O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas
O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas
O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Parte V - O <strong>hom<strong>em</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>Estado</strong> do século V<br />
Esta perspetiva, que surge no seio <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>mocracia, é própria <strong>de</strong> um<br />
pensamento aristocrático 47 , mas acabou por se revelar verda<strong>de</strong>ira, na medida<br />
<strong>em</strong> que o excesso <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> do povo, que se <strong>de</strong>u particularmente quando<br />
este <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ter alguém que o soubesse conduzir como Péricles, levou à<br />
ruína da . Segundo o fundador da Aca<strong>de</strong>mia, a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong>sregrada do<br />
povo conduz à <strong>de</strong>gradação moral <strong>de</strong> toda uma socieda<strong>de</strong> e a longo prazo trará<br />
o <strong>de</strong>scrédito e a ruína <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> constituição. E Platão podia armá-lo<br />
com segurança, pois no nal do século V a.C. já era possível vericar,<br />
pelos acontecimentos, o mau efeito <strong>dos</strong> excessos <strong>de</strong>mocráticos. Fica assim<br />
b<strong>em</strong> <strong>de</strong>monstrado que apenas o passar <strong>dos</strong> anos permite constatar as reais<br />
consequências das medidas governativas anteriores.<br />
Ainda que esta crítica possa ser apontada a Péricles pelos seus adversários e<br />
sobretudo pelos que se opõ<strong>em</strong> à <strong>de</strong>mocracia, a verda<strong>de</strong> é que a sua atitu<strong>de</strong> para<br />
com as massas foi quase s<strong>em</strong>pre a contrária, à exceção <strong>dos</strong> dois momentos 48 <strong>em</strong><br />
que lutou pela supr<strong>em</strong>acia no po<strong>de</strong>r. O primeiro teve lugar, quando, jov<strong>em</strong> e<br />
timorato, procurando ingressar na vida política, Péricles buscou o seu favor 49 .<br />
Para isso usou <strong>de</strong> alguma <strong>de</strong>magogia, sobretudo <strong>de</strong>vido ao peso do principal<br />
opositor que então <strong>de</strong>frontava, Címon, um indivíduo muito rico e generoso,<br />
que brindava os mais pobres e os estrangeiros com roupa, alimentos e dinheiro.<br />
Como a reação típica da população nestas circunstâncias é agra<strong>de</strong>cer o benefício<br />
com o seu apoio, Péricles viu-se obrigado a alinhar no esqu<strong>em</strong>a 50 . Só que, como<br />
a sua fortuna não era tão vasta quanto a <strong>de</strong> Címon, o aspirante a um lugar <strong>de</strong><br />
peso conce<strong>de</strong>u benesses ao povo não a expensas próprias, mas com dinheiros<br />
do <strong>Estado</strong>. Foi nessa altura que, segundo Per. 9. 1-3, a multidão teve direito<br />
47 Esta visão preconceituosa das massas, como muito b<strong>em</strong> enfatiza Saïd (2005: 7, 18),<br />
<strong>de</strong>corre do facto <strong>de</strong> os textos on<strong>de</strong> essa opinião é manifestada ser<strong>em</strong> escritos por aristocratas<br />
para aristocratas.<br />
48 Na verda<strong>de</strong>, <strong>Plutarco</strong> recorda um terceiro momento <strong>em</strong> que o estratego recorre à<br />
<strong>de</strong>magogia, que se distingue <strong>dos</strong> outros dois por não ter como objetivo a conquista do po<strong>de</strong>r<br />
mas aplacar a ira do povo, <strong>de</strong>scontente com a estratégia assumida para a Guerra do Peloponeso.<br />
Em Per. 34. 2, o Queroneu arma que Péricles ofereceu subsídios, propôs cleruquias e sorteou<br />
Egina pelos Atenienses, conseguindo, assim, controlar o povo por mais algum t<strong>em</strong>po. Segundo<br />
Stadter (1989: 314), a alusão aos subsídios e cleruquias é da responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Plutarco</strong> (ou<br />
<strong>de</strong> outra fonte <strong>de</strong>sconhecida), já que uc. 2. 27. 1 apenas menciona o sorteio <strong>de</strong> Egina, que<br />
terá tido como principal intuito não o domar a fera <strong>ateniense</strong>, mas sim pôr termo à ameaça<br />
que Egina, apoiante <strong>dos</strong> Lace<strong>de</strong>mónios, constituía para Atenas. Sobre a revolta do povo contra<br />
Péricles, vi<strong>de</strong> infra p. 236 sqq.<br />
49 Cf. supra p. 202.<br />
50 Não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser curioso vericar o diferente aproveitamento (consciente ou não) que<br />
<strong>Plutarco</strong> faz <strong>de</strong> um mesmo material <strong>em</strong> biograas diferentes. Enquanto <strong>em</strong> Per. 9. 2 chama<br />
«<strong>de</strong>magogia» aos donativos que Címon faz aos mais pobres, como que para justicar a conduta<br />
<strong>de</strong> Péricles, <strong>em</strong> Cim. 10. 5-6 atribui essa generosida<strong>de</strong> à ‘gran<strong>de</strong>za <strong>de</strong> alma’ do<br />
irmão <strong>de</strong> Elpinice e arma que este não agia com intuitos <strong>de</strong>magógicos, porque era seguidor <strong>de</strong><br />
uma política aristocrática e laconizante.<br />
220