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O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas

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Parte V - O <strong>hom<strong>em</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>Estado</strong> do século V<br />

Contudo, mais do que isso, tal como um médico, Péricles revela-se<br />

senhor da paciência necessária para não dar importância a <strong>de</strong>scontentamentos<br />

e protestos (Per. 33. 6), n<strong>em</strong> às injúrias proferidas nos momentos <strong>de</strong> maior<br />

sofrimento (Per. 34. 5), sobretudo quando a Guerra do Peloponeso causava<br />

graves danos à população; animava-o a convicção <strong>de</strong> que a sua estratégia<br />

permitiria a Atenas alcançar a vitória.<br />

Devido a esta atitu<strong>de</strong> protetora, e também por inuência platónica 89 (R.<br />

488a-e, Grg. 512b-d), o biógrafo compara igualmente 90 o comportamento do<br />

estadista ao <strong>de</strong> um piloto (Per. 33. 6) que t<strong>em</strong> <strong>de</strong> ignorar as lágrimas, as náuseas<br />

e o medo <strong>dos</strong> passageiros para po<strong>de</strong>r agir <strong>de</strong> modo a que não naufragu<strong>em</strong><br />

to<strong>dos</strong>. De facto, não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser curioso notar que Péricles atua como pai,<br />

médico e piloto sobretudo quando a contestação do povo e o perigo que corre<br />

são maiores, pois é nessa altura que o seu bom-senso e prudência se revelam<br />

fundamentais.<br />

E o povo <strong>ateniense</strong>, apesar <strong>de</strong> muito fustigado por várias «doenças»<br />

<strong>de</strong>correntes do po<strong>de</strong>r que a <strong>de</strong>tinha (Per. 15. 2), <strong>em</strong>bora por diversas<br />

vezes discordasse e até se manifestasse contra as suas <strong>de</strong>cisões, raramente<br />

<strong>de</strong>ixava <strong>de</strong> o seguir e, por norma, acabava por concordar com as opções por ele<br />

tomadas (Per. 15. 1). Uma das ocasiões <strong>em</strong> que Péricles não foi b<strong>em</strong> sucedido<br />

a convencer o povo foi a da expedição proposta por Tólmi<strong>de</strong>s 91 (Per. 18. 2-3).<br />

É <strong>caso</strong> para dizer que este falhanço foi importante no sentido <strong>de</strong> mostrar ao<br />

povo a clarividência do estadista, a sua preocupação com a e também<br />

porque serviu <strong>de</strong> lição: pelo sim pelo não, <strong>em</strong> próxima situação s<strong>em</strong>elhante,<br />

seria melhor ouvir os conselhos que lhe dava.<br />

Péricles era um <strong>de</strong>magogo inato, no sentido etimológico do termo. Tinha,<br />

como nenhum outro, o dom <strong>de</strong> conduzir os Atenienses, que, <strong>em</strong> Per. 15. 2,<br />

são mais uma vez compara<strong>dos</strong> a um cavalo, animal que gosta <strong>de</strong> galopar <strong>em</strong><br />

liberda<strong>de</strong>, mas que é domesticável pelo rigor do freio 92 . S<strong>em</strong>pre que o «seu<br />

89 Note-se, contudo, que esta imag<strong>em</strong> t<strong>em</strong> muita tradição mesmo antes <strong>de</strong> Platão, algo que<br />

po<strong>de</strong>mos comprovar, por ex<strong>em</strong>plo, através <strong>de</strong> Archil. fr. 105 West e A. . 654.<br />

90 Em Per. 15. 2, esta i<strong>de</strong>ia surge <strong>de</strong> modo indireto, já que é a ação <strong>de</strong> Péricles que é associada<br />

a um l<strong>em</strong>e, e não o estadista a um . A comparação <strong>de</strong> Péricles com um piloto é mais<br />

pertinente do que qualquer outra, na medida <strong>em</strong> que está relacionada com a metáfora da nau<br />

do <strong>Estado</strong> (Pl. R. 488a-e). Segundo Breebart (1987: 56), a i<strong>de</strong>ia da manipulação subjacente a<br />

esta metáfora é particularmente cara à elite imperial, que acredita que «the people can only be<br />

the subject of politics through its lea<strong>de</strong>r». Para uma análise mais cuidada <strong>de</strong>ste passo <strong>de</strong> <strong>Plutarco</strong><br />

por comparação com a sua fonte (uc. 2. 65. 9, on<strong>de</strong> a imag<strong>em</strong> do piloto não é utilizada),<br />

consulte-se Romilly (1988: 24). Ambos os paralelos – Péricles-médico/Péricles-piloto – revelam<br />

as preocupações literárias do biógrafo, que procura adornar a imag<strong>em</strong> do político <strong>ateniense</strong><br />

como <strong>hom<strong>em</strong></strong> sábio e pru<strong>de</strong>nte, que, <strong>em</strong> situações difíceis, apenas ouve a voz da razão.<br />

91 Cf. supra p. 184, nota 91.<br />

92 No entanto, esta imag<strong>em</strong> <strong>de</strong> um Péricles cavaleiro volta a ocorrer <strong>em</strong> 15. 1 e realça os dotes<br />

do nosso protagonista para este tipo <strong>de</strong> equitação, pois sabia como ninguém puxar ou soltar as<br />

ré<strong>de</strong>as do seu cavalo. De um modo geral, <strong>Plutarco</strong> <strong>de</strong>screve o povo (à boa maneira <strong>de</strong> Platão)<br />

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