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O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas

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O <strong>caso</strong> <strong>de</strong> Péricles e Alcibía<strong>de</strong>s<br />

relação à sua pessoa ser díspar da <strong>dos</strong> outros amantes fez com que Alcibía<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong>senvolvesse por ele um sentimento <strong>de</strong> respeito e t<strong>em</strong>or (Alc. 6.1: <br />

), distinto do <strong>de</strong>sprezo que nutria pelos <strong>de</strong>mais (como os <strong>caso</strong>s<br />

que já abordámos supra, nomeadamente o episódio do assalto à casa <strong>de</strong> Ânito).<br />

Alcibía<strong>de</strong>s reconhecia o valor <strong>de</strong> Sócrates 114 e procurava passar muito t<strong>em</strong>po<br />

com ele (jantavam, lutavam e partilhavam a mesma tenda), o que até causava<br />

estranheza à sua volta. E, s<strong>em</strong>pre que ouvia os seus discursos, sentia-se tocado<br />

pelas palavras proferidas; era como se a sua natureza virtuosa <strong>de</strong>spertasse e lhe<br />

provocasse r<strong>em</strong>orsos pelos comportamentos indignos que assumia 115 . Ainda<br />

assim, abandonava amiú<strong>de</strong> o mestre, não <strong>em</strong> busca <strong>de</strong> prazer sexual, mas para<br />

receber mimos <strong>dos</strong> outros amantes (com os quais, como já vimos, mantinha<br />

uma relação contraditória) que o cobriam <strong>de</strong> lisonja, um esqu<strong>em</strong>a <strong>em</strong> que<br />

Sócrates não alinhava. No entanto, acabava s<strong>em</strong>pre por regressar para junto<br />

do lósofo (Alc. 6. 1 116 ), que tinha por hábito caçá-lo, como se <strong>de</strong> um escravo<br />

fugitivo se tratasse. Era, segundo <strong>Plutarco</strong>, nessas alturas que Alcibía<strong>de</strong>s podia<br />

ser comparado ao ferro: quando se afastava <strong>de</strong> Sócrates, cava moldável à<br />

inuência nefasta <strong>dos</strong> bajuladores (do mesmo modo que o ferro o é ao po<strong>de</strong>r do<br />

fogo), mas <strong>de</strong> regresso à companhia daquele, retomava a sua «dureza natural»,<br />

isto é, cava permeável à inuência <strong>de</strong> Sócrates e à sua tendência inata para a<br />

virtu<strong>de</strong>.<br />

Mas, <strong>em</strong>bora muitas vezes se mostrasse terreno fértil para o germinar da<br />

s<strong>em</strong>ente socrática, Alcibía<strong>de</strong>s acabou, como Sócrates b<strong>em</strong> t<strong>em</strong>ia, por ce<strong>de</strong>r<br />

à pressão <strong>dos</strong> aduladores e da sua própria maneira <strong>de</strong> ser. Platão consi<strong>de</strong>ra<br />

que Sócrates não po<strong>de</strong> ser responsabilizado por tamanho falhanço 117 ; faltou<br />

a Alcibía<strong>de</strong>s uma sólida formação losóca <strong>de</strong> base que fomentasse um bom<br />

aproveitamento das suas capacida<strong>de</strong>s inatas; por isso mesmo a sua vida foi<br />

vivida «à marg<strong>em</strong> da lei» () e cheia <strong>de</strong> altos e baixos ().<br />

Assim, <strong>em</strong> jeito <strong>de</strong> súmula, po<strong>de</strong>mos dizer que, <strong>em</strong>bora oriun<strong>dos</strong> da<br />

mesma família e senhores <strong>de</strong> «naturezas losócas», Péricles e Alcibía<strong>de</strong>s<br />

114 Segundo Alc. 4. 4, o jov<strong>em</strong> consi<strong>de</strong>rava a obra <strong>de</strong> Sócrates como uma incumbência divina<br />

() para cuidado e salvação <strong>dos</strong> jovens (). O<br />

modo como <strong>Plutarco</strong> enten<strong>de</strong> a missão <strong>de</strong> Sócrates t<strong>em</strong> subjacente a <strong>de</strong>nição <strong>de</strong> amor para os<br />

lósofos, nomeadamente Polémon (cf. Moralia 780D). Esta i<strong>de</strong>ia é recorrente <strong>em</strong> <strong>Plutarco</strong>, que,<br />

por ex<strong>em</strong>plo, consi<strong>de</strong>ra o amor <strong>de</strong> Ariadne por Teseu um sentimento <strong>de</strong> natureza s<strong>em</strong>elhante.<br />

Cf. Plu. Rom. 30. 6-7 e Flacelière (1948: 101-102).<br />

115 Em Plu. Alc. 6. 1 é clara a inuência <strong>de</strong> Pl. Smp. 215e, on<strong>de</strong> o jov<strong>em</strong> admite que n<strong>em</strong> as<br />

palavras <strong>dos</strong> oradores mais ilustres – como Péricles – lhe provocavam tamanha comoção.<br />

116 Nota-se mais uma vez a inuência platónica, já que a metáfora da caça amorosa é<br />

frequente na obra <strong>de</strong>ste lósofo. Vi<strong>de</strong> Louis (1945: 55).<br />

117 Cf. Pl. R. 494d-495c. Nesse passo, Platão não se refere a Alcibía<strong>de</strong>s pelo nome, mas as suas<br />

palavras faz<strong>em</strong> pensar <strong>de</strong> imediato no Alcmeónida. O facto <strong>de</strong> Alcibía<strong>de</strong>s não ter modicado<br />

o caráter pernicioso que lhe conhec<strong>em</strong>os terá certamente contribuído para a acusação <strong>de</strong><br />

corromper a juventu<strong>de</strong> <strong>de</strong> que Sócrates foi alvo e que muito pesou para a sua con<strong>de</strong>nação à<br />

morte (cf. X. M<strong>em</strong>. 1. 1. 1, 1. 2. 12-16; Pl. Ap. 33 a-b; D. L. 2. 40).<br />

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