No Compasso da História - MultiRio

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17.04.2013 Views

ele, entrar no Penetrável significava caminhar “dobrando pelas ‘quebradas’ do morro, ou estar pisando na terra outra vez”. No fim do labirinto, um receptor de TV estava sempre ligado: “é a imagem que devora então o participador, pois é ela mais ativa que o seu criar sensorial”, na visão de seu autor. Aliás, a participação do espectador era comum a muitas das artes visuais, que desejavam ultrapassar o território fechado de museus e galerias e ganhar as ruas, promovendo uma aproximação entre arte e vida. Os artistas plásticos Flávio Mota e Nelson Leirner, impedidos pelos fiscais da Prefeitura de São Paulo de exibir bandeiras projetadas para um evento visual de rua, convocaram vários artistas para um happening na Praça General Osório, zona sul do Rio. Com o auxílio luxuoso da Banda de Ipanema e de passistas da escola de samba Estação Primeira de Mangueira, o evento reuniu veteranos como Carlos Scliar e Glauco Rodrigues e jovens como Carlos Vergara e Claudio Tozzi, que criou a bandeira “Guevara, vivo ou morto”. Oiticica mostrou o trabalho Seja Marginal, Seja Herói, em homenagem ao bandido carioca Cara de Cavalo. 16 . Detalhe do estandarte de Hélio Oiticica E foi assim que os jovens da época entraram em contato com os happenings, termo usado na Europa e nos Estados Unidos para designar uma forma de arte que combina artes visuais e um tipo de teatro improvisado, sem texto ou representação, que se dá em tempo real, em contextos variados como ruas e lojas vazias. O objetivo é fazer com que o espectador participe da “cena” proposta, de modo a anular a separação entre público e espetáculo, rompendo deliberadamente as fronteiras entre arte e vida. O disco pioneiro 17 . Álbum que marcou o movimento tropicalista na música Sobre a cabeça os aviões Sob os meus pés os caminhões Aponta contra os chapadões Meu nariz Eu organizo o movimento Eu oriento o carnaval Eu inauguro o monumento No planalto central do país tropicália (Caetano Veloso) Como tudo acontecia ao mesmo tempo em uma época que sonhava com a imaginação no poder, em São Paulo, ainda em 1968, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Os Mutantes, Tom Zé, Tropicália 197

Tropicália 198 Capinam, Torquato Neto, Gal Costa, Rogério Duprat e Nara Leão entraram no estúdio para gravar o disco Panis et Circencis, ou simplesmente Tropicália. O disco fez sucesso e ajudou a abrir espaço para os tropicalistas. Caetano e Gil se apresentavam no Programa do Chacrinha (outro ídolo do movimento) e diziam frases de efeito, como esta de Gil: “O mundo de hoje é muito pequeno. Não há razões para regionalismos”. O maestro Rogério Duprat impressionava a plateia afirmando: “A música acabou”. Já o poeta Torquato Neto acrescentava: “O Tropicalismo é brasileiro, mas é muito pop”. E o iconoclasta Tom Zé, músico baiano radicado em São Paulo, completava: “É somente requentar e usar porque é made, made, made in Brazil”. A cena e o cinema tropicais Roda mundo, roda gigante Roda moinho, roda pião O tempo rodou num instante Nas voltas do meu coração Roda Viva (Chico Buarque) 18 . Cena de O Rei da Vela, de José Celso Martinez Corrêa O teatro foi buscar em Oswald de Andrade a inspiração para sua encenação de maior impacto: a peça Rei da Vela, dirigida por José Celso Martinez Corrêa, com o Grupo Oficina. Misturando elementos da cultura popular, como o circo e o rádio, com uma estética de vanguarda, o espetáculo rompia com as limitações físicas do palco italiano tradicional e criticava nossa elite, denunciando a manipulação que ela fazia historicamente do povo brasileiro. Os estudantes contestadores adoraram, e a peça ficou meses em cartaz. 19 . Cena de Roda Viva, de Chico Buarque de Hollanda Foi também de José Celso outro espetáculo que marcou a cena em 1968: Roda Viva, com música de Chico Buarque, que questionava o uso pelo sistema dos ídolos que ele próprio construía. Em cena, o artista que vende sua alma para ter fama na televisão e depois é jogado fora. O Cinema Novo também aderiu ao Tropicalismo. O filme Terra em Transe, de Glauber Rocha, um balanço crítico do período posterior ao golpe militar de 1964, foi um marco na estética do movimento. Caetano Veloso se inspirou nessa obra para compor a letra da canção Tropicália, a mais característica da nova tendência. Macunaíma, de Joaquim Pedro de Andrade, foi outro sucesso do cinema tropicalista. Na trilha sonora, canções de Jards Macalé e Heitor Villa-Lobos. Inspirado no romance

Tropicália<br />

198<br />

Capinam, Torquato Neto, Gal Costa, Rogério<br />

Duprat e Nara Leão entraram no estúdio<br />

para gravar o disco Panis et Circencis, ou<br />

simplesmente Tropicália.<br />

O disco fez sucesso e ajudou a abrir espaço<br />

para os tropicalistas. Caetano e Gil se<br />

apresentavam no Programa do Chacrinha<br />

(outro ídolo do movimento) e diziam frases<br />

de efeito, como esta de Gil: “O mundo de<br />

hoje é muito pequeno. Não há razões para<br />

regionalismos”. O maestro Rogério Duprat<br />

impressionava a plateia afirmando: “A música<br />

acabou”. Já o poeta Torquato Neto acrescentava:<br />

“O Tropicalismo é brasileiro, mas é<br />

muito pop”. E o iconoclasta Tom Zé, músico<br />

baiano radicado em São Paulo, completava:<br />

“É somente requentar e usar porque é made,<br />

made, made in Brazil”.<br />

A cena e o cinema tropicais<br />

Ro<strong>da</strong> mundo, ro<strong>da</strong> gigante<br />

Ro<strong>da</strong> moinho, ro<strong>da</strong> pião<br />

O tempo rodou num instante<br />

Nas voltas do meu coração<br />

Ro<strong>da</strong> Viva<br />

(Chico Buarque)<br />

18 . Cena de O Rei <strong>da</strong> Vela, de José Celso Martinez Corrêa<br />

O teatro foi buscar em Oswald de Andrade a<br />

inspiração para sua encenação de maior impacto:<br />

a peça Rei <strong>da</strong> Vela, dirigi<strong>da</strong> por José<br />

Celso Martinez Corrêa, com o Grupo Oficina.<br />

Misturando elementos <strong>da</strong> cultura popular,<br />

como o circo e o rádio, com uma estética de<br />

vanguar<strong>da</strong>, o espetáculo rompia com as limitações<br />

físicas do palco italiano tradicional e<br />

criticava nossa elite, denunciando a manipulação<br />

que ela fazia historicamente do povo<br />

brasileiro. Os estu<strong>da</strong>ntes contestadores adoraram,<br />

e a peça ficou meses em cartaz.<br />

19 . Cena de Ro<strong>da</strong> Viva, de Chico Buarque de Hollan<strong>da</strong><br />

Foi também de José Celso outro espetáculo<br />

que marcou a cena em 1968: Ro<strong>da</strong> Viva, com<br />

música de Chico Buarque, que questionava<br />

o uso pelo sistema dos ídolos que ele próprio<br />

construía. Em cena, o artista que vende<br />

sua alma para ter fama na televisão e depois<br />

é jogado fora.<br />

O Cinema <strong>No</strong>vo também aderiu ao Tropicalismo.<br />

O filme Terra em Transe, de Glauber<br />

Rocha, um balanço crítico do período posterior<br />

ao golpe militar de 1964, foi um marco<br />

na estética do movimento. Caetano Veloso<br />

se inspirou nessa obra para compor a letra<br />

<strong>da</strong> canção Tropicália, a mais característica<br />

<strong>da</strong> nova tendência.<br />

Macunaíma, de Joaquim Pedro de Andrade,<br />

foi outro sucesso do cinema tropicalista.<br />

Na trilha sonora, canções de Jards Macalé<br />

e Heitor Villa-Lobos. Inspirado no romance

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