Augusto de Santa-Rita e a criação literária para a infância
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<strong>Augusto</strong> <strong>de</strong> <strong>Santa</strong>-<strong>Rita</strong> e a <strong>criação</strong> <strong>literária</strong> <strong>para</strong> a <strong>infância</strong><br />
Retomando o número três, como número fundamental que é, e que é apresentado<br />
a propósito da distância a que fica a casa, po<strong>de</strong>rá ser um indício do que acontecerá, uma<br />
vez que, simbolicamente, serve <strong>para</strong> assegurar a probabilida<strong>de</strong> da concretização. Neste<br />
caso po<strong>de</strong>rá remeter <strong>para</strong> o local concreto on<strong>de</strong> se confirmou a entrega da Princesa.<br />
Perante este cenário romântico, o tempo parece ter passado sem se dar por ele,<br />
pois “o sol estava a baixar”, enchendo o céu <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s manchas vermelhas”.<br />
O vermelho é a cor da paixão e da libido. É a cor do eros livre e triunfante. Por<br />
outro lado, dada a sua conotação sanguínea, é a cor que estimula a força e o <strong>de</strong>sejo.<br />
Deste modo, a cor vermelha do astro reflecte o <strong>de</strong>sejo aprisionado no coração daqueles<br />
jovens, que, ao ser contemplada, ainda mais inflama tais pulsões. Assiste-se, então, a<br />
uma mudança <strong>de</strong> estado psicológico daquela jovem, uma vez que já vai surgir montada<br />
na égua, toda branca, sempre a par do cavalo, todo preto, em que montava o Príncipe.<br />
O <strong>de</strong>sejo e o sentimento que os une são recíprocos: “vinham os dois muito<br />
contentes não obstante a companhia que os seguia”. Tal é visível pela inversão da<br />
colocação do sujeito (os dois), colocando em <strong>de</strong>staque a terceira pessoa do plural do<br />
verbo Vir, bem como pelo grau do adjectivo contente. O superlativo absoluto sintético<br />
transmite, também, uma i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> continuida<strong>de</strong> e o verbo remete <strong>para</strong> um estado <strong>de</strong><br />
crescente euforia.<br />
O vermelho surgirá novamente quando, já quase no final do conto, o Príncipe se<br />
vai encontrar com a Estrelinha em casa <strong>de</strong> seus pais e “O sol <strong>de</strong>scia no horizonte, como<br />
um gran<strong>de</strong> balão vermelho”. Esta com<strong>para</strong>ção permite, ainda, vislumbrar o <strong>de</strong>sejo<br />
ar<strong>de</strong>nte do jovem.<br />
Apesar <strong>de</strong> satisfeito com a sua caçada, esta ainda continuará, talvez como forma<br />
<strong>de</strong> satisfazer os outros Cavaleiros da Corte, que “soprando numas compridas trombetas,<br />
com os seus toques estri<strong>de</strong>ntes, davam sinal aos galgos <strong>para</strong> que avançassem em<br />
perseguição das gazelas, mal estas eram avistadas”.<br />
É notório o vocabulário metafórico <strong>para</strong> transmitir a vonta<strong>de</strong> voraz <strong>de</strong> cair sobre<br />
o <strong>de</strong>spojo. A trombeta é um instrumento que associa o céu e a terra numa celebração<br />
comum. Por si só, “simboliza uma conjunção importante <strong>de</strong> elementos e<br />
acontecimentos” (CHEVALIER 1994: 662) e, metaforicamente, po<strong>de</strong>r-se-á interpretar<br />
como a ligação espiritual que ocorreu entre os dois jovens.<br />
O Príncipe dá por terminada a caçada, or<strong>de</strong>nando que não tocassem mais<br />
trombetas, “porque a melhor gazela” daquele bosque já ele apanhara e, tal como o leão