17.04.2013 Views

O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas

O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas

O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Parte V - O <strong>hom<strong>em</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>Estado</strong> do século V<br />

252<br />

“alguém manifestamente incorruptível e inacessível a subornos.”<br />

E, acrescenta o biógrafo, apesar <strong>de</strong> ter <strong>de</strong>ixado Atenas mais rica do que<br />

quando subiu ao po<strong>de</strong>r, não aumentou a fortuna que herdara do pai <strong>em</strong> uma<br />

única dracma 193 . Conta o Queroneu que, por causa do excesso <strong>de</strong> trabalho e<br />

preocupações que tinha com o governo <strong>de</strong> Atenas, o lho <strong>de</strong> Xantipo conou a<br />

gestão <strong>dos</strong> seus bens priva<strong>dos</strong> a um escravo chamado Evângelo – provavelmente<br />

ele próprio dotado para esta ativida<strong>de</strong> –, que seguia à risca o plano traçado<br />

pelo estadista para o efeito 194 . Esta gestão eciente da sua casa é mais um <strong>dos</strong><br />

motivos pelos quais <strong>Plutarco</strong> o admira, pois consi<strong>de</strong>ra que, só aliando este fator<br />

à sabedoria e a uma vida privada b<strong>em</strong> estruturada, um político po<strong>de</strong> servir <strong>de</strong><br />

ex<strong>em</strong>plo aos concidadãos e inspirar conança pelo seu modo <strong>de</strong> vida 195 .<br />

193 Isócrates (8. 126) arma que Péricles não conseguiu conservar na íntegra a fortuna que o pai<br />

lhe legara. Esta perspetiva, porém, não se coaduna com o elogio que <strong>Plutarco</strong> faz à administração<br />

<strong>dos</strong> bens pessoais do her<strong>de</strong>iro <strong>de</strong> Xantipo (cf. Per. 16. 3). Importa chamar a atenção para o facto <strong>de</strong>,<br />

nas biograas <strong>de</strong> Teseu e <strong>de</strong> Alcibía<strong>de</strong>s, não haver qualquer menção <strong>de</strong> preocupações <strong>de</strong>ste género.<br />

No <strong>caso</strong> do fundador mítico, isso po<strong>de</strong> justicar-se pelo próprio caráter lendário da história e pelo<br />

altruísmo que o caracteriza. Qu<strong>em</strong>, como ele, se dispõe a arriscar a vida para ajudar os fracos e<br />

oprimi<strong>dos</strong> não t<strong>em</strong> perl compatível com o <strong>de</strong> alguém que ce<strong>de</strong> à inuência do dinheiro. No <strong>caso</strong><br />

<strong>de</strong> Alcibía<strong>de</strong>s, tão-só pelo facto <strong>de</strong> se tratar <strong>de</strong> um jov<strong>em</strong> <strong>de</strong> famílias ricas, pouco responsável, que<br />

t<strong>em</strong> como uma das suas principais ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>lapidar a fortuna herdada – característica que, <strong>de</strong><br />

resto, parece partilhar com os lhos do próprio Péricles.<br />

194 Segundo <strong>Plutarco</strong>, <strong>em</strong>bora não caísse <strong>em</strong> tentação por causa <strong>de</strong> dinheiro, Péricles não<br />

era indiferente aos negócios. Esta postura do estadista merece uma atenta reexão do biógrafo,<br />

porque diverge <strong>dos</strong> ensinamentos <strong>de</strong> Anaxágoras, que, apesar <strong>de</strong> oriundo <strong>de</strong> família rica e<br />

inuente, abdicou da herança, das facilida<strong>de</strong>s e sucesso político, que po<strong>de</strong>ria alcançar se <strong>de</strong>la<br />

dispusesse, para se entregar à ciência e à losoa (cf. Pl. Hp. Ma. 281c, 283a; D. L. 2. 6-7). Para<br />

ele a vida só t<strong>em</strong> valor se servir para uma melhor compreensão do cosmos a que se pertence;<br />

tudo o resto é supéruo: o apego aos bens materiais e à felicida<strong>de</strong> terrena não vale a pena, pois<br />

todo o <strong>hom<strong>em</strong></strong> é mortal e, mais cedo ou mais tar<strong>de</strong>, to<strong>dos</strong> têm o mesmo <strong>de</strong>stino – vi<strong>de</strong> Guthrie<br />

(1969: II, 266 sq.). Péricles, <strong>em</strong>bora admirasse Anaxágoras como ninguém (supra 5. 1), tinha<br />

uma visão mais pragmática da vida e nisso não seguia os ensinamentos do seu mestre, como nolo<br />

diz <strong>Plutarco</strong> <strong>em</strong> Per. 16. 7. De facto, segundo Van Raalte (2005: 88), nas Vidas, o Queroneu<br />

opta por apresentar a losoa <strong>em</strong> contraste com a ativida<strong>de</strong> política e a diferença que mais<br />

sobressai entre o estilo <strong>de</strong> vida <strong>de</strong> um lósofo teórico e o <strong>de</strong> um político é a atitu<strong>de</strong> perante os<br />

bens materiais. Enquanto teorizador político, não con<strong>de</strong>na o <strong>hom<strong>em</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>Estado</strong> que se preocupa<br />

com a riqueza. Pelo contrário, <strong>em</strong> Cor. 10. 8, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que o correto uso <strong>dos</strong> bens materiais é mais<br />

proveitoso que a excelência nas armas. Já <strong>em</strong> Sol. 2. 5, consi<strong>de</strong>ra que o <strong>hom<strong>em</strong></strong> b<strong>em</strong> formado<br />

e bom cidadão, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que não tenha ambição <strong>em</strong> <strong>de</strong>masia n<strong>em</strong> <strong>de</strong>seje o supéruo, <strong>de</strong>ve fruir<br />

do necessário e do suciente, pois é impossível fazer face à dura realida<strong>de</strong> s<strong>em</strong> dinheiro. O<br />

Queroneu, que t<strong>em</strong> por hábito atribuir a virtu<strong>de</strong> da carida<strong>de</strong> às suas personagens (cf. Sol. 2. 1),<br />

b<strong>em</strong> como reetir sobre o uso que um político <strong>de</strong>ve fazer do dinheiro (cf. Publ. 1. 2, Fab. 7. 7,<br />

8, Comp. Per.-Fab.), arma mesmo que a riqueza po<strong>de</strong> ser uma virtu<strong>de</strong>, se o político a usa para<br />

fazer b<strong>em</strong> aos mais necessita<strong>dos</strong>, como no <strong>caso</strong> <strong>de</strong> Péricles. Mas a verda<strong>de</strong> é que não consta<br />

que Péricles fosse possuidor <strong>de</strong> uma generosida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sinteressada, no que contrasta com Címon<br />

(Cim. 10) e Nícias (Nic. 3. 1).<br />

195 Moralia 800C-801B. Sobre este t<strong>em</strong>a, vi<strong>de</strong> De Blois (2004: 57). Esta postura do lho<br />

<strong>de</strong> Xantipo é oposta, por ex<strong>em</strong>plo, à <strong>de</strong> Nícias, que <strong>de</strong>scurava os seus bens, porque tinha como

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!