias os viajantes podiam matar a<br />

sêde <strong>com</strong> um potezinho de chá verde, bem quente,<br />

que lhes era vendido por 5 sen (250 réis). "O domburi",<br />

apresentado em grandes vasilhas de porce-<br />

lana, tentava os famintos. (O domburi consiste em<br />

arroz quente, sobre o qual se serve enguia deliciosamente<br />

preparada).<br />

"O bento" (almoço» n'essa hora encontrava tam-<br />

bém grande acolhida, apressando-se muitos dos<br />

passageiros em pôr seus pauzinhos em actividade;<br />

o arroz era artisticamente apresentado <strong>com</strong> en-<br />

feites de rabanete amarello fermentado, peixe<br />

frito, omelette cortada em fatias e círculos róseos<br />

de pasta de peixe.


4 Illusliação Brasileira<br />

S. Excia o Snr.<br />

MINISTRO ATAULPHO DE PAIVA,<br />

Presidente do Conselho Nacional do Serviço Social»<br />

Presidente Perpetuo da Fundação Ataulpho de Paiva<br />

c e x-P residente da Academia Brasileira,


• *<br />

O embellezamento do bairro da Urea não faltou o pitto-<br />

resco. Ao contrario : bem que sobrou. Montanhas, vales,<br />

gargantas, rochas formidáveis, mar, balneario, ancoradou-<br />

ros, aerodromo, campo de foot-ball e de hippismo, e no<br />

meio de tudo isso, algumas centenas de bungalows de caprichosa e<br />

varia architectura — eis ahi a Urca, o bairro que nasceu da sombra<br />

do Pão de Assucar, ás margens da mais linda enseada do Rio do<br />

Janeiro.<br />

Elie tem o dom de não cansar a vista, porque offerece, de um lado,<br />

os panoramas múltiplos do mar sobre que se balançam pequenos<br />

Uma parte da Urca e a enseada de Botafogo, vistos do alto da Urca Campo de hippismo, ao pé do Morro da Urca<br />

£ Illustração Brasileira


"yachts" e lanchas, e, do outro, as paisagens variadas da montanha<br />

e da floresta, eriçadas de rochas abruptas, rscadas de anfractuosi-<br />

dades, convidando para todas as emoções do alpinismo. E querendo<br />

a visão de um horizonte mais dilatado, basta uma ascensão ao Pão<br />

de Assucar ou ao Morro da Urca, de cujos cimos se gozam os mais<br />

bellos panoramas da terra carioca.<br />

f/mu*<br />

A reportagem photograph : ca destas paginas dá ao leitor uma idéa<br />

muito v«va sobre o encanto desse pedaço da Capital Federal sobre<br />

o qual a mão de Deus e a mão do homem, igualmente pródigas,<br />

deixaram cair tantas coisas agradaveis.<br />

Outro trecho encantador da Urca, vendo-se a ponte da Saudado,<br />

Grand%s arvores dão á Urca um encanto paradisíaco <strong>com</strong> seu pitoresco ancoradouro e o Fluminense Yacht C ub<br />

Fevereiro 11)40 7


OUVIA - SE, de quando em quando, a voz<br />

do gerente indicando aos visitantes o<br />

lugar procurado :<br />

— Terceiro balcão, à esquerda.<br />

Era curioso. Em pleno inverno, não se parava<br />

de vender leques e ventarolas. O verão havia<br />

passado fazia muito tempo, as mulheres já<br />

prateavam o pescoço <strong>com</strong> o pelo das raposas<br />

mais raras, as tardes tinham um véu de neblina<br />

para caracterizar o inverno, os homens não despresavam<br />

o sobretudo. Entretanto, continuava<br />

a freguesia de leques, <strong>com</strong>o se ainda se estivesse<br />

na estação calmosa.<br />

Entravam fregueses e fregueses à procura de<br />

abanadores. O gerente indicava :<br />

— Terceiro balcão, à esquerda.<br />

Por trás da armação, vestida de preto, <strong>com</strong> a<br />

gola branca que <strong>com</strong>pletava o uniforme do<br />

emprego, via-se uma creatura jovem, mais bonita<br />

do que era necessário para adornar o ambiente<br />

da loja. A todos os que a visitavam<br />

distribuía uma gota de luz, movendo uns olhos<br />

sensuais, que eram uma especie de promessa<br />

coletiva. Ninguém possuia a faculdade de<br />

possuir um par de olhos <strong>com</strong>o aqueles. Que<br />

olhar ! Não era somente um dom. Era já<br />

privilegio. Nada de estudado. Tudo natural,<br />

de uma naturalidade cativante, por isso mesmo<br />

terrível. Quando falavam <strong>com</strong> ela, insensivelmente<br />

atendia <strong>com</strong> os olhos. E vinha deles<br />

uma coisa rara, que descia das palpebras, tomava<br />

conta do rosto e a iluminava inteiramente,<br />

extranhamente. Aquele olhar ! Seria possível<br />

que não fosse inventado, estudado, copiado ?<br />

Não. Nenhuma artista o lançara. Nenhuma<br />

gravura, nenhuma estampa, nenhuma imagem<br />

o possuia. Era virgem, exato, original. Por<br />

isso mesmo, os homens não se cansavam de<br />

aplaudi-lo <strong>com</strong> galanteios. Uns galanteios gulosos,<br />

que circundavam o balcão, a pretexto de<br />

<strong>com</strong>pras. Mesmo as mulheres não se julgavam<br />

diminuídas em admira-lo. Prestavam-lhe a homenagem<br />

de uma contemplação furtiva, enciumada<br />

mas reverente.<br />

A empregada continuava a distribuir por todos<br />

um pedaço a cada um — a fatia divina que<br />

estava nela em estado de graça. Fazia-o distraída,<br />

insensível, misturando os olhos <strong>com</strong> os<br />

deveres. E <strong>com</strong>o a interpretavam ? Seria<br />

curioso saber. Pela expressão de cada fisionomia,<br />

fôra fácil adivinhar <strong>com</strong>o se criam<br />

pagos pelo talisman da vendedora os que <strong>com</strong>pravam<br />

outras mercadorias. Teria ela culpa ?<br />

Era outro problema que acendia no espirito dos<br />

regueses indagações maliciosas. Afinal, porque<br />

cargas dagua o proprietário da loja colocara<br />

naquele balcão uns olhos dessa marca ? Haveria<br />

uma razão oculta justificando a afluência<br />

de fregueses interessados em <strong>com</strong>prar leques,<br />

quando o termômetro acusava temperatura tão<br />

baixa.<br />

Aqueles olhos ! Desde que eles entraram para<br />

a loja, o ambiente se modificara. O terceiro<br />

balcão à esquerda passou a contar <strong>com</strong> uma<br />

clientela nunca vista. E o encarregado das<br />

vitrines, que sempre fôra insensível à solicitações<br />

femininas, que sempre se mostrara indiferente<br />

à faceirice das outras, foi o primeiro a<br />

sofrer a tentação dos recem-vindos. Deixou-se<br />

cativar pelos encantos da nova empregada. E<br />

vigiava-a de longe, a principio apenas enamorado<br />

; depois, enamorado e zeloso. Quizera<br />

sosinho receber a luz daqueles faróis. E inquietava-se<br />

toda vez que eles se dirigiam para outros<br />

naufragos ou viajantes.<br />

No <strong>com</strong>eço, tais cenas satisfaziam a vaidade do<br />

rapaz, justificando de certo modo o acerto de<br />

3 Illustraçâo Brasileira<br />

o s v<br />

D A A C<br />

sua preferencia. Para o fim. era já contratempo,<br />

aborrecimento e castigo. Os olhos da<br />

rapariga, mobilisados o dia inteiro para a contemplação<br />

de todos e cortesia de cada um.<br />

passaram a constituir uma preocupação. O<br />

enamorado foi sentindo a tortura do esbulho.<br />

Julgava-se preterido, quando não ludibriado.<br />

Cada vez que a empregada ia atender a um dos<br />

fregueses, uma onda de ciúme lhe tomava os<br />

sentidos. Via fixados em outro aqueles olhos<br />

que lhe pareciam privativos. Não se conformava<br />

<strong>com</strong> esse contacto da vista, mesmo fugidio<br />

e eventual.<br />

A' saida da loja, ele a advertia <strong>com</strong> o zelo do<br />

homem apaixonado :<br />

— Aquilo não era direito. Devia olhar <strong>com</strong><br />

mais seriedade as pessoas. Já haviam reparado<br />

na desenvoltura <strong>com</strong> que recebia galanteios de<br />

uns e outros. Não era à tôa que o seu balcão<br />

vivia cheio de don juans e indivíduos apresentados<br />

e pelintras. Os homens tinham o faro<br />

da presa, sentiam de longe o cheiro das facilidades.<br />

Tal maneira de olhar era um convite<br />

acintoso às concupiscências soltas na rua. Tivesse<br />

cautela e decoro. Devia lembrar-se que<br />

era uma criatura <strong>com</strong>prometida. Já se falava<br />

tanta coisa . . .<br />

Realmente os ouvidos do rapaz viviam cheios<br />

de avisos pouco re<strong>com</strong>endáveis.<br />

A moça não entendia bem a linguagem das advertências.<br />

Corrigir-se ? Então seus olhos<br />

eram culpados ? De que, santo Deus ? Onde<br />

o motivo ? Que haviam feito de mal para<br />

enlicarem <strong>com</strong> ela ? Todas essas interrogações<br />

lhe ficavam bailando na imaginação. Então<br />

era em outro sentido que os homens a fitavam,<br />

que a procuravam ? Não sabia nada disso.<br />

Mas a gravidade <strong>com</strong> que o noivo lhe falava,<br />

o tom sisudo que punha nas palavras, enchia-a<br />

de tristeza. Tristeza de não ser <strong>com</strong>preendida.<br />

De ser mal julgada. O peor é que não podia<br />

governar os olhos. Como fazê-lo ? Eles eram<br />

assim porque eram. Não havia remedio. Nem<br />

ela tinha culpa de haver nascido daquele jeito,<br />

de trazer a beleza <strong>com</strong>o um castigo, quando os<br />

outros trazem <strong>com</strong>o premio. Contradições do<br />

berço. Sentia que as colegas a espiavam <strong>com</strong><br />

prevenção, que em torno de si havia um mistério,<br />

um cruzamento de suspeitas mal disfarçadas.<br />

Nunca imaginara, porém, que se fizesse tal<br />

juízo a seu respeito, que os seus olhos fossem<br />

julgados daquela fôrma. Via-se agora ao espelho.<br />

Não descobria a causa de tanto rumor.<br />

Olhava <strong>com</strong>o toda gente. Si havia mal, não<br />

estava nela. Não atinava. Ou melhor : não<br />

sentia. Nem chegava a alcançar a extensão<br />

de seu drama, que era, afinal, o drama de todas<br />

as creaturas cuja belesa não tinha proteção<br />

nem apoio.<br />

Agora meditava. Aqueles olhos não representavam<br />

um enfeite, mas uma condenação. Estavam<br />

longe de ser um adorno. Eram um convite<br />

. Cada qual se julgava senhor de seus<br />

encantos. Não podia mover as contas negras<br />

em presença de alguém, sem que logo se atravessasse<br />

no espirito da gente uma suspeita imediata<br />

: será honesta ? Mas se é, por que olha<br />

assim ? E na imaginação de cada um gerava-se<br />

logo a flôr da lisonja e da audacia. O que<br />

todos viam espelhar-se nos olhos era um corpo<br />

cheio de desejos e uma alma cheia de ambições.<br />

E, assim, o trabalho e o dever transformavam-se<br />

em sua fisionomia em um campo de tentações,<br />

simples pretexto para o sonho e para o pecado.<br />

E fossem dizer que não era ! Fossem defendê-la,<br />

A L D O O R I C O<br />

A D E M I A B R A S I L E I R A<br />

alegando a necessidade de sustentar três irmãosinhos,<br />

de ajudar a casa, de não ser pesada a<br />

ninguém, de vestir-se e apresentar-se <strong>com</strong>o toda<br />

gente ! Logo a malícia crestaria cada argumento<br />

<strong>com</strong> o seu poder invencível de julgar as<br />

coisas, <strong>com</strong> uma réplica total e fulminante :<br />

aqueles olhos ... O interesse burguês, <strong>com</strong>odo e<br />

maléfico, não admitiria outro raciocínio. Uns<br />

olhos assim, boiando num corpo jovem e indefeso,<br />

repeliam qualquer presunção de honestidade.<br />

* * *<br />

E a rapariga <strong>com</strong>eçou então a experimentar a<br />

força dessa ameaça, desfechada por todas as<br />

conciencias. Até o noivo, que fôra o primeiro<br />

a inclinar-se pela expressão dos seus olhos, agora<br />

desconfiava deles. E <strong>com</strong>o provar-lhe que eram<br />

os mesmos, que à superfície daqueles lagos, nenhuma<br />

outra imagem havia ficado gravada ?<br />

A calunia rondava-lhe o corpo, espreitava-lhe<br />

o semblante, colocando-lhe uma etiqueta denunciadora.<br />

Seria inútil defender-se, explicar a natureza<br />

do olhar, mixto de dôr e ausência. Ninguém<br />

acreditaria possível um milagre conjugal<br />

naqueles olhos de alcova !<br />

Com o correr do tempo, parecia que mais se acentuava<br />

tal vocação. Onde tais olhos pousassem,<br />

tudo se impurificava. Tinham o dom esquisito<br />

de acenar volúpias e despertar sensações dissimuladas,<br />

que chegavam cá fôra sob a capa de<br />

gentilesas. Mandavam-lhe flôres, flores que<br />

eram simples disfarces de apetites. Ela as recebia<br />

inocente e desprevenida, sem imaginar que<br />

em cada aroma ia um hálito de prostituição, uma<br />

caricia do instinto. A vida não lhe consentia<br />

outras alegrias. Forçoso era aproveitar aquela,<br />

mesmo que lhe custasse o sacrifício da reputação.<br />

Afinal, era mulher. Tinha de sentir<br />

o mel da vaidade, ainda quando viesse <strong>com</strong> o<br />

gosto de calunia.<br />

O noivo é que não se conformava.<br />

A principio, ainda<br />

suportava a situação,<br />

submetendo-se aos aleives.<br />

Mas depois, o zum - zum, o<br />

falatorio daqui e dali, as<br />

insinuações, o ambiente da<br />

loja, tudo veio em auxilio<br />

de uma solução brusca : o<br />

rompimento. Desfez-se o<br />

noivado. A frieza <strong>com</strong><br />

que a moça recebeu a noticia<br />

confirmou a impressão<br />

geral de que não gostava<br />

do rapaz. Nem de<br />

ninguém. Gostava apenas<br />

de si. E os <strong>com</strong>entários<br />

das colegas não se fizeram<br />

esperar.


— Repare <strong>com</strong>o está hoje. Ê a mesma de<br />

sempre. Nem parece que foi <strong>com</strong> ela. Outra<br />

qualquer sentiria nem que fosse um pouquinho.<br />

Também admiradores não lhe faltam. Com<br />

aqueles olhos . . . Crédo ! Parecia, realmente,<br />

que nunca o desgosto chegaria aos olhos da rapariga.<br />

Jamais seriam visitados pela tristeza.<br />

Eles estavam <strong>com</strong>o sempre, intranquilos e quentes,<br />

estendendo-se a uns e outros, <strong>com</strong>o si soltassem<br />

promessas no ar. Quem os fitasse, imaginaria,<br />

de fato, que o rompimento do noivado<br />

fosse mais um alivio do que um castigo. Porque<br />

os olhos brincavam <strong>com</strong>o sempre aquela<br />

brincadeira tragica de quem não conhece o destino<br />

e, por isso mesmo, está sempre satisfeito<br />

<strong>com</strong> ele.<br />

• * *<br />

A ausência da empregadinha, no dia seguinte,<br />

só foi notada quando chegaram os primeiros fregueses,<br />

que constituiam a clientela enamorada<br />

do balcão n.° 3.<br />

Aproximavam-se, viam outra pessoa a atender<br />

à freguesia e desistiam de <strong>com</strong>prar leques.<br />

Também estava tão frio . . .<br />

Por que teria faltado ? Com certesa outros<br />

amores a arrastavam à impontualidade. Logo<br />

agora que estava livre, sem as impertinenecias<br />

do noivo, sem ter a quem dar contas de si . . .<br />

Era natural que faltasse. Outros caminhos se<br />

lhe rasgavam à leviandade e à cobiça. E havia<br />

na loja uma sensação de alivio pela ausência<br />

daquela creatura, de quem todos se sentiam<br />

rivais, porque monopolisava a atenção e o interesse<br />

dos fregueses. Um ar de felicidade e<br />

desafogo se estampava na fisionomia das colegas,<br />

principalmente das que a falta de uns<br />

olhos belos exasperava a honestidade, tornandoas<br />

puritanas e agressivas.<br />

Para toda aquela gente despeitada e hostil, a<br />

falta da rapariga era uma vitoria, porque importava<br />

numa confissão. As outras olhavam<br />

para o ex-noivo <strong>com</strong>o a indicar-lhe o perigo de<br />

que se livrara. Onde estaria àquelas horas ?<br />

Só ele se inquietava. A quem olharia, <strong>com</strong><br />

aqueles olhos que o haviam encantado tantas<br />

vezes e dos quais ainda se sentia cativo ? E se<br />

fosse possivel recupera-la ? Dar-lhe outros<br />

conselhos e reconciliar-se, afinal . . . Havia<br />

tanta doçura numa reconciliação ! Nem admitiu<br />

que ficasse ridiculo. Deixou a loja. Correu<br />

para a casa dela. Viu flôres à entrada. Sempre<br />

aquelas flôres a atormentar-lhe a existencia,<br />

a excitar-lhe o zelo . . . Pisou-as. Não reparou<br />

que eram pobres, modestas. Varou o corredor<br />

e chegou ao quarto onde a rapariga repousava,<br />

<strong>com</strong>o se estivesse ainda dormindo.<br />

E dormia, de fato, de olhos ignotos e parados,<br />

velada por duas ou três creanças, que a fitavam<br />

inconscientes, sem explicar porque a irmã, tão<br />

madrugadora e pontual, ainda não acordara<br />

naquele dia.<br />

Sacudiu-a. Chamou-a. Gritou para dentro de<br />

sua alma, que estava agora muda. Tentou<br />

ainda mover aqueles olhos, que ele proprio desejara<br />

que ficassem parados nos seus. Parados,<br />

<strong>com</strong>o ele queria. Como todos queriam.<br />

E não era que um dia ela lhes fizera a<br />

vontade ?


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A PROPOSITO DO CENTENARIO DE D. SILVÉRIO<br />

ESTA curiosa photographia tem, actualmente, a mais viva opportunidade. Foi ella colhida a 28 de Maio de 1920 quando a Acade-<br />

mia de Letras, em sessão solemne, recebeu e empossou a Dom Silvério Gomes Pimenta, illustre prelado patrício que era, ao mesmo<br />

tempo, um dos luminares das nossas letras. A Casa de Machado de Assis vem de prestar, justamente agora, tocantes homenagens a Dom<br />

Silvério, por motivo do centenário de seu nascimento, razão pela qual nos occorreu offerecer aos leitores este precioso documento,<br />

aliás bem pouco conhecido. Fazem parte do grupo : Sentados — Lauro Muller, Rodrigo Octávio, Don Silvério Gomes Pimenta, Carlos<br />

de Laet, Affonso Celso e Luiz Guimarães. De pé — Dantas Barreto, Ataulpho de Paiva, Afrânio Peixoto, Augusto de Lima, Miguel<br />

Couto, Medeiros e Albuquerque, Felinto de Almeida, Paulo Barreto, Silva Ramos, Aloysio de Castro, Luiz Murat, Osorio Duque Estrada,<br />

Antonio Austregésilo, Mario de Alencar, Alberto de Oliveira, Goulart de Andrade Humberto de Campos, Felix Pacheco e Coelho Netto<br />

massas lateraes para povoar o campo, fazendo-a balançar equi-<br />

libradamente : de um lado, o poder civil e, de outro, o religio-<br />

so. Assim a I 8 de julho de 1841 apparece no seu duplo presti-<br />

gio. O episodio fixado foi o ultimo da coroação : a proclama-<br />

ção, e que se realisou na varanda adrede preparada por Arauio<br />

Porto Alegre, architecto e pintor. A scena, assim, se passa na<br />

Capella Imperial, do Rio de Janeiro.<br />

O segundo painel focou, <strong>com</strong>o therna, a partida da família<br />

imperial para o exilio. E" a madrugada de I 7 de novembro de<br />

1889 que Raul Pompeia tão lucidamente descreveu <strong>com</strong>o sen-<br />

do Uma noite histórica. Mas a figuração synthetica que Carlos<br />

Oswald escolheu não é a do embarque, no caes do Pharoux.<br />

E, sim, a scena da descida da escadaria dp paço, trazendo pelo<br />

braço a Imperatriz. O exilado tira o chapéo numa ultima sau-<br />

dação aos que lhe apresentam armas e ao official que o saúda<br />

<strong>com</strong> a espada.<br />

Ambos os painéis pretendem offerecer uma collecção de retra-<br />

tos de valor historico. E. de "tal sorte, constituem mais uma<br />

allegoria, para cada momento, do que obra de valor artístico,<br />

<strong>com</strong>o traducção imaginativa.<br />

Ao centro da capella — destaca-se a crypta : — a lage, ou<br />

plate-tombe, não parece definitivamente installada : as figuras<br />

jacentes dos imperadores foram esculpidas pelo esculptor Ma-<br />

gran,~*"autor da estatua de Pedro II que domina a praça de PE-<br />

trópolis, appellidada a Bacia. Essa especie de tabula, ao que<br />

parece, não foi ainda fixada, dando assim uma impressão de<br />

instabilidade.<br />

No mais, tanto o monumento funerário, <strong>com</strong>o a decoração e<br />

a capella mesma, tudo foi concebido e executado para dar<br />

uma excellente impressão de serenidade, grandesa tranquiiia<br />

e um sentimento muito delicado de evocação e reconhecimento.<br />

Não se negará que a cathedral concorre, <strong>com</strong> sua belleza sim-<br />

ples e austera, para o effeito de conjuncto, dando a tudo uma<br />

das mais bellas realisações architectonicas e plasticas do Brasil.<br />

4- k^o^ojyo^<br />

Illustraçfio Brasileira 11


O L E G Á R I O M A R I A N N O<br />

Da Academia Brasileira<br />

Beretê ! No teu sangue tumultúa<br />

O odio ás u bandeiras" invasoras . . . Passa<br />

Da lua vida na. paisagem núa<br />

O Amor — vento de gloria e de desgraça.<br />

Se em teu corpo moreno se insinúa<br />

Flor de frescura e de beleza, — a graça,<br />

O orgulho dos teus géstos perpetúa<br />

O indomável ardor da vua raça.<br />

Em teus olhos pequenos e selvagens,<br />

Como no espelho móvel das paisagens,<br />

Vejo rios, penhascos e cachoeiras.<br />

E a tua voz sem timbre me parece<br />

Um som longínquo de borés que viesse<br />

No fundo das florestas brasileiras . . .


VISITA Á CASA DE<br />

OSWALDO CRUZ<br />

No mundo onde não se conhe-<br />

cem vaidades, invejas ou<br />

mesquinharias, mas onde só<br />

se trabalha em prol da<br />

humanidade soffredora.<br />

AGORA que o governo brasileiro, bem<br />

inspirado, na faina patriótica de cultuar<br />

os grandes nomes que, abnegadamente,<br />

em todos os ramos da actividade humana,<br />

ajudaram a cimentar a nacionalidade;<br />

agora que se projecta erigir á memoria<br />

do saudoso sábio patrício, Oswaldo Cruz,<br />

um monumento que perpetue, <strong>com</strong> dignidade,<br />

os seus altos feitos, no terreno da sciencia,<br />

em beneficio do nosso povo, em particular,<br />

e da humanidade, em geral. — uma<br />

visita ao Instituto Manguinhos, a bemfeitora<br />

fortaleza em que elle se entrincheirou para<br />

o rude <strong>com</strong>bate aos inimigos do organismo<br />

humano, se impunha desde logo.<br />

Um photographo, algumas chapas e para lá<br />

nos dirigimos.<br />

— E' a "ILLUSTRAÇAO BRASILEIRA", que<br />

deseja fazer uma visita ao maior reducto cia<br />

Sciencia, na America do Sul.<br />

O acolhimento que nos é dispensado, captiva-nos<br />

e <strong>com</strong>move-nos. Os mais alcos dirigentes<br />

do notável estabelecimento se põem<br />

á nossa disposição, franqueando-nos aqueile<br />

grande mundo, onde numerosos sábios, vivendo<br />

exclusivamente para o saber, consomem<br />

toda a existencia. Alli não ha vaidades,<br />

não ha invejas, não ha pequeninas <strong>com</strong>petições:<br />

alli ha, tão somente, a vontade, o<br />

desejo, o escopo de bem servir os que soffrem,<br />

de alliviar a carga pathologica que a<br />

creatura humana carrega <strong>com</strong>o um castigo.<br />

A fachada do palacio em estylo mourisco, do Instituto de Manguinhos<br />

Busto de Oswaldo Crux, erigido á mages-<br />

tosa entrada do Instituto de Manguinhos<br />

O anno de 1899 assignala uma nova era nos<br />

fastos intellectuaes do Brasil. Nessa época<br />

Pasteur já havia diffundido pelo universo os<br />

pontos das suas observações: as suas theorias<br />

<strong>com</strong>pletamente novas já empolgavam os<br />

homens de sciencia do mundo inteiro.<br />

Por esse tempo, <strong>com</strong>o muito bem frizou um<br />

dos biographos do immortal hygienista, nós<br />

éramos ainda um paiz onde não se acreditava<br />

em microbios. Entretanto, não faltavam<br />

nomes que nos pudessem tirar de tal vexatória<br />

situação: Pedro Severiano de Magalhães,<br />

Chapot Prevost, Domingos Freire, F.<br />

Fajardo, Ismael da Rocha, Emilio Gomes e<br />

outros que trabalhavam <strong>com</strong> o afan, no sentido<br />

de levar á clinica a vantagem das noções<br />

etiologicas. Não havia, sem embargo,<br />

ambiente.<br />

De repente, porém, nos fins desse mesmo<br />

anno de 1899 irrompe, em Santos e no Rio,<br />

um surto de peste. A' voz da imprensa, que o<br />

proclama, verificam os poderes públicos que<br />

não dispõem de recursos, nem para prevenir,<br />

nem para <strong>com</strong>bater o mal. E\ então, que a<br />

Prefeitura do Districto Federal resolve avocar<br />

a si a iniciativa de fundar um estabelecimento<br />

que se destinasse á preparação de<br />

um soro ou vaccina contra a terrivel doença<br />

ameaçadora. O prefeito Cesário Alvim resolve<br />

confiar ao barão de Pedro Affonso — que<br />

fóra o introduetor da vaccina animal nt<br />

Brasil — a organização do novo Instituto.<br />

Sem demora, deu o barão todos os passos necessários<br />

ao desempenho da importante missão<br />

que lhe era determinada. Havia, porém,<br />

o receio de que não houvesse um especialista<br />

em condições de arcar <strong>com</strong> a responsabili-


No Laboratorio de Physiologia do prof. Miguel Osorio de Almeida. O assistente, dr. Mario Vianna<br />

Dias, faz uma demonstração pratica para a "lllustração", extrahindo o labyrintho de uma rã<br />

O Laboratorio de Ontomologia do dr. Arthur Neiva, em plena actividado<br />

Cavallariça, cujos animaes fornecem sangue para o fabrico de soros<br />

dade do futuro Instituto. Entretanto, a esse<br />

tempo, conforme asseveram os historiographos<br />

de Manguinhos, Oswaldo Cruz já <strong>com</strong>provara<br />

a sua reputação de homem de sciencia,<br />

quando pouco antes fizera, em caracter<br />

official, e <strong>com</strong> a maxima pericia, o diagnostico<br />

bacteriologico <strong>com</strong>pleto da doença reinante<br />

em Santos, conforme constava do seu<br />

relatorio apresentado ao ministro do Interior<br />

de então. Era proverbial, também, em<br />

todo o paiz, a <strong>com</strong>petencia do jovem sábio<br />

patricio, adquirida em longo aprendizado no<br />

Instituto Pasteur, de Paris. Assim estava<br />

elle indicado para um posto de alta relevância,<br />

mesmo quando não se levasse em linha<br />

de conta os elogios altamente significativos<br />

que lhe prodigalizara o celebre professor<br />

Roux, seu mestre.<br />

Afinal foi organisado o primeiro quadro do<br />

pessoal que devia trabalhar na projectada<br />

repartição da Prefeitura: Director Administrativo,<br />

Barão de Pedro Affonso; bacteriologistas:<br />

Oswaldo Cruz e Ismael da Rocha;<br />

auxiliares-estudantes, Augusto Paulino Soares<br />

de Souza e Ezequiel Caetano Dias.<br />

Contemporaneamente, escolhia-se o local<br />

para a installação do estabelecimento: a<br />

chamada fazenda de Manguinhos, de propriedade<br />

da Prefeitura. Entrementes, o Barão<br />

de Pedro Affonso embarcava para a Europa,<br />

<strong>com</strong> a lista do material de laboratorio,<br />

fornecida por Oswaldo Cruz. Para não se<br />

perder tempo, davam-se as primeiras providencias<br />

para a realização de exames em animaes,<br />

destinados á preparação do sóro. Tudo<br />

isso, porém, encontrava obstáculos: a<br />

penúria financeira do municipio, o decréscimo<br />

dos casos de pestes etc...<br />

Aos 25 de Maio de 1900, encetavam-se os trabalhos<br />

preliminares, confiados ao mesmo<br />

pessoal (excepto o doutorando Auguslo Paulino),<br />

que se via accrescido dos nomes do dr.<br />

Henrique Figueiredo de Vasconcellos e do<br />

veterinário Carré. Pouco depois vinha juntar-se<br />

á pequena collectividade mais um: o<br />

do 4.° annista de medicina Antonio Cardoso<br />

Fontes, actual director de Manguinhos e nome<br />

conhecido universalmente nos domínios<br />

do Saber.<br />

Emfim, aos 23 de Julho de 1900, inauguravase<br />

o Instituto Sorotherapico Federal <strong>com</strong> a<br />

Interior; conselheiro Nuno de Andrade, direpresença<br />

do dr. Epitácio Pessoa, ministro do<br />

ctor da Saúde Publica; drs. Camillo Terni,<br />

Carlos Seidl, Emilio Gomes e representantes<br />

da imprensa.<br />

Ao terminar o anno de 1902 exonerou-se o<br />

barão de Pedro Affonso. Resolveu então o<br />

governo conliar a Oswaldo Cruz a direção<br />

geral do Instituto. Em seguida, é elle nomeado<br />

director da Saúde Publica. Ahi <strong>com</strong>eça então<br />

a grande fama do fundador da medicina<br />

experimental no Brasil e o grande papel que<br />

o Instituto desempenharia no desenvolvimento<br />

da sciencia.<br />

Oswaldo Cruz assume, então, o <strong>com</strong>promisso<br />

de erradicar do Rio a febre amarella no<br />

praso improrogavel de tres annos. E assim<br />

acontece.<br />

A "ILLUSTRAÇAO BRASILEIRA" aproveita<br />

a opportunidade para percorrer as varias de-


pendencias do Instituto. Além, do edifício<br />

principal, onde funccionam os laboratorios,<br />

as salas de prelecção, o museu, a bibliotheca,<br />

ha ainda o pavilhão para estudos da peste;<br />

a cavallariça para animaes fornecedores de<br />

sôros; grande bioterio para pesquizas em<br />

grandes animais; pequeno bioterio; viveiro<br />

para criação de pequenos animaes de laboratorio;<br />

fornos crematorios e apparelhos de<br />

desinfecção; pavilhão hospitalar paru moléstias<br />

humanas; pavilhão hospitalar para moléstias<br />

de animaes; aquarios para animaes<br />

de agua doce e saldada; habitação para o<br />

pessoal de serviço e um magnifico parque.<br />

Almoçámos em <strong>com</strong>panhia do nosso esplendido<br />

"cicerone", o Pinto, funccionario ccm 32<br />

annos de casa, habilissimo photographo e cinematographista<br />

do estabelecimento. A seguir<br />

somos conduzidos ao laboratorio de Physiologia<br />

do prof. Miguel Osorio de Almeida,<br />

onde assistimos, especialmente para nós, a<br />

diversas experiencias no corpo de uma rã,<br />

pelos illustres assistentes drs. Mario Vianna<br />

Dias e H. Monssatché.<br />

O laboratorio do Dr. Arthur Neiva estava,<br />

também, em plena actividade. Surprehendemos<br />

todos os seus auxiliares ao microscopio.<br />

Alli se pesquisa exclusivamente o campo da<br />

ontomologia.<br />

Ir ao Instituto Manguinhos e não visitar o<br />

Museu, não é evocar <strong>com</strong>pletamente a me •<br />

moria de Oswaldo Cruz. O Museu de hoje é<br />

o seu antigo gabinete de trabalho. Alli tudo<br />

está <strong>com</strong>o elle o deixou, no seu ultimo dia de<br />

trabalho, antes de jornadear para a Eternidade.<br />

Alli está a sua preciosa bibliotheca,<br />

em cujos volumes havia o sabor e a experiencia<br />

de que necessitava para levar avante<br />

os seus notáveis trabaliios. Ali vemos, ainda,<br />

desordenadas, nas pratileiras, as obras da sua<br />

predilecção: obras <strong>com</strong>pletas de Molière, o<br />

"Gil Blas de Santillana", Chateaubriand ao<br />

lado de um tratado de Semiótica Nervosa;<br />

Lamartine de braço dado <strong>com</strong> Testut; clássicos<br />

<strong>com</strong>o Azurara, misturado <strong>com</strong> patholo- Galeria principal do Instituto Oswaldo Cruz<br />

O Museu, antigo gabinete de trabalho de Oswaldo Cruz, no estado<br />

em que o deixou o saudoso sábio, na ultima vez que ali trabalhou<br />

gistas allemães; Spencer par a par <strong>com</strong> Shakespeare<br />

(<strong>com</strong>plete works); obras <strong>com</strong>pletas<br />

de Willemani, e quantos outros: dezenas,<br />

centenas de outras obras. Vê-se, no recinto,<br />

o formigueiro em que estudava a vida das<br />

saúvas. Muitas photographias, o fardão de<br />

acadêmico, diplomas de um sem numero de<br />

sociedades scientificas dos cinco continentes<br />

.. . Numa das paredes esta placa de<br />

bronze:<br />

"Oswaldo Gonçalves Cruz — fundador da<br />

medicina experimental no Brasil — Desta<br />

sala, hoje museu de suas recordações, <strong>com</strong><br />

sabedoria e justiça, dirigiu Oswaldo Cruz os<br />

destinos deste Instituto e estabeleceu os fundamentos<br />

do seu prestigio — 1872 — 1917".<br />

Oswaldo Cruz, toda vez que voltava da Europa,<br />

costumava dizer:<br />

— Quanto mais conheço o extrangeiro mais<br />

amo e gosto dos meus patrícios.<br />

Isto basta para definil-o <strong>com</strong>o patriota.<br />

Saibamos honral-o, perpetuando a sua memoria<br />

<strong>com</strong> um monumento á altura da grandeza<br />

do seu coração e da sua sabedoria.


A METROPOLE AO SEU SANEADOR<br />

n RGUENDO um monumento a<br />

Oswaldo Cruz na capital da Republica,<br />

presta o nosso paiz a mais<br />

justa e a mais inadiavel das homenagens<br />

áquelle que desempenhou, em<br />

dado momento historico, papel relevantíssimo<br />

na vida nacional.<br />

Oswaldo Cruz, que foi talvez o nosso<br />

único sociologo pratico, conseguiu,<br />

pela sua acção, pelo seu valor e pela<br />

sua capacidade, criar para os brasileiros<br />

uma nova mentalidade provando,<br />

entre outras coisas, que cada um<br />

precisa da saúde de todos, que a hygiene<br />

é uma medicina preventiva<br />

mais do grupo que do individuo e<br />

que a restricção da liberdade individual,<br />

no tocante á hygiene, redundava<br />

no beneficio do conjuncto urbano.<br />

Por isso mesmo tem despertado vivo


interesse o concurso aberto entre<br />

artistas para escolha do melhor e<br />

mais apropriado monumento ao saneador<br />

do Rio de Janeiro, cujas<br />

màos fizeram o milagre de transformar<br />

a velha Corte na metropole saudavel<br />

que hoje tem o titulo de maravilhosa.<br />

Cerca de trinta foram os trabalhos<br />

apresentados a julgamento, no Concurso,<br />

e o numeroso publico, que<br />

affluiu ao saguão da Escola Nacional<br />

de Bellas Artes, poude apreciar, na<br />

concepção dos nossos melhores ar-<br />

tistas, as mais bellas syntheses que<br />

a esculptura pode crear, no seu papel<br />

de arte consagradora por excellencia.<br />

Sao alguns dos monumentaes traba-<br />

lhos concorrentes que aqui apparecem,<br />

nas reproduções photographicas<br />

desta pagina, e pelos quaes nossos<br />

leitores poderão formar uma idéa<br />

do êxito alcançado pelo certamen.


O RIO DE HA 30 ANNOS...<br />

18 Illustração Brasileira<br />

©<br />

bairro aristocrático do Império era o de São<br />

Christovão. A sociedade elegante da Republica<br />

preferiu, entretanto, Botafogo. Por algum tempo,<br />

Botafogo dividiu a sua supremacia <strong>com</strong> a Tijuca e<br />

perdeu-a, depois, para Copacabana. Ainda hoje, é um<br />

dos bairros mais bellos do Rio, senão pela graça da<br />

architectura residencial, ao menos pelo encanto dos seus<br />

jardins, de suas quintas e. principalmente, pelo maravilhoso<br />

corte da sua enseada.<br />

A fachada de Botafogo é a sua praia, rodeada, hoje. de<br />

jardins maravilhosos. Entre collinas suaves e o mar<br />

tranquillo, os arranha-céos impertigam-se enormes e pesados<br />

<strong>com</strong> os seus mil buracos e o seu todo de colmeia<br />

immensa.<br />

A arborização da praia de Botafogo é um dos encantos<br />

do Rio de hoje. Ha trinta annos, quando essas arvores<br />

copadas que lhe hoje dão sombra e pittoresco, não<br />

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passavam de frágeis mudas,<br />

essa avenida praieira<br />

já possuia um bello<br />

jardim, mas não differia<br />

muito de qualquer praça<br />

de cidade do interior.<br />

Podemos ter uma exacta<br />

noção da maravilhosa<br />

transformação de Botafogo<br />

em 30 annos atravez<br />

destas photographias que.<br />

fixam três aspectos da<br />

actualidade, ao lado de outra,<br />

tirada em 1910.<br />

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... E O RIO DE HOJE<br />

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N A T U R E Z A M O R T A<br />

Tela de Gilberto Trompowsky


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Aspectos<br />

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1 —Lagoa de Piratininga - (Estado do Rio) Photo de João G. v. O. Martin.<br />

2 — Fundo de quintal - (Queimadas-Bahia) Photo de Voltaire Fraga.<br />

3 — J aboticabeira florida -(S. Paulo) Photo «Fotoptica».<br />

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ALOYSIO DE CASTRO<br />

(Da Academia Brasileira)<br />

HISTORIA<br />

DE<br />

LILIANA<br />

(RECORDAÇÕES DE ALBERTO DE OLIVEIRA)<br />

QUANDO foi ? Foi um dia, ha bons quinze<br />

annos, em Veneza.<br />

Ella vinha <strong>com</strong> traje de baile, <strong>com</strong>o uma<br />

gentildona do século XVIII. Era alta, tinha os<br />

cabellos prateados <strong>com</strong>o as damas dos bons tem-<br />

pos, o collo niveo e uns braços que eram dois lyrios, de tão brancos. Nos<br />

olhos a secreta luz do sonho. Tudo era belleza e graça espiritual<br />

naquella figura italiana de mulher, e assim a contemplou arrebatado,<br />

vendo-a pensativa, recostada na cadeira de espaldar, um amigo de<br />

Alberto de Oliveira, num dia em que foi buscar em Veneza as mais<br />

bellas impressões de sua vida. Ah ! si aquella contemplação pudesse<br />

durar por toda a vida e si a vida fosse eternidade ! Mas um dia suc-<br />

cede a outro, e lá seguiu o viajante o seu destino, sob o deslumbra-<br />

mento T.ielancolico da visão já passada.<br />

Dois anno3 rodaram, e eis de novo em Veneza aquelle mesmo amigo<br />

de Alberto, buscando na voz da laguna o echo do sonho perdido. O<br />

acaso, ás vezes, traz em si a força dos milagres. Era de tarde. O<br />

céo azul cantava sobre a cupola de São Marcos. No borborinho da<br />

praça os pombos revoavam e ouvia-se o alacre tatalar das azas.<br />

Diz-se de Veneza que é uma cidade triste. É uma cidade alegre.<br />

Cheia de forasteiros, todos alli têm o ar contente e extasiado. A<br />

belleza do tudo transfigurava as cousas, dando áquelle momento um<br />

esplendor irreal. Como arrastado por invisivel força, o enamorado<br />

de Veneza caminhava absorto, sob as arcadas que o gênio de Sansovino<br />

traçou para os séculos.<br />

Luziam nas lojas os chalés, as sedas, as rendas e os damascos, e<br />

entre esmaltes e coraes, rutilavam espelhos e os aurilavrados crystaes<br />

de Murano. No Café Florian, entre os bancos de velludo vermelho,<br />

a musica dizia que Veneza é a gondola. Pouco além o nosso passeante<br />

susteve o passo, <strong>com</strong>o mysteriosamente attrahido por alguém. Olhou<br />

em torno, volvendo em si e, oh prodigio ! estava deante daquella que<br />

alli encontrara dois annos antes, toda vestida de baile. Era em<br />

tudo a mesma e parecia sonhar o mesmo grande e bello sonho, <strong>com</strong>o<br />

si o tempo não tivesse andado. Destino busca destino. Daquella<br />

vez não haveria mais separação.<br />

Mêses depois, milagre sobre milagre, estava a romantica veneziana<br />

immovel na sua belleza, em casa do amigo de Alberto de Oliveira.<br />

Estava alli sobre o piano, <strong>com</strong>o uma grande flòr.<br />

Transpondo a porta, junto á qual cresce um cypreste vindo de Flo-<br />

rença e sóbe os virentes ramos o loureiro plantado pela mão amiga<br />

de Afrânio Peixoto, transpondo a porta abriu-se em luz o rosto de<br />

Alberto. "Quem é aquella, que não conheço, <strong>com</strong> tantas scismas nos<br />

olhos ?" perguntou. "Não sei", volveu o hospede. "Não falia.<br />

Sonha. Vae á festa ? Vem da festa ? Vive a muda aspiração ?<br />

Ou dòr, desengano e duvida ?" Houve um silencio. Parecia que emfim<br />

ella ia fallar e decifrar o mysterio. Mas então se viu que era de<br />

porcellana. Disse Alberto : "Dou-lhe o nome de Liliana". "Liliana<br />

se chamará", confirmou o outro, tirando do lápis, <strong>com</strong> que traçou<br />

estes versos fugazes :<br />

A DONA DE PORCELLANA<br />

Já nas mãos do estâtuario, pouco a pouco,<br />

A branca argila informe se modela :<br />

Veio do chão, que a enxada, no cavouco,<br />

No campo abriu de Italia ou de Castella.<br />

Glorioso barro, não serás reboco<br />

Que encasquc vil parede ! A' imagem bclla<br />

Da mulher darás corpo, e de amor louco<br />

Ferirás quem lhe vir os olhos delia !<br />

Porque aquelle que fez esta figura,<br />

E pulchra te creou, Lilia ou Liliana,<br />

Deu-te alma e sonho e alou-se em noite escura.<br />

Por isso vives, fria porcellana,<br />

E em ti palpita e freme a van tortura<br />

De um coração, que é terra em sombra humana !<br />

Algum tempo depois, em Janeiro de 1927, encontrando-se Alberto de<br />

Oliveira em São Paulo, caminho de Araxá, escreveu no Hotel Terminus<br />

este soneto, ainda inédito :<br />

EM SÃO PAULO<br />

Longe de nossa terra, e em nossa terra,<br />

Pois é tudo Brasil S. Paulo e Rio,<br />

Aqui, fugindo do queimoso estio<br />

Ou dos raios do sol á accêsa guerra,<br />

Por largo espaço entre saudades erra<br />

Meu pensamento quando, no sombrio<br />

"Terminus", do meu quarto ao longe espio<br />

E o perfil vejo a alcantilada serra.<br />

Lembram-me os nossos morros, — sentinellas<br />

Da cidade, de dia conversando<br />

Com o mar visinho, e á noite <strong>com</strong> as estrellas ;<br />

E ao pé de um delles, tua casa, amigo,<br />

Onde os olhos de louça entrecerrando,<br />

Liliana está <strong>com</strong>o a sonhar <strong>com</strong>tigo . . .<br />

Passaram annos. Passou, para outra gloria, Alberto de Oliveira.<br />

Agora alli, no mesmo logar, naquella casa onde elle deixou tanto de<br />

sua alma, Liliana é uma saudade.


idge é, tal <strong>com</strong>o o foot-ball, um sport bretão que<br />

conquistou o mundo: um sport em queentram igualmente<br />

a sorte e a intelligencia. Apenas, em vez de empregar<br />

os musculos, o jogador de bridge usa os miolos.<br />

Depois de dominar a Inglaterra, o bridge avassalou os<br />

Estados Unidos e <strong>com</strong>eça a espalhar-se pelo resto da<br />

America. A verdade é que ninguém pode ver jogar o<br />

bridge sem sentir vontade de aprender ede jogar também.<br />

No Brasil, elle pegou facilmente, tal <strong>com</strong>o ja pegara<br />

o foot-ball. E em S. Paulo e 110 Rio ja se vae tornando<br />

um habito social. Nesta pagina pode-se ver: em cima,<br />

as mãos de um jogador de bridge baralhando as cartas<br />

e ao lado marcando os resultados. No centro, flagrante<br />

apanhado durante um match de bridge no Club Athletico<br />

Paulistano, da capital de S. Paulo. Embaixo, finaljnente,<br />

a <strong>com</strong>posição ideal que todo jogador desejaria ter,


O VAGABUNDO<br />

A CLÁUDIO DE SOUZA<br />

Rodando sobro as lages dos fundos do Palacio da Relação, o carro<br />

parou á porta do Necroterio. Era um velho coche mortuário,<br />

de ínfima classe, sujo, esfarrapado, enferrujado, <strong>com</strong> os frizos<br />

amarellos já de cor esverdeada e as franjas negras desmaiando para<br />

um pardo-cinzento. Dentro, vinha um caixão de adulto, caixão <strong>com</strong>-<br />

mum, que servia para toda gente anonyma. Quantos já teria elle<br />

levado até lá ? O cocheiro, um mulato que parecia exhalar paraty<br />

por todos os póros, meio derreado na boléa, cigarro apagado por traz<br />

da orelha, impassível e expressivo no seu scepticismo de conductor<br />

profissional Uc cadaveres, perdera a conta. Elle mesmo dizia, aca-<br />

nalhado e despeitado, que a sorte fôra muito ingrata para <strong>com</strong>sigo,<br />

pois, lhe ívservára a funcção pouco divertida de trazer da Santa<br />

Casa para o Necroterio, e deste para a valia dos desconhecidos, os<br />

mortos sem eira, nem beira, os ignorados, apanhados na rua ou<br />

boiando á tona dagua, sem amigos, sem parentes nem adherentes,<br />

os que vegetaiam pela existencia afóra, até serem desta carregados<br />

para melhor. Preferia guiar coches mais ricos.<br />

A felicidade está sempre onde cada um a vê, e esse cocheiro de alma<br />

empedrada e figado esponjoso estimava que o destino o aquinhoasse<br />

<strong>com</strong> uma situarão mais desejável, enfarpelando-o de trajes á Luiz XV<br />

e guindando-o ás almofadas dos carros de luxo, entre velludos, sedas<br />

c metaes brancos, para ter a suprema honra e a deliciosa ventura<br />

de transportar aos cemiterios os ricos e os poderosos do dia. As<br />

gorgetas inevitáveis também lhe entravam nos cálculos.<br />

Era um typo familiar aos empregados da morgue. Assoviou alto c<br />

esperou que lhe apparecesse alguém, que não se fez demorar.<br />

Ora, você, Cartolinha ! gritou um guarda capenga, approximando-se<br />

do calhambeque.<br />

Trocar ar; um aperto de mãos, affectuosamente. Falaram do accumulo<br />

dos serviços e arriscaram palpites sobre o bicho. Cartolinha accendeu<br />

a ponta do cigarro e desceu, afim de empurrar o caixão para fóra.<br />

— Gente atôa, resmungou elle para o outro. Levaram-no hontem de<br />

manhã, para a S." enfermaria, onde morreu á noite. Uns falaram<br />

que foi uremia, outros que foi desgosto concentrado. Mas o certo<br />

é que lá - chego a sem articular palavra e acabou-se sem que ninguém<br />

o identificasse. Os vermes que o nào poupem.<br />

— Como deu a cara ?<br />

— A<strong>com</strong>panhado de guia policial. Acharam-n'o no Passeio Publico,<br />

cahido ao pé do busto de Mestre Valentim. Ninguém o reclamou,<br />

ninguém adivinhou quem fosse. Esquecido, viveu, desprezado morreu.<br />

Vac para baixo da terra <strong>com</strong>pletamente ignorado.<br />

Suspenderam» o caixão e depositaram o corpo nú numa das mesas<br />

de mármore do amphitheatro. Era joven ainda, apezar da devastação<br />

que em todo o physico lhe deixaram os soffrimentos. A pallidez da<br />

morte parecia exaggerada. Nas roupas que lhe arrancaram, porém,<br />

quem reparasse bem, haveria de notar que o indigente talvez tivesse<br />

uma origem <strong>com</strong> a qual não se extinguira.<br />

Minutos apôs, procedia-se á autopsia. A hypothese da uremia fôra<br />

posta á margem. O trapo humano succumbira a uma syneope cardíaca.<br />

Os médicos admiravam-se <strong>com</strong>o resistira tanto aos embates do<br />

mundo. A re<strong>com</strong>posição deu ao infeliz um ar mais suave e resignado.<br />

Á noite, na romaria de sempre que alli se faz, um repórter atilado<br />

procurou restabelecer a physionomia moral do morto abandonado.<br />

O rapaz viera da Argentina ou do Uruguay, não se sabia <strong>com</strong> segurança,<br />

havia oito ou dez annos, trabalhar no <strong>com</strong>mercio do Rio. Mettera-se<br />

nuns negocios ambulantes e perambulara por ahi, oscillando entre a<br />

bóa e má cstrella. O jogo o seduzira. Estreára por elegancia, talvez<br />

por displicência, arrastado por mulheres. Uma noite, depois de<br />

ter perdido successivamente todo o dinheiro que trazia, o seu e o<br />

patrões, appeilara para o credito que o banqueiro do baccarat lhe<br />

recusára. O dono de casa, malandro em terceiro gráu, desfez-se em<br />

salamaleques, mas confessou, immensamente penalisado, que também<br />

não podia adeantar-lhe um vintém. Entalado no vicio, arruinado e<br />

desmoralisado, não houve <strong>com</strong>o esconder-se no dia seguinte. A policia<br />

procurou-o, segurou-o, fichou-o no Corpo de Segurança e processou-o,<br />

por vadiagem. Absolvido pela prova de ter trabalho na quinzena<br />

precedente á detenção, um pouco por philosophia, mais por cynismo,<br />

delibeiou, ser de facto e de direito um vagabundo profissional.<br />

Aos trinta annos de idade, envilleccra e envelhecera. A vida de expedientes<br />

inconfessáveis, indo e vindo constantemente da policia para<br />

justiça, e cesta para aquella, tornara-o, alternativamente nos xadrezes<br />

districtaes e na Colonia Correcional de Dois Rios, o espectro symbolico<br />

da legitima miséria. Ás vezes, sentindo no intimo a convulsão<br />

da própria personalidade, procurava rehabilitar-se, mas não tinha força<br />

nem coragem para reatar uma conducta enfraquecida pelas torpezas<br />

de que se íizera heróe. Apagava-se lentamente.<br />

Mas, nunca se soube quem fosse, realmente, nem onde nascera. Sem<br />

lar, sern domicilio, sem origem, sem amigos, passára <strong>com</strong>o um pária,<br />

batido pelos vendavaes das aventuras em que se envolvera, manchando-se,<br />

apodrecendo irresistivelmente.<br />

Uma rapariga de Assumpção, cantora de cabarets, que o fôra ver á<br />

Santa Casa, momentos depois delle expirar, trouxe alguma luz ao<br />

mysterio. Era filho de um emigrado paraguayo, refugiado em Buenos<br />

Aires. O pse fôra senhor de uma fortuna, dissipada logo a seguir á<br />

queda de Albino Jara. Criara-se e educara-se na Argentina, mas<br />

fugira <strong>com</strong> uma bailarina de terceira ordem de um café-concerto da<br />

callc Florida, indo para Montevidéo. Ahi, a <strong>com</strong>panheira despedira-o,<br />

substituindo-o por um estancieiro rico e o desgraçado, a quem o velho<br />

revolucionário foragido lançara a maldição, talvez houvesse embarcado,<br />

<strong>com</strong>o moço de frete, num paquete nacional, rumando para o<br />

Rio. Tinha, <strong>com</strong> tudo, habilidade, intelligencia e recursos artísticos.<br />

Se levasse uma actividade honesta, faria carreira, porque era um talento<br />

de medalhista.<br />

Os fados não lho permittiram. E morreu desilludido e vencido, cm<br />

paragens extranhas, sem ao menos deixar de si o endereço exacto,<br />

uni nome, <strong>com</strong> que seu pae, a sua gente, os seus amigos, se os teve,<br />

soubessem do seu trágico sumiço. Apenas, conservando-lhe a recordação<br />

vaga e imprecisa, ficara aquella desabalada paragusya, de<br />

de quem o pobre diabo era devedor de dez mil réis, tomados por empréstimo<br />

numa hora de fraqueza e de fome . . .<br />

— Terceira mesa, á direita ! exclamou o guarda. Pôde levar !<br />

Dois homens puxaram o fardo humano e atiraram-n'o de novo para<br />

o rabecão. Cartolinha segurou as redeas dos animaes, mascando a<br />

ponta do cigarro no canto da bocca. Olhou o sol, que cegava lá do<br />

céo e sentiu o calor que asphyxiava cá a terra. Praguejou entre os<br />

dente3. Berrou para as alimarias. O carro rodou ganhando a rua,<br />

aos trancos, desapparecendo <strong>com</strong> aquelle capitulo de vida, que daria<br />

um romance para os emotivos.<br />

M. P A U L O FILHO


S. FRANCISCO DE ASSIS E A ARTE MODERNA<br />

"Gioito" — Um habitante de Assis estende o mauro<br />

diante de S. Francisco — (Basílica de Assis. - Superior}<br />

"Giotto" — S. Francisco renuncia o pae. — Florença<br />

28 IIlustração Brasileira<br />

FLEXA RIBEIRO<br />

)>rof. cathedratico na Escola Nacional<br />

de Bellas Artes, Director<br />

do Curso de Arte Decorativa.<br />

SEGUNDO noticias da Ifalia, a archoologia acaba de desco-<br />

brir o sitio preciso, sem erro topooraphico, onde nasceu,<br />

em Assis, o grande e fecundo S. Francisco, no correr do<br />

anno 1102. De tal sorte, imprevistamente, vo'ta á memoria esfu-<br />

mada dos homens, o nome do verdadeiro creador do sentimento<br />

moderno, nas artes plasticas.<br />

Conta-se que quando S. Francisco representou, de maneira ingé-<br />

nua, a Natividade, onde appareciam os reis e anjos <strong>com</strong> as rudes<br />

vestes da Idade Media, perucas douradas <strong>com</strong>o aureolas, acon-<br />

teceu um milagre. O Menino Jesus era um boneco de madeira.<br />

São Francisco tomou-o nos braços, apertou-o de encontro ao<br />

coração : — a imagem ve : o a vida, no seu colo.<br />

O raconto é, verdadeiramente, o symbolo da acção do grande<br />

santo, tanto na esphera social, <strong>com</strong>o na das artes. Aliás, antes de<br />

Dante e de Giotto, na <strong>com</strong>posição, <strong>com</strong>o no jogo dramatico das<br />

figuras e do sentido espiritual, dentro do realismo objectivo da<br />

expressão, encontramos o génio crsador, innovador, remanescente<br />

de S. Francisco. Em quase todos os domínios vivos dos nossos tem-<br />

pos, <strong>com</strong>o aurora do novo mundo, vamos deparal-o, <strong>com</strong>o um an-<br />

tecipado. E não somente nas idéas abstractas, mas, principalmen-<br />

te, nas realizações. Nos actos materiaes profanos.<br />

Pela hora, só falaremos de sua influencia, funda, no sentido mo-<br />

derno da pintura e da esculptura. Até antes de Cimabue e os<br />

Pisani a arte, no sentido bysantino ou românico, não passava de<br />

uma superposição de camadas de tintas lisas, contornadas forte-<br />

mente por uma silhueta externa. As figuras, antes, pareciam cari-<br />

caturas da realidade. Os elementos christão primitivo, hellenisti-<br />

co, <strong>com</strong>o persa-sassanida e mais as influencias copta, anatoliane,<br />

mahatta e propriamente constantinopliana, acabaram por fazer da<br />

arte bysantina uma pura estylisação das formas. Era o dominio<br />

da symbolica, do convencional.<br />

O espirito que a dominava seria encontrar a unidade psycho-<br />

logica, a expressão meramente espiritual, <strong>com</strong> desdem integral da<br />

fôrma. Para isso, e segundo a doutrina, mistér se fazia anniquil'ar<br />

o corpo para que a alma se aperfeiçoasse. De que valia a pta-<br />

tica ? Simples capsula em que a a'ma se aqitava ! Tal "soma"<br />

não merecia cuidados ópticos; qualquer indicação summaria e<br />

deformativa servia. Tudo estaria no "germe" espiritual que se<br />

desejava perpetuar.<br />

A Natureza objectiva era condemnada <strong>com</strong>o immoral ou impia.<br />

O homem se aninhava dentro de uma abstracção. Para aperfei-<br />

çoar a Natureza era necessário destruil-a. S. Francisco de Ass«s,<br />

<strong>com</strong> sua alegria, <strong>com</strong> seu rythmo vivaz e contagioso de animador<br />

dos sentidos, <strong>com</strong> sua integração nos motivos humanos da natu-<br />

reza, dá o signal universal da unidade da Vida e da Arte. Fugia,<br />

assim, do nominalismo que dominara até o século XII, e funda a<br />

era nova, as bases do século XIII, verdadeiramente creador do<br />

Progresso.<br />

Quem examinar a cavalleiro a evolução da pintura, da época<br />

bysantina, antegiottesca até o <strong>com</strong>eço do século XVI, post-leonar-<br />

desca, conseguirá encontrar a razão maior desse formidável es-<br />

forço. O que se pretendia era encontrar a vida interior do perso-<br />

nagem. A expressão formal não passaria de uma tendencia pagã.<br />

Os gregos attingiram á perfeição na retratação do corpo, obser-<br />

vando-o docilmente tanto na sua proporção, <strong>com</strong> seus cânones,<br />

<strong>com</strong>o em sua acção, pelo movimento transitorio. Assim, tanto os<br />

animaes, <strong>com</strong>o os homens, apparecem <strong>com</strong>o maravilhas até ho;e<br />

não ultrapassadas. Mas suas figuras não têm alma : são expressões<br />

plasticas de corpos humanos <strong>com</strong> cabeças de estatuas... Os bysar.-<br />

tinos, <strong>com</strong>o os românicos, tentavam precisamente o contrario.<br />

Queriam attingir a alma sem obediencia aos cânones.<br />

Com S. Francisco a procura foi outra. Conseguir chegar á expres-<br />

são e á vida interior do individuo sem deformal-o, antes tomando<br />

o corpo <strong>com</strong>o caminho seguro daquella conquista. De tal sorte., a


"Giotto" — Casamento de São Francisco<br />

<strong>com</strong> a Pobreza. (Basilica de Assis - inferior)<br />

"Giotto" — São Francisco<br />

préga aos passaros. — (Ba-<br />

sílica de Assis - Suporiorj<br />

"Giotto" — A morte do<br />

São Francisco. Florença<br />

volta ao modelo era o meio imposto pela nova esthetica. Para<br />

isso era necessário mudar o consciente da natureza e da vida. Foi<br />

o gênio de S. Francisco de Assis que realisou, na aurora do sé-<br />

culo XIII, semelhante milagre. E não somente pela prégação; mas<br />

pelo exemplo; pela própria unidade de seu viver. Para elle, a<br />

vida era um poema : da immensa poesia que ha na Natureza de-<br />

veríamos fazer o sentido alto de nossa existência. A fonte pri-<br />

meira, dessa adaptação, era a alegria. O homem deveria sair da<br />

abstração em que vivera e voltar a si mesmo dentro da realidade<br />

moral da energia espiritual que sonha nos actos mais simples dos<br />

seres e das coisas.<br />

Aqui temos os elementos essenciaes da Renascença italiana. Para<br />

attingirmos os domínios da substancia moderna da arte, no seu<br />

<strong>com</strong>plexo psychologico, ainda se consumiram quase tres séculos.<br />

De tal sorte, poderemos dizer que nem Giotto, nem Botticelli,<br />

aquelle no século XIV, e este no XV, definiram em toda sua gran-<br />

deza a doutrina artística de S. Francisco. Foi na aurora do século<br />

XVI que Leonardo da Vinci assume, num dictame, aquelle ma-<br />

gno e profundo sonho, fundindo as duas bellezas na unidade ex-<br />

pressional da Vida.<br />

Fevereiro — 1040 29


tHWMia<br />

GRETA GARBO, em a "Dama das Camélias"<br />

J O R G E S A N T O S<br />

Redactorchefe da lllustraçôo Brasileira<br />

MAIS VIVA AINDA, QUASI<br />

CEM ANNOS PASSADOS,<br />

A DAMA DAS CAMÉLIAS<br />

MARIE DUPLESSIS JIOKKEU NVM<br />

DIA DO CARNAVAL DE 1847<br />

UM <strong>com</strong>positor — perdôem-me as Musas a blasphemia ! — a<br />

serviço de Momo, prestou, inconscientemente, uma cruel homenagem<br />

a Marie Duplessis, a admiravel e immortal martyr do<br />

Amor que Dumas Filho, biographando numa obra - prima, apresentou<br />

á humanidade, quando já o romantismo tendia ao enfraquecimento.<br />

Esse fiel servidor do paganismo, na verdade, lançou para o Carnaval<br />

de <strong>1940</strong>, um desses arranjos musicaes que empestam o Brasil, periodicamente,<br />

e a que deu o titulo de "Dama das Camélias". De maneira que<br />

a heroina, cuja abnegação nobilita a especie humana e cujos soffrimentos<br />

enternecem e hão de <strong>com</strong>mover, pelos séculos afóra, gerações<br />

e gerações, andou na bocca de foliões de todas as camadas, cantada,<br />

simultaneamente, por malandros e granfinos, servindo de motivo para<br />

exteriorizações grotescas de multidões em orgia e de creaturas incontinentes.<br />

Já succedeu o mesmo, aqui, a Maria Antonietta, victima de novo,<br />

um século após á sua decapitação, da irreverencia popular, consubstanciada<br />

em estrophes obscenas, tal <strong>com</strong>o no tempo em que, rainha, contra<br />

ella se manifestava a veia poética dos sans - culottes e das tricoteuses<br />

de Robespierre. Não havia negro beiçudo, mulata desdentada, de<br />

cordão da Praça Onze, ou jovem carnavalesco de bôa familia, que não<br />

cantarolasse pornographias, em estribilhos improvisados, de rimas<br />

fáceis, allusivas a Maria Antonietta ... O que, porém, desta feita,<br />

torna interessante a iniciativa do <strong>com</strong>positor popular da "Dama das<br />

Camélias" 6 a coincidência. Realmente, sabbado de Carnaval, considerado<br />

por pierrots e colombinas de todas as épocas, no Brasil, <strong>com</strong>o<br />

o melhor, o mais animado, o mais ruidoso de todos os dias do reinado<br />

de Momo cahiu, neste anno da graça, no dia 3 de Fevereiro. Ora,<br />

precisamente, a. 3 de Fevereiro de 1847, quando, em Paris, que a essa<br />

época ainda admittia festejos carnavalescos, hoje inteiramente abolidos<br />

— Dieu Merci ! — o Carnaval "battait son plein", quando os mascaras<br />

patinhavam na lama, e nos "Boulevards", en liesse" ouviam-se musicas<br />

berrantes e viam-se pares e grupos em alegria desenfreada, agonisava,<br />

num apartamento do boulevard de la Madeleine, Marie Duplessis, Marguerite<br />

Gautier, a "Dama das Camélias", hoje mais celebre do que<br />

hontem c bem menos do que amanhã . . . Era num» *obre-loja do prédio<br />

30 Illustração Brasiler<br />

numero 15, que ainda hoje existe. Se os cicerones, quando os omnibus<br />

deslisam, repletos, pelo boulevard, chamam, para o pequeno apartamento,<br />

a attcnção dos forasteiros <strong>com</strong>o o fazem, mechanicamente, quando os<br />

rebanhos de curiosos exoticos que conduzem defrontam a casa onde<br />

morou Madame Roland, o Palais de Justice, o Sacré Cceur, o tumulo<br />

de Napoleão ou as "oubliettes" da Cité, não sei, porque eu, em França,<br />

nunoa fui turista. Quanto a mim, múltiplas vezes, estacionei em frente<br />

áquella casa, santuario em que se operou a redempção, por um grande<br />

sacrifício, de uma peccadora, cuja memoria aureolada fala á sensibilidade<br />

dos que amam e dos que sentem nostalgias do sub-consciente.<br />

Só não ousei, <strong>com</strong>o Dumas Filho, entrar a porta larga, subir o primeiro<br />

lance da cscada :<br />

"J'ai revu, me courbant sous les lourdes pensées<br />

L'escalier bien connu, ce seuil souvent foulé . . . »<br />

Marie DupU ssis agonisava. Na rua, o ruido bizarro das cantigas e<br />

dos gritos dos mascarados, despertou-lhe a curiosidade. E a "Dama<br />

das Camélias" pediu que lhe transportassem o leito para junto da janella,<br />

de onde, a Morte, sem disfarces, bem junto delia, ouvia as notas de um<br />

realejo estridente. A Dama das Camélias, que tanto soffrera, não<br />

queria morrer. Supplicava, mesmo, que não a deixassem partir.<br />

Pallida, <strong>com</strong> a pallidez de cera das monjas maceradas, <strong>com</strong> as mãos<br />

crispadas a amarrotar, no desespero, os finos lençoes que a cobriam, a<br />

mulher legitima do Conde de Perregaux pedia que não a deixassem<br />

morrer. Tinha tanto amor á vida e tanto horror a entregar o corpo,<br />

por tantos cobiçado, á terra, que, afinal o iria possuir para sempre,<br />

que ainda teve, num instante passageiro de calma, a idéa, em meio ao<br />

turbilhão de desesperos de moribunda consciente, de re<strong>com</strong>mendar que<br />

retardassem, tanto quanto possivel, a <strong>com</strong>municação do seu fallecimento.<br />

Para que ? "Afim de que a deixassem por mais tempo em sua<br />

casa..." Os soluços da tysica augmentavam. Chegava o instante.<br />

Seus olhos, maiores pela moléstia, brilhavam impressionantemente.<br />

Sua criada, a fiel Clothilde, escrevera a Alexandre Dumas, que se encontrava<br />

em viagem. Não quizeram os fados que elle assistisse o desenlace.<br />

A Dama das Camélias não teve, assim, o consolo de despedirse<br />

do homem que, paradoxalmente, a divinisou. E implorando o perdão<br />

de Deus, expirou. Nunca, porém, ella foi tão viva <strong>com</strong>o depois de<br />

sepultada. Todos os annos, o seu tumulo enche-se de flores. No cemiterio<br />

de Montmartre, ao lado dos Goncourts, na 15.* divisão da avenida<br />

Saint-Charles, repousa, "sans crainte du réveil", Maria Duplessis.<br />

Grandes expressões do drama, Réjane, Sarah - Benhardt, Cécile Sorel,<br />

continuaram interpretando, para goso das platéas, o papel da peccadora<br />

que um grande Amor redimiu. Na scena lyrica, Verdi, <strong>com</strong> a<br />

"Traviata", engrandeceu a memoria da linda mulher, modelo de abnegação,<br />

de espirito de renuncia e sacrificio. No cinema, as estrellas<br />

<strong>com</strong>o Greta Garbo, vulgarisam, agora, a redempção de Marguerite<br />

Gautier. Nas brochuras baratas e nos folhetins dos jornaes, a vida da<br />

mulher peccadora, que sentia a attracção das camélias immaculadas e<br />

que o Amor acabou purificando, é offerecida, <strong>com</strong> gravuras grosseiras,<br />

mas evocativas, á observação do povo inculto. E não ha quem não tenha<br />

tido os olhos marejados de lagrimas deante de algumas passagens<br />

da obra - prima de Dumas Filho. Só não se terão emocionado os snobs<br />

ou os homens que acham mais belleza na rigidez de um binomio, na<br />

aridez da Chimica, na resistencia do cimento armado. Cécile Sorel, que<br />

foi minha <strong>com</strong>panheira de viagem, na travessia do Atlântico, e que é<br />

uma gloria do theatro francez, <strong>com</strong> os seus maravilhosos 70 annos,<br />

dizia-me, cheia de emoção, recordando a sua carreira de "sociétaire",<br />

quo dois papeis, sobretudo, a empolgaram sempre e a empolgam ainda :<br />

"A Dama das Camélias" e "Madame Capet". Onde ha o sacrificio e<br />

a resignação, sem desfallecimentos, ha a redempção.<br />

Pobre "Dama das Camélias" ! Em <strong>1940</strong> o teu nome e a tua nobreza<br />

serviram de motivo para algazarras mais ou menos rythmadas durante<br />

o triduo carnavalesco !<br />

Emfim, a tua immortalidade ficou mais uma vez provada !<br />

CÉCILE SOREL, gloria do theatro francez, uma das mais famosas inter-<br />

pretes do papel da "Dama das Camélias", a bordo do "Florida", quando<br />

regressava d França, após uma "tournée" pela America do Sul. Ao<br />

lado, á direita, o nosso <strong>com</strong>panheiro, autor desta chronica e á esquerda,<br />

—i o scientista argentino, Dr. Minoli —


Cortejo de mascaras, na praça c!a Concordia, na época da morte de Marie üuplessis (184/) — (Jiiadro de Seigneurgens (Museu Carnavalet)<br />

O Carnaval, dizem todos, está decadente. Primeiro, foi-se o<br />

entrudo, cujo ultimo refugio foi Petropolis. Não ha mais<br />

nem mesmo a alegria "a secco*' de outrora nas ruas; os<br />

mascarados vulgares rareiam, os de espirito, que s e m p r e<br />

foram poucos desappareceram por <strong>com</strong>pleto. O corso<br />

teve sua época, mas hoje, confettis e serpentinas, já não arruinam<br />

ninguém porque as batalhas cahiram de moda. Os préstitos não<br />

A<br />

evoluíram e os carros allegoricos continuam, <strong>com</strong>o em 1900, mais<br />

ou menos monstruosos, <strong>com</strong> mulheres horrendas a atirar beijos á<br />

multidão, que, de anno para anno, diminue de volume. Ninguém<br />

mais aluga janellas na Avenida para assistir á passagem das<br />

"sociedades", <strong>com</strong>o se fosse a um "pic-nic" <strong>com</strong> a indefectível<br />

matolotagem, <strong>com</strong>o logo que Frontin concluiu as obras da grande<br />

artéria, o faziam os pacatos paes de família que só eram bons<br />

chefes se também fossem carnavalescos...<br />

EM DECADENCIA<br />

TAMBÉM NO BRASIL ?<br />

O Carnaval de rua morreu. Resta o carnaval dos salões. Bailes<br />

em clubs, bailes em casinos, bailes em hotéis, bailes em ranchos,<br />

bailes de todas as cathegorias, para todos os preços, para todos<br />

os paladares.<br />

E firmou-se, nos annaes de Momo, o baile de gala do Municipal.<br />

Em França, também, aliás mais radicalmente as alegrias do triduo<br />

famoso desappareceram.<br />

Antigamente, no Século XIX, o carnaval punha as ruas em delírio.<br />

Os bailes de mascaras multiplicavam-se. Dansava-se na "Opera",


Kntrada do baile da Opera na terça-feira gorda em 1859<br />

na "Opera-Comica", no "Variétés" e no "Ambigu", no "Boeuf-<br />

Rouge", na "Chartreuse" e no " Veau-qui-Tête".<br />

Mas, dizem os chronistas da época, onde o delirio attingia gran-<br />

des proporções era na Opera, sob a direcção de Musard.<br />

Foi Musard que lançou o "cancan", que se tornou, <strong>com</strong>o o samba<br />

no Brasil, a dança nacional... O "cancan", <strong>com</strong>o o samba, pe-<br />

netrou na Opera, vindo do Variétés. O galope final era marcado<br />

por um tiro de morteiro; installado especialmente no theatro.<br />

Antes de iniciar as danças, a tradição mandava, por sua vez, que-<br />

brar uma cadeira da orchestra.<br />

Um dos últimos desfites da Courtille<br />

32 IlUwtração Brasileira<br />

Os bohemios. os artistas, poetas, pintores, escriptores transfor-<br />

mavam seus ateliers em salões de dansa. Dumas, certa vez, conta-o<br />

Léo Séché no seu livro "Jeunesse dorée sous Louis-Philippe ',<br />

alugara um apartamento no mesmo andar em que morava e<br />

depois de forral-o todo de verde, pediu a Delacroix, Barège, Jadin,<br />

Decamps e a outros mestres que enchessem as paredes de allego-<br />

iias e decorações. Resultou dessa collaboração de génios uma<br />

verdadeira maravilha! Ora. continua Séché, por baixo de Dumas<br />

morava um immortal enfermo. Era o académico Tissot. Dumas<br />

foi vel-o e lhe disse:<br />

— Caro mestre, estou na imminencia de dansar sobre a sua cabeça.<br />

— E' natural que a mocidade baile.<br />

— Mas não lhe será possível dormir e por isso eu venho con-<br />

vidal-o a unir-se a nós.<br />

— Como seria possível, meu caro Dumas?<br />

— Sim, sim, mestre, venha phantasiado de doente.<br />

— Esplendido!<br />

— De certo. Ficará installado num canto de onde assistirá a tudo<br />

e onde não será in<strong>com</strong>modado.<br />

Tissot acceitou. Na noite do baile, Jadin appareceu vestido<br />

de cocheiro de carro-funebre, chicote na mão abrindo passagem<br />

na sala. Feito isso, <strong>com</strong> as vestes características de quem conduz<br />

a carruagem dos defuntos, grita para Tissot:


I)etallic da ornamentação do Theatro Municipal<br />

para o baile de gala de 1938. execução de<br />

Fernando Valentim c Gilberto Tronipowsky<br />

— Estou prompto! E, então, não queres<br />

aproveitar a conducção?<br />

Tissot, em consequência, quasi morreu de<br />

verdade...<br />

Hoje, em Paris, não se vê um só mascarado.<br />

A celebre "descente de la Courtille", onde<br />

na quarta-feira de cinzas enterrava-se o<br />

Carnaval, por entre gritos e libações alcoó-<br />

licas, desappareceu. 0 cortejo do "boi gor-<br />

do" também. Os bailes da Opera foram<br />

decahindo, até que em 1870, foram abolidos.<br />

Em 1900 resuscitou o baile da Opera, mas<br />

resurgiu estylisado, sem ser obrigatoria a<br />

phantasia, <strong>com</strong> fins de caridade. E nunca<br />

mais teve o esplendor dos outros tempos.<br />

Hoje, diz o escriptor Albérie Cakuet, o car-<br />

naval é apenas a sombra de uma sombra.<br />

E' realmente, muito pouco.<br />

Terá o mesmo fim o Carnaval do Rio?


Mm<br />

K *<br />

AO C V-?<br />

_ (fa .âSa'i<br />


A FROTA O A SCIENCIA — O explorador Byrd. cujo nome está littado ás expedições sclent!flcns<br />

nas regiões erlaciaes, tem á sua disposição mais um navio, o "North Star", recem-constru!do e que<br />

é dotado de tudo quanto possa interessar a um expedicionário da sciencia<br />

m<br />

•JvH<br />

OS GRANDES HOMENS DA ACTUALIDADE — Jonte VI. Rei da Grã-<br />

Bretanha. em uniforme de almirante. S. M. é um veterano de 1914, tendo<br />

participado da batalha naval da Jut!andia.<br />

Instantâneos ile todo o mundo<br />

PREMIO DE BELLEZA — Em Shanghai teve loffar uma <strong>com</strong>petição de belleza<br />

internacional. A* Sta. Linda Brent, de New York, coube o titulo de 4#A mulher<br />

mais bella da raça branca".<br />

* m<br />

;<br />

ADEUS DE UM PILOTO — A "Taça Thompson", avaliada em 37.500 dollars, coube<br />

ao avidador americano Roscoe Turner (no cliché), tido <strong>com</strong>o o "az dos corredores<br />

aereos". Roscoe, em sua ultima façanha, desenvolveu a velocidade de 28*2 milhas horarias.<br />

Elie não correrá mais.<br />

SCENARIOS DA GUERRA - A localidade de Saarholzbach. onde os francezes. ENGENHO DIABOUCO - Os inprlezes encontraram, afinal, um meio de exUrminar. <strong>com</strong><br />

ultimamente, oppuzeram tenaz resistencia á offensiva inimiffa. :i?í?urança. os submarinos: í a "bomba fulminante", cuja acção terrífica se faz sentir mesmo<br />

a prrande distancia do ponto visado.


QUATRO OBRAS DE VULTO<br />

Por N E N Ê M A C A G G I<br />

GOLONIÁ DE PSYCHOPATHAS<br />

Construído pela União, que entrou <strong>com</strong> a terça<br />

parte e pelo Estado, é o LEPROSARIO da<br />

COLONIA "SANTA THEREZA" uma encantadora<br />

e moderna cidade em miniatura, podendo<br />

supplantar, sem exaggero, suas rivaes congêneres<br />

do Espirito - Santo ou do Ceará.<br />

Situado no lugar denominado Fazenda, a 25<br />

kilometros da capital, numa area de 2.099.800<br />

metros quadrados ( 200.000 metros quadrados<br />

de área construída ), feito sob o typo Carville<br />

Curupaity, tem o LEPROSARIO capacidade<br />

para 400 doentes e sua divisão se acha feita<br />

englobada em 3 Blocos distinctos, constituindo<br />

as 3 zonas : sadia, intermediaria ou neutra e<br />

doente.<br />

As habitações dos contaminados se <strong>com</strong>põem de<br />

12 Pavilhões Carville ( 7 para solteiros, 3 para<br />

solteiras, 1 para crianças e 1 de observação ) e<br />

de casas geminadas, havendo 9 desses bungalws,<br />

portanto 18 residencias para casaes e familias,<br />

já concluidos.<br />

Modelo de colonia agricola, <strong>com</strong>o um grande<br />

lar que abriga a todos, tem o LEPROSARIO<br />

os <strong>com</strong>pletos requisitos de vida própria : grupo<br />

thermo - electrico para illuminação, cozinha a oleo de alto valor acquisitivo,<br />

lavanderia automatica, também a oleo, e do typo mais aperfeiçoado,<br />

rêde de esgottos <strong>com</strong>pleta, agua canalizada e reservatório<br />

de agua <strong>com</strong> capacidade para milhares de litros, rêde telephonica,<br />

forno crematorio para a queima do lixo, etc., etc., possuindo montada<br />

e em funccionamento, uma olaria que pertence ao plano de<br />

installações technico - profissionaes e agro - pecuarias a ser brevemente<br />

realizado.<br />

Atravez da profunda significação desse gesto soberbo do Governo<br />

ABRIGO DE MENORES<br />

Situado logo á entrada da Ilha, esta encantadora<br />

Ilha de Santa Catharina, fita verde e amarella<br />

a bordejar o Atlântico, ergue-se, soberbo e dominante,<br />

jogando para o céu os braços de seus<br />

muros claros, o DEPARTAMENTO DE SAÜDE<br />

de Florianopolis.<br />

É um prédio estylizado, attendendo ao padrão<br />

do mais hodierno e util sanitarismo, onde o<br />

<strong>com</strong>mando vigilante divide-se em duas longas<br />

alas terminando, de urn lado, pelos Serviços de<br />

Hygiene Infantil, e, do outro, pela Bibliotheca e<br />

Sala de Projecções.<br />

Todo o Serviço de Saúde está situado no prédio,<br />

sendo os mais interessantes o de Hygiene Infantil,<br />

o Pré - Natal, o Escolar e Pré - Escolar,<br />

o de Ophtalmo - otho - rhino - laryngologia, o de<br />

Epidemiologia, Tuberculose e o de Syphillis, tudo<br />

admiravelmente montado, tendo o Gabinete de<br />

Raios X o serviço de Manoel de Abreu, englobados<br />

numa frequencia media que oscilla entre<br />

800 e 1.000 pessoas mensalmente.<br />

Esse trabalho technico, tão bem diffundido, mostra que o SERVIÇO<br />

DE SAÜDE PUBLICA vem dando os resultados almejados, sendo que<br />

a Bio - Estatística, sabiamente controlada por um technico, apresenta<br />

uma baixa de 20 % na mortandade infantil e o seu Laboratorio Central<br />

deu /para os diversos Serviços do CENTRO, 14.000 exames variados.<br />

A columna vertebral do Serviço é o Controle das Visitadoras Sanitarias,<br />

technica e theoricamente preparadas, podendo, <strong>com</strong> o seu espirito<br />

subtil de catechese, levar a todos os lares os conhecimentos principaes<br />

para a educação sanitaria dos leigos e necessitados.<br />

Entrando ali, onde tudo esplende pela limpeza, olhando o carinho<br />

<strong>com</strong> que os médicos e enfermeiras cuidam dos doentes, vendo aquellas<br />

dezenas de rostinhos soffredores, aquelles pobres bracinhos, a jazerem,<br />

inertes, sobre o collo materno, aquellas boquinhas, resequidas e febris,<br />

a se fecharem num rictus de tortura e pensando que dali a pouco<br />

3 6 Ulustração Brasileira<br />

Colonia de Psychopathas<br />

Catharinense em preencher uma das lacunas da Assistência Social<br />

de maior necessidade no momento, <strong>com</strong> perturbadora emoção prevê-se<br />

a felicidade, o conforto, a serenidade que se desprenderão dos rostos<br />

enigmáticos e dolorosos dos que, marcados pela Desgraça e pelo<br />

Aniquillamento Physico, têm nas carnes vibrantes de suas almas<br />

ainda não contaminadas pela descrença, porque ali estão, <strong>com</strong>o anjos<br />

vigilantes, as Irmãs de Caridade, palavras de gratidão aos que,<br />

guiados por fraternal devotamento, vêm em seu auxilio para que<br />

supportem o monstruoso mal que lhes devora a vida . . .<br />

Vista parcial do Abrigo de Menores<br />

tempo melhorarão, sorrirão e lhes voltará a saúde, abrindo-se <strong>com</strong>o<br />

um capulho de Victoria - regia, nós, os sãos, nós, os que samebos <strong>com</strong>prehender<br />

os gestos humanitários, não podemos deixar de louvar a<br />

acção ennobrecedora e digna desse eminente pysichiatra e Director<br />

da SAÜDE PUBLICA DO ESTADO, que é o Dr. Aggripa de Castro<br />

Faria e de prestar a nossa homenagem de sympathia e de agradecimento<br />

á sabedoria pratica e engenhosa do Interventor Nerêu Ramos,<br />

figura impar no patriotismo nacional, implantada nos corações de<br />

todos os catharinenses, que, <strong>com</strong> seu fino trato tanto tem tirado de<br />

si mesmo em pról da felicidade de seu povo, na santa e pura nudez<br />

da Caridade e da Lucta contra a Morte, defendendo a Saúde e ensinando<br />

os ipequeninos sêres que se estão formando e que, talvez, amanhã,<br />

sejam os grandes heroes do Brasil, a serem sãos e a viverem sãos,<br />

gozando um Presente tranquillo e aguardando um Futuro cheio de<br />

glorias para a nossa Patria !


DO GOVERNO CATHARINENSE<br />

ASYLO-GOLONIA "Santa THEREZA"<br />

O que realmente existia, até ha bem pouco tempo,<br />

de Assistência Social, em Santa Catharina, no<br />

que concerne á Psychiatria e Hygiene Mental,<br />

eram dois insufficientes Hospitaes particulares<br />

situados em Brusque e Joinville, os quaes são<br />

até agora auxiliados pelo Governo Estadual.<br />

Mas, eis que surgiu, na figura energica de um<br />

catharinense democrata, o Dr. Nerêu Ramos,<br />

a defesa persistente e forte da saúde e do bemestar<br />

do povo. E esse catharinense illustre,<br />

secundado por capacidades outras productivas,<br />

resolveu definitivamente o difficil e triste problema<br />

da Assistência aos Psychopathas, mandando<br />

construir, a 19 kilometros de Florianopolis e<br />

perto da Usina Hydro - Eléctrica do Maroim, a<br />

COLONIA DE PSYCHOPATHAS, numa saudavel<br />

e bellissima area de 2.000.000 de metros<br />

quadrados.<br />

Com capacidade .para 300 doentes, o Hospital<br />

é bisexuado e dividido em quatro Pavilhões,<br />

onde as diversas enfermidades nosologicas são<br />

separadas ,por secções, havendo ainda um Pavilhão<br />

,para agitados, <strong>com</strong> uma sala de vigilancia<br />

continua e um perfeito Serviço de Balneotherapia.<br />

Possue ainda uma Sala especial para partos, além de uma Sala de<br />

Cirurgia Sceptica para ambos os sexos, um outro Pavilhão de Intercurrencia,<br />

Serviços Infantil e Administrativo, fora Garage, Ambulatório,<br />

Padaria, Praxitherapia, Habitações para Médicos, Irmãs de Caridade<br />

e demais auxiliares, hortas, jardins, pavilhões para a Criação<br />

de gado vaccum, suino e lanigero, gallinheiros, etc., etc. .<br />

Construído sob a mais rigorosa technica moderna, este Hospital servirá<br />

de padrão futuro a outros que venham a ser construídos no Estado.<br />

DEPARTAMENTO DE SAÚDE<br />

De aspecto imponente e alegre, <strong>com</strong> fundo para<br />

o mar e rodeado de jardins, hortas, pomares e<br />

campos esportivos, ergue-se á rua Ruy Barbosa,<br />

perto da Estação Agronomica, o ABRIGO DE<br />

MENORES.<br />

Com uma área de 1.300 metros quadrados e<br />

num terreno de 160.000 metros quadrados, <strong>com</strong><br />

capacidade para 300 menores, correspondendo<br />

plenamente á confiança do povo, as providencias<br />

reguladoras da creação do Juizado de Menores<br />

veio modificar e aclarar o sério problema<br />

social que até então se debatia no negror da<br />

duvida e da tentativa infructifera.<br />

A construcção desse esplendido edificio dividese<br />

em quatro Blocos, ligados entre si, e mais<br />

um separado, que é a Enfermaria e Observação.<br />

Na frente, <strong>com</strong>pondo o primeiro Bloco, estão<br />

dois pavimentos, onde funccionam o Juizado de<br />

Menores e a Administração do ABRIGO.<br />

mgm<br />

Dos lados, em dois Blocos também <strong>com</strong> dois pavimentos, estão localizadas<br />

as Salas de aula, 4 para cada secção, sendo que nos primeiros<br />

pavimentos se encontram um pateo coberto e o Refeitorio, que é,<br />

pelo gosto artístico, o que de mais interessante e suggestivo se nota<br />

em todo o ABRIGO.<br />

No centro, o quarto Bloco, apresenta quatro pavimentos, dois para<br />

Dormitorios, um, o central, para Sala de Estudos e o ultimo, o terreo,<br />

para a Cozinha, Refeitorio para professores e recreio coberto, para<br />

uma das secções, localizando-se no sub-sólo uma extensa lavanderia.<br />

Ê, de facto, o ABRIGO DE MENORES um lindo e utilíssimo prédio.<br />

Agora que me vou embora e que deixo esta sympathica Florianopolis,<br />

que tão doces recordações me traz, eu me lembro sempre dessas cen-<br />

Colonia Santa Thereza ( Leprosario)<br />

E confesso agora, leiga que sou na maravilhosa Sciencia da Psychiatria,<br />

a minha surpreza bastante grande em admirar ainda mais a<br />

Opacidade humanitaria e christã do Interventor Nerêu Ramos, admittindo<br />

o Conceito de Pinel, isto é, não collocando nella, na Colonia,<br />

grades nem cadeias e, portanto, quebrando o grilhão impiedoso e vexatorio<br />

que prendia o alienado ás prisões eternas, igualando-o aos outros<br />

doentes, já que por si são tão desventurados em não poderem<br />

<strong>com</strong>prehender a Belleza real da Vida !<br />

Â<br />

O Centro de Saúde<br />

tenas de menores abandonados e delinquentes, que ali encontrarão<br />

abrigo, conforto e carinho, producto triumphador dessa campanha<br />

transformadora e revigorante que, <strong>com</strong> segurança e êxito o Governo<br />

Estadual vem de emprehender.<br />

E vejo, presa nas garras da realidade, naquelle Refeitorio todo azul<br />

do ABRIGO, refeitorio cuja vista geral traz a impressão nítida de um<br />

avanço do céu pelas janellas a dentro, aquelle banuo de passaros hu-<br />

manos, tontos de azul e de felicidade, entre revoadas e gorgeios, co-<br />

merem <strong>com</strong> soffreguidão, para depois correrem para as salas de aula,<br />

em busca do estudo, da expansão do espirito, da mil vezes abençoada,<br />

Instrucçào . . .


MUSICA<br />

Uma visão retrospectiva pelo anno musical<br />

que passou poderá não assignalar grandes<br />

revelações. Registra, entretanto uma inten-<br />

sidade de movimento realmente digno de<br />

realce. A musica é um dos feitiços da nossa<br />

alma de românticos inveterados e o piano<br />

é, talvez, o seu instrumento predilecto. Dahi<br />

a frequencia <strong>com</strong> que se succedem recitaes<br />

de piano e, portanto, revelações pianisticas<br />

de primeira ordem.<br />

Duas alumnas, muito jovens ainda, consti-<br />

tuíram duas surpresas agradabilíssimas:<br />

Vera Cruz Pientznaner, discípula de Liddy<br />

Chiaffarelli Mignone, e Lais Prado Vascon-<br />

cellos, alumna de Suzana de Figueiredo.<br />

Também foram recebidos <strong>com</strong> sympathia<br />

a pianista Nayl de Mello Cavalcanti, e o<br />

violinista Bernardo Federowski, solistas da<br />

Orchestra de Creangas da Escola Nacional<br />

de Musica creada por Joanidia Sodré.<br />

0 piano, entretanto, proporcionou ao pu-<br />

blico algumas noites inolvidáveis, que evo-<br />

caremos <strong>com</strong> prazer: Maria Antonieta, de-<br />

liciosa pela sonoridade, pelo equilíbrio, pela<br />

perfeição dos pedaes, pelo encanto das in-<br />

terpretações sadias; Yolanda Ferreira, a<br />

virtuose exhuberante, dominadora do te-<br />

clado: Georgette Remy, <strong>com</strong> seu tempera-<br />

mento romântico; Anna Carolina, presente-<br />

mente em pleno explendor de uma carreira<br />

cheia de victorias; Yolanda Moreaux, sem-<br />

pre evoluindo; Maria Luiza Lima, <strong>com</strong> ex-<br />

cellentes predicados artísticos; Zilah de<br />

Moura Brito, pianista "doublée" de pro-<br />

fessora; Nair da Cunha Braga, excellente<br />

3 8 Illustraçfto Brasileira<br />

promessa; Arnaldo Rebello e Mario Aze-<br />

vedo que continuam cultivando o genero<br />

uois pianos; Leonor de Macedo Costa, sem-<br />

pre estudiosa; Maria Luiza Vaz, promessa<br />

interessante; José Vieira Brandão, nome<br />

que se vae impondo; Arnaldo Estrella, cada<br />

dia mais <strong>com</strong>pleto e mais impressionante:<br />

J. Octaviano, <strong>com</strong>positor, virtuose, mestre<br />

cheio de autoridade; Thomaz Teran, artista<br />

e professor que todos apreciam; e os estran-<br />

geiros <strong>com</strong> maior ou menor prestigio junto<br />

ao nosso publico: Giorgy Sándor, Simon<br />

Barrer, Cláudio Arran e Brailoswsky, o pre-<br />

dilecto.<br />

Para acolher esses artistas, encheram-se de<br />

maior ou menor auditório o Theatro Munici-<br />

pal e o Salão Leopoldo Miguez, da Escola<br />

Nacional de Musica, os únicos que possuímos<br />

e nos quaes se succederam as cantoras: Lais<br />

Waliace, Helena Figner, Rosetta Costa<br />

Pinto, Letícia de Figueiredo, Margit Bokor,<br />

Marion Mathaus, e os tres grandes nomes<br />

de Madeleine Grey, Bidu Sayão e Tito<br />

Schipa.<br />

A esses, devemos accrescentar os nomes de<br />

Edyr Austregésilo, Maria de Lourdes Sá<br />

Earp e Violeta Coelho Netto, que junta-<br />

mente <strong>com</strong> Bidu Sayão, triumpharam du-<br />

rante as temporadas lyricas de S. Paulo e<br />

Rio.<br />

Aliás, é preciso registrar a tentativa feita<br />

pela Prefeitura do Districto Federal, de realisar,<br />

directamente, a estação de opera. A<br />

experiencia não correspondeu á expectativa,<br />

apesar de todos os esforços dos que delia<br />

se acharam encarregados.<br />

Parallelamente <strong>com</strong> os espectáculos lyricos,<br />

tivemos bailados russos, dos quaes parti-<br />

cipou o corpo de bailes do Theatro Muni-<br />

cipal.<br />

Alguns concertos symphonicos deixaram<br />

impressão inesquecível, graças ao brilho<br />

que lhes deram os respectivos regentes:<br />

ARTE}<br />

Eugen Szenkar, Francisco Mignone, Vilia-<br />

Lobos, Eduardo de Guarnieri.<br />

Nesse capitulo, registramos, <strong>com</strong> prazer, o<br />

apparecimento de Carlos de Almeida, dirigindo<br />

intelligentemente a orchestra de<br />

alumnos do Conservatorio do Districto Federal.<br />

Não foram muitos os recitaes de violino.<br />

Em todo caso, alguns tiveram repercussão<br />

maior e foram os de Yolanda Maurity Sabóia,<br />

Yolanda Peixoto e do grande Mischa<br />

Elman.<br />

Como notas de destaque, apresentaram-se<br />

dois quartettos de corda: o quartetto Lener<br />

e o Fritzcher.<br />

Muito brilhante, o reapparecimento de Zuleika<br />

Margarida, que, num concerto realmente<br />

interessante, se apresentou <strong>com</strong>o<br />

<strong>com</strong>positora, pianista e regente, ou seja autora<br />

e interprete de sua própria obra.<br />

Succederam-se as audições de alumnas de<br />

piano e de canto, devendo ser salientadas<br />

as das professoras Alcina Navarro, Dulce


de Sanies, Zilah de Moura Brito e a do<br />

maestro J. Octaviano, e as da professora<br />

Riva Pasternac, realisadas no Salão da As-<br />

sociação Christã de Moços, sob o patrocínio<br />

da Sociedade Brasileira de Bellas Artes e<br />

no Theatro Casino de Copacabana.<br />

Merecem registro especial a homenagem dos<br />

alumnos e professores do Conservatorio do<br />

Districto Federal ás suas duas professoras<br />

Helena e Suzana de Figueiredo, e o Concurso<br />

de piano promovido pela Pró Musica,<br />

do qual foi vencedor o pianista Ruy Botti<br />

Cartolano, de S. Paulo.<br />

Houve, naturalmente, muitas outras manifestações<br />

menos importantes, de boa musica.<br />

Mas bastam essas que aqui são destacadas,<br />

para se ter um bom resumo do movimento<br />

musical de 1939.<br />

PINTURA<br />

Não fossem algumas exposições pessoaes<br />

realmente dignas de nota, e o anno que<br />

findou, em matéria de bellas-artes teria<br />

sido um anno realmente fraco. E mesmo<br />

assim, observadas essas exposições, verificamos<br />

que poucas foram as que exhibiram<br />

arte re<strong>com</strong>mendavel que mereça destaque<br />

aparte.<br />

Nenhuma iniciativa digna de nota, se verificou,<br />

para tirar o meio artístico do ma-<br />

rasmo em que vive. Se alguma inquietação<br />

maior se observou por vezes, foi devida exclusivamente<br />

aos proprios artistas, que vivem<br />

para o seu ideal.<br />

Finalmente, o movimento entre elles cresce<br />

por occasião do Salão de Bellas-Artes. 0<br />

anno passado, além desse, houve os salões<br />

de S. Paulo e de Porto Alegre, além do de<br />

New York, para agitar os interessados.<br />

E houve também o Concurso para o monumento<br />

de Oswaldo Cruz, um dos mais interessantes<br />

que aqui tem havido, e que foi<br />

inexplicavelmente annulado... Houve ainda<br />

a mudança da séde da Sociedade Brasileira<br />

de Bellas Artes, para o edificio Porto<br />

Alegre e houve a série de iniciativas do seu<br />

presidente, Castro Filho, que a ella está<br />

entregue de corpo e alma. Muito digno de<br />

registro foi o esforço de Guerra Duval na<br />

direcção da Associação dos Artistas Brasileiros,<br />

que prossegue no cumprimento de<br />

sua tarefa.<br />

Entre os nomes femininos que se apresentaram<br />

em exposições individuaes, dois queremos<br />

destacar, pela excellencia da producção<br />

exposta: Edith Aguiar Theil e Maria<br />

Meyer Marschner.<br />

Ha, entretanto, uma que, pela personalidade<br />

inconfundível de sua arte, merece registro<br />

a parte: Maria Margarida, — a artista<br />

de sensibilidade extranha e de emoção<br />

differente.<br />

Vindos de S. Paulo, dois artistas de alto<br />

valor tiveram a sua quinzena de bella evidencia:<br />

Ricardo Cipicchia, "o esculptor que<br />

brinca <strong>com</strong> o jacarandáe Paim, o ceramista<br />

sempre interessante.<br />

Gilberto Trompowski fez a sua exhibição<br />

annual calcada em motivos decorativos e,<br />

principalmente, em figurinos.<br />

Entre os nomes consagrados no meio, teve<br />

brilhante destaque a exposição de paisagens<br />

de Vicente Leite. Produziram excellente<br />

successo, as de Leopoldo Gottuzo, Almeida<br />

Júnior e A. Norfini. De volta de suas via-<br />

gens á Europa e ao Norte do Brasil, res-<br />

pectivamente, apresentaram-se Rocha Fer-<br />

reira, autor de alguns moisacos primorosos,<br />

e J. Rescála, que nos fez ver muita coisa<br />

nova da nossa terra. Gerson de Azeredo<br />

Coutinho e Gastão Formenti confirmaram<br />

os seus titulos de figuras da vanguarda da<br />

nossa arte. E Heitor de Pinho collocou-se<br />

definitivamente entre os maioraes.<br />

Continuaremos registrando mais alguns no-<br />

mes: Ismailowitch, Barros, o Mulato, Fran-<br />

co Cerri, Renée Lefevre, Francisca de Aze-<br />

vedo Leão, Otilia Lindenberg, Alexandre de<br />

Almeida, Clotilde Cavalcanti, Franta Reyl.<br />

Além do Salão Official, assignalaremos os<br />

Salões de Maio, de Marinhas, de Outomno<br />

e Feminino, iniciativas dignas de applauso.<br />

Merece registro especial a frequencia do<br />

Museu Nacional de Bellas-Artes, hoje diri-<br />

gido por Oswaldo Teixeira. As galerias fo-<br />

ram visitadas por uma média diaria de 167<br />

pessoas — o que é bastante animador. Quem<br />

lá andou viu que não perdeu seu tempo. Ha<br />

ali muita coisa digna de ser vista. Espe-<br />

remos que este anno fiquem installadas as<br />

novas salas, para exhibição de preciosas<br />

peças ainda postas á margem.


QoinviCte<br />

FUNDADA em 1851 por immigrantes estrangeiros, principalmente<br />

allemães e suissos, enviados pela Sociedade Colonizadora<br />

de Hamburgo, JOINVILLE, alegre e bonita, fica<br />

situada ao norte do Estado de Santa Catharina.<br />

Suas terras attingiam mais ou menos a extensão de 25 léguas e<br />

eram do patrimonio do Principe de Joinville, casado <strong>com</strong> a Princesa<br />

D. Francisca, filha do Imperador D. Pedro I em Março de 1851.<br />

Constantes do contracto de casamento dos Principes, chegaram<br />

então os primeiros immigrantes (191!), localizando-se á margem<br />

direita do rio Cachoeira, que banha a região. Fundaram então a Colonia<br />

Agrícola "Dona Francisca", tendo <strong>com</strong>o director Eduardo<br />

Schoeder, que dispendeu todo o esforço no sentido da localização<br />

definitiva dos colonos e do escoamento e drenagem do terreno,<br />

que naquelle tempo era pantanoso e húmido. Como representante<br />

do Principe de Joinville foi mandado para cá Lèenccé Aubé, que<br />

exerceu o cargo até 1860. sendo então substituido por Otto Luiz<br />

Niemayer. Tudo prosperou rapidamente e foram chegando novas<br />

levas de immigrantes que a Sociedade Colonizadora de Hamburgo<br />

mandava, e que se espalhavam pela região, penetrando o "hinterland"<br />

e fundando os novos centros de Annaburgo, Guiger,<br />

Brüderthal, etc., núcleos estes que, apezar de tudo o que se fez por<br />

elles, até agora estão sem grande progresso.<br />

O desenvolvimento da Colonia crescia cada vez mais, até que<br />

em 1858 foi elevada á cathegoria de Freguezia, sob a invocação de<br />

São Francisco Xavier. Em 1866 foi então constituida Município<br />

<strong>com</strong> o nome de JOINVILLE. E em 1877 passou á cathegoria de Cidade.<br />

A "Manchester Catharinense" divide-se em 4 Districtos: JOINVIL-<br />

LE, creado pela lei prov. n.° 452 de 1858; BANANAL, pela lei munie.<br />

n.° 281 de 1929; CORVETA, pela lei munie. n.° 309 de 1922; e<br />

PEDREIRA, pelo decreto federal n.° 439 de 1933, actos esses que<br />

depois foram ratificados pelo decreto federal n.° 311 de 2 de Março<br />

de 1938.<br />

JOINVILLE conta <strong>com</strong> uma população de mais de 40.000 habitantes,<br />

os quaes se dedicam a todos os misteres, principalmente á industria,<br />

ao <strong>com</strong>mercio e á lavoura pecuaria.<br />

f<br />

• us. •<br />

N E N É M A C A G G I<br />

Princesa do Norte Catharinense<br />

Seu <strong>com</strong>mercio é bastante grande, mas suas fabricas, em numero<br />

de 195 no Districto de Joinville, 42 em Pedreira, 59 em Bananal e<br />

28 em Corveta, abrangendo, portanto, um total de 324 fabricas,<br />

quer na fiação e tecelagem, em perfumaria, metallurgica, moveis,<br />

cerveja, etc., etc., são o seu maior e melhor attractivo, constituindo<br />

uma gloria não só para o Estado, <strong>com</strong>o para o Brasil inteiro, pela<br />

honestidade e bello acabamento de seus produetos.<br />

Com uma população ordeira, laboriosa e affeita ao dynamismo<br />

realizador dos antepassados, tem ainda a sua parte administrativa<br />

sempre entregue a brasileiros idoneos, cujos esforços se multiplicaram<br />

em prol do bem e da tranquillidade da Communa.<br />

RECEITA ARRECADADA PELA PREFEITURA<br />

MUNICIPAL DE JOINVILLE até 30 de Dezembro<br />

de 1939<br />

(N. B. — O anno Financeiro da Prefeitura<br />

será encerrado em 31 de Janeiro de <strong>1940</strong>).<br />

ARRECADAÇAO DURANTE O ANNO DE 1939<br />

" DA PRIMEIRA COLLECTORIA FEDERAL<br />

IDEM, IDEM DA SEGUNDA COLLECTORIA<br />

FEDERAL<br />

IDEM, IDEM DA COLLECTORIA ESTADUAL<br />

DE JOINVILLE<br />

RECEITA PREVISTA PARA O MUNICÍPIO DE<br />

JOINVILLE, NO ORÇAMENTO PARA <strong>1940</strong><br />

1.986:437$800<br />

2.478:005$500<br />

1.186:1038600<br />

3.572:325$000<br />

1.925:2008000<br />

Esteio financeiro do Estado de Santa Catharina, constitue a prospera<br />

e tranquilla cidade um "todo especial" na suggestividade de<br />

seus panoramas e de sua vida interna, toda ella moldada em costumes<br />

tradiccionaes perfeitamente adaptaveis aos brasileiros c aos<br />

que têm origem estrangeira.


\\<br />

rmm \ÍL<br />

O NO MICO<br />

BANCO INTER-AMERICANO<br />

A creação do Banco Inter - Americano pôde<br />

vir a ter uma influencia considerável no progresso<br />

material e no desenvolvimento economico<br />

de todos os paizes da America Latina.<br />

Elie se destina a estimular o <strong>com</strong>mercio<br />

entre os paizes deste hemispherio,<br />

fornecendo créditos e facilitando a inversão<br />

de capitaes em emprehendimentos de futuro.<br />

Todos os paizes concorreriam para a formação<br />

desse organismo internacional, de accordo<br />

<strong>com</strong> as suas possibilidades, e todos os paizes<br />

lucrariam <strong>com</strong> sua intervenção no <strong>com</strong>mercio<br />

e na producção, afastada toda idéa politica,<br />

assim as influencias nacionaes.<br />

O capital do Banco Inter - Americano será de 100.000.000 de dollars,<br />

e a sua creação foi resolvida em Washington, numa conferencia a que<br />

<strong>com</strong>pareceram representantes de todos os paizes da America. 4<br />

O Brasil, que possue tão grandes reservas naturaes, naturalmente,<br />

muito tem a esperar de todas as iniciativas, <strong>com</strong>o esta, visando<br />

augmentar o potencial financeiro e economico das nações americanas.<br />

O CONSUMO MUNDIAL DO CAFE'<br />

Uma estatística official mostra, claramente, a posição do café brasileiro<br />

em face do consumo mundial, no que se refere á safra dt<br />

1938/39. DeSta safra, foram exportadas para a Europa G.630.000<br />

saccas, ou 815.000 mais que na safra precedente ; para os Estados<br />

Unidos 9.040.000 saccas ou mais 1.148.000 que em 1937 - 1938 ; portou<br />

do sul 1.312.000, ou menos 78.000 que a safra anterior.<br />

O Brasil entregou ao consumo externo 16.982.000 saccas, ou<br />

mais 2.185.000.<br />

Quanto aos cafés de outras procedências, a Europa recebeu 4.968.000,<br />

menos 734.000 saccas que em 1937- 1938; Estados - Unidos 4.776.000.<br />

menos 334.000. No total de 9.744.000 saccas, de outros paizes<br />

houve decrescimo de 1.068.000 saccas, <strong>com</strong>paradas ás duas<br />

safras. O Brasil augmentou 14,02 em seus negocios de café <strong>com</strong><br />

a Europa e 19,07 # <strong>com</strong> os Estados - Unidos. Relativamente aos<br />

portos do sul diminuiu 14,77 %. Os cafés estrangeiros, por sua vez,<br />

diminuíram suas entregas em 12,87 % na Europa e 6,54 % nos<br />

Estados - Unidos.<br />

O total geral das entregas ao consumo do mundo foi de 26.726.000,<br />

ou mais 1.117.000 saccas. Nessa safra, pois, o Brasil ganhou<br />

2.185.000 e os outros paizes perderam 1.068.000 saccas.<br />

O CONSUMO DE PETROLEO NO BRASIL<br />

Agora que o problema do petroleo está na ordem do dia, passemos<br />

em revista alguns dados sobre esse producto.<br />

Como ao sabe, o maior productor mundial de petroleo são os Estados -<br />

Unidos, que entram nas estatísticas <strong>com</strong> 62


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