O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas
O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas
O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Parte V - O <strong>hom<strong>em</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>Estado</strong> do século V<br />
A segunda consi<strong>de</strong>ração <strong>de</strong>corre da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> recordar algo evi<strong>de</strong>nte:<br />
a ativida<strong>de</strong> militar da Atenas li<strong>de</strong>rada por Péricles e Alcibía<strong>de</strong>s já não se<br />
dirige contra o inimigo por excelência <strong>dos</strong> Helenos, os Bárbaros, sobretudo os<br />
Persas. Estes ainda ofereciam algum perigo ocasional, mas nada que pu<strong>de</strong>sse<br />
dar gran<strong>de</strong>s preocupações aos Atenienses 238 , a qu<strong>em</strong>, no entanto, ainda era<br />
conveniente <strong>de</strong>ixar transparecer a importância da prevenção contra eventuais<br />
investidas do inimigo oriental. É que foi a eciência <strong>de</strong> Atenas no combate<br />
a esse perigo que valeu à cida<strong>de</strong> a heg<strong>em</strong>onia sobre os <strong>de</strong>mais Gregos e o<br />
enriquecimento <strong>dos</strong> seus cofres com os tributos que <strong>de</strong>les recebiam.<br />
Neste contexto, a gran<strong>de</strong> preocupação da <strong>em</strong> termos <strong>de</strong> política<br />
externa e <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> militar acaba por ser a manutenção <strong>de</strong> um império unido<br />
– porque <strong>de</strong>le <strong>de</strong>pendia o grosso da riqueza da cida<strong>de</strong> sob a forma <strong>de</strong> tributos<br />
– e a luta contra Esparta que, incomodada pelo crescente po<strong>de</strong>rio da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
Atena, tentava a todo o custo pôr m à heg<strong>em</strong>onia que aquela <strong>de</strong>tinha sobre a<br />
quase totalida<strong>de</strong> da Héla<strong>de</strong> 239 (Per. 21. 1, 22. 1).<br />
Como é óbvio, o esforço necessário para <strong>em</strong>preen<strong>de</strong>r esta missão era muito<br />
gran<strong>de</strong>. Péricles teve consciência disso e, enquanto <strong>hom<strong>em</strong></strong> pru<strong>de</strong>nte e cheio <strong>de</strong><br />
visão, enten<strong>de</strong>u que não seria o momento oportuno para «dilatar» o império 240 .<br />
Valeu a Atenas – pelo menos t<strong>em</strong>porariamente – o seu pulso forte sobre os<br />
concidadãos, pois havia uma fação que ansiava já por esse alargamento. Este<br />
238 Um ex<strong>em</strong>plo da ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Atenas contra os Bárbaros é a expedição do Quersoneso, por<br />
volta <strong>de</strong> 447 a.C. – segundo parece indicar uma inscrição (IG I 2 943) –, que libertou a região do<br />
agelo <strong>dos</strong> piratas - vi<strong>de</strong> Lewis (1992: 95). Em Per. 19. 1, <strong>Plutarco</strong> consi<strong>de</strong>ra esta <strong>em</strong>presa como a<br />
mais apreciada pelas massas, provavelmente porque teve como alvo o inimigo comum <strong>dos</strong> Gregos e<br />
não um povo heleno. De facto, o comentário que Elpinice faz a Péricles a propósito das celebrações<br />
fúnebres <strong>dos</strong> que pereceram <strong>em</strong> Samos sugere a existência <strong>de</strong> uma fação <strong>de</strong>scontente com aquilo que<br />
seria o disperdício <strong>de</strong> recursos a combater Gregos e não Bárbaros (Per. 28. 4): <br />
<br />
<br />
– ‘que feitos admiráveis e dignos das coroas os teus, Péricles! Tu que zeste perecer muitos <strong>dos</strong> nossos<br />
valorosos cidadãos, não a fazer guerra contra os Fenícios e contra os Me<strong>dos</strong>, como o meu irmão<br />
Címon, mas a <strong>de</strong>struir uma cida<strong>de</strong> aliada e da mesma raça da nossa.’ Em Cim. 19. 3, <strong>Plutarco</strong> arma<br />
mesmo que, <strong>de</strong>pois da morte <strong>de</strong> Címon, nenhum outro general grego fez algo <strong>de</strong> admirável contra<br />
os Bárbaros. Pelo contrário: excita<strong>dos</strong> por <strong>de</strong>magogos e belicistas, os Gregos voltaram-se uns contra<br />
os outros, tornando-se nos principais responsáveis pela ruína da Grécia. Esta expedição teve ainda a<br />
vantag<strong>em</strong> <strong>de</strong> ter permitido a fundação <strong>de</strong> uma nova cleruquia <strong>em</strong> um território que, além <strong>de</strong> possuir<br />
um solo muito fértil, era estratégico porque se situava na passag<strong>em</strong> da Europa para a Ásia, pelo que o<br />
seu domínio permitia controlar a auência <strong>dos</strong> cereais vin<strong>dos</strong> do Mar Negro para Atenas. No século<br />
VI a.C., foi proprieda<strong>de</strong> da família <strong>de</strong> Milcía<strong>de</strong>s; no princípio do século V a.C., a região cou sob<br />
o domínio persa até que, por volta <strong>de</strong> 450 a.C., os Atenienses a integraram na Simaquia <strong>de</strong> Delos.<br />
239 Sobre esta rivalida<strong>de</strong>, veja-se o capítulo «Atenas, o umbigo da Héla<strong>de</strong>».<br />
240 O texto <strong>de</strong> <strong>Plutarco</strong> (Per. 22. 1) é eloquente neste sentido: <br />
– “que com razão canalizava<br />
as forças <strong>dos</strong> Atenienses para a Grécia, os acontecimentos test<strong>em</strong>unharam-no”. De facto, não<br />
<strong>de</strong>morou muito para que diversas cida<strong>de</strong>s aliadas, das quais Eubeia e Mégara foram as primeiras,<br />
<strong>de</strong>ss<strong>em</strong> mostras <strong>de</strong> <strong>de</strong>scontentamento e tentass<strong>em</strong> a secessão.<br />
262