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Campanha Abolicionista no Recife – Eleições de 1884 143 Mas não tenhais medo de ferir esses princípios com que eles se protegem dos nossos golpes... Nem o direito de propriedade, nem a vida e a segurança das famílias, nem o crédito do Estado, nem a união dos brasileiros, nem a integridade da pátria sofrerão a mais leve ferida. Esses interesses, esses princípios nada têm a ver com a escravidão, que é o inimigo de nós todos e de todos eles. (Aplausos.) Os vossos ídolos ficarão intactos; ainda mais no ardor do combate vós os vereis sustentando a boa causa que é a nossa. (Aplausos.) Senhores, quando a majestade desta reunião, como creio que ainda não houve igual no Recife, não bastasse para tomar imperecível em mim a lembrança da campanha eleitoral que deve terminar amanhã, estou certo de que a todo tempo os que me escutastes daríeis testemunho de que empreguei todos os esforços da palavra e da persuasão ao meu alcance para conquistar o voto e a opinião da capital de Pernambuco, em favor da idéia abolicionista. Quanto a mim estou satisfeito por ter proclamado os princípios cardeais da nova propaganda e por ter começado a vê-los germinar... Essas grandes verdades que tratei de passar para os vossos espíritos, com a mesma força e evidência com que elas se impuseram ao meu, hão de ficar profundamente gravadas no patriotismo e na consciência de todos vós. A primeira foi que há brasileiros ainda sem pátria, e que a nação brasileira, com o regime servil, está posta fora da lei no interior, abaixo da lei nas cidades... (Aplausos). A segunda foi que a propriedade não tem só direitos, tem também deveres, e que ela tem faltado a todos os seus deveres, dos quais não chegou ainda a ter sequer consciência. (Aplausos.) A terceira foi que a solução do problema da miséria nas cidades, da ociosidade e da indiferença no interior só pode ser produzida por uma lei agrária, que, por meio do imposto territorial ou da desapropriação, faça voltar para o domínio público toda a imensa extensão de terras que o monopólio escravista não cultiva nem deixa cultivar. (Aplausos.) A quarta foi que nós precisamos de reformas sociais que tenham por centro esse único interesse nacional – o trabalho – (aplausos): liberdade de trabalho, amor ao trabalho, instrução técnica e cívica do trabalhador, voto do operário, proteção ao trabalho, criação de indústrias etc., e que precisamos desse grupo de reformas sociais de preferência a mudanças e reformas políticas que não afetem o nosso povo, mas tão-somente a oligarquia criada pela escravidão. (Aplausos.)

144 Joaquim Nabuco Essas verdades podem parecer novas, arriscadas e injustas... mas, assim como a pedra da Caaba, que de branca tornou-se preta pelo toque de gerações sucessivas de crentes, elas hão de ser cada vez mais reverenciadas pelo povo brasileiro, a cujas necessidades mais palpitantes e vitais correspondem, hão de ser os dogmas de uma crença política diversa daquela em que fomos educados no período de superstição e de ignorância, em que a nação se resume na classe governante e deixa-se o povo crescer na degradação, no cativeiro e na miséria... (Longos aplausos.) Pitt dizia ao Duque de Devonshire: “Estou certo de que eu posso salvar a Inglaterra e de que ninguém mais o pode”. Não posso falar como o grande estadista, porque só depois de arrancadas as raízes da escravidão é que se poderá avaliar a extensão do mal que ela nos fez e o que ela não solapou... mas posso dizer com a mesma fé e segurança: “Se não estou certo de que a abolição possa salvar o Brasil, estou certo de que nada mais o pode”. (Aplausos.) Falo do presente, porque, quanto ao futuro, a abolição o pode e o há de salvar. (Novos aplausos.) Sim, senhores, essa prosperidade, essa fertilidade de que a escravidão se ufana, é apenas a ironia da esterilidade nacional. (Muito bem!) A escravidão só existe, só produz porque nós não produzimos (aplausos), porquanto se houvesse trabalho livre não haveria escravidão... (aplausos), e nós só não produzimos porque ela existe e produz, porquanto se não houvesse escravidão haveria o trabalho livre, o trabalho nacional... A fertilidade dela é assim, como eu disse, a nossa esterilidade... É como no Gênese, quando a esposa estéril julgava-se fecunda, julgava-se mãe, se uma de suas escravas concebia do patriarca e, na frase da Bíblia, paria sobre os joelhos dela... Sim, senhores, é a escravidão que pare há três séculos sobre os joelhos da nossa pátria! (Longos aplausos.) Como é triste esse espetáculo de um país novo reduzido à decrepitude por um sistema que deixa sem trabalho, que impede de trabalhar a massa válida da população nacional. Eu tive ocasião de ver o reflexo triste que ele projeta, até mesmo no coração das nossas cidades, nas minhas visitas ao eleitorado. Em que condições de pobreza, de dependência, de abandono encontrei parte do povo que entrou no eleitorado. Que admirável coragem a desses homens que criam uma família, contribuem para o aumento da população nacional, nas condições de vida

144 Joaquim Nabuco<br />

Essas verdades podem parecer novas, arriscadas e injustas... mas,<br />

assim como a pedra da Caaba, que de branca tornou-se preta pelo toque de<br />

gerações sucessivas de crentes, elas hão de ser cada vez mais reverenciadas<br />

pelo povo brasileiro, a cujas necessidades mais palpitantes e vitais correspondem,<br />

hão de ser os dogmas de uma crença política diversa daquela em<br />

que fomos educados no período de superstição e de ignorância, em que a<br />

nação se resume na classe governante e deixa-se o povo crescer na degradação,<br />

no cativeiro e na miséria... (Longos aplausos.)<br />

Pitt dizia ao Duque de Devonshire: “Estou certo de que eu posso<br />

salvar a Inglaterra e de que ninguém mais o pode”. Não posso falar como<br />

o grande estadista, porque só depois de arrancadas as raízes da escravidão é<br />

que se poderá avaliar a extensão do mal que ela nos fez e o que ela não solapou...<br />

mas posso dizer com a mesma fé e segurança: “Se não estou certo de<br />

que a abolição possa salvar o Brasil, estou certo de que nada mais o pode”.<br />

(Aplausos.) Falo do presente, porque, quanto ao futuro, a abolição o pode e<br />

o há de salvar. (Novos aplausos.)<br />

Sim, senhores, essa prosperidade, essa fertilidade de que a escravidão<br />

se ufana, é apenas a ironia da esterilidade nacional. (Muito bem!) A<br />

escravidão só existe, só produz porque nós não produzimos (aplausos), porquanto<br />

se houvesse trabalho livre não haveria escravidão... (aplausos), e nós<br />

só não produzimos porque ela existe e produz, porquanto se não houvesse<br />

escravidão haveria o trabalho livre, o trabalho nacional... A fertilidade dela<br />

é assim, como eu disse, a nossa esterilidade... É como no Gênese, quando<br />

a esposa estéril julgava-se fecunda, julgava-se mãe, se uma de suas escravas<br />

concebia do patriarca e, na frase da Bíblia, paria sobre os joelhos dela... Sim,<br />

senhores, é a escravidão que pare há três séculos sobre os joelhos da nossa<br />

pátria! (Longos aplausos.)<br />

Como é triste esse espetáculo de um país novo reduzido à decrepitude<br />

por um sistema que deixa sem trabalho, que impede de trabalhar a<br />

massa válida da população nacional. Eu tive ocasião de ver o reflexo triste<br />

que ele projeta, até mesmo no coração das nossas cidades, nas minhas visitas<br />

ao eleitorado. Em que condições de pobreza, de dependência, de abandono<br />

encontrei parte do povo que entrou no eleitorado.<br />

Que admirável coragem a desses homens que criam uma família,<br />

contribuem para o aumento da população nacional, nas condições de vida

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