Augusto de Santa-Rita e a criação literária para a infância
Augusto de Santa-Rita e a criação literária para a infância
Augusto de Santa-Rita e a criação literária para a infância
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Sem nunca o per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista,<br />
Sorrindo, murmura rindo:<br />
- «Não é tal um trapalhão;<br />
É poeta futurista!»<br />
E na sua<br />
Continua,<br />
Como um pretinho escarumba<br />
Dançando lá no setão:<br />
- «Zumba…bumba…catapumba…<br />
Catapumba… bumba… bumba<br />
Tão-ba-la-lão… Ba-la-lão!...»<br />
<strong>Augusto</strong> <strong>de</strong> <strong>Santa</strong>-<strong>Rita</strong> e a <strong>criação</strong> <strong>literária</strong> <strong>para</strong> a <strong>infância</strong><br />
Na obra O Menino Perdido, por exemplo, é possível, ainda, encontrar alguns<br />
elementos marcantes da socieda<strong>de</strong> rural dos anos 20, concretamente as consequências<br />
da guerra, a viuvez e o estado da saú<strong>de</strong> da população portuguesa 80 , bem como a<br />
existência <strong>de</strong> amas <strong>de</strong> leite. O excerto que se segue po<strong>de</strong> talvez ilustrar esses elementos.<br />
Viuva 81 e órfã 82 , na manhã seguinte à morte do pai, após o enterro e uma noite<br />
inteira a soluçar no regaço da Tia Rosária do Adro, Rosa Gião pões-se a pensar na vida<br />
que a esperaria agora. Sòzinha no mundo, com um filhinho no colo, única companhia<br />
que inda por cima a vinha encher <strong>de</strong> cuidados, já sem pinga <strong>de</strong> leite <strong>para</strong> o amamentar,<br />
que fazer, que fazer?! …<br />
Tia Rosária lembrou: - «A mulher do Ti´Chico da Nora, a quem nascera há um<br />
mês uma menina, faria a esmola <strong>de</strong> amamentar o <strong>de</strong>la, emquanto Rosa não pu<strong>de</strong>sse<br />
pagar a uma ama mercenária. E, condoída ao ouvir o pequenino a chorar, cheio <strong>de</strong> fome,<br />
arrebatou-lho do colo, exclamando a animá-la: - «Confia-me o teu menino. Trago-to já;<br />
vai mamar!».<br />
(…)<br />
O papá e a mamã <strong>de</strong> Jorginho e <strong>de</strong> Fina haviam morrido há seis meses,<br />
vitimados pela gran<strong>de</strong> epi<strong>de</strong>mia conhecida por pneumónica e que, embora quási<br />
<strong>de</strong>belada, estava ainda fazendo algumas vítimas, principalmente em Lisboa.<br />
Ao longo dos vários tipos <strong>de</strong> texto, e não obstante as temáticas tratadas, o que se<br />
verifica é a apresentação do tempo diegético segundo uma or<strong>de</strong>m linearmente<br />
cronológica, indo ao encontro do público a que se <strong>de</strong>stina.<br />
80 Em 1918, Portugal fora assolado por uma epi<strong>de</strong>mia <strong>de</strong> pneumonia.<br />
81 O seu “nome, ti‟Tónio”, “fora obrigado a incorporar-se no C.E.P. – (corpo expedicionário português) –<br />
ao encontro do «boches» inimigos” e morrera na guerra.<br />
82 A mãe morrera quando ela era ainda <strong>de</strong> colo e o pai acabara <strong>de</strong> ser «Triturado no açu<strong>de</strong>!».