Augusto de Santa-Rita e a criação literária para a infância
Augusto de Santa-Rita e a criação literária para a infância
Augusto de Santa-Rita e a criação literária para a infância
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
<strong>Augusto</strong> <strong>de</strong> <strong>Santa</strong>-<strong>Rita</strong> e a <strong>criação</strong> <strong>literária</strong> <strong>para</strong> a <strong>infância</strong><br />
Refira-se <strong>de</strong> imediato a presença <strong>de</strong> vários elementos que autorizam – por<br />
audaciosa que seja – uma leitura claramente “erotizante” <strong>de</strong>ste conto.<br />
O bosque, como elemento equivalente à floresta, é o verda<strong>de</strong>iro santuário em<br />
estado natural, condizendo com o estado da Princesa. E é no centro do bosque que tudo<br />
acontece.<br />
Os referentes cavalo e égua, como metáforas <strong>de</strong> quem os conduz, adquirem<br />
conotação erótica. O cavalo é símbolo do psiquismo inconsciente, das impetuosida<strong>de</strong>s<br />
do <strong>de</strong>sejo e da juventu<strong>de</strong> do homem, ligado aos relógios naturais ou à impetuosida<strong>de</strong> do<br />
<strong>de</strong>sejo. O facto <strong>de</strong> ser branca, a égua à luz do dia, representa o instinto controlado,<br />
dominado, <strong>para</strong> além da beleza, o que traduz claramente aquela imagem feminina da<br />
Princesa pudica. O cavalo preto, <strong>para</strong> além <strong>de</strong> ser símbolo do <strong>de</strong>sejo libertador, é on<strong>de</strong> o<br />
Príncipe vem “montado”, adjectivo pleno <strong>de</strong> erotismo, e adquire ainda maior<br />
valorização sexual uma vez que este vem “à caça <strong>de</strong> gazelas”.<br />
A gazela é associada a velocida<strong>de</strong>, a beleza e a graça femininas. Estas<br />
características <strong>de</strong>ixam transparecer, por um lado, a atitu<strong>de</strong> do Príncipe face à presa,<br />
remetendo <strong>para</strong> a sua acuida<strong>de</strong> visual e rapi<strong>de</strong>z e, por outro lado, apontam <strong>para</strong> os<br />
atributos <strong>de</strong>ssa mesma presa, esquiva e bela, tal como a Princesa.<br />
Este estado <strong>de</strong> indiferença da Princesa é também verificável pelo facto <strong>de</strong>, no<br />
início, não se referir que monte o cavalo. Só o Príncipe aparece montado, o que po<strong>de</strong><br />
traduzir a i<strong>de</strong>ia do ímpeto sexual do jovem, bem como a i<strong>de</strong>ia pré-<strong>de</strong>finida <strong>de</strong> domínio e<br />
posse por parte da figura masculina, ficando reservado à figura feminina a passivida<strong>de</strong>,<br />
o que também po<strong>de</strong> ser testemunhado pelo facto <strong>de</strong> ser ele quem se dirige a ela, até<br />
mesmo <strong>para</strong> saber quem era e como se chamava.<br />
A ânsia <strong>de</strong> consumação do acto sexual po<strong>de</strong> ainda inferir-se pelo facto do<br />
Príncipe <strong>de</strong> imediato preten<strong>de</strong>r pedi-la em casamento. Por tradição, só <strong>de</strong>pois da união<br />
espiritual (religiosa), seria possível a consumação física.<br />
Por outro lado, três actos sucessivos asseguram o êxito do empreendimento e, <strong>de</strong><br />
facto, o Príncipe encontrou-se com a Princesa vários dias, mas concretamente<br />
apresentados são apenas três, antes do compromisso oficial. Nesse dia, o Príncipe<br />
surgirá na casa da futura noiva num “coche doirado puxado por três parelhas <strong>de</strong><br />
cavalos”. Estes, contrariamente ao que é hábito nos contos <strong>de</strong> fadas, serão cor <strong>de</strong> canela<br />
e não pretos, o que po<strong>de</strong>rá, também, comprovar a consumação do acto sexual antes<br />
<strong>de</strong>ssa data, uma vez que o <strong>de</strong>sejo originário já teria sido saciado.