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17.04.2013 Views

Campanha Abolicionista no Recife – Eleições de 1884 149 Por último, e em quinto lugar, falei do momento atual. Seria este o momento da resistência e da reação hoje que o movimento já libertou três províncias, que o entusiasmo abolicionista comunicou-se ao exército e à armada, que o nome do Brasil está comprometido perante o mundo a uma reforma séria, que a ansiedade pública irrompe de todos os lados e todos sentimos estar na véspera da redenção do nosso país? (Aplausos.) Assim, senhores, não tenhais medo de que o Partido Conservador se recomende mais à confiança do Imperador do que o Liberal, a cujo programa de reformas, à realização de cujas idéias parece-me de agora em diante ligada a sorte da monarquia no Brasil. O Imperador imitará o Rei Humberto e não a Afonso XII, certo de que sustentar o Partido Liberal no poder é tonificar a monarquia, e derribá-lo é lançá-la num caminho de aventuras que só pode levar à revolução, desde que a alternativa – o despotismo – é impossível no Brasil e contrário a todas as tendências históricas da nossa raça e da própria dinastia brasileira. (Aplausos.) Eu sei que os nossos adversários procuram deter-nos o passo invocando contra nós um homem que hoje estaria conosco, a menos que ele quisesse destruir a sua própria legenda, o Visconde do Rio Branco. Senhores, o Visconde do Rio Branco, Paranhos, viveu e morreu no serviço do Estado, deixou o seu nome inscrito em inúmeros atos legislativos e administrativos do reinado, foi ministro repetidas vezes, com a exceção notável da missão Saraiva, escreveu por assim dizer a história da nossa diplomacia no Rio da Prata durante toda a sua vida política, e no entanto o que é que o povo sabe, o que é que o mundo sabe do Visconde do Rio Branco? Que ele fez a lei de 28 de setembro. (Aplausos.) Isso quer dizer que não foi o nome de Paranhos que fez grande a emancipação dos escravos, mas que foi a emancipação que fez grande o nome de Paranhos. (Grandes aplausos.) Mas, senhores, esqueço-me que estamos na véspera do combate e que vós e eu devemos reservar as nossas forças para o dia de amanhã. Amanhã com efeito a cidade do Recife vai ser chamada a pronunciar-se num julgamento solene, entre duas idéias irreconciliáveis, entre dois espíritos que, como o do bem e do mal nas teogonias do Oriente, estão em perpétuo conflito na marcha do mundo. (Aplausos.) Vede o sombrio préstito com que a escravidão pretende disputar os vossos votos, o cortejo com que se apresenta em vossos comícios. Olhai para essa multidão que desfila atrás do

150 Joaquim Nabuco carro triunfal do Moloch americano que há três séculos se alimenta entre nós de vítimas da África sacrificadas à sua sede de sangue! (Aplausos.) São os velhos de 60 anos, carregados de velhice e de trabalho, que não deram somente ao seu senhor inexorável grandes safras de açúcar e de café, mas lhe deram filhos e netos, essa outra colheita que o enriqueceu; os galés de uma vida cuja história toda é a tragédia da senzala, sem uma consolação, sem um apoio fora de si mesmos e do seu próprio coração torturado, da sua consciência esmagada, sem nenhum desses apoios estranhos que nós todos temos na vida, nem a família, nem os amigos, nem o magistrado, nem a religião, nem a lei; portadores de uma vida assim roubada toda a si mesmo, ao seu corpo e à sua alma, vida cujos dias um por um caíram fundidos em moedas de cobre nas mãos do proprietário... e vós imaginais que sofrimentos devem ser os do homem cujos dias são assim vazados um por um, sem respeito às necessidades físicas e morais do ser pensante, que nós somos, em moedas de cobre... Vede todo esse cortejo de inválidos, seguidos dos seus filhos e netos, escravos como eles, primícias do seu próprio sangue que eles ofereceram à cupidez de seu senhor sem por elas todavia resgatar-se da escravidão (aplausos) – porquanto a escravidão é isso mesmo: é o tráfico do que há mais santo, mais misterioso, mais inexplicável na natureza: a maternidade! (sensação); é essa lei bárbara e atroz que diz à mulher que concebe: “Teu filho vai ser um escravo como tu, tu vais enriquecer o teu opressor com o produto do teu seio”... Não se diga que entre nós está abolido esse monstruoso princípio, porque não está; é em virtude dele tão-somente que existe a escravidão em nosso país, e aboli-lo, seriamente, seria decretar a emancipação de todos os escravos, presente gratuito e involuntário, às vezes filho do crime e da violência, que as escravas fizeram aos seus senhores! (Prolongada emoção.) Ah!, senhores, porque não aconteceu para honra da natureza humana em nosso país que, como se diz de certas espécies animais, a espécie humana também não se reproduzisse no cativeiro! (Nova emoção.) Parece que não poderei chegar ao fim das minhas frases, tanto sou arrebatado pela torrente das impressões que me causa esse regime que quando não foi pirataria tornou-se em lei de Herodes... Mas não são somente os velhos de 60 anos que apelam para vós: são todas as gerações escravas, a contar do ingênuo – escravo até aos 21 anos! De que massa humana sois feitos, pernambucanos, se tão grande injustiça não vos revolta e tão grande sofrimento não vos comove! Vós,

Campanha Abolicionista no Recife – Eleições de 1884 149<br />

Por último, e em quinto lugar, falei do momento atual. Seria este<br />

o momento da resistência e da reação hoje que o movimento já libertou três<br />

províncias, que o entusiasmo abolicionista comunicou-se ao exército e à<br />

armada, que o nome do Brasil está comprometido perante o mundo a uma<br />

reforma séria, que a ansiedade pública irrompe de todos os lados e todos<br />

sentimos estar na véspera da redenção do nosso país? (Aplausos.)<br />

Assim, senhores, não tenhais medo de que o Partido Conservador<br />

se recomende mais à confiança do Imperador do que o Liberal, a cujo<br />

programa de reformas, à realização de cujas idéias parece-me de agora em<br />

diante ligada a sorte da monarquia no Brasil. O Imperador imitará o Rei<br />

Humberto e não a Afonso XII, certo de que sustentar o Partido Liberal<br />

no poder é tonificar a monarquia, e derribá-lo é lançá-la num caminho de<br />

aventuras que só pode levar à revolução, desde que a alternativa – o despotismo<br />

– é impossível no Brasil e contrário a todas as tendências históricas<br />

da nossa raça e da própria dinastia brasileira. (Aplausos.)<br />

Eu sei que os nossos adversários procuram deter-nos o passo invocando<br />

contra nós um homem que hoje estaria conosco, a menos que ele<br />

quisesse destruir a sua própria legenda, o Visconde do Rio Branco. Senhores,<br />

o Visconde do Rio Branco, Paranhos, viveu e morreu no serviço do<br />

Estado, deixou o seu nome inscrito em inúmeros atos legislativos e administrativos<br />

do reinado, foi ministro repetidas vezes, com a exceção notável<br />

da missão Saraiva, escreveu por assim dizer a história da nossa diplomacia<br />

no Rio da Prata durante toda a sua vida política, e no entanto o que é que<br />

o povo sabe, o que é que o mundo sabe do Visconde do Rio Branco? Que<br />

ele fez a lei de 28 de setembro. (Aplausos.) Isso quer dizer que não foi o<br />

nome de Paranhos que fez grande a emancipação dos escravos, mas que foi<br />

a emancipação que fez grande o nome de Paranhos. (Grandes aplausos.)<br />

Mas, senhores, esqueço-me que estamos na véspera do combate e<br />

que vós e eu devemos reservar as nossas forças para o dia de amanhã. Amanhã<br />

com efeito a cidade do Recife vai ser chamada a pronunciar-se num<br />

julgamento solene, entre duas idéias irreconciliáveis, entre dois espíritos<br />

que, como o do bem e do mal nas teogonias do Oriente, estão em perpétuo<br />

conflito na marcha do mundo. (Aplausos.) Vede o sombrio préstito com<br />

que a escravidão pretende disputar os vossos votos, o cortejo com que se<br />

apresenta em vossos comícios. Olhai para essa multidão que desfila atrás do

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