O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas
O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas
O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
O <strong>caso</strong> <strong>de</strong> Péricles e Alcibía<strong>de</strong>s<br />
As primeiras investidas levadas a cabo no âmbito <strong>de</strong>sta expedição foram<br />
b<strong>em</strong> sucedidas: os estrategos consegu<strong>em</strong> submeter Régio 353 , na Itália, e Catânia,<br />
na Sicília (Alc. 20. 3). No entanto, na sequência do processo que <strong>de</strong>ixara<br />
pen<strong>de</strong>nte <strong>em</strong> Atenas, Alcibía<strong>de</strong>s é convocado a regressar para o julgamento.<br />
Daí para a frente, nada voltaria a ser como antes… Po<strong>de</strong>mos, contudo,<br />
acreditar que, do mesmo modo que Atenas po<strong>de</strong>ria ter vencido a Guerra do<br />
Peloponeso, se Péricles tivesse continuado à frente do governo e das tropas,<br />
também Alcibía<strong>de</strong>s (se não tivesse sido afastado pelos Atenienses) po<strong>de</strong>ria ter<br />
levado a bom porto a expedição à Sicília. Po<strong>de</strong>mos, se quisermos, consi<strong>de</strong>rar,<br />
como Péricles (Per. 34. 4) e <strong>Plutarco</strong>, que a mudança <strong>de</strong> sorte <strong>de</strong> Atenas se<br />
<strong>de</strong>veu à intervenção divina 354 . Mas os <strong>de</strong>uses apenas foram verda<strong>de</strong>iramente<br />
responsáveis pela <strong>de</strong>rrocada <strong>de</strong> Atenas por ter<strong>em</strong> afastado Péricles. Alcibía<strong>de</strong>s<br />
surge, na sua ambiguida<strong>de</strong>, como uma nova oportunida<strong>de</strong> promissora, uma<br />
espécie <strong>de</strong> Pandora, um presente envenenado: apesar <strong>de</strong> ter muito potencial,<br />
a sua maneira <strong>de</strong> ser acaba por fazer com que o povo <strong>de</strong>ixe <strong>de</strong> conar nele e,<br />
assim, <strong>de</strong>sperdice a segunda hipótese que os <strong>de</strong>uses lhe <strong>de</strong>ram <strong>de</strong> sair vencedor<br />
do conito com os Lace<strong>de</strong>mónios.<br />
Não po<strong>de</strong>ndo dar o seu melhor enquanto estratego a favor <strong>de</strong> Atenas,<br />
Alcibía<strong>de</strong>s fá-lo contra aquela 355 , naquele que, na nossa opinião, <strong>Plutarco</strong><br />
consi<strong>de</strong>ra o único momento <strong>em</strong> que, verda<strong>de</strong>ira e conscient<strong>em</strong>ente, o estratego<br />
fez mal aos concidadãos 356 . Ainda que possa ter tido alguma participação na<br />
mutilação <strong>dos</strong> Hermes 357 , não foi a malda<strong>de</strong> que o moveu mas a sua maneira<br />
leviana <strong>de</strong> ser. Pelo contrário, quando se sentiu traído pelos concidadãos, que<br />
até então lhe haviam <strong>de</strong>dicado múltiplos carinhos 358 , teve a atitu<strong>de</strong> própria <strong>de</strong><br />
(Alc. 18. 1-2) vocabulário relacionado com o vinho, pois fala na necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> misturar<br />
() a audácia <strong>de</strong> um Alcibía<strong>de</strong>s puro () com a prudência ( <br />
– Nic. 12. 5) <strong>de</strong> Nícias. Este tipo <strong>de</strong> metáfora ocorre também <strong>em</strong> Per. 7. 8 a<br />
propósito do povo e da liberda<strong>de</strong> que este conseguira sob o governo <strong>de</strong> Péricles.<br />
353 Esta informação que <strong>Plutarco</strong> fornece <strong>em</strong> Alc. 20. 2 diverge do que arma uc. 6. 44,<br />
segundo o qual Régio não foi conquistada, porque optou por uma posição <strong>de</strong> neutralida<strong>de</strong>. Os<br />
Atenienses ter-se-ão limitado a acampar nessa região.<br />
354 Esta i<strong>de</strong>ia é reforçada <strong>em</strong> Nic. 17. 4, on<strong>de</strong> o biógrafo arma que os Atenienses obtiveram<br />
oito vitórias sobre os Siracusanos, antes que uma oposição (), vinda <strong>dos</strong> <strong>de</strong>uses ()<br />
ou da fortuna (), parasse os Atenienses no apogeu do seu po<strong>de</strong>rio.<br />
355 É b<strong>em</strong> verda<strong>de</strong> que, Alcibía<strong>de</strong>s, se não fosse mimado e voluntarioso, po<strong>de</strong>ria ter<br />
enveredado por outro caminho, como Címon que, também ele exilado, acorreu a acudir a cida<strong>de</strong><br />
quando a viu <strong>em</strong> apuros (Per. 10). Alcibía<strong>de</strong>s, que amadureceu muito com a experiência do<br />
exílio, teve esse comportamento da segunda vez que os Atenienses o afastaram do comando. No<br />
entanto, a sua atuação anterior, que <strong>em</strong> tudo correspon<strong>de</strong> à reação <strong>de</strong> um indivíduo <strong>de</strong> «gran<strong>de</strong><br />
natureza», fez com que ninguém acreditasse na sua boa vonta<strong>de</strong>. Infra p. 301.<br />
356 A vingança <strong>de</strong> Alcibía<strong>de</strong>s acossado no exílio é igual à reação <strong>de</strong> um leão. Cf. supra p. 230.<br />
Sobre a reação <strong>de</strong> Alcibía<strong>de</strong>s, consulte-se Gribble (1999: 274).<br />
357 Supra p. 233, nota 117.<br />
358 Cf. uc. 6. 15. Foi a oscilação <strong>de</strong> afeições para com Alcibía<strong>de</strong>s durante os <strong>de</strong>z últimos<br />
anos <strong>de</strong> guerra que <strong>de</strong>itou por terra a possibilida<strong>de</strong> da vitória <strong>ateniense</strong>.<br />
285