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52 Joaquim Nabuco do Paraguai, o foi pelos descendentes e filhos de escravos (aplausos); devem lembrar-se de que as classes proprietárias entenderam que não valia a pena fazer o sacrifício das suas preciosas vidas para defender a integridade do território (sensação), sem esquecerem que enquanto os libertos, resgatados pelo Estado, derramavam o seu sangue nos campos de batalha, os títulos de nobreza eram dados aos senhores. (Novos aplausos.) Peço os votos do clero, porque não é compatível essa monstruosa tolerância em nosso país, esse contubérnio da Igreja que desceu do calvário envolta na mortalha do grande Redentor, com uma instituição que é fundamentalmente contrária a todas as aspirações do Cristo, a toda a obra do Cristianismo. (Aplausos.) Peço os votos de todos os descendentes de escravos, de todos os homens de cor, porque estou trabalhando pela sua causa (apoiados), e porque, apesar de não haver entre nós o preconceito que desonrou a democracia norteamericana, com o que lhe damos um grande exemplo de liberalismo e fraternidade, é preciso que a raça negra se convença de que ela ainda tem no futuro de nosso país grandes transes por que passar, grandes dificuldades, desigualdades e opróbrios que vencer, e de que a justiça que ela terá de receber no futuro será medida pelo interesse e pelo amor que nesta geração houver mostrado pelos seus irmãos de cativeiro. (Longos aplausos.) Peço o voto dos operários, porque represento a liberdade, a dignidade do trabalho, e eles sabem que ainda mesmo quando a escravidão tiver morrido em nosso país, quando não houver mais escravos nem senhores, o espírito maldito que degradou e aviltou o trabalho, e que hoje atrofia o nosso país, tendo perdido as senzalas, há de continuar a esvoaçar como uma ave de rapina sobre os trabalhadores livres. (Aplausos.) Sim, eles devem saber que o poder insaciável de sangue humano que, julgando certa a perda do tributo africano, já lança olhos cobiçosos para o imenso manancial de homens que se chama China, vendo-se sem outros recursos, há de procurar – ou por meio do capital acumulado ou por outro qualquer meio de domínio – escravizar os homens livres, e que teremos que assistir a esforços para criar uma escravidão talvez pior que a verdadeira escravidão: a da pobreza, a da miséria, a da falta de trabalho, a da fome! (Prolongados aplausos.) Chamam-nos de comunistas, a nós que proclamamos o princípio da inviolabilidade da propriedade humana. (Aplausos.) Chamam-nos de niilistas – a nós que queremos destruir o pior dos niilismos –, o niilismo da
Campanha Abolicionista no Recife – Eleições de 1884 53 nossa personalidade, a escravidão! (Aplausos.) Dizem que somos os que não têm o que perder. Pois bem, senhores, essa qualificação não nos ofende mais do que ofendia os livres, os indomáveis holandeses quando eles sacudiam o jugo estrangeiro e combatiam, pela independência da sua pátria e pela liberdade das suas consciências, o serem chamados de Gueux pelos espanhóis orgulhosos, deslumbrados com as riquezas do Novo Mundo. (Muito bem!) Sabeis por que isso não nos ofende? Porque como eles somos a idéia nova, a redenção da pátria! Porque somos dez milhões de brasileiros, a nação inteira, “os que nada têm que perder”. (Aplausos calorosos.) Sinto, meus senhores, não ter forças para prosseguir, e não ter podido senão indicar sumariamente, sem as desenvolver, as relações profundas da escravidão com todos os vícios, fraquezas e atrasos nacionais. Receio entretanto haver esboçado um quadro demasiadamente sombrio, de sorte que a muitos pareça que nada podemos fazer para modificar uma situação tão desesperada; mas é preciso que tudo façamos, é nosso dever não desesperar. Chegamos, eu confesso, a um tempo difícil, cuja literatura única em harmonia com as calamidades nacionais parece ser a dos antigos profetas chorando lamentações sobre as ruínas e o cativeiro de Jerusalém, mas por isso mesmo é chegado o tempo da luta e do combate. Lembremonos que as nações, como os indivíduos, que cessam de lutar, começam a morrer.” O vosso futuro está nas vossas mãos. Há na história dos hebreus uma passagem célebre que parece simbolizar o período de ansiedade, de privação, de desespero que os povos atravessam quando saem do cativeiro para a liberdade. É a peregrinação dos 40 anos no deserto. Moisés não tira o seu povo da terra do Egito para leválo logo à Terra da Promissão. Entre uma e outra medeia esse longo intervalo de mais de uma geração, em que o caráter nacional é sujeito às provações do deserto e educado na escola da obediência, da fome, da resignação, da disciplina, e durante o qual os que viveram no cativeiro morrem sem chegar à terra prometida. Não vos parece que essa grandiosa legislação do Sinai torna-se maior e mais sublime entendida assim – como a fundição da alma de um povo criado no cativeiro para as lutas, a orfandade e os esforços do homem entregue a si mesmo? (Longos aplausos.) Pois bem, senhores, lembremo-nos dessa epopéia hebraica que pode simbolizar a aprendizagem difícil da vontade e dos hábitos de inde-
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nossa personalidade, a escravidão! (Aplausos.) Dizem que somos os que não<br />
têm o que perder. Pois bem, senhores, essa qualificação não nos ofende mais<br />
do que ofendia os livres, os indomáveis holandeses quando eles sacudiam<br />
o jugo estrangeiro e combatiam, pela independência da sua pátria e pela liberdade<br />
das suas consciências, o serem chamados de Gueux pelos espanhóis<br />
orgulhosos, deslumbrados com as riquezas do Novo Mundo. (Muito bem!)<br />
Sabeis por que isso não nos ofende? Porque como eles somos a idéia nova,<br />
a redenção da pátria! Porque somos dez milhões de brasileiros, a nação inteira,<br />
“os que nada têm que perder”. (Aplausos calorosos.)<br />
Sinto, meus senhores, não ter forças para prosseguir, e não ter<br />
podido senão indicar sumariamente, sem as desenvolver, as relações profundas<br />
da escravidão com todos os vícios, fraquezas e atrasos nacionais.<br />
Receio entretanto haver esboçado um quadro demasiadamente sombrio,<br />
de sorte que a muitos pareça que nada podemos fazer para modificar uma<br />
situação tão desesperada; mas é preciso que tudo façamos, é nosso dever<br />
não desesperar. Chegamos, eu confesso, a um tempo difícil, cuja literatura<br />
única em harmonia com as calamidades nacionais parece ser a dos antigos<br />
profetas chorando lamentações sobre as ruínas e o cativeiro de Jerusalém,<br />
mas por isso mesmo é chegado o tempo da luta e do combate. Lembremonos<br />
que as nações, como os indivíduos, que cessam de lutar, começam a<br />
morrer.” O vosso futuro está nas vossas mãos.<br />
Há na história dos hebreus uma passagem célebre que parece<br />
simbolizar o período de ansiedade, de privação, de desespero que os povos<br />
atravessam quando saem do cativeiro para a liberdade. É a peregrinação dos<br />
40 anos no deserto. Moisés não tira o seu povo da terra do Egito para leválo<br />
logo à Terra da Promissão. Entre uma e outra medeia esse longo intervalo<br />
de mais de uma geração, em que o caráter nacional é sujeito às provações<br />
do deserto e educado na escola da obediência, da fome, da resignação, da<br />
disciplina, e durante o qual os que viveram no cativeiro morrem sem chegar<br />
à terra prometida. Não vos parece que essa grandiosa legislação do Sinai<br />
torna-se maior e mais sublime entendida assim – como a fundição da alma<br />
de um povo criado no cativeiro para as lutas, a orfandade e os esforços do<br />
homem entregue a si mesmo? (Longos aplausos.)<br />
Pois bem, senhores, lembremo-nos dessa epopéia hebraica que<br />
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