17.04.2013 Views

O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas

O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas

O homem de Estado ateniense em Plutarco: o caso dos Alcméonidas

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

O <strong>caso</strong> <strong>de</strong> Péricles e Alcibía<strong>de</strong>s<br />

nos primeiros capítulos, o que acarreta consequências para a caracterização<br />

<strong>dos</strong> protagonistas. Com efeito, <strong>Plutarco</strong> <strong>de</strong>dica um largo espaço à infância <strong>de</strong><br />

Alcibía<strong>de</strong>s, para cuja narração se serve <strong>de</strong> inúmeras anedotas. No que respeita<br />

a Péricles, se excluirmos o sonho <strong>de</strong> Agariste (que não po<strong>de</strong> ser propriamente<br />

consi<strong>de</strong>rado alusivo à infância <strong>de</strong> Péricles), tudo o que se refere a esse período<br />

pren<strong>de</strong>-se à educação que o futuro estadista recebeu, sugerindo que a educação<br />

cuidada do lho <strong>de</strong> Xantipo e a menos aprumada <strong>de</strong> Alcibía<strong>de</strong>s tiveram<br />

consequências na formação do caráter <strong>de</strong> ambos. Talvez se possam apontar<br />

dois fatores como justicação para a presença residual <strong>de</strong> anedotas na Vida <strong>de</strong><br />

Péricles: a austerida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ste Alcmeónida, por oposição a Alcibía<strong>de</strong>s, e o facto <strong>de</strong><br />

o sonho <strong>de</strong> Agariste se substituir, <strong>de</strong> certo modo, à função das anedotas 58 , pois<br />

é particularmente sugestivo para a caracterização indireta do lho, <strong>de</strong>ixando<br />

antever a sua importância e maneira <strong>de</strong> ser no futuro. Por outras palavras, este<br />

58 <strong>Plutarco</strong> só não menciona anedotas sobre infância quando elas não exist<strong>em</strong>. Cf. Pelling<br />

(1990: 216). A importância que as anedotas assum<strong>em</strong> na <strong>de</strong>scrição <strong>de</strong> um caráter é mencionada<br />

por <strong>Plutarco</strong> <strong>em</strong> Alex. 1. 2: <br />

<br />

. “n<strong>em</strong> é <strong>de</strong> forma alguma<br />

nas ações mais admiráveis que está a explicação da virtu<strong>de</strong> e do vício. Muitas vezes um pequeno<br />

feito, uma palavra, ou uma anedota reet<strong>em</strong> melhor a imag<strong>em</strong> do caráter do que combates<br />

mortíferos, gran<strong>de</strong>s batalhas e cercos das cida<strong>de</strong>s”. Também Ca. Mi. 24. 1 e 37. 10 sustentam<br />

a mesma i<strong>de</strong>ia: <br />

... ‘se não é conveniente negligenciar os traços <strong>de</strong> caráter mais insignicantes<br />

quando se pinta, por assim dizer o retrato <strong>de</strong> uma alma...’ e <br />

<br />

. ‘enten<strong>de</strong>mos que estes <strong>de</strong>talhes não são menos instrutivos para <strong>de</strong>scobrir<br />

e dar a conhecer um caráter do que as gran<strong>de</strong>s ações públicas, e foi por isso que os relatámos<br />

tão aprofundadamente.’ Embora possam ocorrer <strong>em</strong> qualquer parte <strong>de</strong> uma biograa, costumam<br />

concentrar-se na fase inicial, que <strong>de</strong>senvolve o período da infância (<strong>em</strong>. 2. 1-3, Alex. 4. 8-10. 4,<br />

D<strong>em</strong>etr. 3. 1-4. 5, Ca. Mi. 1. 3 - 3. 10, Cic. 2. 1-5), ou nos momentos que correspon<strong>de</strong>m ao relato<br />

do apogeu da vida <strong>dos</strong> heróis (<strong>em</strong>. 18. 1-9, Lys. 18. 4-19. 6, Cic. 24. 1-27. 6). Este procedimento<br />

correspon<strong>de</strong> ao que faz Heródoto: as suas histórias <strong>de</strong> cção inci<strong>de</strong>m na fase <strong>de</strong> ascensão (orig<strong>em</strong>)<br />

e <strong>de</strong> clímax da vida <strong>dos</strong> monarcas. Quando utiliza este recurso, <strong>Plutarco</strong> não t<strong>em</strong> por objetivo<br />

mostrar como se <strong>de</strong>senvolve o caráter n<strong>em</strong> fazer uma narrativa <strong>dos</strong> primeiros anos <strong>de</strong> vida. É por<br />

essa razão que só muito raramente as anedotas são enunciadas numa sequência cronológica - sobre<br />

as questões <strong>de</strong> cronologia nas Vidas, vi<strong>de</strong> Polman (1974: 169-177). De um modo geral, como<br />

tão b<strong>em</strong> ex<strong>em</strong>plica a Vida <strong>de</strong> Alcibía<strong>de</strong>s, essas breves histórias, <strong>de</strong> origens diversas, encontram-se<br />

justapostas para ilustrar um traço <strong>de</strong> caráter particular; é aquilo a que Pelling (1989: 262-3) chama<br />

integration of characteristics around a trait. No <strong>caso</strong> <strong>de</strong> Alcibía<strong>de</strong>s, o conjunto <strong>dos</strong> <strong>de</strong>zasseis capítulos<br />

iniciais serve ainda para sugerir a diculda<strong>de</strong> – que <strong>Plutarco</strong> parece recordar a cada passo – <strong>de</strong> se<br />

fazer um julgamento moral sobre este Alcmeónida. Tal efeito resulta da forma vaga e difícil <strong>de</strong><br />

seguir <strong>em</strong> que se encontram organiza<strong>dos</strong>, s<strong>em</strong> qualquer nexo cronológico, test<strong>em</strong>unhos literários<br />

diversos. Fica a impressão <strong>de</strong> se estar diante <strong>de</strong> um conjunto pouco harmonioso e contraditório <strong>de</strong><br />

excertos que parec<strong>em</strong> não <strong>de</strong>senhar uma gura coerente. Isso está relacionado com a inconsistência<br />

<strong>de</strong> caráter <strong>de</strong> Alcibía<strong>de</strong>s ( – Alc. 2. 1, – Alc. 16. 9), uma i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong>senvolvida<br />

sobretudo no capítulo 16. Esta inconsistência é muitas vezes vista <strong>em</strong> termos <strong>de</strong> ética <strong>de</strong> género:<br />

o seu comportamento <strong>em</strong> relação à luxúria e ao prazer é consi<strong>de</strong>rado como tipicamente f<strong>em</strong>inino,<br />

mas as suas ambições são masculinas.<br />

173

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!