O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas
O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas
O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Parte III - A Vida <strong>de</strong> Teseu<br />
2). O tópico ao qual <strong>de</strong>dicou mais atenção é o terceiro e mais controverso – a<br />
natureza do Minotauro e o <strong>de</strong>stino <strong>dos</strong> sete rapazes e sete raparigas <strong>ateniense</strong>s<br />
que lhe eram envia<strong>dos</strong> como tributo. Também por causa do compromisso que<br />
assumiu no princípio <strong>de</strong>sta vida, <strong>de</strong>dica mais t<strong>em</strong>po às versões que procuram<br />
racionalizar o mito 82 , <strong>em</strong> <strong>de</strong>trimento da mais corrente (veiculada sobretudo<br />
pelos tragediógrafos), segundo a qual os jovens seriam <strong>de</strong>vora<strong>dos</strong> pelo<br />
Minotauro.<br />
Se <strong>Plutarco</strong> se alonga no tratamento <strong>de</strong>ste episódio não o faz apenas<br />
pela riqueza <strong>de</strong> variantes, mas sobretudo porque esta aventura é fundamental<br />
para <strong>de</strong>linear o caráter do herói. Por isso mesmo, o Queroneu opta, <strong>de</strong> novo,<br />
por enfatizar a versão que mais lhe convém 83 a propósito da associação <strong>de</strong><br />
Teseu à expedição a Creta. Consequent<strong>em</strong>ente, a participação do jov<strong>em</strong> surge<br />
como iniciativa do herói 84 . Deste modo, ao oferecer-se <strong>de</strong> livre vonta<strong>de</strong> – e<br />
82 A mais complexa – e a primeira que <strong>Plutarco</strong> evoca (es. 16. 1, 18. 4-7) – é veiculada<br />
por Filócoro e atribuída por este autor aos Cretenses. Faz do labirinto uma prisão <strong>de</strong> alta<br />
segurança, on<strong>de</strong> os jovens cavam presos até ser<strong>em</strong> entregues como prémio ao vencedor <strong>dos</strong><br />
jogos instituí<strong>dos</strong> por Minos <strong>em</strong> m<strong>em</strong>ória <strong>de</strong> Andrógeo. Além disso, transforma o Minotauro<br />
num general inuente do exército cretense, chamado Tauro, que, por vencer constant<strong>em</strong>ente<br />
os jogos, foi alvo da inveja e da maledicência <strong>dos</strong> Cretenses, que insinuaram que mantinha um<br />
romance com a rainha Pasífae. Esse militar, <strong>de</strong> caráter duvi<strong>dos</strong>o e pouco afável, era responsável<br />
pelo tratamento arrogante e cruel <strong>de</strong> que eram vítimas os jovens <strong>ateniense</strong>s. Deste modo, quer<br />
Tauro quer o Minotauro surg<strong>em</strong> como forças selvagens e monstruosas, que se ass<strong>em</strong>elham<br />
aos seres não civiliza<strong>dos</strong> com os quais Teseu se <strong>de</strong>frontou no caminho por terra para Atenas.<br />
<strong>Plutarco</strong> (es. 16. 2) menciona ainda uma versão atestada por Aristóteles, na Constituição da<br />
Botieia (Fr. 443 Rose), segundo a qual os jovens morriam <strong>de</strong> velhos ao serviço <strong>de</strong> Minos. Refere,<br />
inclusive, que os seus <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes terão integrado uma comitiva que se dirigiu a Delfos para<br />
cumprir uma promessa e que acabou por se evadir e fundar uma cida<strong>de</strong> na Trácia.<br />
83 Exist<strong>em</strong> três versões. A mais antiga é aquela segundo a qual Teseu, como os <strong>de</strong>mais<br />
participantes, foi sorteado (Pherecyd., FGrHist. 3 F 148). Outra, atestada por Helânico<br />
(FGrHist 4 F 164 = 323 a F 14) e por D. S. 4. 61. 4, atribui a escolha <strong>de</strong> Teseu a Minos, que se<br />
<strong>de</strong>slocara a Atenas para selecionar as vítimas. A terceira – a que mais convém a <strong>Plutarco</strong> – ocorre<br />
igualmente <strong>em</strong> Isoc. 10 27, Catul. 44. 80-85 e faz da participação <strong>de</strong> Teseu um ato voluntário.<br />
84 es. 17. 2. Este comportamento <strong>de</strong> Teseu é s<strong>em</strong>elhante ao <strong>de</strong> Meneceu, <strong>de</strong>scrito <strong>em</strong> E. Ph.<br />
991-1018. Do mesmo modo que Egeu quis evitar que Teseu partisse para Creta, Creonte tentou<br />
impedir que o lho fosse sacricado <strong>em</strong> prol do povo. E, do mesmo modo que Teseu, também<br />
Meneceu, colocando o pátrio interesse acima da própria vida, contrariou a vonta<strong>de</strong> do pai.<br />
Note-se, no entanto, que o herói <strong>ateniense</strong> manifestou claramente o seu intento ao progenitor,<br />
ao passo que Meneceu preferiu agir <strong>em</strong> segredo. O «sacrifício humano» é frequente<br />
na literatura grega. De um modo geral, surge como solução apresentada por um oráculo para<br />
eliminar um perigo – – que põe <strong>em</strong> causa a existência <strong>de</strong> uma comunida<strong>de</strong>. Como arma<br />
Bonnechère (1998: 211-212), «le sacrice humain passait pour paradigmatique <strong>de</strong> la tragique<br />
réarmation du groupe et <strong>de</strong> sa primauté sur l’individu». Muitas vezes a escolha da vítima é –<br />
como indica uma das versões da história <strong>de</strong> Teseu – feita por sorteio, o que sugere que a ameaça<br />
afeta todo o povo (quer as potenciais vítimas, quer as suas famílias). No âmbito do sacrifício<br />
humano, po<strong>de</strong>m ocorrer sacrifícios voluntários. Nesses <strong>caso</strong>s, o herói ou é expressamente<br />
nomeado por um oráculo e a<strong>de</strong>re à vonta<strong>de</strong> divina (como no <strong>caso</strong> <strong>de</strong> Meneceu) ou, ao saber da<br />
necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um sacrifício para o qual ainda não há vítima (<strong>caso</strong> <strong>de</strong> Macária nos Heraclidas),<br />
apresenta-se <strong>de</strong> livre vonta<strong>de</strong> para ser imolado. Estamos, pois, perante jovens que revelam<br />
um gran<strong>de</strong> autodomínio e generosida<strong>de</strong> (virtu<strong>de</strong>s que os seus parentes ou concidadãos não<br />
68