17.04.2013 Views

O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas

O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas

O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Parte V - O <strong>hom<strong>em</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>Estado</strong> do século V<br />

nossos dias há a preocupação <strong>de</strong> julgar as capacida<strong>de</strong>s e os atos políticos com<br />

base na vida privada, inclusivamente <strong>de</strong> atribuir <strong>de</strong>cisões políticas importantes<br />

à necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> esbater os comentários sobre «pequenos» tropeços da vida<br />

familiar 34 . Assim, quanto menor fosse o t<strong>em</strong>po <strong>de</strong> exposição no convívio com as<br />

massas – talvez também Péricles o pensasse –, menores seriam as possibilida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> ser apanhado <strong>em</strong> falso e <strong>de</strong> per<strong>de</strong>r o respeito que por ele sentiam (o que é<br />

importante sobretudo <strong>em</strong> início <strong>de</strong> carreira) 35 .<br />

Consequent<strong>em</strong>ente, Péricles só era visto na rua a fazer o percurso casatrabalho-casa<br />

e <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> participar <strong>em</strong> banquetes, mesmo os que eram<br />

ofereci<strong>dos</strong> pela família 36 . Diz-nos o biógrafo que apenas abriu uma exceção<br />

por ocasião do casamento do primo, Euriptól<strong>em</strong>o; mas, mesmo nessa altura, só<br />

cou até ao nal das libações. <strong>Plutarco</strong> justica esta atitu<strong>de</strong> com o argumento<br />

<strong>de</strong> que as festas não facilitam a manutenção da dignida<strong>de</strong> e <strong>de</strong> que o convívio<br />

torna difícil conservar a serieda<strong>de</strong> que leva à boa reputação 37 .<br />

Assim, Péricles põe ao serviço da <strong>de</strong>mocracia uma atitu<strong>de</strong> fort<strong>em</strong>ente<br />

aristocrática, já que se nota uma certa aversão pelo convívio popular. Mas, por<br />

outro lado, esta atitu<strong>de</strong> <strong>em</strong> exagero t<strong>em</strong> os traços do arrogante que Teofrasto<br />

<strong>de</strong>screve no capítulo 24 <strong>de</strong> Carateres...<br />

34 Cf. Per. 31-32, on<strong>de</strong> a eclosão da Guerra do Peloponeso se justica, segundo alguns,<br />

pelo facto <strong>de</strong> Péricles não ter cedido às exigências <strong>dos</strong> Lace<strong>de</strong>mónios como forma <strong>de</strong> dispersar<br />

as atenções das acusações feitas contra Fídias, Aspásia e Anaxágoras. Os comediógrafos<br />

partilhavam <strong>de</strong>sta perspetiva: Ar. Ach. 524-527 atribui esse mesmo acontecimento ao rapto da<br />

prostituta <strong>de</strong> Aspásia; Cratino, <strong>em</strong> N<strong>em</strong>esis (430-429 a.C.), narra a união <strong>de</strong> Zeus (Péricles) e<br />

Némesis (Aspásia), da qual resulta Helena e responsabiliza Péricles pelo <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ar da Guerra<br />

do Peloponeso, já que este apareceria disfarçado <strong>de</strong> Zeus para levar a cabo os seus intentos.<br />

Sobre este assunto, vi<strong>de</strong> infra pp. 212 e 244 sq.<br />

35 Como arma Connor (1971: 121-122), «this was a means of winning the support of the<br />

<strong>de</strong>mos of the city. ere are perhaps two ways in which such a restraint contributed to obtaining<br />

that support. e rst is by presenting Pericles as the indispensable expert in the complexity<br />

of public business; the second is by presenting him as an impartial public servant, without<br />

dangerous obligations to philoi.» Sobre este assunto, consulte-se ainda Humpreys (1983: 24).<br />

36 Segundo Plu. Nic. 5, Nícias adotou uma postura próxima da <strong>de</strong> Péricles, já que era<br />

circunspeto <strong>em</strong> relação aos sicofantas, não jantava com cidadãos, não se relacionava com<br />

ninguém no dia-a-dia e não consagrava t<strong>em</strong>po ao lazer. Também era difícil <strong>de</strong> abordar, pois,<br />

quando não estava no trabalho, estava <strong>em</strong> casa. A sua <strong>de</strong>dicação ao trabalho foi <strong>de</strong> tal or<strong>de</strong>m<br />

que <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> tomar conta <strong>dos</strong> seus assuntos pessoais (nisto, diferente <strong>de</strong> Péricles, cf. Per. 16.<br />

3 – vi<strong>de</strong> infra pp. 252-253), per<strong>de</strong>u a fortuna, os amigos e agravou o seu já débil estado <strong>de</strong><br />

saú<strong>de</strong>. Conta que fazia correr o rumor <strong>de</strong> que levava essa vida infeliz por causa da sua gran<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>dicação à cida<strong>de</strong>. Nícias era, portanto, o inverso da maioria <strong>dos</strong> <strong>de</strong>magogos do seu t<strong>em</strong>po que<br />

se aproveitavam da tribuna para fazer amigos e enriquecer. Sobre este comportamento pouco<br />

sociável e <strong>de</strong>mocrático, vi<strong>de</strong> etiam Nic. 11. 2. Em Moralia 823C, <strong>Plutarco</strong> elogia aqueles que,<br />

como Nícias e Péricles, se preocupam continuamente com os assuntos públicos e consi<strong>de</strong>ram a<br />

política não um passat<strong>em</strong>po, mas um modo <strong>de</strong> vida.<br />

37 Em Moralia 800B-D, volta a referir-se a esta alteração no comportamento <strong>de</strong> <strong>Plutarco</strong>,<br />

que consi<strong>de</strong>ra pru<strong>de</strong>nte, na medida <strong>em</strong> que os políticos têm <strong>de</strong> prestar contas da sua vida<br />

pública e privada (aparência, amores, diversões, alimentação), aspetos esses que também são<br />

responsáveis pela admiração ou aversão que o povo lhes <strong>de</strong>dica (800F-801A).<br />

200

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!