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44 Joaquim Nabuco dos escravos, tão imponente como a que se travou a 28 de setembro de 1871 em tomo dos seus berços (muito bem!), assim como todos sabeis que os vossos candidatos preferem a derrota no terreno dos princípios a pedir votos com duas linguagens diversas, enganando os livres e os escravos, e escondendo o seu título de abolicionista que é hoje o único título de honra para o cidadão brasileiro. (Calorosos aplausos.) Se por acaso formos derrotados nas urnas, não será porque a opinião desta capital não anseie pelo nosso triunfo, mas sim por causa dos vícios profundos em política do caráter e do temperamento nacional, vícios que todos resultam ainda da escravidão. De qualquer lado que se encare a escravidão, que é o centro de todo o nosso organismo social, ela é a enfermidade moral de que todos sofremos; e por isso quando vos digo que é preciso, antes de tudo e acima de tudo, eliminá-la do nosso sistema, não estou senão expressando a magnitude dos efeitos que ela produziu e das influências que ela exerce sobre todos nós. Vós me ouvistes na passada conferência mostrar que a escravidão estava moralmente morta, e que nada podia ressuscitar uma instituição sepultada na consciência de um povo. Eu vos disse então que o espírito público tinha-se levantado em revolta contra ela e que, quando o espírito público assim se levanta contra uma ordem de coisas, não há força material que a possa manter. Mostrei-vos a marcha da idéia abolicionista, que comparei a uma grande corrente equatorial, formada dos afluentes do caráter e da inteligência nacional; disse-vos que não tivesses medo dessa inundação, porque assim como o Nilo deposita sobre o solo árido do Egito camadas fecundas, assim também da corrente abolicionista havia de brotar o solo físico e moral da pátria futura! (Aplausos.) Pois bem, se a escravidão está morta, se não há nada que a possa ressuscitar e se por outro lado o que vem atrás dela é a abundância e a fertilidade, é preciso abreviar o mais possível o terrível interregno que estamos atravessando da escravidão para a liberdade. (Aplausos.) Senhores, há uma palavra da qual compreendeis toda a importância e todo o alcance e que para mim pode resumir a influência da escravidão entre nós. A escravidão é o meio social do nosso povo. Muitos supõem que ela não tem as ramificações que já deitou pelo solo, abaixo da superfície do nosso país. Esses pensam na escravidão
Campanha Abolicionista no Recife – Eleições de 1884 45 que se vê, mas a escravidão que se não vê tem muito maior extensão e profundidade. (Muito bem!) Vai longe o tempo em que um grande filósofo inglês, Charles Darwin, ao atravessar as ruas do Recife, ouvindo os gemidos dos escravos, escrevia no seu livro, nesse grande livro que encerra a maior das concepções da natureza, uma frase que tenho por vezes citado: – “Graças a Deus, não tornarei mais a visitar um país de escravos.” Esse tempo já passou, e a escravidão assim escandalosa não é mais encontrada em torno de nós na cidade e é preciso penetrar no interior para ver esse melancólico grupo de escravas no serviço da enxada como uma tradição que nunca se extingue. Mas a escravidão não é uma opressão ou constrangimento que se limite aos pontos em que ela é visível; ela espraia-se por toda a parte; ela está onde vós estais; em nossas ruas, em nossas casas, no ar que respiramos, na criança que nasce, na planta que brota do chão... Ela começou por ser um regime de trabalho agrícola. O europeu, transportado para este mundo virgem, procurou o braço do africano para tomar posse do território. Mas esse regime de trabalho agrícola, só podendo ser mantido pela supressão da natureza humana, precisava cercar-se de proteções especiais e viver num meio à parte, fechado e todo seu, e daí resultou um sistema territorial, caracterizado pelo monopólio da terra e pela clausura dos trabalhadores. Tal sistema deu origem nos seus interstícios e nas suas fendas apenas à aparição e gradualmente ao crescimento de uma população livre, que nada tem que possa chamar seu, sem um palmo de terra que possa cultivar por sua conta, miserável e dependente no mesmo grau que o escravo. Eis aí a escravidão agrícola e territorial. Mas como se vê, com uma instituição que possui o solo, o trabalho agrícola e a população livre, o mal não podia circunscrever-se: a escravidão, de sistema agrícola e territorial, tornou-se um regime social e estendeu o seu domínio por toda a parte. Com efeito, senhores, havendo uma só classe que produz neste país, todas as outras são tributárias dela e daí um sistema social que se expressa desta forma: – um país de algumas famílias transitoriamente ricas e de dez milhões de proletários. (Adesões. Movimento.)
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que se vê, mas a escravidão que se não vê tem muito maior extensão e profundidade.<br />
(Muito bem!)<br />
Vai longe o tempo em que um grande filósofo inglês, Charles<br />
Darwin, ao atravessar as ruas do Recife, ouvindo os gemidos dos escravos,<br />
escrevia no seu livro, nesse grande livro que encerra a maior das concepções<br />
da natureza, uma frase que tenho por vezes citado: – “Graças a Deus, não<br />
tornarei mais a visitar um país de escravos.”<br />
Esse tempo já passou, e a escravidão assim escandalosa não é<br />
mais encontrada em torno de nós na cidade e é preciso penetrar no interior<br />
para ver esse melancólico grupo de escravas no serviço da enxada como uma<br />
tradição que nunca se extingue.<br />
Mas a escravidão não é uma opressão ou constrangimento que<br />
se limite aos pontos em que ela é visível; ela espraia-se por toda a parte; ela<br />
está onde vós estais; em nossas ruas, em nossas casas, no ar que respiramos,<br />
na criança que nasce, na planta que brota do chão...<br />
Ela começou por ser um regime de trabalho agrícola. O europeu,<br />
transportado para este mundo virgem, procurou o braço do africano para<br />
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ser mantido pela supressão da natureza humana, precisava cercar-se de<br />
proteções especiais e viver num meio à parte, fechado e todo seu, e daí resultou<br />
um sistema territorial, caracterizado pelo monopólio da terra e pela<br />
clausura dos trabalhadores. Tal sistema deu origem nos seus interstícios e<br />
nas suas fendas apenas à aparição e gradualmente ao crescimento de uma<br />
população livre, que nada tem que possa chamar seu, sem um palmo de<br />
terra que possa cultivar por sua conta, miserável e dependente no mesmo<br />
grau que o escravo.<br />
Eis aí a escravidão agrícola e territorial.<br />
Mas como se vê, com uma instituição que possui o solo, o<br />
trabalho agrícola e a população livre, o mal não podia circunscrever-se: a<br />
escravidão, de sistema agrícola e territorial, tornou-se um regime social e<br />
estendeu o seu domínio por toda a parte. Com efeito, senhores, havendo<br />
uma só classe que produz neste país, todas as outras são tributárias dela e<br />
daí um sistema social que se expressa desta forma: – um país de algumas<br />
famílias transitoriamente ricas e de dez milhões de proletários. (Adesões.<br />
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