No Compasso da História - MultiRio
No Compasso da História - MultiRio No Compasso da História - MultiRio
termos filosóficos, como a grega, admitiam a escravidão. Prisioneiros de guerra eram considerados escravos naturais e levados pelos vencedores para o cativeiro. A doutrina da liberdade individual – “todo homem nasce livre” –, como a conhecemos hoje, é bem recente. 4 . Mapa do continente africano Angola Congo Benguela Monjolo Cabinda Mina Quiloa Rebolo Aqui onde estão os homens Há um grande leilão Dizem que nele há Uma princesa à venda Que veio junto com seus súditos Acorrentados num carro de boi Zumbi (Jorge Ben Jor) A escravidão já existia na África antes mesmo que os ocidentais ali chegassem em busca de mão de obra para colonizar o Novo Mundo. Há relatos de que, entre os séculos X e XV, o comércio de escravos foi largamente praticado nos reinos africanos da época. As tribos rivais faziam prisioneiros em seus conflitos e os vendiam, primeiro, para os árabes; em seguida, para os europeus. 5 . Etnia fula, que habita do Senegal até Camarões e Sudão A grande empresa colonial ocidental utilizou muito a mão de obra africana: não há números precisos, mas estima-se que, de 1450 a 1900, cerca de 11 a 15 milhões de homens e mulheres foram transferidos para o continente americano. Geraram riqueza, filhos, miscigenaram-se, emprestaram à cultura ocidental o melhor de sua música, de sua comida, de sua religião. É desse legado para nós, brasileiros, que trata este capítulo. Com a permissão da Igreja Combate, Male! Dá três pulos aí, Saci! Se atira no espaço por nós, Zumbi! Joga a chibata, João, no mar que te [ampliou! Ah, olha o raio de luz: Kawô, Xangô! João do Pulo (João Bosco e Aldir Blanc) Em 18 de junho de 1452, o papa Nicolau V, através de uma bula (documento outorgado pelo papa que tinha valor de lei para os católicos), concedeu ao rei de Portugal, D. Afonso V, e a seus sucessores a faculdade de conquistar e subjugar as terras dos Raízes africanas – Capoeira, mungunzá e valentia 29
Raízes africanas – Capoeira, mungunzá e valentia 30 “infiéis” (todos aqueles que não professavam a religião católica), podendo escravizar os prisioneiros. Não demorou muito para que comerciantes portugueses chegassem ao Golfo de Benin e ao delta do Rio Níger, integrando-se normalmente ao tráfico de escravos que já existia na região. Foi assim durante todo o século XV, mas, a partir da descoberta da América, o fato atingiu grandes proporções. No Brasil, foi Salvador, na Bahia, o primeiro grande entreposto da escravatura. Os navios mercantes portugueses que vinham de Goa (Índia) com mercadorias como louças e tecidos faziam escala em Luanda e completavam a carga com escravos africanos. Em seguida, rumavam para o Brasil, que assim se tornou, no século XVII, o principal difusor dos produtos indianos na América do Sul. De acordo com as estimativas, entre três e cinco milhões de escravos teriam entrado aqui até finais do século XIX. 6 . Interior de um navio negreiro carregado de escravos Os dados disponíveis sobre o tráfico negreiro revelam que a população masculina era muito maior do que a feminina. Há vários fatores que concorrem para essa proporção, que pode ter chegado a 75% de homens. Em um primeiro momento da economia negreira, os europeus lidavam com traficantes árabes, que tinham por hábito vender os homens e incorporar as mulheres a seus grupos. Por outro lado, os homens eram muito mais resistentes às terríveis condições que viviam ao serem trazidos para a América. E, no Brasil, os senhores de escravos preferiam comprar cativos novos a permitir que os seus procriassem, por conta da grande oferta no mercado e do gasto menor do que seria o de cuidar das crianças. Oxalá, Deus! Onde está Deus? – Em todo lugar! Olorum, Jeová, Oxalá, Alah, N’Zambi... [Jesus! E o Espírito Santo? É Deus! Salve sincretismo religioso! – Salve! Quem é Omulu, gente? – São Lázaro! Iansã? – Santa Bárbara! Ogum? – São Jorge! Xangô? – São Jerônimo! Oxóssi? – São Sebastião! Aioká, Inaê, Kianda – Iemanjá! Viva a Nossa Senhora Aparecida! – [Padroeira do Brasil! Sincretismo Religioso (Martinho da Vila) A arte afro-brasileira desenvolvida durante a escravidão viveu em completa obscuridade até meados do século XX. Interpretada como manifestação religiosa, escapou ao olhar crítico e, também, ao grande público. No entanto, segundo o pesquisador Francisco Martins, “apesar de a maioria dos artistas negros terem como religião o candomblé, eles souberam estabelecer sincretismo com a religião católica, que era dominante. Foram muitas as obras realizadas por artistas negros em templos católicos, onde criaram obras repletas de detalhes sutis que valorizaram o conjunto pelo ineditismo”. É o caso do barroco mineiro, em que a escultura e a arquitetura de Aleijadinho se destacam no
- Page 1 and 2: No Compasso da História
- Page 4: No Compasso da História ..........
- Page 8: Prefácio Recentemente, em um traba
- Page 12 and 13: Raízes indígenas Sinopse A histó
- Page 14 and 15: de mandioca - e teciam redes e cest
- Page 16 and 17: 6 . Reprodução de Descobrimento d
- Page 18 and 19: fundado o primeiro núcleo colonial
- Page 20 and 21: “Entendo por experiência o pouco
- Page 22 and 23: No século XIX, artistas, escritore
- Page 24 and 25: Passados 500 anos da chegada dos po
- Page 26 and 27: Pindorama. Brasil, 1970. Direção:
- Page 28 and 29: Raízes africanas - Capoeira, mungu
- Page 32 and 33: conjunto da obra, considerada por m
- Page 34 and 35: e morto em uma emboscada. Sua cabe
- Page 36 and 37: ao sistematizar os principais golpe
- Page 38 and 39: Apesar de o samba carioca ser recon
- Page 40 and 41: BASTIDE, Roger. O Candomblé da Bah
- Page 42 and 43: Ouro em Minas Sinopse O ouro brasil
- Page 44 and 45: escravizar, pois eram necessários
- Page 46 and 47: dos exemplares mais magníficos do
- Page 48 and 49: palavras, sensibilidades e visões
- Page 50 and 51: foi transferida, paulatinamente, de
- Page 52 and 53: epública, não haveria exército r
- Page 54 and 55: Primeiro de Março, s/nº). Sugira
- Page 56 and 57: 1808: Era no tempo do rei Sinopse D
- Page 58 and 59: eais e tão apinhados estavam todos
- Page 60 and 61: na cidade. Em seguida, o Palácio d
- Page 62 and 63: praticando, inclusive, através de
- Page 64 and 65: discutir, abertamente, as questões
- Page 66 and 67: forma de governar o Brasil. Coroado
- Page 68 and 69: dinastia. De volta a Portugal, enfr
- Page 70: WILCKEN, Patrick. Império à Deriv
- Page 73 and 74: 1808: O Segundo Reinado 72 Entre do
- Page 75 and 76: 1808: O Segundo Reinado 74 A Revolu
- Page 77 and 78: 1808: O Segundo Reinado 76 afronta
- Page 79 and 80: 1808: O Segundo Reinado 78 Nesse pe
Raízes africanas – Capoeira, mungunzá e valentia<br />
30<br />
“infiéis” (todos aqueles que não professavam<br />
a religião católica), podendo escravizar<br />
os prisioneiros. Não demorou muito para<br />
que comerciantes portugueses chegassem<br />
ao Golfo de Benin e ao delta do Rio Níger,<br />
integrando-se normalmente ao tráfico de escravos<br />
que já existia na região. Foi assim<br />
durante todo o século XV, mas, a partir <strong>da</strong><br />
descoberta <strong>da</strong> América, o fato atingiu grandes<br />
proporções.<br />
<strong>No</strong> Brasil, foi Salvador, na Bahia, o primeiro<br />
grande entreposto <strong>da</strong> escravatura. Os navios<br />
mercantes portugueses que vinham de<br />
Goa (Índia) com mercadorias como louças e<br />
tecidos faziam escala em Luan<strong>da</strong> e completavam<br />
a carga com escravos africanos. Em<br />
segui<strong>da</strong>, rumavam para o Brasil, que assim<br />
se tornou, no século XVII, o principal difusor<br />
dos produtos indianos na América do Sul.<br />
De acordo com as estimativas, entre três e<br />
cinco milhões de escravos teriam entrado<br />
aqui até finais do século XIX.<br />
6 . Interior de um navio negreiro carregado de escravos<br />
Os <strong>da</strong>dos disponíveis sobre o tráfico negreiro<br />
revelam que a população masculina era<br />
muito maior do que a feminina. Há vários<br />
fatores que concorrem para essa proporção,<br />
que pode ter chegado a 75% de homens. Em<br />
um primeiro momento <strong>da</strong> economia negreira,<br />
os europeus li<strong>da</strong>vam com traficantes árabes,<br />
que tinham por hábito vender os homens e<br />
incorporar as mulheres a seus grupos. Por<br />
outro lado, os homens eram muito mais resistentes<br />
às terríveis condições que viviam<br />
ao serem trazidos para a América. E, no Brasil,<br />
os senhores de escravos preferiam comprar<br />
cativos novos a permitir que os seus<br />
procriassem, por conta <strong>da</strong> grande oferta no<br />
mercado e do gasto menor do que seria o<br />
de cui<strong>da</strong>r <strong>da</strong>s crianças.<br />
Oxalá, Deus!<br />
Onde está Deus? – Em todo lugar!<br />
Olorum, Jeová, Oxalá, Alah, N’Zambi...<br />
[Jesus!<br />
E o Espírito Santo? É Deus!<br />
Salve sincretismo religioso! – Salve!<br />
Quem é Omulu, gente? – São Lázaro!<br />
Iansã? – Santa Bárbara!<br />
Ogum? – São Jorge!<br />
Xangô? – São Jerônimo!<br />
Oxóssi? – São Sebastião!<br />
Aioká, Inaê, Kian<strong>da</strong> – Iemanjá!<br />
Viva a <strong>No</strong>ssa Senhora Apareci<strong>da</strong>! –<br />
[Padroeira do Brasil!<br />
Sincretismo Religioso<br />
(Martinho <strong>da</strong> Vila)<br />
A arte afro-brasileira desenvolvi<strong>da</strong> durante a<br />
escravidão viveu em completa obscuri<strong>da</strong>de<br />
até meados do século XX. Interpreta<strong>da</strong> como<br />
manifestação religiosa, escapou ao olhar crítico<br />
e, também, ao grande público.<br />
<strong>No</strong> entanto, segundo o pesquisador Francisco<br />
Martins, “apesar de a maioria dos artistas<br />
negros terem como religião o candomblé,<br />
eles souberam estabelecer sincretismo com<br />
a religião católica, que era dominante. Foram<br />
muitas as obras realiza<strong>da</strong>s por artistas<br />
negros em templos católicos, onde criaram<br />
obras repletas de detalhes sutis que valorizaram<br />
o conjunto pelo ineditismo”. É o caso<br />
do barroco mineiro, em que a escultura e a<br />
arquitetura de Aleijadinho se destacam no