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O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas

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Convenções literárias associadas à vida <strong>de</strong> um fundador<br />

sonho foi tido como um indício nefasto para o po<strong>de</strong>r do rei: é que, para Me<strong>dos</strong><br />

e Assírios, a urina 14 era símbolo do nascimento <strong>de</strong> um lho. Assim, o sonho <strong>de</strong><br />

Astíages constituía uma ameaça ao seu estatuto <strong>de</strong> governante supr<strong>em</strong>o, pois,<br />

segundo a pr<strong>em</strong>onição, o po<strong>de</strong>r do jov<strong>em</strong> her<strong>de</strong>iro esten<strong>de</strong>r-se-ia da Média<br />

por toda a Ásia.<br />

Por isso, para evitar dissabores, quando Mandane atingiu a ida<strong>de</strong> própria,<br />

<strong>caso</strong>u-a não com um medo, mas com um persa, chamado Cambises, que<br />

consi<strong>de</strong>rava pouco digno da lha, <strong>de</strong>vido à crença <strong>de</strong> que era possível evitar os<br />

perigos relaciona<strong>dos</strong> com a <strong>de</strong>scendência, se uma mulher fosse <strong>de</strong>sposada por<br />

um <strong>hom<strong>em</strong></strong> <strong>de</strong> condição social inferior 15 .<br />

O segundo sonho <strong>de</strong> Astíages, porém, revela que o estratag<strong>em</strong>a não fora<br />

ecaz: <strong>de</strong>sta vez, ele vê nascer do sexo da lha uma vinha – símbolo do po<strong>de</strong>r<br />

e do sucesso – que cobria toda a Ásia, o que, <strong>de</strong> acordo com os intérpretes,<br />

signicava que o seu neto iria substituí-lo no po<strong>de</strong>r. Mas Mandane já estava<br />

grávida; portanto, a Astíages apenas restava a hipótese <strong>de</strong> tentar resolver o<br />

probl<strong>em</strong>a a posteriori.<br />

Há, porém, histórias <strong>em</strong> que a ameaça representada pela gura <strong>de</strong> um<br />

<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte é <strong>de</strong> tal modo óbvia que qu<strong>em</strong> <strong>de</strong>tém o po<strong>de</strong>r procura pôr s<strong>em</strong><br />

<strong>de</strong>mora – e s<strong>em</strong> sucesso – cobro ao perigo, s<strong>em</strong> que nenhuma divinda<strong>de</strong><br />

necessite <strong>de</strong> o alertar. É o <strong>caso</strong> <strong>de</strong> Amúlio, tio-avô <strong>de</strong> Rómulo 16 e R<strong>em</strong>o.<br />

Como aquele tinha <strong>de</strong>stronado o irmão Numitor, pai <strong>de</strong> uma única lha,<br />

o po<strong>de</strong>r assim alcançado apenas po<strong>de</strong>ria ser reivindicado pelos netos que<br />

Numitor viesse a ter. Era, pois, evi<strong>de</strong>nte que, para se salvaguardar, Amúlio<br />

precisava <strong>de</strong> fazer tudo o que estivesse ao seu alcance para que a sobrinha<br />

não se envolvesse com nenhum <strong>hom<strong>em</strong></strong>. Foi por isso que o usurpador fez<br />

<strong>de</strong>la uma sacerdotisa vestal. Não obstante, a jov<strong>em</strong> <strong>de</strong>u à luz dois gémeos do<br />

sexo masculino.<br />

Contudo, apesar <strong>dos</strong> oráculos (ou das pr<strong>em</strong>onições) e <strong>dos</strong> esforços para<br />

evitá-lo, perante a iminência da chegada <strong>de</strong>stas crianças, pre<strong>de</strong>stinadas a nascer<br />

e a realizar feitos ou missões <strong>de</strong> monta, aos progenitores ou outros familiares<br />

(o avô, no <strong>caso</strong> <strong>de</strong> Ciro; o tio-avô, no <strong>de</strong> Rómulo e R<strong>em</strong>o) que se sentiam <strong>em</strong><br />

perigo, apenas restava aguardar, vigilantes, a sua chegada. Só então po<strong>de</strong>riam<br />

tentar, mais uma vez, frustrar o <strong>de</strong>stino. Desta feita, a solução encontrada<br />

consistia <strong>em</strong> con<strong>de</strong>nar à morte os recém-nasci<strong>dos</strong>.<br />

14 Cf. Asheri (1988). Segundo Immerwahr (1966: 163, n. 40), para os Persas, que<br />

reverenciavam a pureza da água, a urina era sinónimo <strong>de</strong> poluição. Sobre este assunto, consulte-se<br />

Pelling (1996: 68-77).<br />

15 O mesmo <strong>de</strong>stino tiveram Labda, a mãe <strong>de</strong> Cípselo (Hdt. 5. 92), e a Eletra <strong>de</strong> Eurípi<strong>de</strong>s (El.<br />

34 sqq.). Quanto a Cambises, ao contrário do que Heródoto parece sugerir, tinha ascendência<br />

real. Sobre a história da casa real da Pérsia, vi<strong>de</strong> Bowman et alii (2000: 4, 2-6).<br />

16 Em Rom. 2. 2-8, <strong>Plutarco</strong> narra diferentes versões sobre a orig<strong>em</strong> <strong>dos</strong> gémeos. Aquela <strong>em</strong><br />

que baseámos o nosso raciocínio é a que ele consi<strong>de</strong>ra mais <strong>de</strong>digna (Rom. 3-8).<br />

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