No Compasso da História - MultiRio

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Um dos personagens mais interessantes do Rio de Janeiro do começo do século XX foi o jornalista, cronista e escritor João do Rio (pseudônimo de Paulo Barreto), que, desde os 18 anos, já colaborava com a imprensa carioca. Aliás, graças ao seu incessante trabalho, pela primeira vez, o jornalismo na cidade deixou de ser um “bico” de funcionários públicos ou escritores com tempo livre para tornar-se uma profissão. Mas, para viver de seu trabalho, Paulo Barreto criou cerca de dez pseudônimos, atendendo aos diversos tipos de público. 12 . Capa do livro As Religiões do Rio, de Paulo Barreto, conhecido como João do Rio Seu método de trabalho, que hoje é comum em qualquer redação, foi um achado à época: ia para as ruas e, com sua extrema sensibilidade, captava o espírito de uma cidade que acelerava aos poucos seus movimentos. Em 1904, ao realizar uma série de reportagens intitulada As Religiões do Rio, alcançou a notoriedade; pois, além do óbvio tino jornalístico, fez uma série de observações de caráter sociológico e antropológico que até hoje são utilizadas pelos pesquisadores. Ao perceber o sucesso da empreitada, o autor publicou as reportagens em livro, vendendo mais de seis mil exemplares, um número astronômico para a época. Outra coletânea de seus textos, A Alma Encantadora das Ruas, mantém-se como um testemunho preciso do que era o Rio de Janeiro e, por isso, é sempre reeditada. Paulo Barreto elegeu-se para a Academia Brasileira de Letras em 1910 e foi o primeiro “imortal” a usar o famoso “fardão”. Figura polêmica, Barreto vestia-se de maneira escandalosa e se propunha a defender novas ideias nos campos político e social. Foi o primeiro a traduzir para o português as obras do escritor inglês Oscar Wilde, e suas atitudes nada convencionais atraíam muitos inimigos, o maior deles, provavelmente, o escritor Humberto de Campos. Aos 40 anos, Barreto morreu, vítima de um fulminante ataque cardíaco. Segundo a crônica da época, o enterro foi acompanhado por cerca de cem mil pessoas, e seu túmulo, no cemitério São João Batista, é considerado um dos mais belos expoentes da arte funerária na cidade, atraindo até hoje muitos visitantes. Obra fascinante para quem quer conhecer o Rio de Janeiro da época, a bela biblioteca de Paulo Barreto ficou intacta, doada por sua mãe ao Real Gabinete Português de Leitura. 13 . O jornalista, cronista e escritor João do Rio 1889: Nasce a República – A alma encantadora das ruas 93

1889: Nasce a República – A alma encantadora das ruas 94 A vez da borracha A Inglaterra mandou um emissário pra cá Tudo que viu ele voltou pra confirmar Teatro, casa de chá, boemia, Muito mais a fidalguia tinha aos seus pés Os barões da borracha tinham ousadia De acender os charutos com 500 mil réis Estórias para Ninar um Povo Patriota (Paulo Mumunha, Adão Conceição, Marcos do Açougue e Anísio Silva) Uma árvore nativa da Amazônia foi a responsável por um grande surto econômico que chegou a ameaçar o império do café no início da República: a seringueira. Dela, era extraído um líquido branco e viscoso – matéria- -prima de um produto fundamental para a indústria do começo do século XX: a borracha. Nem era preciso plantar, pois havia tantas seringueiras na mata que a extração se fazia de forma quase aleatória: marcava-se o terreno, riscava-se o tronco da árvore e colocava-se uma vasilha para recolher o líquido. 14 . Seringueiro trabalhando na extração da borracha, por Percy Lau A borracha já era conhecida desde o começo do século XIX, mas havia uma questão técnica que inviabilizava sua utilização: ficava muito dura no inverno e amolecia no verão. Foi o engenheiro norte-americano Charles Goodyear que resolveu o problema, criando um processo chamado de “vulcanização”, que dava à borracha a textura e a consistência necessárias para seu uso industrial. A partir daí, ela começou a ser empregada para a produção de pisos, cobertura, solas de sapato, luvas. Mas foi com o espetacular crescimento da indústria automobilística que a borracha atingiu seu auge, já que os engenheiros de produção do setor logo perceberam que não havia matéria-prima melhor para a fabricação de pneus. 15 . O Teatro Amazonas, inaugurado em 31 de dezembro de 1896 Entre 1890 e 1920, o ciclo da borracha transformou algumas cidades amazônicas em verdadeiros centros econômicos e, até, culturais. Os chamados “barões da borracha”, similares aos “barões do café”, enriquecidos pela exportação do produto para os Estados Unidos e para a Europa, construíram belíssimos palacetes em Belém e em Manaus. É interessante notar como, no imaginário popular, a monarquia ainda tinha seu lugar, pois os novos-ricos sempre levavam a alcunha de “barões”. Lembrança física desse

Um dos personagens mais interessantes do<br />

Rio de Janeiro do começo do século XX foi<br />

o jornalista, cronista e escritor João do Rio<br />

(pseudônimo de Paulo Barreto), que, desde<br />

os 18 anos, já colaborava com a imprensa<br />

carioca. Aliás, graças ao seu incessante trabalho,<br />

pela primeira vez, o jornalismo na<br />

ci<strong>da</strong>de deixou de ser um “bico” de funcionários<br />

públicos ou escritores com tempo livre<br />

para tornar-se uma profissão. Mas, para<br />

viver de seu trabalho, Paulo Barreto criou<br />

cerca de dez pseudônimos, atendendo aos<br />

diversos tipos de público.<br />

12 . Capa do livro<br />

As Religiões do Rio,<br />

de Paulo Barreto,<br />

conhecido como<br />

João do Rio<br />

Seu método de trabalho, que hoje é comum<br />

em qualquer re<strong>da</strong>ção, foi um achado<br />

à época: ia para as ruas e, com sua extrema<br />

sensibili<strong>da</strong>de, captava o espírito de<br />

uma ci<strong>da</strong>de que acelerava aos poucos seus<br />

movimentos. Em 1904, ao realizar uma série<br />

de reportagens intitula<strong>da</strong> As Religiões<br />

do Rio, alcançou a notorie<strong>da</strong>de; pois, além<br />

do óbvio tino jornalístico, fez uma série de<br />

observações de caráter sociológico e antropológico<br />

que até hoje são utiliza<strong>da</strong>s pelos<br />

pesquisadores.<br />

Ao perceber o sucesso <strong>da</strong> empreita<strong>da</strong>, o autor<br />

publicou as reportagens em livro, vendendo<br />

mais de seis mil exemplares, um<br />

número astronômico para a época. Outra coletânea<br />

de seus textos, A Alma Encantadora<br />

<strong>da</strong>s Ruas, mantém-se como um testemunho<br />

preciso do que era o Rio de Janeiro e, por<br />

isso, é sempre reedita<strong>da</strong>.<br />

Paulo Barreto elegeu-se para a Academia<br />

Brasileira de Letras em 1910 e foi o primeiro<br />

“imortal” a usar o famoso “fardão”.<br />

Figura polêmica, Barreto vestia-se de maneira<br />

escan<strong>da</strong>losa e se propunha a defender<br />

novas ideias nos campos político e social.<br />

Foi o primeiro a traduzir para o português<br />

as obras do escritor inglês Oscar Wilde, e<br />

suas atitudes na<strong>da</strong> convencionais atraíam<br />

muitos inimigos, o maior deles, provavelmente,<br />

o escritor Humberto de Campos.<br />

Aos 40 anos, Barreto morreu, vítima de um<br />

fulminante ataque cardíaco. Segundo a crônica<br />

<strong>da</strong> época, o enterro foi acompanhado<br />

por cerca de cem mil pessoas, e seu túmulo,<br />

no cemitério São João Batista, é considerado<br />

um dos mais belos expoentes <strong>da</strong> arte funerária<br />

na ci<strong>da</strong>de, atraindo até hoje muitos<br />

visitantes. Obra fascinante para quem quer<br />

conhecer o Rio de Janeiro <strong>da</strong> época, a bela<br />

biblioteca de Paulo Barreto ficou intacta,<br />

doa<strong>da</strong> por sua mãe ao Real Gabinete Português<br />

de Leitura.<br />

13 . O jornalista, cronista e escritor João do Rio<br />

1889: Nasce a República – A alma encantadora <strong>da</strong>s ruas<br />

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