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Cinco critérios para a formação do psicólogo - Vigotski - Brasil

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VIII JOP<br />

Jornada Internacional de Psicologia<br />

fazem parte da gênese de nossa tomada de consciência da realidade e de nós mesmos com relação a ela.<br />

Contu<strong>do</strong>, que tipo de generalizações estão em jogo, quan<strong>do</strong> se trata como geral um processo específico?<br />

Coloca-se o problema da ideologia, no senti<strong>do</strong> marxiano, qual seja: tomar uma verdade particular e fazê-la<br />

passar por uma verdade universal; ou, então, o problema correlato <strong>do</strong> “preconceito” – uma forma de<br />

pensamento ultrageneralizante, irrefletida, cristalizada e, no limite, carregada de afetos destrutivos, como a<br />

rejeição, o ódio ou o me<strong>do</strong>. É importante, <strong>para</strong> a crítica, superar essas visões parciais e/ou preconceituosas.<br />

Mas como, se não é possível ver tu<strong>do</strong>? Como, se não é possível chegar a sínteses mais seguras sem passar<br />

pela análise? Como, se o conhecimento é um processo que sempre nos leva, a saber, que há muito mais<br />

coisas de que não sabemos <strong>do</strong> que as que já sabemos? Esse é um desafio colossal quan<strong>do</strong> se trata da<br />

<strong>formação</strong>. Colocamo-nos, especificamente, diante da questão <strong>do</strong> “profissional generalista”, num mun<strong>do</strong> que<br />

tende abertamente à especialização e estratificação cada vez maiores <strong>do</strong>s saberes e, ao mesmo tempo, impõe<br />

aos profissionais a necessidade de serem suficientemente hábeis <strong>para</strong> exercer diferentes funções ao mesmo<br />

tempo. Seria o generalista uma espécie de “genérico” que se adapta a múltiplas situações? Trilhar por este<br />

caminho é uma das opções que se pode ter. Contu<strong>do</strong>, consideramos essa via como algo que vai à<br />

contracorrente <strong>do</strong>s <strong>critérios</strong> de uma ética e de um compromisso social criticamente orienta<strong>do</strong>. Não há de ser a<br />

“flexibilidade” exigida no mun<strong>do</strong> globaliza<strong>do</strong> <strong>do</strong> trabalho, o único critério da <strong>formação</strong> <strong>do</strong> generalista. Não<br />

pelo fato de que ela não deva ser considerada como uma realidade importante que aí está posta, mas até<br />

porque ela implicará, acima de tu<strong>do</strong>, o desenvolvimento de uma capacidade de adaptar-se a situações que<br />

ainda virão. Um <strong>do</strong>s problemas é em que medida se pode ser generalista se a generalidade se subordina às<br />

múltiplas possibilidades de especialização apontadas no horizonte num merca<strong>do</strong> que nem sempre tem os<br />

mesmos princípios éticos e compromissos sociais defini<strong>do</strong>s no projeto que visa a <strong>formação</strong> destes<br />

profissionais. Entretanto, é possível delinear com clareza: a <strong>formação</strong> generalista (seja ela subordinada à<br />

especialização ou regente da especialização) não pode ser sinônimo de “conjunto de especialidades”. Um<br />

simpósio de especialidades das mais variadas e interessantes não tem como garantir o caráter generalista. Um<br />

generalista não é aquele que sabe “de tu<strong>do</strong> um pouco”. Consta que Hegel dissera que se “algo é tu<strong>do</strong>, esse<br />

algo é nada”, e podemos <strong>para</strong>fraseá-lo concluin<strong>do</strong> que: “se alguém sabe tu<strong>do</strong>, esse alguém sabe nada”. Um<br />

generalista seria, mais propriamente, aquele que <strong>do</strong>mina os fundamentos de sua área e de tão bem <strong>do</strong>miná-los<br />

torna-se apto a transitar por campos de aplicação distintos e funções distintas. No caso das ciências humanas,<br />

o que há de geral é o próprio homem. Quanto mais se vai fun<strong>do</strong> na condição humana, tanto mais tornamo-nos<br />

aptos a lidar com pessoas em diferentes situações, ainda que sempre haja a dimensão da imprevisibilidade e<br />

da novidade, o que não deixa de ser uma característica geral constitutiva da realidade. Na ética isso é<br />

<strong>para</strong>digmático, mas também o pode ser na antropologia, na sociologia, na pedagogia e na psicologia – desde<br />

que se ocupem <strong>do</strong> humano naquilo em que o constitui como tal, ou seja, na sua condição histórica e cultural,<br />

na sua inserção social, grupal e intersubjetiva, no seu desejo de criar e em sua aspiração à transcendência.<br />

Operar com isso é complexo. Então logo se vê que geral não é sinônimo de simplifica<strong>do</strong> ou elementar. O<br />

geral não é o resumi<strong>do</strong>, nem o mais fácil, tampouco o mais comum. O geral implica a aproximação à<br />

complexidade <strong>do</strong> objeto de estu<strong>do</strong> em diferentes determinações – e isso não se dará apenas através de um vôo<br />

panorâmico por um índice de informações diversas, dispersas, justapostas. Para chegar-se a uma visão<br />

generalista é preciso um trabalho estrutura<strong>do</strong>, já que se trata de uma visão estruturada. Evidentemente, isso<br />

demanda tempo. Não há como captar o geral numa apreensão instantânea, a não ser que se trate de<br />

genialidade ou embuste. Por motivos diferentes, nenhum destes <strong>do</strong>is casos nos interessa, de mo<strong>do</strong> que se uma<br />

atitude generalista for característica fundamental <strong>para</strong> a <strong>formação</strong> profissional, será preciso enfrentar o fato<br />

de que isso depende de tempo. Tempo que o mun<strong>do</strong> da técnica e <strong>do</strong> trabalho “flexível” (talvez fosse melhor<br />

dizer “sobrecarrega<strong>do</strong>”), nem sempre nos coloca à disposição.<br />

(5) Quanto ao critério da “competência técnica”, levantamos ainda alguns pontos de discussão,<br />

entenden<strong>do</strong> que ele se articula aos anteriores e lhes dá coesão. Durante os anos oitenta e início <strong>do</strong>s noventa<br />

(<strong>do</strong> século vinte), houve um debate bastante acirra<strong>do</strong> no campo da pedagogia em torno <strong>do</strong> suposto dilema<br />

entre “competência técnica” e “compromisso político”, ao que Saviani (1991) contrapôs seu brilhante texto<br />

sobre “compromisso técnico” e “competência política”. A noção central é a de que um profissional, mesmo<br />

que militante de uma causa justa, pouco contribui com a construção de relações sociais mais justas na sua<br />

própria área de atuação se não for competente nela. Por outro la<strong>do</strong>, um profissional que imagina cumprir bem<br />

a sua tarefa sem envolver-se com questões relativas à vida pública, ao bem-estar da coletividade à qual<br />

pertence, também deixará lacunas, pois nenhuma profissão se exerce no vazio, mas sempre num determina<strong>do</strong><br />

contexto, atravessa<strong>do</strong> por diferentes relações de força. Estamos apresentan<strong>do</strong> a questão de forma bastante<br />

resumida, mas entendemos que esta discussão segue sen<strong>do</strong> importante, caso haja intenção de articular a<br />

competência técnica com os <strong>critérios</strong> anteriores. Notamos que ainda persistem distorções quanto a este tema:<br />

críticas ideológicas sagazes, mas demasiadas abstratas e descomprometidas com a técnica; e habilidades<br />

técnicas virtuosas, mas demasiadas irrefletidas e descomprometidas com a crítica. A síntese entre os<br />

melhores aspectos de cada um desses extremos é o mais difícil de atingir e também aquilo de que mais

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