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O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas

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Orig<strong>em</strong>, formação e reconhecimento<br />

tinha atingido a ida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conhecer a sua orig<strong>em</strong>, proce<strong>de</strong> <strong>de</strong> acordo com as<br />

instruções <strong>de</strong> Egeu. Antes <strong>de</strong> partir, o rei <strong>de</strong> Atenas <strong>de</strong>ixara tudo preparado:<br />

<strong>caso</strong> Etra estivesse grávida e <strong>de</strong>sse à luz um rapaz, quando este chegasse à<br />

ida<strong>de</strong> adulta, <strong>de</strong>veria conduzi-lo à rocha sob a qual escon<strong>de</strong>ra a própria espada<br />

e as sandálias (que funcionariam como 14 ). Se o jov<strong>em</strong> fosse<br />

capaz <strong>de</strong> levantá-la (comprovando, assim, a sua ascendência), Etra <strong>de</strong>veria<br />

enviá-lo <strong>em</strong> segredo a Atenas para que se apresentasse ao pai. Até lá, teria <strong>de</strong><br />

ocultar a paternida<strong>de</strong> do lho varão, pois Egeu t<strong>em</strong>ia que os seus sobrinhos,<br />

os Palântidas (que representavam a oposição tradicional que barra a ascensão<br />

do jov<strong>em</strong> ao po<strong>de</strong>r como legítimo sucessor e herdariam o po<strong>de</strong>r se Egeu não<br />

tivesse <strong>de</strong>scendência), lhe zess<strong>em</strong> algum mal.<br />

Importa abrir aqui um parêntesis para abordar a questão da paternida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> Teseu. A tradição apresenta-o ora como lho do mortal Egeu, ora como<br />

lho do imortal Poséidon 15 . <strong>Plutarco</strong>, que se havia comprometido, no proémio<br />

<strong>de</strong>sta vida 16 , a expurgar, na medida do possível, a narrativa <strong>de</strong> el<strong>em</strong>entos<br />

inverosímeis, aponta uma justicação para esta dupla paternida<strong>de</strong>. Segundo<br />

o biógrafo, Piteu zera correr rumores que atribuíam a paternida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Teseu<br />

a Poséidon, <strong>de</strong>us particularmente adorado <strong>em</strong> Trezena por ser o protetor da<br />

A oscilação do vocabulário entre os dois autores parece sugerir (uma vez que <strong>Plutarco</strong><br />

certamente não <strong>de</strong>sconhecia o texto do historiador) uma preocupação do biógrafo <strong>em</strong> enfatizar<br />

esses traços <strong>de</strong> Teseu, já que não só <strong>de</strong>ne a inteligência do herói com recurso a duas palavras<br />

com o sentido <strong>de</strong> inteligência, como também especica que a força <strong>em</strong> causa é física.<br />

14 São vários os test<strong>em</strong>unhos iconográcos <strong>de</strong>ste episódio. Para pormenores, consulte-se,<br />

e.g., Sourvinou-Inwood (1971: 94-109). A propósito da simbologia <strong>de</strong>stes ,<br />

citamos as palavras <strong>de</strong> García Gual (1990: 148): «L’épée est l’instrument <strong>de</strong> la gloire et les<br />

chaussures comportent un valeur symbolique. Un prince mal chaussé <strong>de</strong>vient vite suspect:<br />

souvenez-vous <strong>de</strong> Jason . Si ésée soulève facil<strong>em</strong>ent le rocher sous lequel sont<br />

placés ces objects, ce n’est pas par sa force extraordinaire, mais parce que cette prouesse lui était<br />

magiqu<strong>em</strong>ent réservée, comme le signe <strong>de</strong> sa legitimité. Il est l’héritier légitime, le ls du roi.»<br />

Sobre a diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> , vi<strong>de</strong> supra pp. 36 (nota 20) e 41.<br />

15 Teseu surge como lho <strong>de</strong> Poséidon, e.g., Od. 11. 631; E. Hipp. 887sqq.; Isoc. 10. 18. De<br />

acordo com Paus. 2. 33. 1, Etra foi induzida por Atena a dirigir-se à ilha <strong>de</strong> Esféria, on<strong>de</strong> foi<br />

possuída por Poséidon. Segundo Apollod. Bibl. 3. 15. 7 e Hyg. Fab. 37, Egeu e Poséidon terão<br />

partilhado, na mesma noite, o leito <strong>de</strong> Etra. A lógica mítica permitia a existência <strong>de</strong> dois pais,<br />

um mortal e um <strong>de</strong>us (como, por ex<strong>em</strong>plo, Héracles, lho <strong>de</strong> Zeus e Antrião, ou Helena,<br />

lha <strong>de</strong> Zeus e Tíndaro). No <strong>caso</strong> <strong>de</strong> Teseu, a preferência por Egeu <strong>de</strong>corre das necessida<strong>de</strong>s<br />

propagandísticas <strong>de</strong> Atenas, que não exclui totalmente a paternida<strong>de</strong> divina e o ascen<strong>de</strong>nte que<br />

ela dá. Essa duplicida<strong>de</strong> está atestada nos po<strong>em</strong>as 17 e 18 <strong>de</strong> Baquíli<strong>de</strong>s, que ora o apresenta<br />

como lho do mortal, ora como lho do <strong>de</strong>us. Sobre a dupla paternida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Teseu, que <strong>de</strong>corre<br />

da dualida<strong>de</strong> Trezena/Atenas, consult<strong>em</strong>-se, e.g., Pérez Jiménez (2000: 159, nota 24); Walker<br />

(1995: 84-92). Em Atenas, o interesse por esta versão manifestou-se particularmente a partir da<br />

década <strong>de</strong> 70 do século V, por causa do po<strong>de</strong>rio marítimo que Atenas <strong>de</strong>senvolveu. De realçar<br />

ainda que, no âmbito das narrativas sobre a vida <strong>dos</strong> fundadores, é frequente apresentar-se os<br />

heróis como alguém particularmente protegido pela divinda<strong>de</strong>, o que aumenta a sua credibilida<strong>de</strong><br />

e justica a sua superiorida<strong>de</strong> e po<strong>de</strong>r. Por isso, muitos passam por lhos <strong>de</strong> <strong>de</strong>uses. Vi<strong>de</strong> capítulo<br />

«Convenções literárias associadas à vida <strong>de</strong> um fundador», notas 18 e 21.<br />

16 Vi<strong>de</strong> supra p. 32.<br />

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