O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas
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Orig<strong>em</strong>, formação e reconhecimento<br />
Um <strong>dos</strong> el<strong>em</strong>entos usa<strong>dos</strong> para essa comparação é o facto <strong>de</strong> ambos ser<strong>em</strong><br />
consi<strong>de</strong>ra<strong>dos</strong> heróis civilizadores. Com efeito, havia entre os antigos a noção<br />
<strong>de</strong> que a «vida civilizada» não era algo que existisse <strong>de</strong>s<strong>de</strong> s<strong>em</strong>pre, mas antes<br />
uma conquista para a qual contribuíram os feitos <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>dos</strong> heróis, ditos<br />
«civilizadores», que se opunham à violência pela violência, à injustiça e que<br />
eram capazes <strong>de</strong> livrar o mundo <strong>de</strong> monstros, <strong>de</strong> proteger a humanida<strong>de</strong> <strong>dos</strong><br />
seus inimigos e da ausência <strong>de</strong> valores e <strong>de</strong> normas <strong>de</strong> convívio social 32 . Como<br />
arma Tucídi<strong>de</strong>s, que, nos primeiros doze capítulos da sua História da Guerra<br />
do Peloponeso, <strong>de</strong>screve o modus vivendi nos primórdios da Héla<strong>de</strong>, o <strong>de</strong>albar<br />
da vida civilizada só foi possível quando se conseguiu pôr m à selvajaria, ao<br />
domínio do mais forte sobre o mais fraco. O historiador insiste na noção <strong>de</strong> que<br />
o modo <strong>de</strong> vida <strong>de</strong> então se ass<strong>em</strong>elhava ao «atual modo <strong>de</strong> vida <strong>dos</strong> bárbaros»<br />
(uc. 6. 6) e na i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que Atenas foi o primeiro local on<strong>de</strong> a civilização<br />
brotou na Grécia (uc. 6. 3). De facto, o <strong>hom<strong>em</strong></strong> só consegue <strong>de</strong>dicar-se a<br />
ativida<strong>de</strong>s que não estejam diretamente relacionadas com a subsistência –<br />
como a ciência, a losoa e a arte – quando vive <strong>em</strong> paz e segurança.<br />
Isócrates, por ex<strong>em</strong>plo, apresenta quer Teseu quer Héracles como heróis<br />
civilizadores ( 33 ), mas atribui uma importância<br />
distinta aos feitos e comportamentos <strong>de</strong> cada um. Segundo ele, apesar <strong>de</strong><br />
os feitos <strong>de</strong> Héracles ter<strong>em</strong> alcançado maior fama por ser<strong>em</strong> mais difíceis<br />
( ), os <strong>de</strong> Teseu tinham sido mais úteis para a<br />
Héla<strong>de</strong> ( ) 34 . Além disso,<br />
caracteriza Héracles como uma espécie <strong>de</strong> mercenário, contratado para resolver<br />
probl<strong>em</strong>as alheios; ao passo que Teseu surge como um voluntário que, <strong>de</strong> livre<br />
e espontânea vonta<strong>de</strong>, enfrentava perigos <strong>em</strong> prol do b<strong>em</strong>-comum (Isoc. 10.<br />
24-25).<br />
Na verda<strong>de</strong>, a maioria das façanhas <strong>de</strong> Héracles 35 foi cometida a serviço<br />
<strong>de</strong> Euristeu, com o objetivo <strong>de</strong> alcançar a imortalida<strong>de</strong> (D. S. 4. 9. 5). Só<br />
esporadicamente – sobretudo no <strong>de</strong>curso <strong>dos</strong> doze trabalhos e durante o<br />
cativeiro na corte <strong>de</strong> Ônfale –, quando confrontado com situações <strong>de</strong> violência<br />
gratuita e <strong>de</strong> <strong>de</strong>sprezo pelos valores vigentes (como o respeito pelo estrangeiro<br />
e pela hospitalida<strong>de</strong> – por ex<strong>em</strong>plo, nos episódios <strong>de</strong> Sileu 36 , que obrigava os<br />
estrangeiros a trabalhar<strong>em</strong> nas suas vinhas, e no do rei Anteu 37 , que lutava<br />
32 Convém, contudo, não esquecer que até estes heróis – aos quais, como ver<strong>em</strong>os adiante,<br />
também se atribui o estabelecimento <strong>de</strong> cultos e jogos – protagonizam aventuras «menos éticas»<br />
(como raptos ou parricídios) que, <strong>em</strong>bora possam parecer contraditórias, também serv<strong>em</strong> para<br />
ilustrar como os comportamentos <strong>de</strong>sviantes levam, fatalmente, ao sofrimento.<br />
33 Isoc. 10. 23.<br />
34 Esta posição está <strong>em</strong> sintonia com a perspetiva <strong>ateniense</strong> coeva <strong>de</strong> Isócrates, segundo a<br />
qual Atenas era o berço da vida civilizada e da paz.<br />
35 Sobre este t<strong>em</strong>a, consult<strong>em</strong>-se, e. g., Brommer (1972); Galinsky (1972).<br />
36 Apollod. Bibl. 2. 6. 3; D. S. 4. 31. 7.<br />
37 E. g., Pi. I. 4. 87; D. S. 4. 17. 4; Paus. 9. 11. 6.<br />
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