17.04.2013 Views

O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas

O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas

O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

O <strong>caso</strong> <strong>de</strong> Péricles e Alcibía<strong>de</strong>s<br />

Péricles – que era «elevado e isento <strong>de</strong> vulgarida<strong>de</strong>s populares e <strong>de</strong> mau tom»<br />

e veiculado por uma voz imperturbável – e <strong>de</strong>screve também a mo<strong>de</strong>ração que<br />

se manifesta <strong>em</strong> toda a sua maneira <strong>de</strong> ser.<br />

Daqui po<strong>de</strong>mos inferir dois traços fundamentais da personalida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> Péricles – que serão menciona<strong>dos</strong> e sugeri<strong>dos</strong> várias vezes ao longo da<br />

biograa, ainda que <strong>em</strong> outros contextos: a sua mo<strong>de</strong>ração e o autodomínio.<br />

Também a inexibilida<strong>de</strong> do olhar, a tranquilida<strong>de</strong> do andar, a modéstia no<br />

vestir – no fundo, a dignida<strong>de</strong> do porte e mesmo da linguag<strong>em</strong> – <strong>de</strong>monstram<br />

essas mesmas características e a serieda<strong>de</strong> do nosso estadista. Outro tanto não<br />

se po<strong>de</strong> dizer <strong>de</strong> Alcibía<strong>de</strong>s. Segundo test<strong>em</strong>unho indireto do comediógrafo<br />

Arquipo 91 (que zombava do lho <strong>de</strong> Alcibía<strong>de</strong>s e não diretamente do próprio),<br />

o Alcmeónida caminharia com indolência afetada e com a nuca inclinada,<br />

arrastando o manto, e ceceava <strong>de</strong> cada vez que abria a boca. Deixava, assim,<br />

evi<strong>de</strong>nte a necessida<strong>de</strong> que sentia <strong>de</strong> se mostrar superior e <strong>de</strong> atrair os olhos <strong>de</strong><br />

to<strong>dos</strong> na sua direção.<br />

Com Anaxágoras, Péricles apren<strong>de</strong>u ainda a não ser supersticioso –<br />

– (Per. 6. 1) 92 . Segundo <strong>Plutarco</strong>, isso aconteceu<br />

porque a posse <strong>de</strong> conhecimentos cientícos o levou à melhor compreensão<br />

e conhecimento <strong>dos</strong> fenómenos naturais, o que não permite aceitar qualquer<br />

justicação sobrenatural para tais inci<strong>de</strong>ntes. Esta característica é ex<strong>em</strong>plicada<br />

<strong>em</strong> Per. 35. 2, quando, no momento da partida para Epidauro, t<strong>em</strong> lugar um<br />

eclipse do sol, que quase paralisa to<strong>dos</strong> <strong>de</strong> pavor. Vericando o medo do piloto,<br />

Péricles fá-lo compreen<strong>de</strong>r que nada há a t<strong>em</strong>er, que se trata <strong>de</strong> um fenómeno<br />

inofensivo, tal como o é a escuridão provocada pelo cobrir do rosto com um<br />

manto. É assim que consegue fazer com que a armada parta.<br />

No entanto, no nal <strong>de</strong>sta biograa, <strong>em</strong> Per. 38. 2 93 , quando <strong>Plutarco</strong><br />

nos informa da doença que viria a vitimar o estadista, invoca Teofrasto 94 : ao<br />

<strong>de</strong> <strong>Plutarco</strong> é a re<strong>de</strong>nição permanente e progressiva <strong>dos</strong> traços <strong>de</strong> caráter das suas personagens.<br />

É assim que ele individualiza, que torna mais singulares, as características que preten<strong>de</strong> realçar;<br />

no <strong>caso</strong> <strong>de</strong> Alcibía<strong>de</strong>s, por ex<strong>em</strong>plo, com o <strong>de</strong>senrolar da Vida, o jov<strong>em</strong> torna-se cada vez mais<br />

invulgar: ninguém jamais conseguira comportar-se <strong>de</strong> um modo tão ultrajant<strong>em</strong>ente encantador,<br />

com tanta versatilida<strong>de</strong> e habilida<strong>de</strong>.<br />

91 Alc. 1. 8.<br />

92 Teofrasto (Char. 16) <strong>de</strong>screve a gura do supersticioso e <strong>de</strong>ne superstição como sendo<br />

simplesmente o t<strong>em</strong>or do sobrenatural. Neste passo, salienta-se a importância da losoa para a<br />

formação do indivíduo. L<strong>em</strong>br<strong>em</strong>o-nos <strong>de</strong> que, já Platão (Alc. 1. 118b-c) o dizia, foi o estudo da<br />

losoa – condição sine qua non para um bom <strong>de</strong>s<strong>em</strong>penho político – que marcou a diferença<br />

entre Péricles e os outros políticos mais distintos do seu t<strong>em</strong>po.<br />

93 Esta anedota po<strong>de</strong> ter sido retirada <strong>de</strong> uma obra <strong>de</strong> ética ou <strong>de</strong> psicologia.<br />

94 Uma das questões que parecia preocupar Teofrasto (fr. 463 Fortenbaugh) era saber se a<br />

virtu<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser alterada pelo <strong>de</strong>stino ou por outros fatores exteriores, nomeadamente a dor<br />

física. A partir do <strong>caso</strong> <strong>de</strong> Péricles, parece que realmente fatores externos, como o sofrimento<br />

causado pela peste que acabou por vitimar o estadista, foram capazes <strong>de</strong> lhe fazer mudar o<br />

comportamento. De que outro modo – diz Teofrasto – se po<strong>de</strong>ria compreen<strong>de</strong>r que Péricles<br />

181

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!