Download do livro na íntegra - Instituto JCA
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"TUDO COMEÇOU<br />
COM MEIO ÔNIBUS"<br />
JELSON DA COSTA ANTUNES
TUDO COMEÇOU<br />
COM MEIO ÔNIBUS<br />
A HISTÓRIA DO GRUPO <strong>JCA</strong>
TUDO COMEÇOU COM MEIO ÔNIBUS<br />
A HISTÓRIA DO GRUPO <strong>JCA</strong><br />
CONSELHO EDITORIAL DO GRUPO <strong>JCA</strong><br />
Amaury de Andrade<br />
Carlos Otávio de Souza Antunes<br />
Heloísa Hele<strong>na</strong> Antunes de Andrade<br />
Marcelo Garcia Antunes (coorde<strong>na</strong><strong>do</strong>r)<br />
<br />
Editor e diretor: Marino Lobello<br />
Pesquisa, texto e edição: Aline Sasahara<br />
<br />
Revisão: A<strong>na</strong> Lúcia Guimarães Neiva<br />
<br />
Suporte operacio<strong>na</strong>l: Moacir Apareci<strong>do</strong> Rosa da Silva<br />
<br />
Digitalização de arquivos: RR Donnelley<br />
<br />
Rua Pamplo<strong>na</strong>, 1119 – conjunto 73<br />
01405-001 – São Paulo – SP<br />
<br />
11 3289-8133
Este <strong>livro</strong> registra a história das empresas que integram o Grupo <strong>JCA</strong>,<br />
em especial a Auto Viação 1001 e a Viação Cometa, que em 2008 completam<br />
60 anos, e a Auto Viação Catarinense, que neste ano chega aos 80 anos de<br />
existência. É uma oportunidade de olhar para nosso passa<strong>do</strong>, avaliar o presente<br />
e fazer planos para o futuro.<br />
As pági<strong>na</strong>s desta obra representam nosso reconhecimento à trajetória<br />
<strong>do</strong> funda<strong>do</strong>r <strong>do</strong> Grupo <strong>JCA</strong>, Jelson da Costa Antunes, que figura entre os<br />
pioneiros <strong>do</strong> transporte de passageiros no Brasil, e soube imprimir sua marca de<br />
empreende<strong>do</strong>r visionário e determi<strong>na</strong><strong>do</strong> em to<strong>do</strong>s os passos de sua caminhada,<br />
inclusive <strong>na</strong>s ações sociais mantidas pelas empresas <strong>do</strong> Grupo, hoje incorporadas<br />
no <strong>Instituto</strong> <strong>JCA</strong>.<br />
É também uma forma de home<strong>na</strong>gear a to<strong>do</strong>s os homens e mulheres que<br />
vêm participan<strong>do</strong> da construção dessa história que, com seu trabalho, colaboram<br />
to<strong>do</strong>s os dias com a atividade de nossas empresas.<br />
Grupo <strong>JCA</strong>
PATROCINADORES<br />
APOIADORES
Este <strong>livro</strong> é dedica<strong>do</strong> a Jelson da Costa Antunes,<br />
patriarca de nossa família e funda<strong>do</strong>r <strong>do</strong> Grupo <strong>JCA</strong>.
SUMÁRIO<br />
10<br />
52<br />
80<br />
108<br />
132
Enxergan<strong>do</strong> além da curva<br />
10
P<br />
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um dia em que eu estava <strong>na</strong> garagem, ele<br />
chegou e disse:<br />
- ‘Bom dia, Bocaz.’ “...Teve<br />
- ‘Bom dia, seu Jelson’, respondi. E ele:<br />
- ‘Mas você não vai apertar a minha mão?’<br />
- ‘É que eu estou com as mãos muito sujas de graxa!’<br />
- ‘Que é isso, Bocaz?’<br />
E apertou a minha mão suja. Os convida<strong>do</strong>s que estavam com ele, to<strong>do</strong>s arruma<strong>do</strong>s,<br />
de gravata, ficaram meio sem jeito e acabaram fazen<strong>do</strong> o mesmo:<br />
apertaram minha mão suja de graxa…” 1<br />
1 Depoimento de Arlito de Azeve<strong>do</strong>, apelida<strong>do</strong> de Bocaz pelo seu eterno sorriso. Emprega<strong>do</strong><br />
da Auto Viação 1001 desde os tempos <strong>do</strong>s irmãos Cortez, é hoje o funcionário mais<br />
antigo da empresa.<br />
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14
Assim era o seu Jelson, <strong>na</strong> memória<br />
<strong>do</strong>s que ele chamava de “colabora<strong>do</strong>res”, valorizan<strong>do</strong><br />
cada um <strong>do</strong>s emprega<strong>do</strong>s como<br />
parte fundamental da azeitada engre<strong>na</strong>gem<br />
ou da enorme família que formou ao<br />
longo <strong>do</strong>s anos.<br />
E não há quem tenha convivi<strong>do</strong> com<br />
esse fluminense de Itaboraí que não destaque<br />
sua coragem, ousadia, inteligência, visão<br />
arguta. Sua história de vida, que até parece<br />
roteiro de filme, é prova de que não há exagero<br />
nenhum nessas lembranças elogiosas.<br />
<br />
<br />
<br />
Trabalho, trabalho, desde sempre<br />
Em 9 de novembro de 1927, <strong>na</strong>scia Jelson,<br />
o décimo segun<strong>do</strong> <strong>do</strong>s 13 filhos de Maria<br />
das Dores Antunes e de Carlos Ber<strong>na</strong>rdino<br />
Antunes Filho, conheci<strong>do</strong> por to<strong>do</strong>s como<br />
seu Beleza. Desde ce<strong>do</strong>, os filhos aprenderam<br />
que o dia-a-dia era de muito trabalho. Seu<br />
Beleza tinha um armazém, mas não sobrava<br />
dinheiro. Aristeu, o primogênito, logo ce<strong>do</strong><br />
começou a engordar porcos com as laranjas<br />
caídas <strong>do</strong> pomar que havia atrás <strong>do</strong> estabele-<br />
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16<br />
cimento <strong>do</strong> pai. Assim, juntou as economias<br />
com as quais começaria, ainda muito jovem,<br />
seu primeiro negócio.<br />
Aos 8 anos, o menino Jelson já ajudava<br />
no armazém consumi<strong>do</strong> pelas chamas de um<br />
incêndio. E lá foi seu Beleza tocar outra quitanda<br />
no bairro de Neves, em São Gonçalo,<br />
Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio. Diariamente, Jelson tomava<br />
o bonde para abrir o comércio. E, para sustentar<br />
a família, o pai trabalhou também em<br />
botequim e olaria. Com tanta luta, o menino<br />
acabou deixan<strong>do</strong> o banco da escola no terceiro<br />
ano primário.<br />
Do<strong>na</strong> Maria das Dores faleceu quan<strong>do</strong><br />
ele tinha ape<strong>na</strong>s 11 anos, e o pai resolveu que<br />
o melhor seria desfazer a casa da família. To<strong>do</strong>s<br />
foram viver com os irmãos que, de alguma<br />
maneira, já se encontravam estabeleci<strong>do</strong>s.<br />
Jelson foi morar em Niterói com a irmã Elza,<br />
mãe de um único filho, Elmar, que passou a<br />
dividir o quarto com o jovem tio, que praticamente<br />
acabou se tor<strong>na</strong>n<strong>do</strong> um irmão.<br />
O garoto foi trabalhar <strong>na</strong> Viação Cabussú2<br />
, uma firma peque<strong>na</strong> de transporte urbano<br />
de passageiros, de ape<strong>na</strong>s quatro ônibus, em<br />
São Gonçalo. Uma empresa onde Jelson começaria<br />
sua trajetória profissio<strong>na</strong>l, ao la<strong>do</strong> de<br />
Aristeu, o irmão, o amigo, que se tornou seu<br />
guru nesse início de estrada e cujos ensi<strong>na</strong>mentos<br />
o ilumi<strong>na</strong>riam por toda a vida.<br />
Na Cabussú, Jelson foi faxineiro, cobra<strong>do</strong>r<br />
e mecânico. Mas, como aprendiz de<br />
eletricidade, encontrou a profissão em que seria<br />
“bamba”. Aos 17 anos, o rapazinho já era<br />
gerente da empresa e resolveu deixá-la por<br />
uma melhor colocação no merca<strong>do</strong>. Porém,<br />
não aceitava qualquer proposta. Eletricista de<br />
mão cheia, era disputa<strong>do</strong> e, mesmo ainda tão<br />
2 Há certa confusão em torno da grafia <strong>do</strong> nome<br />
da empresa Cabuçú ou Cabussú. Na carteira profissio<strong>na</strong>l<br />
de seu Jelson, no campo de nome da<br />
empresa emprega<strong>do</strong>ra, aparece a versão com “ç”<br />
e no carimbo, com “ss”. Ocorre que existiam duas<br />
empresas homônimas: Cabuçú, no Rio de Janeiro,<br />
e a Cabussú, em São Gonçalo.
jovem, tinha condições de negociar salário.<br />
Ganhava tão bem que podia economizar metade<br />
<strong>do</strong> que recebia. Com o restante, pagava<br />
a pensão onde passou a morar e a lavadeira<br />
que se encarregava de suas roupas. Muito trabalho,<br />
vida simples, dinheiro guarda<strong>do</strong> com<br />
Aristeu, que passou a ser também sua “Caixa<br />
Econômica”. Resulta<strong>do</strong>: aos 18 anos, já com<br />
carteira de motorista e um patrimônio de 15<br />
contos de réis, Jelson associou-se ao irmão<br />
mais velho, que colocou a mesma quantia <strong>na</strong><br />
compra de “Jerico”, apeli<strong>do</strong> carinhoso de seu<br />
primeiro ônibus.<br />
<br />
<br />
<br />
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18<br />
Ou de seu primeiro “meio ônibus”, como<br />
costumava dizer. Agrega<strong>do</strong> à frota da Viação Niterói,<br />
no bairro da Engenhoca, o Chevrolet 1946<br />
com carroceria de madeira ro<strong>do</strong>u com Jelson por<br />
cinco meses e 28 dias, pagou o investimento de<br />
60 contos e, vendi<strong>do</strong> por 110, ainda rendeu o suficiente<br />
para arriscar seu próximo passo. Divididas<br />
as notas promissórias, antes mesmo de completar<br />
19 anos, Jelson da Costa Antunes decidiu seguir o<br />
próprio caminho. Além <strong>do</strong>s 55 contos de réis em<br />
promissórias, juntara uns 700 em dinheiro e chegou<br />
a pensar em comprar um relógio de pulso com<br />
essa quantia. Mas o espírito aventureiro e empreende<strong>do</strong>r<br />
falou mais alto, e o acessório da moda ficou<br />
para outra oportunidade. Seguiu, então, para<br />
Macaé, “a Princesinha <strong>do</strong> Atlântico” 3 , adquirir a<br />
Viação Líder.<br />
<br />
Ocorrera de, numa viagem especial feita ainda<br />
com a velha jardineira, Jelson ter se impressio<strong>na</strong><strong>do</strong><br />
com um ônibus que vira lavan<strong>do</strong>. Investigou<br />
e descobriu o proprietário, pessoa conhecida<br />
3 Município situa<strong>do</strong> no norte fluminense, Macaé é<br />
banha<strong>do</strong> à leste pelo Oceano Atlântico. Pela posição<br />
geográfica e diversidade de atrativos <strong>na</strong>turais – praias,<br />
ilhas, serras, rios, cachoeiras, manguezais e lagoas –<br />
é conheci<strong>do</strong> como “Princesinha <strong>do</strong> Atlântico” (www.<br />
overmun<strong>do</strong>.com.br).
<strong>na</strong> cidade. A Líder era exatamente <strong>do</strong> que<br />
precisava: uma empresa <strong>do</strong> tamanho de suas<br />
economias, com um único ônibus. Único,<br />
mas inteirinho seu. Ape<strong>na</strong>s avalisa<strong>do</strong> pelo<br />
irmão, fez a compra. O ônibus era to<strong>do</strong> de<br />
Jelson, e Jelson era tu<strong>do</strong> <strong>do</strong> ônibus: chofer,<br />
cobra<strong>do</strong>r, mecânico, eletricista. Com a caixa<br />
de ferramentas sempre à mão, se o carro<br />
enguiçasse pelas estradas de terra, assumia<br />
a função de mecânico e resolvia o problema<br />
para, em seguida, assumir o volante. Eram<br />
tempos duros de ainda poucos recursos, de<br />
investimento de cada minuto <strong>do</strong> dia para<br />
que as coisas dessem certo.<br />
Ainda em Niterói, Jelson casou-se<br />
com Cecília Vargas de Souza e, aos 23 anos,<br />
já era pai de Heloísa Hele<strong>na</strong>. Menos de um<br />
ano depois, <strong>na</strong>scia Carlos Otávio. De início,<br />
o casal morou com a irmã mais velha de Cecília,<br />
Dinorah, casada com João. O trabalho<br />
exigia tanta dedicação que os tios, também<br />
padrinhos da meni<strong>na</strong> Heloísa, praticamente<br />
a criaram até os 8 anos.<br />
Jelson não podia se dar ao luxo de<br />
errar. Mas, se o empresário-faz-tu<strong>do</strong> era<br />
competente e trabalha<strong>do</strong>r, também não<br />
lhe faltava sorte. No tempo em que chegou<br />
a Macaé, acontecia no município o alistamento<br />
militar, e muitos <strong>do</strong>s jovens vinham<br />
de Quissamã, justamente o trajeto coberto<br />
pelo ônibus de Jelson. Carro cheio, gente<br />
em pé, vai e vem, vem e vai, e, sen<strong>do</strong> Jelson<br />
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20<br />
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o patrão e “os funcionários” da Viação Líder,<br />
to<strong>do</strong> o dinheiro que entrava ficava com ele. O<br />
onibuzinho enfrentava valente os buracos da<br />
estrada. E, ainda que a empresa fosse peque<strong>na</strong>,<br />
o olhar <strong>do</strong> empresário mirava lá adiante e<br />
encarava o desafio. Assim, os ganhos foram<br />
investi<strong>do</strong>s <strong>na</strong> aquisição de uma segunda linha.<br />
Além de Macaé - Quissamã, a Líder passou a<br />
fazer Macaé - Conceição de Macabu, rodan<strong>do</strong><br />
pela área de restinga com um ônibus garimpa<strong>do</strong><br />
num ferro-velho e reforma<strong>do</strong> de ponta<br />
a ponta pelo habili<strong>do</strong>so motorista-cobra<strong>do</strong>reletricista-mecânico-empresário.<br />
O senso de<br />
oportunidade guiou seus passos. Na Macaé<br />
<strong>do</strong>s mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s anos 1940, em ple<strong>na</strong> zo<strong>na</strong><br />
rural, viajar era sinônimo de boléia de caminhão.<br />
O ônibus chegou como uma espécie de<br />
luxo, mais rápi<strong>do</strong> e confortável. Um sucesso!<br />
A aquisição da terceira linha foi mais um<br />
lance certeiro. Em Tapera, distrito de Trajano<br />
de Morais, iniciara-se, em 1939, a construção<br />
de uma usi<strong>na</strong> hidrelétrica. A distribuição de
energia elétrica era muito instável <strong>na</strong> região,<br />
e a Usi<strong>na</strong> Macabu foi erguida como a solução<br />
para o problema da falta de luz. O fato é que<br />
aquele pedaço de mun<strong>do</strong>, no interior <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong><br />
<strong>do</strong> Rio de Janeiro, fervia: havia emprego,<br />
havia dinheiro, havia futuro. Assim a linha<br />
Macaé - Tapera tinha tu<strong>do</strong> para engre<strong>na</strong>r, embora<br />
fossem 48 quilômetros de estrada ruim.<br />
Uma serra da<strong>na</strong>da de subir. E deu certo. Mas<br />
não foi assim tão fácil, já que nem to<strong>do</strong> mun<strong>do</strong><br />
gostou da chegada de alguém que oferecia<br />
um transporte adequa<strong>do</strong> e regular.<br />
Naquele tempo, não havia ônibus por ali<br />
e era preciso tomar o trem até o Glicério e, de<br />
lá, seguir de caminhão, ao relento, até Tapera.<br />
Uns e outros que transportavam passageiros<br />
em caminhões e ganhavam um dinheirinho<br />
“por fora” se incomodaram – e muito! Tentaram<br />
jogar areia nos planos de Jelson, colocan<strong>do</strong><br />
açúcar no motor <strong>do</strong> ônibus, que fundiu.<br />
Enorme <strong>do</strong>r de cabeça e prejuízo! De olhos<br />
bem abertos depois da péssima experiência,<br />
o empresário passou a deixar o carro durante<br />
a noite em frente ao hotel onde se instalara,<br />
com o motor tranca<strong>do</strong> a cadea<strong>do</strong>.<br />
Porém, os dirigentes da Comissão Central<br />
de Macabu viram <strong>na</strong> empresa de Jelson<br />
o progresso se aproximan<strong>do</strong>. Numa noite,<br />
jantan<strong>do</strong> no mesmo restaurante em que se<br />
encontrava o jovem, Dr. Talmo, gerente <strong>do</strong><br />
empreendimento, e o General Hélio Mace<strong>do</strong><br />
Soares, diretor da comissão e irmão <strong>do</strong> en-<br />
tão gover<strong>na</strong><strong>do</strong>r <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio de Janeiro,<br />
aproximaram-se de sua mesa para comunicar<br />
que, <strong>do</strong> dia seguinte em diante, o transporte<br />
de passageiros por caminhão estaria proibi<strong>do</strong><br />
e que caberia a ele assumir a tarefa. Nessa<br />
época, Jelson não era mais o único a trabalhar<br />
<strong>na</strong> Viação Líder, que prosperava, mas<br />
tinha só um ônibus para cada linha. Se um<br />
deles quebrasse, a linha parava. E a responsabilidade<br />
era imensa.<br />
<br />
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22<br />
Foi então que resolveu<br />
comprar um motor novo e consultou<br />
seu conselheiro, Aristeu.<br />
O irmão foi contra e, como o<br />
negócio de Jelson literalmente<br />
caminhava muito bem, convenceu-o<br />
de que melhor seria ter<br />
um ônibus novo. O custo? 103<br />
contos de réis! Jelson fez o negócio<br />
<strong>na</strong> Mesbla Veículos, em<br />
Niterói, onde Aristeu tinha um<br />
bom amigo que facilitou a compra.<br />
Sensação <strong>na</strong> pacata Macaé:<br />
Jelson entran<strong>do</strong> <strong>na</strong> cidade com<br />
um ônibus novinho, o primeiro<br />
que já rodara por aquelas ruas.<br />
E o veículo virou atração <strong>na</strong> cidade<br />
e, como um táxi de luxo,<br />
passou a ser contrata<strong>do</strong> para<br />
levar convida<strong>do</strong>s a casamentos,<br />
aniversários e eventos <strong>do</strong>s mais<br />
varia<strong>do</strong>s. Jelson acertara mais<br />
uma vez, e o lugarejo já não<br />
comportava mais tantos sonhos<br />
e determi<strong>na</strong>ção. “Macaé ficou<br />
peque<strong>na</strong> para a minha cabeça…”,<br />
refletia o jovem empresário.<br />
A Viação Líder já era o<br />
segun<strong>do</strong> maior negócio <strong>do</strong> município,<br />
ape<strong>na</strong>s atrás da Usi<strong>na</strong><br />
Macabu. E ele queria crescer.<br />
Fez uma proposta aos <strong>do</strong>nos
da 1001 para adquirir a linha<br />
Macaé - Niterói. Queria<br />
levar a Líder até lá. Mas os<br />
irmãos Cortez não quiseram<br />
negociar. O caminho<br />
para expandir tinha de ser<br />
outro. Em Macaé, a família<br />
fora praticamente a<strong>do</strong>tada<br />
por um casal, seu José Lins<br />
e <strong>do</strong><strong>na</strong> Eneida, que os queria<br />
mesmo como filhos. No dia<br />
em que Jelson contou a seu<br />
José sobre o desejo de deixar<br />
a cidade, o homem perdeu o<br />
sono. Achava uma loucura o<br />
“filho” abrir mão da posição<br />
de destaque que conseguira<br />
em tão curto espaço de tempo.<br />
Mas, mesmo contrarian<strong>do</strong><br />
pessoas queridas, Jelson<br />
voltou para Niterói. Agora,<br />
já capitaliza<strong>do</strong>, foi comprar<br />
a Viação Niterói, a mesma a<br />
que fora agrega<strong>do</strong>, <strong>na</strong> Engenhoca.<br />
A frota da Niterói já<br />
era então de onze ônibus velhos,<br />
que faziam a linha Niterói<br />
- Largo da Morte. Jelson<br />
conseguira acertar o passo,<br />
mais uma vez. Porém, não<br />
estava satisfeito com o lugar.<br />
Queria mudar e ir além…<br />
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24<br />
Do<strong>na</strong> Cilinha<br />
“M<br />
inha baixinha”. Era assim que seu Jelson chamava<br />
Cecília, sua grande companheira de estrada da<br />
vida. Nos tempos em que era preciso que o futuro grande<br />
empresário deitasse no chão sujo de graxa para consertar<br />
seu único ônibus, não deixava de levar a marmita com a<br />
comidinha bem caseira, <strong>do</strong> jeitinho que ele gostava. Porque,<br />
mesmo com tanta luta, trabalhan<strong>do</strong> dia e noite, Jelson<br />
reservava tempo para a sagrada refeição. E também<br />
para dançar. Pé-de-valsa, apesar <strong>do</strong>s poucos recursos, tinha<br />
sempre o dinheirinho para ir ao clube calçan<strong>do</strong> sapatos<br />
de pelica. Mas Cecília não gostava de dançar nem de<br />
seu nome, da<strong>do</strong> pela irmã mais velha, Dinorah, em home<strong>na</strong>gem<br />
a uma vizinha muito bonita. Daí que, desde ce<strong>do</strong>,<br />
Cecília ficou sen<strong>do</strong> Cilinha.<br />
Conheceram-se em 1949, em frente à casa de Dinorah,<br />
em São Gonçalo, onde a moça morava. Foram apresenta<strong>do</strong>s<br />
por um amigo em comum, estudante de medici<strong>na</strong>.<br />
Daquele encontro saiu o <strong>na</strong>moro, sempre sob o olhar<br />
cuida<strong>do</strong>so da irmã. O <strong>na</strong>moro foi curto, porque o jovem<br />
empreende<strong>do</strong>r já começava os negócios em Macaé e precisava<br />
se mudar. Mas a união foi dura<strong>do</strong>ura: 49 anos.<br />
Assim como seu esposo, <strong>do</strong><strong>na</strong> Cilinha é sempre lembrada<br />
com belos adjetivos: querida, simples, generosa,<br />
dócil, agrega<strong>do</strong>ra. Talvez tenha si<strong>do</strong> esta última a característica<br />
que lhe garantiu como grande lega<strong>do</strong> uma família<br />
unida, respeitosa, família de verdade. Convocava to<strong>do</strong>s<br />
para encontros que fizeram toda a diferença <strong>na</strong> formação<br />
desse núcleo forte, que hoje reúne a segunda e terceira gerações<br />
da família <strong>na</strong> condução <strong>do</strong> Grupo <strong>JCA</strong>, construí<strong>do</strong><br />
com tanta luta pelos jovens Jelson e Cilinha.
25
26<br />
Um São João <strong>na</strong> estrada<br />
Foi no tempo em que Jelson era tu<strong>do</strong>:<br />
motorista, cobra<strong>do</strong>r, mecânico, eletricista<br />
e <strong>do</strong>no <strong>do</strong> negócio. Quem conta<br />
o episódio é o advoga<strong>do</strong> Re<strong>na</strong>to Justo,<br />
testemunha e perso<strong>na</strong>gem.<br />
Era 24 de junho de 1949 ou 50.<br />
Noite de São João. O jovem Re<strong>na</strong>to Justo<br />
tomou em Quissamã o carro de Jelson,<br />
que o levaria a Macaé. Ia to<strong>do</strong> arruma<strong>do</strong>,<br />
<strong>na</strong> maior animação para encontrar<br />
uma moça bonita a quem pretendia <strong>na</strong>morar.<br />
No entanto, quis o destino que,<br />
pouco antes de chegar a Quissamã, desabasse<br />
um enorme temporal. Estrada<br />
de terra, o Jerico atolou e não houve<br />
meios de ir adiante. Os passageiros desembarcaram<br />
e termi<strong>na</strong>ram o percurso<br />
a pé. Mas, Re<strong>na</strong>to, elegante que estava,<br />
não quis amassar barro até a festa e passou<br />
a noite dentro <strong>do</strong> ônibus com Jelson.<br />
De manhã ce<strong>do</strong>, termi<strong>na</strong>da a chuvarada<br />
e ajuda<strong>do</strong>s por outras pessoas, tiraram<br />
<strong>do</strong> atoleiro o onibuzinho. Foram, então,<br />
fazer um lanche. “Pedimos uma gasosa,<br />
um refrigerante que se fazia em Macaé,<br />
e um salame horroroso, pendura<strong>do</strong> num<br />
barbante.” Re<strong>na</strong>to Justo perdeu a <strong>na</strong>morada,<br />
mas ganhou um grande amigo.<br />
“O empresário deve ter, entre outras, duas<br />
<br />
Palavras de Jelson da Costa Antunes que as comprovou, <strong>na</strong><br />
prática, <strong>na</strong> condução da própria trajetória de vida. Menino<br />
pobre, órfão de mãe aos 11 anos e com escolarização até o terceiro<br />
ano primário, tornou-se grande <strong>do</strong>no de um <strong>do</strong>s maiores<br />
grupos de transporte ro<strong>do</strong>viário <strong>do</strong> Brasil.<br />
Insatisfeito com a Viação Niterói, Jelson precisava se capitalizar<br />
para arriscar um novo lance. Atento, enxergou a oportunidade.<br />
Nos anos 1950, as estradas brasileiras eram muito ruins,
os equipamentos, piores ainda, e os ônibus também<br />
ficavam a desejar. Quem tinha capital para<br />
investir, passava longe <strong>do</strong> setor. Assumir uma<br />
linha e constituir uma frota para atendê-la era<br />
quase que um favor que se prestava à administração<br />
pública. Não havia qualquer burocracia para<br />
obter a concessão. Era solicitar e pronto. Surgia<br />
a chance de ocupar um nicho <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> e, dentro<br />
dele, crescer. Jelson passou a formar cooperativas<br />
de transporte, estruturá-las e vendê-las.<br />
Reuniu cinco sócios em torno da Viação Niterói<br />
e vendeu a cada um deles três ônibus. Foi avalista<br />
desses sócios e, organizada a cooperativa, saiu<br />
<strong>do</strong> negócio com capital <strong>do</strong>bra<strong>do</strong>. Era operação de<br />
risco. Sen<strong>do</strong> avalista de cada sócio escolhi<strong>do</strong>, assumia<br />
toda a responsabilidade. Mas tu<strong>do</strong> dan<strong>do</strong><br />
certo, ele cresceria e muito.<br />
Claro que Jelson prosseguiu, e a segunda<br />
cooperativa foi a Nova Cidade. Vieram ainda a<br />
Barro Vermelho e a Viação Brasília. Com ape<strong>na</strong>s<br />
27 anos, Jelson já era conheci<strong>do</strong> e respeita<strong>do</strong><br />
como empresário <strong>do</strong> transporte coletivo. Tinha<br />
nome e capital. Pôde, então, escolher onde<br />
investir para constituir a própria empresa, sem<br />
sócios, sem cooperativa. Assim <strong>na</strong>sceu, em 1955,<br />
a Auto-Ônibus São José. Nessa operação, Jelson<br />
demonstrava, mais uma vez, ser um homem de<br />
visão ao operar um trajeto que passava por fora<br />
<strong>do</strong> centro de São Gonçalo, por meio de uma estrada<br />
ainda virgem, a ser desbravada. Cresceu<br />
ali um novo merca<strong>do</strong>, e a São José cresceu junto,<br />
sem concorrência.<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
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28
A região de Alcântara, Jardim Catari<strong>na</strong> e<br />
Boa Vista <strong>do</strong> Laranjal crescia, e mais uma vez o<br />
homem de espírito empreende<strong>do</strong>r enxergou ali<br />
nova oportunidade. Futuro. A São José começou<br />
com 16 carros, que faziam as linhas São José -<br />
Alcântara e Alcântara - Niterói. E, mesmo ten<strong>do</strong><br />
prospera<strong>do</strong> muito, Jelson continuava a fazer de<br />
tu<strong>do</strong> <strong>na</strong> empresa. Chegava pela manhã, vestia<br />
seu macacão e atendia a vende<strong>do</strong>res, mexia <strong>na</strong><br />
mecânica, pintava e ensi<strong>na</strong>va o trabalho aos funcionários<br />
novatos. A parte elétrica ficava toda<br />
por sua conta. Quan<strong>do</strong> tinha de assi<strong>na</strong>r algum<br />
<strong>do</strong>cumento <strong>na</strong> ofici<strong>na</strong>, limpava as mãos sujas de<br />
graxa com estopa, cuidan<strong>do</strong> para não manchar o<br />
papel. Naquele tempo, o comum era reformar os<br />
carros e só comprar novos quan<strong>do</strong> absolutamente<br />
necessário. Retirava-se a carroceria, o chassi<br />
era inteiramente repara<strong>do</strong>, passava por pintura<br />
e seguia para ser encarroça<strong>do</strong>. No fim de 1962,<br />
Jelson trouxe da Alemanha uma máqui<strong>na</strong> para<br />
recuperação de bombas injetoras, a primeira em<br />
terreno fluminense.<br />
Em 1963, menos de oito anos depois, a<br />
Auto-Ônibus São José já era a maior empresa<br />
de ônibus de to<strong>do</strong> o Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio de Janeiro,<br />
com 68 carros. E Jelson era o maior empresário<br />
<strong>do</strong> setor com ape<strong>na</strong>s 36 anos. Já tinha recursos<br />
para construir uma garagem própria, modelo<br />
<strong>na</strong> época, e o fez no Laranjal. Já comprara novos<br />
ônibus como forma de investimento e até<br />
14º salário podia oferecer a seus melhores funcionários.<br />
Aposentou o macacão.<br />
<br />
29
30
No entanto, o proprietário da São<br />
José começava a enxergar no transporte<br />
coletivo ro<strong>do</strong>viário uma possibilidade<br />
mais tranqüila de oferecer bons serviços.<br />
Muito organiza<strong>do</strong>, o administra<strong>do</strong>r <strong>na</strong>to<br />
traçou metas. Planejou uma transição<br />
<strong>do</strong> urbano para o ro<strong>do</strong>viário ao longo de<br />
vinte anos, fosse trocan<strong>do</strong> empresas urba<strong>na</strong>s<br />
por ro<strong>do</strong>viárias, fosse compran<strong>do</strong><br />
novas ro<strong>do</strong>viárias e venden<strong>do</strong> urba<strong>na</strong>s.<br />
Ainda em 1963, fun<strong>do</strong>u a Vispan,<br />
que fazia a linha Niterói - São Paulo, em<br />
<strong>do</strong>is horários. Na antiga garagem no Alcântara,<br />
com a mudança da São José para<br />
o Laranjal, Jelson montou uma revenda<br />
Volkswagen, a Casal.<br />
A Transportes Ivanir, que a fazia<br />
linha Araruama - Niterói, foi adquirida<br />
em 1964, e muitos bons negócios ainda<br />
seriam fecha<strong>do</strong>s <strong>na</strong>quela década de 1960.<br />
Foi também nesse perío<strong>do</strong> que Jelson embarcou<br />
pela primeira vez para o exterior.<br />
Voou para a Europa. E ele a<strong>do</strong>rava voar. 4<br />
4 Seu Jelson a<strong>do</strong>rava viajar e tinha verdadeira<br />
paixão pela aviação. Contava que só não<br />
seguiu essa carreira porque, quan<strong>do</strong> obteve<br />
uma vaga <strong>na</strong> antiga Cruzeiro, o salário era<br />
insuficiente para o custeio de suas necessidades<br />
básicas de moradia e transporte.<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
31
32<br />
<br />
Essas sábias palavras, aplicadas <strong>na</strong> prática diária de<br />
seu Jelson, eram repetidas por ele a seus colabora<strong>do</strong>res<br />
mais próximos, desde os tempos da São José.<br />
Andar à toa, mas atento. E não são poucos os relatos<br />
que atestam essa quase mania <strong>do</strong> empresário de estar<br />
sempre rodan<strong>do</strong> e observan<strong>do</strong> os movimentos da empresa,<br />
fosse pela estrada, <strong>na</strong>s ro<strong>do</strong>viárias, onde tivesse<br />
ônibus. Discipli<strong>na</strong> e qualidade de serviço era o que ele<br />
queria ver e agia de forma enérgica quan<strong>do</strong> percebia<br />
displicência em qualquer setor. Funcionários de outras<br />
empresas chamavam a São José de “quartel”, mas to<strong>do</strong>s<br />
queriam trabalhar lá. Motorista admiti<strong>do</strong> <strong>na</strong> empresa<br />
passava pelas ofici<strong>na</strong>s onde lhe era oferecida uma visão<br />
geral da mecânica <strong>do</strong> carro que conduziria: olhava o<br />
ônibus por baixo, o sistema de freio, direção, câmbio.<br />
Seu Jelson, sempre com um papelzinho no bolso,<br />
fazia anotações pelo caminho. Chegava à empresa e,<br />
se tivesse visto algum motorista fazen<strong>do</strong> algo erra<strong>do</strong><br />
pela rua, mandava logo chamar para um pito bem da<strong>do</strong>.<br />
Houve vezes em que fez parar o ônibus, sentou-se no<br />
banco <strong>do</strong> motorista e conduziu o carro até o fi<strong>na</strong>l da<br />
viagem. O sobrinho Elmar, <strong>na</strong> casa de quem morara ao<br />
deixar Itaboraí, e que ce<strong>do</strong> convidara a trabalhar consigo,<br />
lembra que seu Jelson também cansou de pegar<br />
passageiro <strong>na</strong> estrada. “Vinha o ônibus e não pegava o<br />
passageiro, ele pegava o passageiro no carro dele, cercava<br />
o ônibus, mandava parar e embarcava o passageiro.<br />
E aquele motorista já sabia que, quan<strong>do</strong> chegasse à empresa,<br />
ia direto para o refrigera<strong>do</strong>”. E o que seria esse re-<br />
frigera<strong>do</strong>? Nada mais, <strong>na</strong>da menos que a sala <strong>do</strong> patrão,<br />
a única da empresa com ar-condicio<strong>na</strong><strong>do</strong>. Era lá que o<br />
empresário passava as descomposturas.<br />
Às vezes seu Jelson perdia o sono e, de madrugada,<br />
3, 4 horas da manhã, ia para a descida da caixa<br />
d’água, ponto de estratégica visão. Parava seu carro<br />
meio escondi<strong>do</strong> debaixo de uma árvore e ali ficava, só<br />
ven<strong>do</strong> os ônibus descerem. Quanto motorista foi flagra<strong>do</strong><br />
ali, em alta velocidade! Seu Jelson fazia o papel <strong>do</strong><br />
“pardal” <strong>do</strong>s dias de hoje.<br />
E <strong>na</strong> ro<strong>do</strong>viária? Era comum que se sentasse num<br />
banco, discreto, e observasse o movimento, puxasse<br />
conversa com um ou outro passageiro, averiguan<strong>do</strong> a<br />
qualidade <strong>do</strong> serviço. Ninguém imagi<strong>na</strong>va que aquele<br />
senhor no meio da estação, altas horas da noite, fosse o<br />
proprietário da São José, mais tarde, da 1001 e, ao fi<strong>na</strong>l<br />
da vida, de um vasto império.<br />
Caso interessante que ilustra toda essa atenção e<br />
cuida<strong>do</strong> é o da contratação de um antigo motorista da<br />
Auto-Ônibus São José, Agostinho Magalhães. Na época,<br />
a Viação ABC fazia a linha Alcântara - Niterói por<br />
dentro de São Gonçalo e, chegan<strong>do</strong> ao Alcântara, havia<br />
uma ponte por onde passava ape<strong>na</strong>s um veículo por vez.<br />
As regras de trânsito ali eram o bom senso e a educação,<br />
já que a pista tinha de ser revezada. Moran<strong>do</strong> então no<br />
Porto da Pedra, seu Jelson passava por ali várias vezes<br />
ao dia. E observava…<br />
Na empresa, era ele mesmo quem aplicava os testes<br />
aos candidatos a motorista. Por ocasião de um desses<br />
testes, seu Jelson bateu os olhos nos candidatos pré-selecio<strong>na</strong><strong>do</strong>s<br />
e lá se foram to<strong>do</strong>s para a jor<strong>na</strong>da <strong>na</strong> estrada.<br />
Um por um, foram assumin<strong>do</strong> o volante, obedecen<strong>do</strong> às
instruções. Até que ao penúltimo motorista<br />
seu Jelson solicitou que parasse o carro no primeiro<br />
acostamento, concluin<strong>do</strong> a batelada de<br />
testes. E houve certo desconforto porque, afi<strong>na</strong>l,<br />
um <strong>do</strong>s candidatos tinha si<strong>do</strong> ignora<strong>do</strong> e<br />
estava lá quietinho, sem entender o porquê da<br />
discrimi<strong>na</strong>ção ou <strong>do</strong> esquecimento. Foi então<br />
que seu Jelson perguntou: “Vocês perceberam<br />
que eu não chamei um <strong>do</strong>s candidatos? Não o<br />
chamei porque ele já está aprova<strong>do</strong>. Acontece<br />
que cerca de um mês atrás, quan<strong>do</strong> vinha <strong>do</strong><br />
Alcântara para cá, ia embicar <strong>na</strong> ponte quan<strong>do</strong><br />
vi que um ônibus da ABC se aproximava. Pa-<br />
rei e fiz si<strong>na</strong>l para que viesse. O motorista, no<br />
entanto, parou e deu si<strong>na</strong>l de luz para que eu<br />
seguisse. E eu não estava com meu carro, que é<br />
conheci<strong>do</strong>. Estava com o carro de minha esposa,<br />
e Fusca é tu<strong>do</strong> igual.<br />
Eu passei, agradeci e<br />
guardei sua fisionomia.<br />
E, por acaso, é aquele<br />
senhor ali.” Toda a família<br />
de seu Agostinho<br />
Magalhães passou pela<br />
empresa, de onde ele só<br />
saiu ao falecer.<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
o refrigera<strong>do</strong><br />
<br />
33
34<br />
Fechan<strong>do</strong> os anos 1960 com chave de ouro<br />
Foram <strong>do</strong>is meses passean<strong>do</strong> pela Europa e<br />
Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, <strong>na</strong> companhia <strong>do</strong> concunha<strong>do</strong><br />
e amigo João, comemoran<strong>do</strong> os largos<br />
passos da<strong>do</strong>s nos últimos tempos. Ao retor<strong>na</strong>r<br />
ao Brasil, encontrou a empresa ainda maior. A<br />
São José havia si<strong>do</strong> convidada pelo Departamento<br />
de Estradas de Rodagem para atender a uma<br />
nova linha que ligaria o Jardim Catari<strong>na</strong> a Niterói.<br />
Jelson assumiu a empreitada com dez carros<br />
novinhos que enfrentavam uma estrada que<br />
era puro buraco. A linha Catari<strong>na</strong> - Alcântara se<br />
somaria às já regulares Alcântara - Niterói, Marambaia<br />
- Niterói, Alcântara - Niterói (para<strong>do</strong>r e<br />
direto) e São José <strong>do</strong> Itaboraí - Alcântara.<br />
A Expresso Rio Bonito e a Expresso Itaboraí<br />
foram adquiridas em 1967. Com a primeira,<br />
vinha a linha Rio Bonito - Niterói e, com a segunda,<br />
Itaboraí - Niterói.<br />
Mas o maior negócio da década e verdadei-<br />
<br />
ro marco nessa história de conquistas ainda seria<br />
fecha<strong>do</strong>, em 1968. Começou com a tentativa<br />
de adquirir mais uma linha, de Cabo Frio, que<br />
pertencia à empresa <strong>do</strong>s irmãos Cortez. A Auto<br />
Viação 1001, no Fonseca, não andava muito bem<br />
de saúde, e Jelson acreditou que não teria dificuldades<br />
em comprar o que queria. Mas o que ele<br />
não esperava é que os proprietários dissessem<br />
que não só lhe vendiam aquela linha, mas toda a<br />
companhia. Era pegar ou largar! Jelson enfrentou<br />
a parada: “Quanto o senhor quer pela empresa?”.<br />
Não havia a quantia pedida, em caixa, mas<br />
Jelson não se apertou. Negociou um si<strong>na</strong>l e pediu<br />
prazo para completar a entrada. Assinou os<br />
papéis e correu para cobrir o cheque da<strong>do</strong>. Fora<br />
comprar uma linha, saíra <strong>do</strong>no de uma empresa<br />
com cerca de 200 carros. Adquiriu a empresa<br />
fechada, com to<strong>do</strong>s os carros e funcionários e,<br />
assumin<strong>do</strong> os negócios no dia seguinte, não deixou<br />
de rodar um minuto sequer. A 1001 agora<br />
pertencia a Jelson da Costa Antunes.
35
36<br />
Naquela ocasião a empresa fazia, além<br />
da almejada linha Cabo Frio - Niterói, a Araruama<br />
- Niterói e a Saquarema - Niterói. Mas,<br />
apesar <strong>do</strong> tamanho, não estava em boa forma.<br />
O novo proprietário investiu numa frota<br />
nova, ergueu a 1001 e escolheu seu nome<br />
como marca para a organização que, em 1969,<br />
fundiria todas as suas empresas, otimizan<strong>do</strong><br />
a administração. Cada uma tinha a própria<br />
garagem e contava com um centro técnico<br />
instala<strong>do</strong> <strong>na</strong> Travessa Luís Paulino, conheci<strong>do</strong><br />
como “ofici<strong>na</strong> central”, que dava suporte<br />
geral <strong>na</strong> parte mecânica. Lá ficava o almoxarifa<strong>do</strong>,<br />
onde eram feitas as compras e reformas<br />
de componentes para todas as empresas.<br />
Nascia, então, a Auto Viação 1001 S.A.<br />
Com jeito de fi<strong>na</strong>l feliz, esse era só o<br />
começo de uma nova fase de investimentos<br />
e conquistas. Jelson, com seu “olhar além da<br />
curva”, seguiria atento às oportunidades <strong>do</strong><br />
merca<strong>do</strong>, sempre segun<strong>do</strong> seus planos que<br />
envolviam uma grande preocupação com a<br />
logística. Não lhe interessavam empreen-
dimentos que desviassem o foco <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> que já<br />
<strong>do</strong>mi<strong>na</strong>va. Nos anos seguintes, ao longo das décadas<br />
de 1970 e 1980, os negócios cresceram muito. Jelson<br />
adquiriu diversas linhas <strong>na</strong> região, das empresas Útil,<br />
Salutáris, Natividade, Rio Minho, Brasil e União.<br />
Determi<strong>na</strong><strong>do</strong> a migrar totalmente para o transporte<br />
ro<strong>do</strong>viário, em 1982, o setor urbano da empresa<br />
era vendi<strong>do</strong>, e a Auto Viação 1001 S.A. chegava também<br />
à Região da Zo<strong>na</strong> da Mata de Mi<strong>na</strong>s Gerais ao<br />
comprar a Citran, que ligava o Rio de Janeiro a Além<br />
Paraíba, Carmo, Cataguases, Muriaé, Manhumirim,<br />
Manhuaçu e Valadares.<br />
Em 1989, foi compra<strong>do</strong> o Ro<strong>do</strong>porto Oásis, um<br />
ponto de apoio de estrada <strong>na</strong> BR-101, em Casimiro de<br />
Abreu. Nesse tempo, toda a estrutura administrativa<br />
e de manutenção já estava reunida <strong>na</strong> grande sede<br />
construída para esse fim, i<strong>na</strong>ugurada em 1979. Fora<br />
a realização de um sonho de Jelson. E, sua nova meta<br />
era, então, estender o negócio rumo ao Sul <strong>do</strong> país.<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
37
Anos 1990: Jelson da Costa Antunes<br />
alcança o sul <strong>do</strong> Brasil e mais<br />
Omenino Jelson, que ce<strong>do</strong> deixara a escola<br />
e abraçara o trabalho, embora sonhasse<br />
alto, certamente não poderia imagi<strong>na</strong>r<br />
quanto conquistaria ao longo da vida. Aos<br />
63 anos, podia olhar para trás e afirmar, sem<br />
me<strong>do</strong> de errar, que era um vence<strong>do</strong>r. Sempre<br />
respeitan<strong>do</strong> a história e a competência das<br />
empresas que adquiria, ensi<strong>na</strong>n<strong>do</strong> novas práticas,<br />
aprenden<strong>do</strong> o que havia de bom e, humildemente,<br />
incorporan<strong>do</strong> o conhecimento<br />
adquiri<strong>do</strong> ao cotidiano das demais empresas.<br />
38
39
Mas a perspicácia e ousadia desse homem ainda trariam muitas<br />
surpresas ao merca<strong>do</strong>. O grupo queria crescer, e surgiu a<br />
oportunidade de comprar a tradicio<strong>na</strong>l Viação Catarinense,<br />
em 1995. A negociação não foi fácil, as partes não se acertaram.<br />
Porém, seu Jelson não saíra de casa para voltar de mãos<br />
vazias. Saíra para comprar uma empresa no sul e seguiu para<br />
o interior de São Paulo, onde a Rápi<strong>do</strong> Ribeirão Preto estava<br />
à venda. Fechou o negócio e, decorri<strong>do</strong>s cerca de trinta dias,<br />
os proprietários da Catarinense voltaram a chamá-lo para<br />
uma nova conversa. Já ten<strong>do</strong> compra<strong>do</strong> a companhia de São<br />
Paulo, seu Jelson se encontrava em posição mais confortável<br />
para fazer a oferta. E tu<strong>do</strong> deu certo... Mais uma vez.<br />
41
42<br />
Em 1998, uma novidade. O grupo<br />
participava <strong>do</strong> processo de licitação da<br />
concessão <strong>do</strong> transporte por barcas Rio<br />
de Janeiro - Niterói, em consórcio com<br />
mais quatro empresas, e vencia. A empresa,<br />
até então estatal, encontrava-se<br />
bastante deteriorada e exigiu grande<br />
investimento para passar a operar<br />
adequadamente. Hoje, o Grupo <strong>JCA</strong><br />
é acionista majoritário da Barcas<br />
S.A., que faz a travessia por duas<br />
rotas que ligam a estação carioca<br />
da Praça XV às estações de Niterói<br />
<strong>na</strong> Praça Araribóia, <strong>na</strong> região<br />
central, e no bairro de Charitas.<br />
Faz também as rotas Cocotá -<br />
Praça 15, Paquetá - Praça XV,<br />
Mangaratiba - Ilha Grande e<br />
Angra <strong>do</strong>s Reis - Ilha Grande,<br />
as duas últimas compon<strong>do</strong> a<br />
chamada “divisão sul”.
43
44<br />
Mas a aquisição da mítica Viação Cometa, em<br />
2002, talvez tenha si<strong>do</strong> o ato de seu Jelson que mais<br />
impactou o merca<strong>do</strong>. Ninguém acreditava que, um<br />
dia, a empresa fundada por Tito Mascioli e Artur<br />
Brandi, em 1948, pudesse ser vendida. Depois de longa<br />
negociação, os papéis foram<br />
assi<strong>na</strong><strong>do</strong>s, e o coman<strong>do</strong> da empresa<br />
de Tito Mascioli, a quem<br />
tanto seu Jelson admirava e de<br />
quem comprara em sociedade<br />
com o irmão o primeiro ônibus,<br />
passou ao Grupo <strong>JCA</strong>.<br />
Em 2003, o grupo comprou<br />
ainda a empresa Rápi<strong>do</strong><br />
Macaense, que já tentara negociar<br />
em outras ocasiões. A intenção<br />
era incorporar ape<strong>na</strong>s seu<br />
setor ro<strong>do</strong>viário, mas, como os<br />
proprietários só concordassem
em vender a empresa toda, o grupo ficou com os setores<br />
ro<strong>do</strong>viário, urbano intermunicipal e urbano municipal<br />
e promoveu uma reformulação de sua identidade visual.<br />
Os carros deixaram de ser verdes e receberam pintura<br />
azul e branco, além de uma plataforma de petróleo<br />
estilizada, ressaltan<strong>do</strong> a vocação econômica de Macaé.<br />
As mudanças também se deram <strong>na</strong> qualidade <strong>do</strong> serviço,<br />
transforman<strong>do</strong> o padrão de transporte urbano no<br />
município. Em pouco mais de um ano, a empresa adquiriu<br />
cerca de 100 veículos para transporte urbano,<br />
parte deles equipada com itens como ar-condicio<strong>na</strong><strong>do</strong><br />
e som ambiente.<br />
<br />
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Forbes Brasil<br />
45
46<br />
O Grupo <strong>JCA</strong> iniciou, em 1993, um processo<br />
de profissio<strong>na</strong>lização das empresas, quan<strong>do</strong> a primeira<br />
e a segunda gerações já atuavam no grupo e<br />
se preparavam para integrar aos negócios os netos<br />
de seu Jelson, filhos de seus filhos. A terceira geração.<br />
Com uma consultoria especializada em sucessão<br />
familiar e a união que sempre caracterizou os<br />
Antunes, a passagem se dava de forma tranqüila.<br />
Em 2006, no entanto, uma fatalidade abalou<br />
a to<strong>do</strong>s. Em decorrência de um acidente de carro<br />
<strong>na</strong> estrada, lugar que tanto amava e onde escreveu<br />
sua história, faleceu Jelson da Costa<br />
Antunes, o menino de Itaboraí, o eletricista<br />
da Viação Cabussú, o motorista-cobra<strong>do</strong>rmecânico-eletricista-proprietário<br />
da Auto-<br />
Ônibus São José, seu Jelson, o construtor<br />
<strong>do</strong> Grupo <strong>JCA</strong>.<br />
Era preciso seguir em frente, administran<strong>do</strong><br />
o que fora conquista<strong>do</strong>, com a responsabilidade<br />
de manter o empreende<strong>do</strong>rismo<br />
e o bom senso impostos pela batuta<br />
<br />
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<br />
de seu Jelson. E, então, o exemplo vivo que fora o<br />
empresário e o espírito agrega<strong>do</strong>r de <strong>do</strong><strong>na</strong> Cilinha<br />
fizeram toda a diferença. Juntas, segunda e terceira<br />
gerações vêm encaran<strong>do</strong> o desafio e vencen<strong>do</strong>.<br />
Hoje, o empreendimento que começou com<br />
“meio ônibus” e muita graxa <strong>na</strong>s mãos, está presente<br />
em sete esta<strong>do</strong>s, representa<strong>do</strong> por sete empresas<br />
que totalizam uma frota de 2.132 ônibus e<br />
20 embarcações, e transporta, anualmente, mais<br />
de 75 milhões de passageiros.<br />
Hoje, quan<strong>do</strong> a Auto Viação 1001 e a Viação
Cometa completam 60 anos de atividades, a Viação<br />
Catarinense comemora seus 80 anos de fundação e<br />
a Rápi<strong>do</strong> Ribeirão Preto chega aos 40, o Grupo <strong>JCA</strong><br />
segue forte, olhan<strong>do</strong> para o futuro.<br />
Hoje, um <strong>do</strong>s grandes sonhos de seu Jelson,<br />
que era oferecer oportunidade de desenvolvimento a<br />
jovens que, embora capazes, carecessem de recursos<br />
fi<strong>na</strong>nceiros para se formarem cidadãos atuantes, homens<br />
públicos conscientes, se faz realidade por meio<br />
<strong>do</strong> <strong>Instituto</strong> Jelson da Costa Antunes.<br />
Hoje, é olhar para trás e reverenciar o grande<br />
homem. É admirar no presente a energia <strong>do</strong> grupo. É<br />
vislumbrar no horizonte o futuro, buscan<strong>do</strong> enxergar<br />
o que há atrás da montanha, para além da curva,<br />
como seu Jelson fazia.<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
47
48
“<br />
Assim dizia seu Jelson, em mais uma de suas famosas<br />
frases.<br />
Sete empresas, sete histórias, milhares de famílias,<br />
milhões de passageiros. Ainda que cada uma<br />
das empresas tivesse a própria administração, alguém<br />
precisava entender e enxergar caminhos para<br />
cada uma delas e para o grupo. Seu Jelson sabia que<br />
contava com os familiares, já bastantes presentes <strong>na</strong>s<br />
empresas. A holding <strong>JCA</strong> Participações Ltda. <strong>na</strong>sceu<br />
assim, reunin<strong>do</strong>, agregan<strong>do</strong> em torno de metas claras:<br />
otimizar e crescer, segun<strong>do</strong> os preceitos de seu<br />
funda<strong>do</strong>r. Crescer de forma profissio<strong>na</strong>lizada, manten<strong>do</strong><br />
as marcas <strong>do</strong> respeito e da competência <strong>na</strong> gestão<br />
<strong>do</strong>s negócios.<br />
Um Conselho de Administração funcio<strong>na</strong> como<br />
o cabeça de tu<strong>do</strong>, estabelecen<strong>do</strong> diretrizes estratégi-<br />
<br />
cas que norteiam a atuação <strong>do</strong>s executivos não-familiares<br />
que administram cada empresa controlada pelo<br />
grupo, contan<strong>do</strong> com a <strong>JCA</strong> Serviços que dá suporte<br />
tanto ao Conselho como às empresas. Foram extintos<br />
os cargos de presidência, à exceção da Viação Cometa,<br />
<strong>na</strong> qual Carlos Otávio de Souza Antunes exerce a função,<br />
e da Barcas S.A., presidida por Amaury de Andrade.<br />
Do Conselho de Administração <strong>do</strong> grupo, segun<strong>do</strong><br />
sua concepção estatutária, farão parte sete membros,<br />
sen<strong>do</strong> quatro da família e três independentes. Atualmente<br />
integram o Conselho <strong>do</strong>is membros de cada<br />
holding familiar, sen<strong>do</strong> um da segunda e outro da terceira<br />
gerações, além de um conselheiro externo. Gradativamente<br />
outros <strong>do</strong>is serão incluí<strong>do</strong>s.<br />
Tradição de bons serviços e modernidade <strong>na</strong><br />
gestão seguem juntas <strong>na</strong>s empresas <strong>do</strong> Grupo <strong>JCA</strong>.<br />
A cabeça de seu Jelson não pára, e seu exemplo de conduta<br />
será sempre a base <strong>do</strong> sóli<strong>do</strong> edifício que ergueu.<br />
49
Um lega<strong>do</strong> para as gerações futuras<br />
Boa logística sempre foi a marca <strong>do</strong>s negócios de Jelson. Localizada<br />
<strong>na</strong> Travessa Luís Paulino, a ofici<strong>na</strong> central, no começo <strong>do</strong>s<br />
anos 1970, concentrava compras e toda a manutenção mecânica.<br />
Lá eram reformadas peças <strong>do</strong> motor, caixa, diferencial, e também<br />
ficava o almoxarifa<strong>do</strong>. A partir dali, o caminhão abastecia as garagens<br />
de todas as empresas adquiridas pelo empresário. Ali foi o<br />
início da carreira <strong>do</strong> filho Carlos Otávio, que, aos 17 anos, entrou<br />
oficialmente para o negócio, pegan<strong>do</strong> logo o chama<strong>do</strong> “chão de fábrica”,<br />
área de que mais gostava. Chão de fábrica que ele percorria<br />
com o pai, desde menino, às vezes pilotan<strong>do</strong> um pequeno carrinho<br />
a motor, outras manobran<strong>do</strong> um <strong>do</strong>s ônibus, o que já fazia aos 10<br />
anos. Filho de peixe… Carlos Otávio tornou-se responsável pelos<br />
suprimentos. Das lembranças de infância, além das freqüentes visitas<br />
às garagens, fazem parte os passeios pela ro<strong>do</strong>viária ou pelas<br />
rotas feitas pelos ônibus <strong>do</strong> pai.<br />
Amaury de Andrade também se recorda de que no início <strong>do</strong><br />
<strong>na</strong>moro com Heloísa Hele<strong>na</strong> Antunes, filha de seu Jelson, aos <strong>do</strong>mingos,<br />
quan<strong>do</strong> o jovem casal queria mais era passear e <strong>na</strong>morar,<br />
ele os “convidava” para almoçar em Friburgo. Desculpa para que<br />
visitassem a garagem de lá. Entre 1967 e 1971, quan<strong>do</strong> Heloísa<br />
e Amaury se casaram, o futuro genro foi convida<strong>do</strong> a trabalhar<br />
<strong>na</strong>s empresas. Forma<strong>do</strong> em economia e administração, começou<br />
pela revenda Volkswagen, a Casal, passan<strong>do</strong> em seguida a atuar<br />
<strong>na</strong> 1001. Amaury reconhece que, no início, era um tanto reticente<br />
em relação ao setor, mas hoje é declaradamente apaixo<strong>na</strong><strong>do</strong> pelo<br />
transporte de passageiros.<br />
Heloísa Hele<strong>na</strong> Antunes de Andrade trabalhava com o pai <strong>na</strong><br />
área fi<strong>na</strong>nceira, quan<strong>do</strong> resolveu abrir uma agência de viagens que<br />
administra até hoje, sempre viajan<strong>do</strong>.<br />
50
Quan<strong>do</strong> <strong>do</strong><strong>na</strong> Cilinha faleceu, em<br />
1998, os irmãos tor<strong>na</strong>ram-se sócios <strong>do</strong> pai.<br />
Os netos de seu Jelson cresceram juntos,<br />
dividin<strong>do</strong> o mesmo quintal <strong>na</strong> chácara<br />
de Piratininga, e também desde ce<strong>do</strong> corriam<br />
pela garagem da empresa. Sem contar<br />
que o grande assunto da família sempre foi<br />
transporte. Hoje, de seus seis netos, quatro<br />
atuam diretamente no grupo: Marcelo<br />
e Alexandre no conselho administrativo <strong>do</strong><br />
Grupo <strong>JCA</strong>, Tatia<strong>na</strong> no coman<strong>do</strong> <strong>do</strong> <strong>Instituto</strong><br />
<strong>JCA</strong> e Rafael desenvolven<strong>do</strong> um programa<br />
de trainee <strong>na</strong>s empresas <strong>do</strong> grupo.<br />
É famosa a frase de seu Jelson: “Não<br />
construí uma empresa para mim, mas para<br />
as gerações da família.” E aí está a vida para<br />
provar que era isso mesmo. Hoje, segunda<br />
e terceira gerações da família <strong>do</strong> funda<strong>do</strong>r<br />
trabalham unidas <strong>na</strong> administração <strong>do</strong><br />
Grupo <strong>JCA</strong>.<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
51
1001, a<br />
empresa-mãe<br />
Tempos de muito trabalho<br />
e prosperidade<br />
52
Q<br />
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<br />
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<br />
<br />
<br />
<br />
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54
era como um poço, onde o carro<br />
ficava para eu trocar coman<strong>do</strong> de válvula,<br />
bomba ejetora, tu<strong>do</strong> era feito lá.<br />
Trocava no pátio, e ele ficava <strong>na</strong> área, <strong>na</strong><br />
“Agaragem<br />
garagem da Alameda Luís Paulino. Depois,<br />
seu Jelson fez a garagem Cachoeira, e aí foi melhoran<strong>do</strong>. Era<br />
pequenininha, tipo um posto. Tinha carro que vinha de Cabo Frio,<br />
mas vinha por Magé, por aquela estrada toda. Antigamente, aqueles<br />
carros pequenos agarravam, tinha de colocar corrente nos pneus deles.<br />
Tinha dia que eu ia trocar bomba ejetora no meio da estrada. Sabe<br />
como fazia? A gente deitava <strong>na</strong> lama e só ficava com a cabeça de fora.<br />
Motor? Quantas vezes troquei motor! A gente trocava e levantava<br />
<strong>na</strong>s costas, com uma madeira colocava. Depois seu Jelson comprou<br />
macaco. Antigamente não tinha isso não… Foi melhoran<strong>do</strong>…” 1<br />
1 Depoimento <strong>do</strong> sr. Arlito de Azeve<strong>do</strong>, o Bocaz.<br />
<br />
<br />
<br />
55
56<br />
E começou pela ofici<strong>na</strong> que seu Jelson aumentou,<br />
cobriu e equipou. Sabia que aquele era o<br />
coração da empresa. E a 1001 passou a chamar a<br />
atenção <strong>do</strong>s passageiros e daqueles que queriam<br />
trabalhar num local organiza<strong>do</strong> e administra<strong>do</strong><br />
por um homem que reconhecia o valor de cada<br />
um <strong>do</strong>s funcionários, compartilhan<strong>do</strong> com eles<br />
to<strong>do</strong> o seu conhecimento <strong>na</strong>s diversas áreas da<br />
empresa. Na ofici<strong>na</strong>, o patrão-eletricista dava<br />
show.<br />
Eram seis firmas, seis administrações, seis<br />
trabalhos. Jelson escolheu a Auto Viação 1001<br />
para ser a empresa-mãe e, sob essa razão social,<br />
fundiu todas as companhias em 1969. A 1001 virou<br />
a maior <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> e não parou de crescer.<br />
Em 1975, comprou da Viação Útil as linhas<br />
Campos - Rio de Janeiro, Campos - Niterói, Macaé<br />
- Rio de Janeiro e Macaé - Niterói. Três anos<br />
depois, adquiriu da Salutáris as linhas Friburgo<br />
- Rio e Friburgo - Niterói. E, em 1976, com festa<br />
e a presença de algumas autoridades, a 1001 lan-
çou o Frescão, um serviço especial entre Rio de Janeiro<br />
e Cabo Frio. Passavam a sair em três horários – 7h00,<br />
12h30 e 18h30 – ônibus com ar-condicio<strong>na</strong><strong>do</strong> e música<br />
ambiente. Com capacidade para 45 passageiros, o Frescão<br />
fazia a linha em duas horas e meia, atrain<strong>do</strong> o passageiro<br />
que costumava viajar de automóvel. E seu Jelson<br />
achou que já era tempo de realizar um grande sonho.<br />
<br />
<br />
57
58<br />
1001, uma empresa de sorte<br />
Ésó ler a história para perceber que, além de uma visão impressio<strong>na</strong>nte<br />
e extrema competência para os negócios, seu Jelson tinha<br />
sorte. Depois de ter cresci<strong>do</strong> tanto em tão pouco tempo, ainda comprou<br />
a 1001 quan<strong>do</strong> ela já era a terceira maior empresa <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />
Rio de Janeiro! Uma empresa que já mostrara ter sorte também.<br />
No início da década de 1940, o senhor Aléxis Novellino<br />
fundara a Auto Viação Salineira, que, com meia dúzia de<br />
ônibus jardineira, fazia a ligação entre Cabo Frio, Arraial<br />
<strong>do</strong> Cabo e Búzios. Ao falecer ainda jovem, em 1947, deixou<br />
a esposa com oito fi lhos pequenos e ninguém que<br />
pudesse tocar o negócio. A viúva, então, procurou<br />
um grande amigo <strong>do</strong> faleci<strong>do</strong>, o senhor Aracy Macha<strong>do</strong>,<br />
que trabalhava com caminhões de carga seca,<br />
e pediu que ele fi casse com a empresa. Sem capital para<br />
adquirir a Salineira, o negócio foi feito sob o acor<strong>do</strong> de ir<br />
saldan<strong>do</strong> a dívida com a receita da própria empresa. Ele e<br />
seu fi lho passaram a administrar a Salineira.<br />
A região prosperava, a empresa crescia, mas a estrada<br />
continuava péssima. Era chover e não tinha como seguir viagem.<br />
O carro só saía <strong>do</strong> lamaçal que se formava puxa<strong>do</strong> a trator.<br />
E, se não chovia, era uma poeira infer<strong>na</strong>l, que deixava os<br />
passageiros literalmente vermelhos. Seu Cortez, proprietário<br />
da Auto Viação 1001, queria muito entrar em Cabo Frio, mas<br />
não conseguia. Fez muitas tentativas de adquirir a Salineira,<br />
até que venceu pelo cansaço. Depois de oito anos de carro<br />
quebran<strong>do</strong> <strong>na</strong> estrada e enfrentan<strong>do</strong> enxurrada, os <strong>do</strong>nos<br />
desistiram <strong>do</strong> negócio e venderam. A linha Cabo Frio - Niterói<br />
fi cou com a 1001, e as linhas inter<strong>na</strong>s foram compradas por outra<br />
empresa. Três meses depois da 1001 assumir a malfadada linha, a<br />
estrada começou a ser asfaltada. Sorte?
Um sonho grande e dispendioso<br />
Assim <strong>na</strong>sceu o projeto de construção de<br />
uma sede que abrigasse toda a administração,<br />
operação e manutenção das empresas.<br />
Seu Jelson comprou uma área de 130 mil metros<br />
quadra<strong>do</strong>s, bastante acidentada, no bairro<br />
da Figueira, em Niterói. Era preciso desmatar<br />
e empreender uma operação de terrapla<strong>na</strong>gem<br />
que talvez inviabilizasse a realização <strong>do</strong><br />
sonho, pelo custo eleva<strong>do</strong>. Mas era tempo de<br />
“milagre econômico”, abrir estradas, e a sorte<br />
não deixaria seu Jelson <strong>na</strong> mão. O desmate foi<br />
feito com equipamento da casa. Usan<strong>do</strong> corrente,<br />
o guincho arrastava o que era corta<strong>do</strong><br />
até o caminhão. Mas, e to<strong>do</strong> aquele saibro que<br />
precisava sair para o prédio subir?<br />
Por uma feliz coincidência, em janeiro<br />
de 1969, começara a sair <strong>do</strong> papel o projeto<br />
idealiza<strong>do</strong> pelo então Ministro <strong>do</strong>s Transportes,<br />
Mario Andreazza, de uma ponte que cruzaria<br />
a Baía de Gua<strong>na</strong>bara, fazen<strong>do</strong> a ligação<br />
entre as cidades de Niterói e Rio de Janeiro,<br />
poupan<strong>do</strong> os motoristas de uma viagem de<br />
100 quilômetros, passan<strong>do</strong> por Magé. Porém,<br />
o consórcio de construtoras responsável<br />
pela obra era obriga<strong>do</strong> a buscar terra em local<br />
muito distante, para proceder ao aterramento<br />
das áreas de cabeceira da ponte, ofi cialmente<br />
batizada de Presidente Costa e Silva. Era um<br />
problema! Até que, numa pesquisa pelo entorno,<br />
descobriu que havia saibro de ótima<br />
qualidade, perfeito para o aterro, numa área<br />
bem próxima. E foi assim que seu Jelson não<br />
só economizou com tratores e caminhões,<br />
como ainda lucrou com a venda <strong>do</strong> material.<br />
Dia e noite caminhões e mais caminhões, devidamente<br />
registra<strong>do</strong>s, saíam com o saibro. E<br />
a nova sede da 1001 pôde, então, começar a<br />
subir. Levantada a estrutura, foi ofereci<strong>do</strong> um<br />
grande churrasco para to<strong>do</strong>s os funcionários<br />
e outros tantos convida<strong>do</strong>s. Em 1979, o complexo<br />
administrativo da 1001 foi i<strong>na</strong>ugura<strong>do</strong><br />
com pompa, circunstância e muita festa.<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
59
60
62<br />
Nem com a crise a 1001 pára de<br />
crescer<br />
Em 1982, a Auto Viação 1001 embrenhouse<br />
pela Região da Zo<strong>na</strong> da Mata Mineira<br />
ao comprar a Citran, que ligava o Rio de Janeiro<br />
a Além Paraíba, Carmo, Cataguases, Muriaé,<br />
Manhumirim, Manhuaçu, Gover<strong>na</strong><strong>do</strong>r Valadares<br />
e Coronel Fabriciano.<br />
Ao longo da década de 1980, apesar da<br />
crise econômica vivida no país, muito negócio<br />
foi feito: a empresa Natividade foi comprada<br />
ainda em 1982, com três linhas que ligavam o<br />
município de mesmo nome ao Rio de Janeiro,<br />
Campos e Niterói. Em seguida, a Natividade<br />
adquiriu da Viação Rio Minho as linhas Itaperu<strong>na</strong><br />
- Rio e Miracema - Rio. E a Auto Viação<br />
1001 vendeu para a Rio Ita seu setor urbano,<br />
que incluía as linhas de Rio Bonito, Itaboraí e<br />
Alcântara. Passa<strong>do</strong>s <strong>do</strong>is anos de sua aquisição,<br />
a Natividade foi vendida para a Viação União.<br />
Já 1986 foi o perío<strong>do</strong> de investir no turismo,<br />
com a i<strong>na</strong>uguração da 1001 Turismo e<br />
Viagens, em Niterói, seguin<strong>do</strong> o mesmo padrão<br />
de qualidade de serviços que sempre caracterizou<br />
o Grupo <strong>JCA</strong>. Em menos de <strong>do</strong>ze meses, a<br />
empresa comprava da Brasil a linha Itaperu<strong>na</strong><br />
- Rio de Janeiro e, em 1989, tor<strong>na</strong>va-se proprietária<br />
<strong>do</strong> Ro<strong>do</strong>porto Oásis, <strong>na</strong> BR-101, em<br />
Casimiro de Abreu. Em 1990, a 1001 adquiriu<br />
da Viação União as linhas Itaperu<strong>na</strong> - Rio e<br />
Miracema - Rio.
63
64
Conselho de amigo, e a compra de uma<br />
linha da Viação Brasil<br />
AViação Brasil, de Antônio Tatajiba, era peque<strong>na</strong>,<br />
com cerca de meia dúzia de carros.<br />
Peque<strong>na</strong>, mas valente. Com esses poucos ônibus,<br />
a Brasil fazia dura concorrência com a 1001, <strong>na</strong><br />
região de Campos, por onde rodava sua frota. Mas<br />
era praticamente impossível disputar com a empresa<br />
de Jelson da Costa Antunes que, ainda por<br />
cima, comprou uma frota de ônibus altos, com<br />
porta central e banheiro embaixo. Batiza<strong>do</strong>s de<br />
superônibus, o empresário os colocou <strong>na</strong> mesma<br />
rota da Brasil. Esta não suportou a concorrência e<br />
acabou venden<strong>do</strong> a linha Itaperu<strong>na</strong> - Rio de Janeiro<br />
para a 1001, em 1987.<br />
Mas o curioso da história toda é que seu Jelson<br />
e seu Toninho da Brasil, como era conheci<strong>do</strong><br />
Antônio Tatajiba, se tor<strong>na</strong>ram grandes amigos. O<br />
<strong>do</strong>no da 1001, com sua percepção aguçada, viu no<br />
empresário – que, com cinco, seis ônibus velhos,<br />
tentava bater a 1001 – um guerreiro. Tanto que<br />
<strong>na</strong> compra da linha, aconselhou Tatajiba a investir<br />
<strong>na</strong> exploração das outras linhas que a Brasil já tinha,<br />
garantin<strong>do</strong> espaço <strong>na</strong> região. E foi o que seu<br />
Toninho fez. E, nos dias de hoje, a Viação Brasil<br />
roda tranqüila pelo triângulo Bom Jesus, Campos,<br />
Itaperu<strong>na</strong>, bem organizada, com carros novos.<br />
Quantas vezes depois seu Toninho da Brasil<br />
convidaria seu Jelson da 1001 para um churrasco<br />
de costela de dia inteiro, para rememorar o episódio<br />
que pôs sua empresa nos trilhos…<br />
<br />
65
66<br />
40 anos de história e quilometragem rodada<br />
Em 1988 se festejou as quatro décadas de muita história<br />
e estrada rodada. A comemoração <strong>do</strong> aniversário da<br />
1001 foi produzida ao longo de <strong>do</strong>is anos e durou um dia<br />
inteiro, para que toda a “família 1001” pudesse participar.<br />
Pode-se dizer que foi uma festa em turnos: começou às 7<br />
horas, com um ato ecumênico <strong>na</strong> sede da empresa, e terminou,<br />
sob protestos, às 22, com um grande car<strong>na</strong>val no Clube<br />
Mauá. Os 40 funcionários mais antigos subiram ao palco<br />
para serem home<strong>na</strong>gea<strong>do</strong>s em nome <strong>do</strong> grupo, por seu Jelson<br />
e <strong>do</strong><strong>na</strong> Cilinha. Teve ainda a premiação <strong>do</strong>s concursos<br />
da bandeira 1001 e de poesias. Deu muito trabalho, mas foi<br />
pura emoção. Quem viveu não esquece!
67
Anos 1990: a 1001 investe <strong>na</strong><br />
modernidade, e o Grupo <strong>JCA</strong><br />
caminha para o Sul<br />
Nos anos 1990, a ficção científica se aproximava<br />
<strong>do</strong> dia-a-dia: os computa<strong>do</strong>res<br />
chegavam aos lares brasileiros, e a internet<br />
começava a permitir comunicação em tempo<br />
real com quase todas as partes <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>.<br />
Na 1001, a modernidade também seria<br />
uma das marcas da década. Sintonizada com<br />
inovações tecnológicas que proporcio<strong>na</strong>ssem<br />
maior segurança e conforto a seus passageiros,<br />
a empresa de seu Jelson crescia não só em<br />
tamanho, mas especialmente <strong>na</strong> extensão <strong>do</strong><br />
serviço presta<strong>do</strong>. Afi<strong>na</strong>l, quem disse que uma<br />
viagem de ônibus começa ape<strong>na</strong>s quan<strong>do</strong> ele<br />
deixa a ro<strong>do</strong>viária? O passageiro da 1001 passou<br />
a contar com a venda de passagens por<br />
telefone, que nos guichês eram emitidas por<br />
computa<strong>do</strong>r. Para acompanhar as mudanças,<br />
foi preciso preparar seus recursos humanos e<br />
investir em reciclagem e capacitação.<br />
A compra de mais duas linhas – Itaperu<strong>na</strong><br />
- Rio de Janeiro e Miracema - Rio de<br />
Janeiro –, até então controladas pela Viação<br />
União, abriu a década.<br />
E, como os negócios crescessem muito,<br />
foi preciso otimizar a gestão. Já não era mais<br />
possível que toda a estratégia de crescimento<br />
e administração ficasse concentrada numa<br />
única cabeça. Em 1993, foi fundada a <strong>JCA</strong><br />
68<br />
Participações Ltda., uma holding cujo Conselho<br />
Administrativo passaria a traçar as metas<br />
para a Auto Viação 1001 e demais empresas<br />
que viessem a ser adquiridas a partir de<br />
então, compon<strong>do</strong> o Grupo Empresarial <strong>JCA</strong>.<br />
Almejan<strong>do</strong> estender seus negócios para os<br />
merca<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Sul, seu Jelson comprou, entre<br />
1994 e 1995, em menos de 40 dias, a Rápi<strong>do</strong><br />
Ribeirão Preto, no Noroeste <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> de São<br />
Paulo, e a tradicio<strong>na</strong>l Auto Viação Catarinense,<br />
em Blume<strong>na</strong>u. As duas empresas continuariam<br />
existin<strong>do</strong> com gestões independentes.
69
O Prêmio Daniel Barata de Qualidade no Transporte<br />
de Passageiros <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio de Janeiro, da Fetranspor2<br />
, veio em 1997, em reconhecimento a to<strong>do</strong> esse esforço<br />
para oferecer um serviço cada vez melhor aos clientes-viajantes.<br />
Na categoria Transporte Ro<strong>do</strong>viário de Passageiros,<br />
a 1001 foi a primeira. E não era só o cliente que merecia a<br />
atenção da empresa. Em 1990, foi i<strong>na</strong>ugurada a Colônia de<br />
Férias para os funcionários, em Saquarema.<br />
2 Fetranspor - Federação das Empresas de Transportes de Passageiros<br />
<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio de Janeiro.<br />
70
Com uma frota de automóveis numerosa<br />
circulan<strong>do</strong> pelas estradas, a concorrência<br />
desleal <strong>do</strong>s veículos clandestinos e a<br />
crescente pressão <strong>do</strong> transporte aéreo nos<br />
trajetos mais curtos, o desafio de se manter<br />
bem coloca<strong>do</strong> no merca<strong>do</strong> era cada vez<br />
maior e exigia investimento em diferenciais.<br />
E foi o que a 1001 fez. Em 1994, i<strong>na</strong>ugurou,<br />
<strong>na</strong> Ro<strong>do</strong>viária Novo Rio, sua primeira Sala<br />
Vip. O passageiro da 1001 com embarque <strong>na</strong><br />
Novo Rio ganhava um espaço exclusivo, com<br />
poltro<strong>na</strong>s confortáveis, ar-condicio<strong>na</strong><strong>do</strong>, televisão,<br />
jor<strong>na</strong>is e revista, banheiro e serviço<br />
de bar. Outras Salas Vips seriam i<strong>na</strong>uguradas<br />
nos termi<strong>na</strong>is ro<strong>do</strong>viários de Niterói<br />
(Roberto Silveira), Campos <strong>do</strong>s Goyatacazes<br />
(Shopping Estrada), São Paulo (Tietê) e Florianópolis<br />
(Rita Maria).<br />
Além da Sala Vip, <strong>na</strong>quele ano foi instala<strong>do</strong><br />
<strong>na</strong> Novo Rio um guichê exclusivo para<br />
atendimento aos que viajavam <strong>na</strong> linha que<br />
fazia Niterói–São Paulo direto, no stop. Chamada<br />
Top Line, a linha impôs um novo patamar<br />
de serviços, para fazer frente às três<br />
companhias ro<strong>do</strong>viárias que exploravam o<br />
trecho Rio de Janeiro - São Paulo e competir<br />
até com o avião. Na Top Line, passaram a rodar<br />
60 carros com ar-condicio<strong>na</strong><strong>do</strong> e serviço<br />
de bor<strong>do</strong> que, partin<strong>do</strong> de Niterói, passavam<br />
pela Ro<strong>do</strong>viária Novo Rio para embarque de<br />
mais passageiros e seguiam viagem. Fazia-se<br />
ape<strong>na</strong>s uma parada técnica para que o motorista<br />
deixasse a direção, esticasse o corpo e<br />
verificasse os pneus, mas sem desembarque<br />
de passageiros. Assim, a viagem se dava em<br />
cinco horas e meia. Informações sobre a linha<br />
podiam ser obtidas pelo Disk Top Line,<br />
e passagens eram oferecidas também em<br />
agências de viagem credenciadas, com a<br />
possibilidade de uso de cartão de crédito no<br />
pagamento. E, num tempo em que era permiti<strong>do</strong><br />
fumar a bor<strong>do</strong>, outro diferencial <strong>do</strong>s<br />
carros era ser não-fumante.<br />
A Auto Viação 1001 queria entrar <strong>na</strong><br />
chamada Ponte Ro<strong>do</strong>viária Rio - São Paulo,<br />
e a Top Line era o primeiro passo nessa direção.<br />
As empresas que detinham a concessão<br />
<strong>do</strong> trajeto chiaram, mas, em 1998, a 1001<br />
adquiriu da Viação Cometa uma de suas<br />
duas concessões e entrou <strong>na</strong> ponte Rio - São<br />
Paulo, revolucio<strong>na</strong>n<strong>do</strong>.<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
71
non stop<br />
72<br />
Ponte Rio-São Paulo, um capítulo de<br />
uma longa história<br />
Muita gente sabe que o Grupo <strong>JCA</strong> comprou<br />
a Viação Cometa, um ícone <strong>do</strong><br />
transporte de passageiros no Brasil, reconheci<strong>do</strong><br />
até mesmo lá fora. Mas poucos, muito poucos,<br />
sabem que essa é ape<strong>na</strong>s parte da história<br />
que liga a trajetória de seu Jelson e a <strong>do</strong> funda<strong>do</strong>r<br />
da Cometa, seu Tito Mascioli.<br />
Não é de hoje que a ligação Rio de Janeiro-São<br />
Paulo é a mais movimentada e rentável<br />
<strong>do</strong> país, seja por terra, seja pelo ar. Até 1998,<br />
quan<strong>do</strong> a Auto Viação 1001 entrou <strong>na</strong> chamada<br />
ponte ro<strong>do</strong>viária, a rota era feita exclusivamente<br />
por três empresas: Viação Cometa, Expresso<br />
Brasileiro e Itapemirim. E não foi <strong>na</strong>da fácil pegar<br />
essa estrada.<br />
Seu Jelson conseguira a concessão da linha<br />
Niterói-São Paulo, em 1963, quan<strong>do</strong> criara<br />
a Vispan – Viação São Paulo/Niterói, para atuar<br />
especialmente nesse trajeto. Na época, como<br />
não existia a Ponte Rio-Niterói, os ônibus eram<br />
obriga<strong>do</strong>s a circundar a Baía da Gua<strong>na</strong>bara, rodan<strong>do</strong><br />
80 quilômetros a mais. A Ro<strong>do</strong>via Presidente<br />
Dutra ainda não era de mão dupla, subin<strong>do</strong><br />
e descen<strong>do</strong> pela Serra das Araras. Resulta<strong>do</strong>:<br />
a viagem durava em média oito horas.<br />
Sob a administração da 1001, já nos<br />
anos 1990, enxergou-se <strong>na</strong> linha um nicho de<br />
merca<strong>do</strong> a ser mais bem explora<strong>do</strong>. A ponte já<br />
existia desde 1985, e a empresa conseguira, em
1992, autorização para que a linha passasse<br />
a ser feita via Ro<strong>do</strong>viária Novo Rio, permitin<strong>do</strong><br />
que os passageiros que embarcavam<br />
<strong>na</strong>quela cidade não precisassem aguardar o<br />
carro ao relento, <strong>na</strong> calçada. As empresas que<br />
detinham o direito de fazer a linha Rio de<br />
Janeiro-São Paulo chiaram. A 1001 passava<br />
pela Novo Rio num belo carro Top Line, e seus<br />
passageiros, que aguardavam o embarque <strong>na</strong><br />
Sala Vip, embarcavam para uma viagem sem<br />
parada, bem mais rápida. A revolta das três<br />
concessionárias acabou numa ação judicial<br />
contra a 1001.<br />
A briga foi feia. Ainda durante a tramitação<br />
<strong>do</strong> processo, as empresas da ponte conseguiram<br />
parar algumas vezes a linha da 1001.<br />
No entanto, ocorreu que o Expresso Brasileiro<br />
resolveu deixar a Ponte Ro<strong>do</strong>viária e notificou<br />
as outras duas empresas de que estaria totalmente<br />
desligada em 180 dias, como previsto<br />
por contrato, em caso de desistência <strong>do</strong> serviço.<br />
A Viação Cometa, por sua vez, tinha duas<br />
licenças para explorar o trajeto, sen<strong>do</strong> uma<br />
delas pouco utilizada. Por que ela tinha duas?<br />
Em 1951, governo de Getúlio Vargas, quan<strong>do</strong><br />
foram concedidas as licenças, uma delas ficou<br />
com a Pássaro Marrom, que nunca a usou e<br />
vendeu para a Cometa, que repassou para a<br />
1001, em 1998, numa negociação tranqüila,<br />
que acabou com a briga e deu o direito à empresa<br />
<strong>do</strong> Grupo <strong>JCA</strong> de oficialmente atender<br />
à linha Rio de Janeiro-São Paulo.<br />
Essa operação contaria<br />
muitos pontos a<br />
favor <strong>do</strong> Grupo <strong>JCA</strong>,<br />
por ocasião da compra<br />
da Viação Cometa, em<br />
2002. Já conhecidas, as<br />
partes se entenderam.<br />
O que foi acerta<strong>do</strong> em<br />
conversa aconteceu. Não<br />
houve briga, não houve<br />
qualquer diferença nem<br />
foi necessária uma auditoria.<br />
A empresa que seu<br />
Jelson nunca imaginou<br />
que compraria e que to<strong>do</strong>s<br />
pensavam que jamais<br />
seria vendida passou a<br />
funcio<strong>na</strong>r sob sua administração,<br />
que soube valorizar<br />
o verdadeiro patrimônio<br />
<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l que é<br />
a Cometa, sua história e<br />
sua imagem.<br />
Seu Jelson sempre admirou a empresa<br />
fundada por Tito Masciolli e o empresário em<br />
si. Para ele, mais <strong>do</strong> que uma conquista, foi<br />
uma honra adquirir a Cometa e recolocá-la<br />
em posição de destaque no transporte ro<strong>do</strong>viário<br />
de passageiros. Afi<strong>na</strong>l, fora de seu Tito<br />
e <strong>do</strong> sócio, Artur Brandi, que ele comprara o<br />
primeiro “meio ônibus”, lá no comecinho da<br />
história, dessa longa e vitoriosa história.<br />
<br />
<br />
<br />
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<br />
<br />
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<br />
<br />
73
Double Decker da 1001<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
Double Class,<br />
<br />
<br />
74<br />
1001 de cara nova<br />
Em 1998, a empresa lançou a nova programação<br />
visual, e toda a frota e instalações<br />
ganharam cara nova. O cata-vento, símbolo<br />
da região salineira onde <strong>na</strong>sceu a 1001, foi<br />
manti<strong>do</strong>, de forma estilizada. Também as cores<br />
representativas da constituição <strong>na</strong>tural<br />
da Região <strong>do</strong>s Lagos permaneceram: o azul<br />
<strong>do</strong> mar, o branco da areia, o cinza <strong>do</strong> sal.<br />
O lançamento <strong>do</strong>s carros Double Decker<br />
– com quatro eixos, DVD, frigobar, comunicação<br />
com a cabine <strong>do</strong> motorista por interfone,<br />
câmeras de monitoramento e oferta de<br />
serviços diferencia<strong>do</strong>s no mesmo veículo – foi<br />
mais uma das novidades lançadas pela 1001<br />
no transporte ro<strong>do</strong>viário regular. Até então<br />
o passageiro que optava por viajar em carro<br />
leito tinha de fazê-lo à noite, já que não havia<br />
oferta desse serviço ao longo <strong>do</strong> dia. No Double<br />
Class, o primeiro piso abriga a primeira<br />
classe com seis poltro<strong>na</strong>s-leito e, no piso superior,<br />
a Classe Executiva acomoda quarenta<br />
poltro<strong>na</strong>s semi-leito. Duas classes, duas tarifas,<br />
num mesmo veículo mais confortável e<br />
mais seguro.
75
76
Relação estreita com a comunidade<br />
Que a 1001 é patrimônio afetivo daqueles que vivem <strong>na</strong> região<br />
onde ela <strong>na</strong>sceu não há dúvidas. Basta ver a intimidade com<br />
que as pessoas se referem aos ônibus que 60 anos atrás levam seu<br />
cata-vento pelas estradas. Mas, em 1998, quan<strong>do</strong> a empresa<br />
completava meio século de história, a idéia foi chegar<br />
ainda mais perto da comunidade, levan<strong>do</strong> um pouco dessa<br />
história. Seu Jelson argumentou que, mais importante<br />
<strong>do</strong> que contar a sua história ou mesmo a da empresa,<br />
era divulgar a trajetória <strong>do</strong> veículo que revolucionou o<br />
transporte de passageiros. Assim <strong>na</strong>sceu o Museu <strong>do</strong><br />
Ônibus, que visitou as principais cidades onde a 1001<br />
atuava, levan<strong>do</strong> pelas ruas, a bor<strong>do</strong> de um superônibus,<br />
entretenimento e informação.<br />
Um ano depois, o Museu <strong>do</strong> Ônibus virou biblioteca<br />
itinerante, por meio <strong>do</strong> projeto 1001 Histórias<br />
e mu<strong>do</strong>u sua rota, que até hoje inclui praças e<br />
escolas públicas, levan<strong>do</strong> a crianças e a<strong>do</strong>lescentes<br />
um acervo de mais de 1.400 <strong>livro</strong>s e gibis, além de<br />
vídeos educativos. Uma pedagoga segue com o ônibus<br />
e orienta as atividades. Cerca de 200 comunidades<br />
já receberam a visita <strong>do</strong> 1001 Histórias.<br />
Onde o ônibus-biblioteca pára, um amplo<br />
tol<strong>do</strong> é estendi<strong>do</strong> e rapidamente estantes, mesas<br />
e cadeiras criam no espaço público um ambiente<br />
aconchegante para a leitura e a troca de idéias.<br />
É só chegar.<br />
<br />
<br />
<br />
77
78<br />
Em 2003, as linhas de Mi<strong>na</strong>s Gerais foram vendidas para a<br />
Viação Rio Doce. A 1001 concentrava, então, sua atividade nos Esta<strong>do</strong>s<br />
<strong>do</strong> Rio de Janeiro, Espírito Santo São Paulo e Santa Catari<strong>na</strong>.<br />
Com o falecimento de seu Jelson, em 2006, era <strong>na</strong>tural que<br />
muitos pensassem que os negócios pudessem desandar. Mas, nos<br />
anos seguintes, o investimento em tecnologia não parou e não pára!<br />
Alguns carros da 1001 já rodam com alimentação para notebook e<br />
há estu<strong>do</strong>s em andamento, para viabilizar conexão à internet ao
longo da viagem. No Termi<strong>na</strong>l Ro<strong>do</strong>viário<br />
Tietê, em São Paulo, o cliente pode retirar<br />
os bilhetes compra<strong>do</strong>s via internet<br />
ou central telefônica de atendimento, <strong>na</strong><br />
Sala Net, espaço reserva<strong>do</strong> exclusivamente<br />
para esse serviço.<br />
Em 2006, fiel à preocupação de seu<br />
Jelson em satisfazer seus passageiros oferecen<strong>do</strong>-lhes<br />
diversidade de comodidades,<br />
a empresa introduziu o Double Servi-<br />
ce em carros que reúnem no mesmo piso<br />
as classes executiva e convencio<strong>na</strong>l.<br />
É fato que, quan<strong>do</strong> foi comprada,<br />
em 1948, a Auto Viação 1001 Ltda. já<br />
era grande no Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio de Janeiro,<br />
para os padrões da época. Um bom<br />
negócio. Mas, mesmo com seu olhar de<br />
enxergar além da curva, será que Jelson<br />
da Costa Antunes podia imagi<strong>na</strong>r que<br />
aquela empresa chegaria a 2008 com<br />
mais de 700 veículos e 2.400 funcionários?<br />
Que ela chegaria ao futuro tão experiente<br />
e tão jovem?<br />
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O sul <strong>do</strong> Brasil<br />
sobre as rodas da<br />
Catarinense<br />
Desbravan<strong>do</strong> as estradas<br />
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Q<br />
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82<br />
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O<br />
alemão Theo<strong>do</strong>r Darius e o húngaro João<br />
Hahn, ten<strong>do</strong> imigra<strong>do</strong> para o Brasil por essa<br />
época, encontravam sérias dificuldade de<br />
adaptação à cultura e ao idioma <strong>do</strong> país. Não<br />
conseguiam emprego, mas precisavam trabalhar.<br />
Tiveram, então, a idéia de comprar um veículo para frete, com o qual começaram<br />
a fazer peque<strong>na</strong>s mudanças. Ocorre que não havia ainda transporte<br />
regular de passageiros no Brasil, com horários e destinos predetermi<strong>na</strong><strong>do</strong>s. Em<br />
quatro anos de frete, cada um com seu carro, muitas vezes eram contrata<strong>do</strong>s para<br />
levar pessoas a algum lugar e perceberam aí um promissor espaço no merca<strong>do</strong>.<br />
Venderam os <strong>do</strong>is carros, compraram uma jardineira, um auto-ônibus Rugby 6<br />
cilindros, e iniciaram uma sociedade com o brasileiro A<strong>do</strong>lfo Hass, em 13 de abril<br />
de 1928, dia que <strong>na</strong>sceu a primeira firma brasileira de transporte ro<strong>do</strong>viário: a<br />
Empreza Auto Viação Hahn, Hass & Darius, o embrião da Empreza Auto Viação<br />
Catharinense, assim grafa<strong>do</strong> <strong>na</strong>quele tempo.
83
84<br />
Aprimeira linha da empresa sediada em Blume<strong>na</strong>u<br />
acontecia entre essa cidade e Florianópolis, passan<strong>do</strong><br />
por Itajaí e Tijucas. Em função das terríveis condições<br />
de viagem, ela era oferecida ape<strong>na</strong>s duas vezes<br />
por sema<strong>na</strong>, sempre partin<strong>do</strong> para Florianópolis as<br />
terças e sextas-feiras, às 8 horas, e retor<strong>na</strong>n<strong>do</strong> a Blume<strong>na</strong>u<br />
às 9 horas, às quartas-feiras e aos sába<strong>do</strong>s. A<br />
viagem, que hoje é feita em duas horas e quinze minutos,<br />
levava, então, <strong>do</strong>ze horas. Eram <strong>do</strong>ze horas de<br />
aventura, que poderiam ser treze, quatorze, quinze. O<br />
sucesso foi imediato. Apesar das dificuldades <strong>na</strong> rota, a<br />
empresa mostrou-se eficiente, pontual e extremamente<br />
preocupada em oferecer o maior conforto possível<br />
a seus passageiros. Era comum que os proprietários<br />
aguardassem até tarde da noite a chegada <strong>do</strong>s ônibus,<br />
para saber <strong>do</strong>s próprios passageiros como havia transcorrida<br />
a viagem. As pessoas em primeiro lugar! Esse<br />
era o lema. E os clientes não viajavam com freqüência,<br />
mas, em tempos de escassez de meios de comunicação,<br />
o deslocamento era a melhor forma de ter contato com<br />
quem estava distante. Para garantir um serviço de qualidade,<br />
diante de tantas adversidades, foi preciso muito<br />
empenho <strong>do</strong>s funda<strong>do</strong>res. Cinco anos depois, eles tinham<br />
uma frota de onze ônibus, empregavam dezessete<br />
funcionários e operavam regularmente em rotas que<br />
incluíam as cidades de Itajaí, Florianópolis, Jaraguá <strong>do</strong><br />
Sul, Joinvile e Curitiba. A passagem <strong>do</strong> coletivo custava<br />
30 mil réis, enquanto que a tarifa <strong>do</strong> automóvel de<br />
aluguel era de 200 mil réis, pela mesma viagem. Só os<br />
abasta<strong>do</strong>s podiam dispor da quantia, e boa parte <strong>do</strong>s<br />
passageiros migrou para o novo serviço. Eram raros os<br />
carros de passeio, e o avião ainda era um sonho.
A Catarinense chega ao Rio<br />
Grande <strong>do</strong> Sul<br />
Aaquisição <strong>do</strong> segun<strong>do</strong> carro aconteceu<br />
logo, com um empréstimo bancário, e<br />
a Catarinense passou a fazer a linha de Blume<strong>na</strong>u<br />
a Porto Alegre, boa parte passan<strong>do</strong><br />
pela praia. Além da chance de atolamento,<br />
havia ainda a questão das marés: só se chegava<br />
ao destino <strong>na</strong> maré baixa. Conta-se<br />
que <strong>do</strong>is carros teriam submergi<strong>do</strong> <strong>na</strong> areia<br />
desse caminho, um <strong>na</strong> foz <strong>do</strong> Rio Perequê e<br />
outro próximo a Torres. Era, de fato, uma<br />
ação pioneira.<br />
Decorri<strong>do</strong>s cerca de dez anos <strong>do</strong> início<br />
das atividades da empresa, as bagagens que<br />
até então eram acomodadas aos pés <strong>do</strong>s passageiros,<br />
pelo corre<strong>do</strong>r, passaram a viajar <strong>na</strong><br />
parte de cima <strong>do</strong> ônibus, protegidas por uma<br />
lo<strong>na</strong> que precisava ser muito bem amarrada.<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
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86
O transporte de encomendas também<br />
era feito pela Catarinense desde os<br />
primeiros tempos. Como não houvesse<br />
serviço oficial de correio, nem qualquer<br />
forma de prestação regular desse tipo<br />
de serviço, a empresa logo se destacou<br />
por entregar as encomendas sem danos,<br />
já que, até então, era muito comum que<br />
fossem extraviadas ou danificadas pelo<br />
caminho. Elas eram transportadas em<br />
carros exclusivos e, quan<strong>do</strong> <strong>na</strong>sceu a empresa<br />
de Correios, a Catarinense foi sua<br />
parceira, em carros que transportavam<br />
encomendas <strong>na</strong> parte traseira e passageiros,<br />
<strong>na</strong> frente. Linhas como a Florianópolis<br />
- Mafra surgiram com os Correios.<br />
<br />
87
88
Mudanças em tempos de guerra<br />
Em setembro de 1937, a Auto Viação<br />
Catarinense passou à sociedade<br />
anônima. No fi<strong>na</strong>l desse ano, um golpe<br />
de esta<strong>do</strong> levou Getúlio Vargas ao poder.<br />
Em 1939, teria início a Segunda Guerra<br />
Mundial que opôs os chama<strong>do</strong>s Alia<strong>do</strong>s<br />
às Potências <strong>do</strong> Eixo. Brasil, Alemanha e<br />
Hungria estavam em campos opostos. Em<br />
1943, o Brasil aderiu ao bloco <strong>do</strong>s Alia<strong>do</strong>s<br />
forma<strong>do</strong> pela Chi<strong>na</strong>, Grã-Bretanha,<br />
França, União Soviética e Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s.<br />
A Alemanha de Hitler encabeçava as forças<br />
<strong>do</strong> Eixo, com a Itália de Mussolini e o<br />
Japão de Hiroito. A Hungria aderiu a essas<br />
forças. Pressio<strong>na</strong><strong>do</strong>s pelo governo brasileiro,<br />
muitos imigrantes vin<strong>do</strong>s de países<br />
<strong>do</strong> Eixo tiveram de se desfazer de seus negócios.<br />
O controle acionário da Catarinense<br />
passou a um grupo de empresários de<br />
Brusque, SC, que ficou à frente da empresa<br />
até 1963, quan<strong>do</strong> a família Bianchini,<br />
também da cidade de Brusque, a assumiu.<br />
Entre 1963 e 1968, a Catarinense<br />
ficou sob o controle da Viação Penha, perden<strong>do</strong><br />
para ela um número significativo<br />
de linhas e frota. Quan<strong>do</strong> da divisão da<br />
empresa Penha, <strong>do</strong>is <strong>do</strong>s sócios, membros<br />
da família Picolli, ficaram com a Catarinense<br />
como pagamento à sua parte<br />
<strong>na</strong> sociedade.<br />
<br />
89
90
No início <strong>do</strong>s anos 1970, a maior parte<br />
<strong>do</strong> capital da empresa passou às mãos<br />
de outro grupo de Blume<strong>na</strong>u, forma<strong>do</strong> por<br />
Oswal<strong>do</strong> e Lourival Friedler, Werner Greuel,<br />
Humberto Hannemann e Wiegand Wanser,<br />
que gradativamente foram assumin<strong>do</strong> o controle<br />
acionário. Apesar das sucessivas mudanças<br />
no controle <strong>do</strong> negócio, a Catarinense<br />
conservava suas características – qualidade,<br />
segurança e pioneirismo – e cresceu ao longo<br />
de toda a década. Em junho de 1971, a empresa<br />
incorporou 60% da Ro<strong>do</strong>viário Brusquense.<br />
Em 1972, comprou a Expresso Massarandubense<br />
/ Ulrich e, em 1975, adquiriu<br />
a Expresso Joinville / Guaratuba Ltda. Os<br />
primeiros monoblocos integraram a frota em<br />
1970, e outras compras foram feitas durante<br />
aquele perío<strong>do</strong> tão produtivo.<br />
Em 1975, iniciam-se as atividades da<br />
Catarinense Cargas, com uma perua Kombi<br />
e um caminhão Mercedes-Benz, fazen<strong>do</strong> o<br />
percurso Curitiba - Blume<strong>na</strong>u - Brusque. Outra<br />
grande operação <strong>na</strong> época foi o fretamento<br />
de carros para as principais indústrias de<br />
Blume<strong>na</strong>u, além de diversas linhas para cidades<br />
vizinhas, com carros deixan<strong>do</strong> a garagem<br />
em intervalos de cinco minutos. E, em<br />
1976, além de investimento <strong>na</strong> diversificação<br />
da frota, a empresa começou a operar a linha<br />
Criciúma - São Paulo.<br />
<br />
<br />
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93
94
A Catarinense continuava como patrimônio<br />
afetivo <strong>do</strong> povo de Santa Catari<strong>na</strong>, embora chegasse<br />
ao fi <strong>na</strong>l <strong>do</strong>s anos 1970 carente de serviços.<br />
Alguns equipamentos estavam ultrapassa<strong>do</strong>s,<br />
faltava meto<strong>do</strong>logia de controle. Eram poucos os<br />
funcionários, não havia ônibus executivos nem<br />
leitos: só os convencio<strong>na</strong>is com 36 poltro<strong>na</strong>s, pequenos<br />
para o intenso movimento, principalmente<br />
nos feria<strong>do</strong>s. Pesava ainda o fato de a sede estar<br />
distante da capital, Florianópolis. A maioria <strong>do</strong>s<br />
sócios resistia em deixar Blume<strong>na</strong>u, e essa mudança<br />
necessária só se daria muito tempo depois.<br />
Em 1978, Heinz W. Kumm, com experiência em<br />
transporte coletivo urbano e turismo, associou-se<br />
à empresa. Nesse mesmo ano, a Catarinense implantou<br />
o serviço executivo com serviço de bor<strong>do</strong><br />
e ro<strong>do</strong>moças, <strong>na</strong>s linhas Blume<strong>na</strong>u - Florianópolis,<br />
Joinville - Florianópolis e Florianópolis - Curitiba.<br />
Pouco depois, Antenor e Elmo Bogo entraram<br />
<strong>na</strong> sociedade.<br />
A passagem para os anos 1980 foi marcada<br />
por inovações que começaram pela aquisição de<br />
veículos com três eixos, mais adequa<strong>do</strong>s às características<br />
<strong>do</strong>s trajetos percorri<strong>do</strong>s: somente 25%<br />
deles eram planos. Ou melhor, não eram morros.<br />
Além <strong>do</strong> melhor desempenho <strong>na</strong>s estradas, os<br />
carros com 50 lugares alteraram positivamente o<br />
custo passageiro por quilômetro.<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
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96<br />
Andan<strong>do</strong> <strong>na</strong> frente, a empresa adquiriu<br />
alguns carros automáticos e reestruturou<br />
o setor de cargas. Os ônibus<br />
ganharam pintura nova, baseada <strong>na</strong> <strong>do</strong>s<br />
carros da america<strong>na</strong> Greyhound. Mais<br />
simples, sem as três faixas exibidas antes,<br />
chamava a atenção <strong>na</strong> estrada e facilitava<br />
o reparo.<br />
As operações no oeste <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong><br />
de Santa Catari<strong>na</strong> tiveram início em<br />
1980 e, no ano seguinte, a empresa passou<br />
a fazer a linha inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l Florianópolis<br />
- Assunção.<br />
No mesmo ano, a Catarinense<br />
i<strong>na</strong>ugurou sua primeira Sala Vip, em<br />
Blume<strong>na</strong>u, e lançou uma frota de ônibus<br />
articula<strong>do</strong>s que rodava entre Blume<strong>na</strong>u,<br />
Balneário Camboriú e Itajaí,<br />
que, pelas características da rota, levava<br />
e trazia passageiros para o trabalho.<br />
Os articula<strong>do</strong>s, com capacidade para<br />
150 pessoas, 62 sentadas, rodaram por<br />
mais de vinte anos.<br />
Em janeiro de 1983, a empresa<br />
adquiriu a Companhia Rex de Transportes,<br />
com quem disputava algumas linhas.<br />
Foi também o ano em que passou<br />
a circular a série Globetrotter de carros e<br />
quan<strong>do</strong> a Catarinense foi surpreendida<br />
por uma grande enchente, que implicou<br />
em grandes perdas e no atraso de seu<br />
plano de desenvolvimento.
97
Pioneira<br />
Aempresa ro<strong>do</strong>viária mais antiga <strong>do</strong> país<br />
seguiu escreven<strong>do</strong> sua história de pioneirismo,<br />
apostan<strong>do</strong> em tecnologia, experimentan<strong>do</strong><br />
equipamentos que, só depois de<br />
aprova<strong>do</strong>s pelo corpo técnico e operacio<strong>na</strong>l<br />
da empresa, chegavam ao merca<strong>do</strong> brasileiro.<br />
Em diferentes ocasiões nesse perío<strong>do</strong>, a Catarinense<br />
resolveu problemas de adaptação<br />
de carros vin<strong>do</strong>s da Europa às condições <strong>do</strong><br />
Brasil, além de introduzir, no passa<strong>do</strong>, uma<br />
série de inovações, das quais muitas são hoje<br />
a<strong>do</strong>tadas por outras empresas <strong>do</strong> setor. Foi<br />
pioneira no uso de rodas forjadas em alumínio,<br />
<strong>na</strong> aquisição de carros com suspensão a<br />
ar, <strong>na</strong> utilização <strong>do</strong> bafômetro, <strong>na</strong> introdução<br />
<strong>do</strong> primeiro carro com “piso alto” no Brasil,<br />
em 1978, e <strong>na</strong> a<strong>do</strong>ção da distância de 90 a 95<br />
centímetros entre as poltro<strong>na</strong>s, permitin<strong>do</strong><br />
que o passageiro <strong>do</strong> assento da janela saísse<br />
de seu lugar sem que o da poltro<strong>na</strong> <strong>do</strong> corre<strong>do</strong>r<br />
precisasse se levantar, dentre outras comodidades.<br />
98<br />
Um susto!<br />
Em 1983, a Catarinense se viu em situação complicada.<br />
Uma enchente inun<strong>do</strong>u a sede da empresa, e 27<br />
veículos ficaram debaixo d`água. Havia, no almoxarifa<strong>do</strong><br />
alaga<strong>do</strong>, cerca de 17.000 itens. Um enorme prejuízo.<br />
Embora a maioria dissesse que outra daquelas não<br />
voltaria a acontecer em pelo menos um século, os proprietários<br />
decidiram mudar a disposição <strong>do</strong> depósito, passan<strong>do</strong><br />
tu<strong>do</strong> para o alto. Sorte a deles! Em 1984, contrarian<strong>do</strong> as<br />
previsões <strong>do</strong>s otimistas, veio ainda mais água, 10 centímetros<br />
acima <strong>do</strong> nível registra<strong>do</strong> <strong>do</strong>ze meses antes. Na noite<br />
anterior, chegara à garagem um carro novinho, o 1301. A<br />
televisão mostrava tu<strong>do</strong> e, em casa, funcionários e acionistas<br />
se desesperavam. Mas, pela telinha mesmo, puderam<br />
ver que o ônibus recém-adquiri<strong>do</strong> estava a salvo, <strong>na</strong> rampa<br />
de manutenção. Mas que foi um susto, foi!
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100<br />
O Grupo <strong>JCA</strong> chega à Catarinense,<br />
respeitan<strong>do</strong> seus valores<br />
“A<br />
s pessoas em primeiro lugar”. O lema<br />
registra<strong>do</strong> <strong>na</strong> carta de fundação da<br />
Auto Viação Catarinese marcou a aquisição<br />
da empresa pelo Grupo <strong>JCA</strong>, em 1995. Seu<br />
Jelson queria crescer em direção ao Sul, e a<br />
compra de uma empresa com o histórico da<br />
Catarinense pareceu um ótimo negócio. Cientes<br />
da tradição e qualidade <strong>do</strong>s serviços presta<strong>do</strong>s,<br />
os responsáveis por assumir o controle<br />
da empresa, embora certos de que ela precisava<br />
ser modernizada, absorveram os antigos<br />
funcionários que quiseram ficar com o grupo<br />
no enfrentamento desse desafio. Muitas dessas<br />
pessoas cresceriam com a empresa que,<br />
no tempo da negociação, contava com cerca<br />
de 500 colabora<strong>do</strong>res e 132 veículos.<br />
No primeiro diagnóstico da empresa,<br />
foi decidi<strong>do</strong> que a sede teria de mudar de Blume<strong>na</strong>u<br />
para Florianópolis tão logo fosse possível.<br />
O Grupo <strong>JCA</strong> se empenharia em fazê-la<br />
crescer com o padrão de qualidade com que<br />
fora escrita sua história, ciente de que se tratava<br />
de patrimônio <strong>do</strong> povo catarinense. Basta<br />
dizer que logo depois que o grupo assumiu<br />
a empresa, o então gover<strong>na</strong><strong>do</strong>r de Santa Catari<strong>na</strong>,<br />
Paulo Afonso Evangelista Vieira, em<br />
audiência com os novos controla<strong>do</strong>res perguntou,<br />
preocupa<strong>do</strong>, se o nome seria troca<strong>do</strong>.<br />
Os novos proprietários tranqüilizaram o<br />
administra<strong>do</strong>r. A Catarinense seguiria pela<br />
estrada levan<strong>do</strong> o nome Catarinense.
101
102<br />
Aula de bons negócios com seu Jelson<br />
Como tu<strong>do</strong> que se relacio<strong>na</strong>va às empresas <strong>do</strong> Grupo <strong>JCA</strong> enquanto esteve<br />
à frente, seu Jelson participou de cada momento da idealização<br />
e construção da nova sede da Auto Viação Catarinense, em Florianópolis.<br />
Da planta à aquisição <strong>do</strong> terreno. A mudança para a capital <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> era<br />
um sonho <strong>do</strong>s antigos sócios, que, por apego às origens e falta de uma boa<br />
oportunidade, não conseguiram realizar. Arroja<strong>do</strong>, seu Jelson dissera desde<br />
o momento da compra, em 1999: “Essa matriz está em lugar erra<strong>do</strong>”. E,<br />
no mesmo ano, saiu à procura de um local adequa<strong>do</strong>, dan<strong>do</strong> uma aula de<br />
como fazer bons negócios aos colabora<strong>do</strong>res que o acompanharam nessa<br />
etapa. Começavam a negociar um terreno, alinhavavam o negócio e, quan<strong>do</strong><br />
estavam quase fechan<strong>do</strong>, nos termos pretendi<strong>do</strong>s, seu Jelson não fechava.<br />
Ninguém entendia. Às vezes, batia o pé: “Não querem vender? Pois<br />
vou embora!”. Dessa forma, com toda essa visão e técnica, seu Jelson fazia<br />
sempre um ótimo negócio. Assim foi com o terreno em Florianópolis e o<br />
mesmo se repetiria <strong>na</strong> aquisição de outras áreas para a construção de bases,<br />
como a de Curitiba. Mas, então, seus companheiros de viagem já haviam<br />
aprendi<strong>do</strong> e até ensi<strong>na</strong>vam que melhor era fi car quieto porque o seu Jelson<br />
tinha sempre um bom desfecho para o negócio, <strong>na</strong> manga.
Acompra das linhas da Viação Itapemirim e da Empresa<br />
Nossa Senhora da Penha, em 1999, praticamente<br />
duplicou a Catarinense em receita, frota e número<br />
de funcionários. E diferentemente de uma linha de<br />
produção de bens materiais de consumo, que pode ser<br />
parada numa ocasião dessas, linhas de ônibus não devem<br />
falhar. E a negociação foi feita <strong>do</strong>is dias antes <strong>do</strong>s<br />
feria<strong>do</strong>s de Páscoa, quan<strong>do</strong> o movimento <strong>na</strong> região era e<br />
<br />
<br />
continua gigantesco. Isto é, a equipe da Catarinense tinha<br />
<strong>do</strong>is dias para organizar a passagem <strong>do</strong>s funcionários<br />
que operavam nessas linhas de uma empresa para a<br />
outra. E assim o fez. Os motoristas foram comunica<strong>do</strong>s<br />
da venda da empresa e de sua permanência <strong>na</strong> função.<br />
Na garagem da Penha, em Curitiba, foi cedi<strong>do</strong> um espaço<br />
à administração da nova proprietária das linhas. Numa<br />
sala, a Penha fazia o desligamento <strong>do</strong>s funcionários, e<br />
<strong>na</strong> sala ao la<strong>do</strong>, a Catarinense efetivava suas contratações,<br />
sem que nenhum passageiro perdesse viagem.<br />
103
104
A Companhia Rex de Transportes,<br />
já controlada pela Catarinense desde o<br />
início <strong>do</strong>s anos 1980, foi incorporada e<br />
todas as suas linhas assumidas por ela,<br />
com ganhos no custo de manutenção,<br />
operacio<strong>na</strong>lização e administração.<br />
Em 1999, a Catarinense deu um salto<br />
praticamente <strong>do</strong>bran<strong>do</strong> de tamanho.<br />
A compra de cinco linhas da Viação Itapemirim<br />
e 23 da Empresa Nossa Senhora<br />
da Penha ampliava para 113 o número de<br />
rotas e crescia em São Paulo e no Paraná.<br />
De 550 funcionários passou a mais<br />
de mil, e a frota de cerca de 200 carros<br />
ganhou mais 118.<br />
E ainda em 1999 começou o trabalho<br />
<strong>do</strong> Grupo <strong>JCA</strong> e da Catarinense em<br />
torno <strong>do</strong> projeto de construção da nova<br />
sede em Florianópolis, numa área de 34<br />
mil metros quadra<strong>do</strong>s. Um espaço de 7,9<br />
mil metros quadra<strong>do</strong>s cobertos, desti<strong>na</strong><strong>do</strong><br />
a receber a frota e todas as necessidades<br />
operacio<strong>na</strong>is e administrativas da<br />
empresa. A mudança aconteceu em 2001,<br />
comemorada com grande festa.<br />
105
106<br />
Miran<strong>do</strong> o futuro<br />
Anova administração trouxe consigo<br />
sua filosofia de investimento <strong>na</strong> diversidade<br />
e <strong>na</strong> extensão de serviços para<br />
além da viagem. Foram introduzi<strong>do</strong>s os<br />
carros Double Decker com duas classes<br />
de serviços, em linhas regulares, e as Salas<br />
Vips com conexão sem fio à internet,<br />
hoje instaladas em Blume<strong>na</strong>u, Joinville,<br />
Curitiba, Florianópolis e Joaçaba.<br />
Sete linhas ligan<strong>do</strong> Porto Alegre a<br />
cidades <strong>do</strong> Sul de Santa Catari<strong>na</strong> e a Florianópolis,<br />
fazen<strong>do</strong> Tubarão - Curitiba -<br />
São Paulo, foram adquiridas em 2004.<br />
No ano seguinte, a Catarinense<br />
adquiriu a empresa Sul America<strong>na</strong>, com<br />
cerca de 35 carros e quatro linhas. E, em<br />
2006 e 2007, o processo de modernização da empresa incluiu a compra de passagens<br />
pela central telefônica e internet.<br />
Hoje, <strong>na</strong> Catarinense que <strong>na</strong>sceu da coragem de Theo<strong>do</strong>r Darius, João<br />
Hahn e A<strong>do</strong>lfo Hass, trabalham cerca de 1.300 pessoas. São 400 ônibus rodan<strong>do</strong><br />
pelos Esta<strong>do</strong>s de Santa Catari<strong>na</strong>, Rio Grande <strong>do</strong> Sul, Paraná e São Paulo, com a<br />
segurança e a qualidade de serviço pautadas por seus funda<strong>do</strong>res. Os passageiros,<br />
que já elogiavam a empresa nos tempos em que a bagagem viajava a seus pés<br />
e o lanche era leva<strong>do</strong> de casa, hoje podem comprar suas passagens nos termi<strong>na</strong>is<br />
ro<strong>do</strong>viários, agências próprias ou terceirizadas, pelo telefone ou pela internet.<br />
Têm à sua disposição uma variada família de serviços e tarifas, que seu Jelson<br />
fez questão de implantar em todas as suas empresas. Afi<strong>na</strong>l, como dizia seu Jelson,<br />
que soube abrir novos caminhos para a Catarinense, “hoje, temos de atender<br />
ao cliente quan<strong>do</strong> ele precisa, no horário que ele quer e da forma como ele se<br />
sente bem. Quanto maior a satisfação <strong>do</strong> cliente, melhor”.
107
Tu<strong>do</strong> começou no<br />
Jabaquara<br />
108
E<br />
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110<br />
Como o acesso fosse muito limita<strong>do</strong>, os empreende<strong>do</strong>res decidiram<br />
montar uma linha de ônibus que fizesse a ligação <strong>do</strong> Jabaquara<br />
à Praça Clóvis Beviláqua, no centro da capital paulista<strong>na</strong>. Foram<br />
adquiridas seis licenças, <strong>na</strong> época cedidas por veículos, e, assim,<br />
criada a Auto Viação Jabaquara. Para gerir o novo negócio, foi<br />
convida<strong>do</strong> o engenheiro aeronáutico, oficial avia<strong>do</strong>r da Aeronáutica Italia<strong>na</strong>, Tito Mascioli,<br />
que participara da primeira travessia <strong>do</strong> Oceano Atlântico, em 1931, quan<strong>do</strong> conhecera o<br />
Brasil. Anos depois voltaria ao país para ficar e fazer história.
Afi cio<strong>na</strong><strong>do</strong> por inovações tecnológicas e<br />
com profun<strong>do</strong> conhecimento em logística de<br />
transportes, seu Tito, como viria a ser conheci<strong>do</strong>,<br />
fez a empresa progredir rapidamente.<br />
Cerca 40% <strong>do</strong> transporte urbano de São Paulo<br />
era feito pela Auto Viação Jabaquara quan<strong>do</strong>,<br />
em 1946, foi criada a Companhia Municipal<br />
de Transportes Coletivos, que encampou todas<br />
as empresas particulares. A família Rocha<br />
Miranda decidiu, então, retirar-se <strong>do</strong> setor<br />
de transporte de passageiros. Artur Brandi<br />
mu<strong>do</strong>u-se para o Rio de Janeiro e, até 1955,<br />
tocou a Viação Relâmpago, criada em sociedade<br />
com seu Tito. Relâmpago de quem seu<br />
Jelson compraria aquele já famoso primeiro<br />
“meio ônibus”.<br />
Em 1947, Tito Mascioli adquiriu a Viação<br />
São Paulo–Santos Ltda., que, desde 1943,<br />
já fazia a viagem ao Litoral paulista, com duração<br />
de uma hora e quarenta minutos. A estrela<br />
que estampava os ônibus ganhou uma<br />
cauda cinco anos depois e foi a inspiração para<br />
o novo nome da empresa: Viação Cometa S.A.<br />
E os carros da Cometa passaram a ser vistos<br />
Brasil afora, como “as luzes da estrada”.<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
America Magazine<br />
111
O Twin Coach<br />
<br />
<br />
112<br />
Chegam os Twin Coachs e a Cometa<br />
cresce<br />
Trinta ônibus americanos Twin Coach chegaram ao<br />
Porto de Santos, em 1948, adquiri<strong>do</strong>s pela Viação<br />
Cometa. Modernos, rodavam com motor Fageol de 6<br />
cilindros, 180 hp de potência e com câmbio devidamente<br />
adapta<strong>do</strong> ao sobe-e-desce da estrada em serra.<br />
A negociação <strong>do</strong>s carros fabrica<strong>do</strong>s em Kent, no Esta<strong>do</strong><br />
de Ohio, foi feita por Ítalo Breda, que viera para<br />
a Cometa com a aquisição da Auto Viação São Paulo-Santos,<br />
da qual seu pai era um <strong>do</strong>s proprietários.<br />
Breda, que mais tarde fundaria a própria empresa, já<br />
mantinha contato com a fábrica <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s,<br />
viajou para lá e ainda conduziu os testes realiza<strong>do</strong>s<br />
com o primeiro carro desembarca<strong>do</strong> no Brasil. Foi ele<br />
o autor <strong>do</strong> lau<strong>do</strong> que levou o fabricante a adaptar as<br />
engre<strong>na</strong>gens <strong>do</strong> câmbio às condições <strong>do</strong> trajeto feito<br />
pelos ônibus.<br />
Em 1949, a Cometa incorporou a Expresso<br />
Bandeirantes Viação S.A. e, no ano seguinte, passou<br />
a operar o transporte coletivo urbano da cidade de<br />
Campi<strong>na</strong>s, por meio da subsidiária Companhia Campineira<br />
de Transporte Coletivo, serviço que exploraria<br />
até 1988.<br />
A Cometa não parava de crescer e ampliou a área<br />
de atuação no interior <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de São Paulo ao comprar,<br />
também em 1950, a Rápi<strong>do</strong> Serrano Viação S.A.<br />
Diferentemente da Expresso Bandeirantes, que tivera<br />
o nome extinto ao ser incorporada, a marca Rápi<strong>do</strong><br />
Serrano foi conservada, fazen<strong>do</strong> as linhas São Paulo–<br />
Campi<strong>na</strong>s, São Paulo - Jundiaí e São Paulo - Sorocaba.
O mito João Havelange<br />
- “D<br />
e quem é a Viação Cometa?”<br />
- “Do Havelange, claro. Do<br />
João Havelange da FIFA.”<br />
De fato, o advoga<strong>do</strong> João Havelange<br />
chegou a presidir a Cometa e<br />
manteve uma participação minoritária<br />
<strong>na</strong> empresa até o momento da venda<br />
para o Grupo <strong>JCA</strong>, em 2002. Sua amizade<br />
e parceria com Tito Mascioli datavam<br />
de 1940, quan<strong>do</strong>, recém-forma<strong>do</strong>,<br />
viera <strong>do</strong> Rio de Janeiro para São Paulo<br />
e passara a trabalhar como advoga<strong>do</strong><br />
da Auto Viação Jabaquara.<br />
Sete anos depois estava <strong>na</strong> Cometa<br />
e foi presidente da antiga Confederação<br />
Brasileira de Desportos - CBD<br />
(atual Confederação Brasileira de Futebol<br />
- CBF) de 1956 a 1974 e diretor da<br />
Fédération Inter<strong>na</strong>tio<strong>na</strong>le de Football<br />
Association - FIFA no perío<strong>do</strong> de 1974<br />
a 1998. Virou, então, o grande cartão<br />
de visitas da empresa, representan<strong>do</strong>-a<br />
seja lá em que parte <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> estivesse.<br />
Como seu Tito e os fi lhos Arthur<br />
e Felipe fossem bastante reserva<strong>do</strong>s<br />
e preferissem não aparecer,<br />
Havelange cumpria muito bem<br />
esse papel de porta-voz. Daí muita<br />
gente acreditar, até hoje, que o <strong>do</strong>no da<br />
Cometa era o Dr. João Havelange.<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
113
É um pássaro? Um avião?<br />
<br />
ARo<strong>do</strong>via Presidente Dutra fora recémi<strong>na</strong>ugurada<br />
quan<strong>do</strong> chegaram ao Brasil<br />
os ônibus que se tor<strong>na</strong>riam ícone <strong>do</strong> transporte<br />
ro<strong>do</strong>viário e “a cara da Cometa”. Um<br />
sucesso em termos de rendimento e marca.<br />
Seu design e estrutura seriam referências<br />
para modelos futuros da empresa. Eram<br />
trinta carros norte-americanos GM Coach<br />
modelo PD-4104, com 41 poltro<strong>na</strong>s revestidas<br />
de corvim estampa<strong>do</strong> de flores vermelhas,<br />
carroceria de alumínio, prateada, com<br />
faixas creme e azul, além de um belíssimo<br />
cometa <strong>na</strong> parte traseira. A bor<strong>do</strong> dessas<br />
máqui<strong>na</strong>s com motor traseiro transversal<br />
de 6 cilindros e 211 cv de potência, suspensão<br />
a ar, vidros ray-ban e ar-condicio<strong>na</strong><strong>do</strong>, a<br />
Cometa avançou até os anos 1980.<br />
Tão marcante era a sua passagem, tão<br />
forte a revolução que impunha, que o modelo<br />
foi batiza<strong>do</strong> de “Morubixaba”, expressão<br />
indíge<strong>na</strong> que significa “chefe da tribo”.<br />
Como não houvesse limite de velocidade<br />
<strong>na</strong>quele tempo, rodava pela estrada a 120<br />
quilômetros por hora, arrebanhan<strong>do</strong> fãs,<br />
com o ronco peculiar de seu motor de <strong>do</strong>is<br />
tempos.<br />
Ao longo da década de 1950, outras<br />
inovações seriam implementadas, seguin<strong>do</strong><br />
a política da empresa de “crescer para<br />
114<br />
dentro” 1 : ao invés de ampliar o número e a<br />
extensão das linhas, a ordem era aprimorar<br />
e consolidar o que já existia. Concentrou suas<br />
atividades, então, nos Esta<strong>do</strong>s de São Paulo,<br />
1 A expressão era usada por Arthur Mascioli, exproprietário<br />
da Viação Cometa, para explicar a<br />
política de expansão da empresa: “em vez de crescer<br />
para fora, como faz a maioria <strong>do</strong>s concorrentes,<br />
optamos por crescer para dentro. Preferimos<br />
criar uma sólida base inter<strong>na</strong> a ampliar o número<br />
e a extensão das linhas.” Revista Transporte Moderno,<br />
ano 26, nº 284, setembro de 1987.
Rio de Janeiro, Mi<strong>na</strong>s Gerais e Paraná, facilitan<strong>do</strong> o controle<br />
e suporte técnico. Seguin<strong>do</strong> essa diretriz, a extensão<br />
da área de atuação da empresa foi limitada a um raio de no<br />
máximo 600 quilômetros da capital paulista. Já acreditavam,<br />
<strong>na</strong> época, que as viagens longas eram mais adequadas<br />
ao transporte aéreo.<br />
Num tempo em que dar um telefonema consistia em<br />
verdadeiro exercício de paciência, a Cometa foi pioneira ao<br />
introduzir, em 1956, um eficiente sistema de comunicação<br />
por rádio, que integrava ônibus, viaturas auxiliares e termi<strong>na</strong>is<br />
ro<strong>do</strong>viários. As redes formadas por rádios transmissores<br />
Motorola VHF (Very High Frequency) contavam<br />
115
America<br />
Magazine<br />
116<br />
<br />
Ser motorista da Cometa era<br />
uma honra. Os Morubixabas<br />
eram vistos <strong>na</strong> estrada como<br />
verdadeiros postos avança<strong>do</strong>s<br />
da Polícia Ro<strong>do</strong>viária. Perdeu o<br />
caminho e precisa retor<strong>na</strong>r? Na<br />
próxima parada, pergunte a um<br />
motorista da Cometa.<br />
Quantas e quantas vezes não se ouviu<br />
esse conselho: “Vá sempre atrás de um carro<br />
da Cometa, principalmente se tiver chuva ou<br />
nebli<strong>na</strong>”?!<br />
E a fama não surgira <strong>do</strong> <strong>na</strong>da. A preocupação<br />
com a avaliação e formação de seus<br />
motoristas sempre caracterizou a empresa.<br />
Muitos vinham da roça, aprendiam a dirigir<br />
um trator, um caminhão e chegavam à cidade<br />
para ser motorista de ônibus. Era preciso<br />
formá-los com muito critério.<br />
<br />
<br />
<br />
Em 1948, quan<strong>do</strong> não havia<br />
ainda o exame psicotécnico obrigatório, a<br />
Cometa criou o próprio departamento médico<br />
e psicotécnico, com meto<strong>do</strong>logia e equipamentos<br />
importa<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s. Eram<br />
realiza<strong>do</strong>s testes de qualidade da visão, reação<br />
ao ofuscamento, reação a estímulos, entre outros,<br />
algo que não se fazia em nenhum outro<br />
lugar no país. Nisso também a Cometa foi pioneira<br />
e serviu de referência quan<strong>do</strong> ocorreu a<br />
implantação de normas de transporte a nível<br />
<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l.<br />
Selecio<strong>na</strong><strong>do</strong>s, os novos motoristas da<br />
Cometa passavam por um trei<strong>na</strong>mento que<br />
não incluía só conhecimentos técnicos e procedimentos<br />
ao volante, mas ainda a apresentação<br />
pessoal e – muito importante! – o bom relacio<strong>na</strong>mento<br />
com os passageiros. A princípio,<br />
o departamento recebia também motoristas<br />
de outras empresas para exame, mas decidiu<br />
focar o serviço nos próprios profi ssio<strong>na</strong>is, de
forma a elevar a qualidade. Qualidade que<br />
se materializava em segurança, credibilidade<br />
e numa excelente imagem no merca<strong>do</strong>.<br />
A fama de absoluto rigor <strong>na</strong> avaliação<br />
<strong>do</strong>s motoristas da Cometa era tão grande,<br />
que até se criou certo folclore em torno disso.<br />
Uma das “lendas” conta que, em da<strong>do</strong><br />
momento <strong>do</strong> teste, era coloca<strong>do</strong> um ovo<br />
atrás de um pneu traseiro <strong>do</strong> carro, num<br />
declive suave – e o motorista que quebrasse<br />
o ovo ao partir estava fora. Como também<br />
se dizia que não era aceito aquele que derrubasse<br />
o copo de água coloca<strong>do</strong> sobre o<br />
painel <strong>do</strong> ônibus.<br />
A Viação Cometa foi a primeira empresa<br />
a adquirir um bafômetro e instituir<br />
o gráfico de serviço <strong>do</strong> motorista (GSM).<br />
Numa folha com 24 quadradinhos que representavam<br />
as 24 horas <strong>do</strong> dia, o condutor<br />
<strong>do</strong> carro marcava horas de serviço ao volante,<br />
em serviço mas fora <strong>do</strong> volante, horas<br />
fora de serviço e as oito horas de sono<br />
que ele devia cumprir nos <strong>do</strong>rmitórios da<br />
empresa. Antes disso, <strong>na</strong>da de estrada.<br />
Além de atento ao caminho, o motorista<br />
da Cometa tinha e – tem de estar!<br />
– sempre alerta. Um caso que ilustra essa<br />
necessidade ocorreu numa viagem entre<br />
São Paulo e Curitiba. Se hoje reclamam que<br />
a estrada é precária, muito pior era nessa<br />
época. Entre um buraco e outro, uma passageira<br />
entrou em trabalho de parto! Como<br />
a empresa fosse pioneira no sistema<br />
de comunicação, o condutor<br />
<strong>do</strong> carro não estava sozinho. Não<br />
havia nenhum hospital <strong>na</strong>s cidades<br />
próximas, e o motorista fez,<br />
então, contato por rádio com a<br />
agência da cidade de Registro, pedin<strong>do</strong> que<br />
deixassem tu<strong>do</strong> prepara<strong>do</strong> para socorrer a<br />
passageira. Mas <strong>na</strong>da disso foi necessário,<br />
afi<strong>na</strong>l. Como o trabalho de parto avançasse<br />
rapidamente e a mulher sofresse com as<br />
<strong>do</strong>res, o motorista teve de encostar o carro<br />
e acabou trazen<strong>do</strong> à luz mais uma brasileirinha.<br />
A bor<strong>do</strong> de um Cometa!<br />
<br />
<br />
<br />
117
118<br />
com 500 estações móveis que equipavam<br />
os ônibus que rodavam em linhas longas<br />
e as viaturas auxiliares, mais 65 estações<br />
fixas situadas ao longo das rotas e nos<br />
termi<strong>na</strong>is das linhas, além de oito repeti<strong>do</strong>ras.<br />
A empresa operou com esse sistema<br />
até mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s anos 1990.<br />
Outro passo lá adiante da<strong>do</strong> pela<br />
Cometa foi a implantação <strong>do</strong> computa<strong>do</strong>r,<br />
em janeiro de 1958, começan<strong>do</strong> com<br />
um tabula<strong>do</strong>r IBM. Em 1964, a empresa<br />
investiria <strong>na</strong> modernização de seu CPD<br />
(Centro de Processamento de Da<strong>do</strong>s), adquirin<strong>do</strong><br />
um computa<strong>do</strong>r Ramac 35 da<br />
IBM. À válvula!<br />
Por muitos anos, a Cometa foi a única<br />
empresa <strong>do</strong> setor a utilizar computa<strong>do</strong>r<br />
<strong>na</strong> integração de serviços, e hoje seu CPD<br />
é referência de qualidade e eficiência.<br />
A prosperidade nos anos 1960<br />
Os chama<strong>do</strong>s Lagartão e Imperial,<br />
tecnicamente identifica<strong>do</strong>s como<br />
GM PD-4101 e PD-4103, haviam si<strong>do</strong><br />
compra<strong>do</strong>s da Expresso Brasileiro de Viação<br />
Limitada e foram usa<strong>do</strong>s para o começo<br />
da operação da linha São Paulo - Curitiba,<br />
em 1961.<br />
A parceria com a Scania começou<br />
nesse mesmo ano, quan<strong>do</strong> a Cometa ad-<br />
quiriu um chassi B-71 importa<strong>do</strong> para<br />
testes e mu<strong>do</strong>u as regras <strong>na</strong> empresa, que,<br />
<strong>na</strong>quele tempo, tinha cerca de 300 carros<br />
da Mercedes-Benz, sen<strong>do</strong> uma das maiores<br />
frotas da marca no mun<strong>do</strong>.<br />
Em 1962, foi i<strong>na</strong>ugurada uma nova<br />
garagem central no bairro da Vila Maria,<br />
zo<strong>na</strong> norte de São Paulo, onde a empresa<br />
funcio<strong>na</strong> até os dias de hoje. E, em mea<strong>do</strong>s<br />
<strong>do</strong>s anos 1960, a Cometa implantou o<br />
serviço de transporte urbano em Ribeirão<br />
Preto, que operaria até 1983.<br />
Os chama<strong>do</strong>s carros Papo Amarelo<br />
<strong>na</strong>sceram em 1963, com carroceria em<br />
duralumínio, da Ciferal <strong>do</strong> Rio de Janeiro.<br />
Embora mais caro, o material era mais<br />
resistente e leve, poupan<strong>do</strong> motor, freios<br />
e pneus, permitin<strong>do</strong> ao carro rodar rapidamente.<br />
Consolidava-se a parceria também<br />
com a Ciferal. Dessas parcerias, saíram<br />
o Flecha de Prata, Jumbo B, Jumbo<br />
C, Turbo Jumbo e o famoso Dinossauro,<br />
lança<strong>do</strong> em 1972. Sempre manten<strong>do</strong> o<br />
jeitão <strong>do</strong>s ônibus norte-americanos, brilhan<strong>do</strong><br />
pelas estradas.<br />
Em 1976, o Dinossauro passou por<br />
peque<strong>na</strong>s mudanças no visual. Aban<strong>do</strong>nou<br />
elementos, como pára-choques de<br />
alumínio, vidros traseiros e tomadas de<br />
ar, para incorporar traseira, pára-choques<br />
em fibra de vidro, motor intercoola<strong>do</strong> e<br />
caixa transversal.
Dinossauros<br />
<br />
<br />
Papo Amarelo<br />
119
As corujinhas da Cometa<br />
Até aquele momento só homens trabalhavam <strong>na</strong> Viação<br />
Cometa. Fim <strong>do</strong>s anos 1960. Foi quan<strong>do</strong> elas<br />
chegaram deixan<strong>do</strong> os ônibus da empresa ainda com<br />
mais cara de avião. No princípio eram dez. Experiente,<br />
Dirce de Oliveira, que já vinha da Impala, dava trei<strong>na</strong>mento<br />
às recém-admitidas ro<strong>do</strong>moças da Cometa. As<br />
candidatas eram submetidas ao exame psicotécnico,<br />
passavam por uma entrevista que testava seu “nível intelectual<br />
e o desembaraço”, tinham de ter mais de 18<br />
anos e “boa aparência”.<br />
E o que fazia uma ro<strong>do</strong>moça? Recepcio<strong>na</strong>va o passageiro,<br />
cuidava para que ele viajasse confortavelmente,<br />
com manta e travesseiro, servia-lhe o café, o lanchinho<br />
e fi cava atenta às janelas, que <strong>na</strong>quele tempo ainda eram<br />
“de abrir”. Afi <strong>na</strong>l, era preciso fechar as cortininhas para<br />
que o vento não incomodasse ninguém.<br />
<br />
120
Equilíbrio era fundamental para<br />
caminhar pelo ônibus em movimento, de<br />
salto alto, com uma bandeja <strong>na</strong>s mãos.<br />
O uniforme, feito especialmente para<br />
elas, incluin<strong>do</strong> os sapatos, tinha uma saia<br />
“bem curtinha”. Mas aí de quem fizesse<br />
gracinha com uma delas! O próprio motorista<br />
nem parava para conversar com a<br />
ro<strong>do</strong>moça, porque era advertência <strong>na</strong> certa.<br />
Tu<strong>do</strong> <strong>na</strong> maior discipli<strong>na</strong> e respeito.<br />
Chegaram a formar um time grande,<br />
já que saíam carros comerciais de<br />
hora em hora, to<strong>do</strong>s com a ro<strong>do</strong>moça a<br />
bor<strong>do</strong>. Mais tarde, o serviço ficou restrito<br />
aos carros-leito, que faziam as linhas que<br />
ligavam São Paulo a Curitiba, Rio de Janeiro,<br />
Juiz de Fora, Belo Horizonte e São<br />
José <strong>do</strong> Rio Preto.<br />
De volta da viagem, <strong>na</strong> garagem da<br />
Vila Maria, subiam para os alojamentos<br />
e tinham que descansar por pelo menos<br />
seis horas. Durante as viagens, que duravam<br />
oito, nove, <strong>do</strong>ze horas, nem pensar<br />
em <strong>do</strong>rmir. A fiscalização estava sempre<br />
atenta e era preciso ter os olhos sempre<br />
bem abertos. Daí o apeli<strong>do</strong> carinhoso: corujinhas.<br />
Em 2005, a Cometa quebraria mais<br />
um grande tabu entre as empresas de<br />
transporte ro<strong>do</strong>viário ao recrutar mulheres<br />
para integrar seu quadro de motoristas<br />
e, em 2006, também para a ofici<strong>na</strong>.<br />
121
122
Nasce a CMA<br />
Em 1983, a Ciferal, grande parceira da<br />
Cometa <strong>na</strong> produção de carrocerias,<br />
apresentava sérias dificuldades e entrou em<br />
concordata. Como não encontrasse quem<br />
prosseguisse o trabalho que a empresa <strong>do</strong> Rio<br />
de Janeiro desenvolvia para a sua firma, seu<br />
Tito optou por abrir a própria fábrica de carrocerias,<br />
a Companhia Manufatureira Auxiliar<br />
- CMA. Reuniu, para isso, uma série de<br />
profissio<strong>na</strong>is que já trabalhavam <strong>na</strong> produção<br />
<strong>do</strong> Dinossauro.<br />
A CMA fora instalada numa área de<br />
11.000 metros quadra<strong>do</strong>s. Da linha de produção,<br />
saía diariamente um Dinossauro IV.<br />
Esse carrão da Cometa em <strong>na</strong>da que se parecia<br />
com as antigas jardineiras: tinha freios<br />
ABS, câmbio Confort Shift hidráulico, que<br />
pré-selecio<strong>na</strong>va as marchas, e caixa de mudanças<br />
com sete velocidades. Posteriormente,<br />
o Dinossauro seria rebatiza<strong>do</strong> de Flecha Azul.<br />
Em 1984, deslizava sem solavancos pela<br />
estrada, o primeiro Flecha Azul Automático,<br />
prefixo 5223, com chassi BR-116 e caixa eletroautomática,<br />
importada da Suécia. Ainda<br />
no mesmo ano, foi lançada uma nova série, a<br />
53, composta por carros equipa<strong>do</strong>s com câmbio<br />
automático computa<strong>do</strong>riza<strong>do</strong>. O anúncio<br />
da novidade comparava os bancos de legítimo<br />
couro vermelho aos de um Rolls Royce, venden<strong>do</strong><br />
luxo e tecnologia.<br />
A movimentada linha Rio - São Paulo<br />
No dia 17 de dezembro de 1985, entrou em<br />
funcio<strong>na</strong>mento a Ponte Ro<strong>do</strong>viária Rio -<br />
São Paulo. Inspirada no modelo da Ponte Aérea, a<br />
operação entre as duas importantes cidades brasileiras<br />
ficou sob a responsabilidade de um consórcio<br />
de empresas. No lançamento, o movimento<br />
era intenso no Termi<strong>na</strong>l Ro<strong>do</strong>viário <strong>do</strong> Tietê, em<br />
São Paulo. Ple<strong>na</strong> sema<strong>na</strong> de Natal e ali estavam<br />
presentes Tito Mascioli, da Cometa, Camilo Cola,<br />
da Itapemirim, e Laurin<strong>do</strong> Romano, da Expresso<br />
Brasileiro, além de executivos das três empresas<br />
reunidas no consórcio.<br />
As concessões de operação da linha já existiam<br />
antes <strong>do</strong> estabelecimento da Ponte, desde<br />
1951, e pertenciam à Única, à Cometa e à Pássaro<br />
Marrom. A Única operou até 1980, quan<strong>do</strong> transferiu<br />
a linha para a Viação Itapemirim. A Pássaro<br />
Marrom nunca chegou a utilizar a concessão, que<br />
vendeu para a Cometa que ficou, então, com duas<br />
licenças. A 1001 já rodava <strong>na</strong> Via Dutra fazen<strong>do</strong> a<br />
linha Niterói - São Paulo desde os anos 1960, mas<br />
não integrava a Ponte. Até que, em 1998, quan<strong>do</strong><br />
a Expresso Brasileiro decidiu deixar o serviço, a<br />
Cometa lhe vendeu uma de suas concessões,<br />
Na efevercência <strong>do</strong> Plano Cruza<strong>do</strong>, a Ponte<br />
Ro<strong>do</strong>viária chegou a oferecer cerca de 250 viagens<br />
por dia, atingin<strong>do</strong> uma média anual de 3<br />
milhões de passageiros. A partir de 1988, o país<br />
declinou e não foi diferente com o movimento da<br />
Ponte Ro<strong>do</strong>viária, que diminuiu em 50%.<br />
123
124<br />
<br />
<br />
<br />
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<br />
<br />
<br />
A dura realidade <strong>do</strong>s anos 1990<br />
Em 1986, a Cometa atingiu a marca<br />
de 1.150 ônibus, sen<strong>do</strong> 900 ro<strong>do</strong>viários<br />
e 250 urbanos, totalizan<strong>do</strong><br />
22 garagens. Cada equipe cuidava de<br />
50 carros no esquema de manutenção<br />
preventiva, enquanto a corretiva era<br />
feita <strong>na</strong> matriz.<br />
O Flecha Azul V, da série que ia<br />
até o prefi xo 7118, chegou à<br />
estrada em 1994. As poltro<strong>na</strong>s<br />
1-2 e 3-4 não tinham mais as<br />
janelas rebaixadas, herança<br />
<strong>do</strong>s antigos.<br />
Em 1998, o Presidente<br />
Fer<strong>na</strong>n<strong>do</strong> Henrique Car<strong>do</strong>so<br />
assinou decreto-lei2 que<br />
dispunha sobre a exploração<br />
<strong>do</strong>s serviços ro<strong>do</strong>viários interestadual<br />
e inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l<br />
de transporte coletivo de passageiros<br />
diretamente pela União, ou mediante<br />
concessão, tratava em um de seus parágrafos,<br />
da implantação de novos ser-<br />
2 Decreto nº 2.521, de 20 de março de<br />
1998. O Art. 11 incumbe ao Ministério<br />
<strong>do</strong>s Transportes decidir sobre a conveniência<br />
e a oportunidade da licitação para<br />
prestação <strong>do</strong> serviço ro<strong>do</strong>viário interestadual<br />
ou inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l de transporte coletivo<br />
de passageiros.<br />
viços em ligações já atendidas por serviço<br />
regular. Na prática, uma quebra de<br />
reserva de merca<strong>do</strong>. A Cometa, que até<br />
então tinha seu espaço garanti<strong>do</strong>, foi<br />
abalada pela concorrência. A margem<br />
de lucro da empresa, que, em 1995,<br />
fora de 13%, caiu para 1% em 2000.<br />
A Cometa a<strong>do</strong>tou uma política<br />
arriscada diante da situação. Aumentou<br />
a oferta para combater a concorrência,<br />
não só das demais empresas <strong>do</strong><br />
setor, mas, principalmente, <strong>do</strong>s clandestinos<br />
e automóveis de passeio. Na<br />
prática, com taxa de lotação abaixo da<br />
média, ela “pagava” para transportar.<br />
Já deixara o setor urbano em Ribeirão<br />
Preto, onde tinha 600 emprega<strong>do</strong>s,<br />
e, em Campi<strong>na</strong>s, onde chegara a ter<br />
1.200 contrata<strong>do</strong>s. Os proprietários<br />
da Cometa começavam a acreditar que<br />
o transporte de passageiros já não era<br />
mais um bom negócio. Para se manter,<br />
era preciso inovar de alguma maneira.<br />
Em abril de 2000, começaram a<br />
rodar <strong>na</strong> linha São Paulo - Franca os<br />
CMA-VIII e, em setembro de 2001, os<br />
ônibus da Cometa, afi <strong>na</strong>l, aban<strong>do</strong><strong>na</strong>m<br />
aquele jeitão norte-americano que tantas<br />
saudades deixariam, mostran<strong>do</strong>-se<br />
mais modernos e competitivos no merca<strong>do</strong>.<br />
Na linha Rio - São Paulo, a chapa<br />
lisa de alumínio substituiu a corrugada
e se integrou à parte superior, acaban<strong>do</strong><br />
com o degrau que caracterizava o<br />
teto <strong>do</strong> carro. Um grande Cometa tomou<br />
o lugar das faixas laterais, e as janelinhas<br />
de correr foram trocadas por<br />
grandes vidraças coladas. Rodan<strong>do</strong><br />
sobre três eixos, traziam ar-condicio<strong>na</strong><strong>do</strong>,<br />
câmbio semi-automático e eram<br />
80 centímetros mais longo, chegan<strong>do</strong> a<br />
14 metros de comprimento e manten<strong>do</strong><br />
o número de 46 poltro<strong>na</strong>s. Aumentava<br />
o conforto <strong>do</strong>s passageiros. Para<br />
muitos, a mudança foi um choque, mas<br />
a Cometa precisava inovar no design.<br />
O que acontecia há algum tempo é que,<br />
embora a frota fosse periodicamente<br />
renovada, para o passageiro fi cava a<br />
impressão de que os carros eram velhos,<br />
já que o padrão visual não mudava.<br />
Mas foram mantidas as cores, o<br />
azul e o prata, que rodavam pela estrada<br />
desde aqueles primeiros “foguetes”.<br />
Mas as difi culdades não eram<br />
poucas, e a tradicio<strong>na</strong>líssima Cometa,<br />
ainda que praticamente sem dívidas,<br />
via ameaça<strong>do</strong> seu lugar no merca<strong>do</strong>.<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
125
A Cometa reconquista o espaço com o<br />
Grupo <strong>JCA</strong><br />
Em 2002, concluin<strong>do</strong> uma negociação que durou<br />
cerca de três anos, a Viação Cometa foi<br />
vendida para o Grupo <strong>JCA</strong>. Jelson da Costa Antunes<br />
muito admirava Tito Mascioli e a própria<br />
Cometa, e assumiu para o grupo – que já detinha<br />
o controle da Auto Viação 1001, Rápi<strong>do</strong> Ribeirão<br />
Preto, Catarinense, Rápi<strong>do</strong> Macaense e da subsidiária<br />
Barcas S.A. – o desafio de recolocar a empresa<br />
em seu mereci<strong>do</strong> lugar. Com respeito à história e à<br />
sólida cultura da Cometa, seu Jelson sabia que era<br />
preciso modernizá-la, não só <strong>na</strong> gestão como <strong>na</strong><br />
oferta de serviços. Ônibus mais modernos, novos<br />
e com cara de novos.<br />
No dia 9 de dezembro de 2002, a Cometa<br />
lançou em São Paulo os primeiros veículos de uma<br />
frota de mais de 100 ônibus com design moderno<br />
e inova<strong>do</strong>r. A carroceria em que o prata<br />
<strong>do</strong>mi<strong>na</strong>va até então ganhou uma pintura<br />
que ressaltava a idéia de conquista<br />
<strong>do</strong> espaço: em azul, uma meia esfera<br />
representan<strong>do</strong> o planeta Terra. Por<br />
trás dela, o sol surgin<strong>do</strong> como um<br />
arco amarelo. Nas linhas claras, o movimento<br />
das estrelas e, por fim, a imagem<br />
real de um cometa. Nas laterais e <strong>na</strong><br />
traseira: “Cometa”. A nova Cometa.<br />
Motor eletrônico, intercooler de<br />
7,2 litros, alcançan<strong>do</strong> 326 cavalos de po-<br />
126<br />
tência. Com os novos carros, seu Jelson e o Grupo<br />
<strong>JCA</strong> introduziam também uma família de serviços<br />
e tarifas e trabalhavam a diversificação da frota,<br />
adequan<strong>do</strong> condições de conforto a cada tipo de itinerário.<br />
Com grande festa, foram lança<strong>do</strong>s os carros<br />
com duas classes de serviço, os Double Decker,<br />
com poltro<strong>na</strong>s-leito no primeiro piso e executivas<br />
no piso superior.
127
128<br />
<br />
volta a crescer<br />
Com a modernização <strong>do</strong> Termi<strong>na</strong>l Ro<strong>do</strong>viário<br />
<strong>do</strong> Tietê, em São Paulo, ao<br />
fi<strong>na</strong>l de uma grande reforma, a Cometa<br />
passou a oferecer aos clientes uma Sala<br />
Vip onde pudessem aguardar o embarque<br />
com conforto e tranqüilidade. Como bem<br />
dizia a propaganda, “um oásis no Termi<strong>na</strong>l<br />
Tietê”. Investimento <strong>do</strong> Grupo <strong>JCA</strong>, a Sala<br />
Vip passava a atender aos passageiros da<br />
Cometa, da 1001 e da Catarinense.
Como forma de fazer frente à pressão<br />
<strong>do</strong> transporte clandestino e aos chama<strong>do</strong>s<br />
“corujões”, que algumas empresas aéreas<br />
ofereciam <strong>na</strong> madrugada, com tarifas compatíveis<br />
às ro<strong>do</strong>viárias, em 2004 a Cometa<br />
investiu <strong>na</strong> diversificação de serviços. Fortaleceu<br />
a infra-estrutura para fretamento<br />
e encomendas. E, em 2006, cresceu com a<br />
aquisição das linhas São Lourenço - São<br />
Paulo, Caxambu - São Paulo, Barra Mansa<br />
- São Paulo, Volta Re<strong>do</strong>nda - São Paulo,<br />
São José <strong>do</strong>s Campos - Caxambu, São Paulo<br />
- Conceição <strong>do</strong> Rio Verde, São José <strong>do</strong>s<br />
Campos - São Lourenço, São José <strong>do</strong>s Campos<br />
- Lambari, São Paulo - Cruzília e São<br />
Paulo - Andrelândia, ligan<strong>do</strong> os Esta<strong>do</strong>s de<br />
São Paulo, Rio de Janeiro e Mi<strong>na</strong>s Gerais,<br />
que, até então, eram exploradas pela Resendense.<br />
Também em 2006 foram introduzidas<br />
as vendas de passagem via internet e os<br />
ônibus Double Service, com poltro<strong>na</strong>s-leito e<br />
executivas no mesmo piso. No Termi<strong>na</strong>l Ro<strong>do</strong>viário<br />
Tietê, o passageiro passou a contar<br />
com a Sala Net, para a retirada de seu bilhete<br />
adquiri<strong>do</strong> por meio <strong>do</strong> site da empresa.<br />
Nesse tempo, as marcas da nova gestão<br />
já eram visíveis, não só ao merca<strong>do</strong>,<br />
mas também aos antigos funcionários da<br />
empresa que, valoriza<strong>do</strong>s, assumiram novas<br />
posições, empenha<strong>do</strong>s em fazer sua<br />
Cometa subir.<br />
<br />
<br />
<br />
129
130
Em 2007, quan<strong>do</strong> da vigésima edição <strong>do</strong><br />
Prêmio Maiores e Melhores <strong>do</strong> Transporte e<br />
Logística, a Cometa foi aclamada vence<strong>do</strong>ra<br />
pela décima vez, <strong>na</strong> categoria Ro<strong>do</strong>viário de<br />
Passageiros, sen<strong>do</strong> a terceira vez consecutiva.<br />
No ano seguinte, sua garagem G1 recebeu a<br />
Certificação da Qualidade de Serviços Automotivos<br />
IQA - <strong>Instituto</strong> da Qualidade Automotiva.<br />
Foi a primeira transporta<strong>do</strong>ra da linha<br />
pesada (caminhões e ônibus) a receber o<br />
selo da qualidade <strong>do</strong> IQA, com a relevância de<br />
trabalhar diariamente com vidas huma<strong>na</strong>s,<br />
quan<strong>do</strong> qualidade significa, entre outras coi-<br />
sas, responsabilidade e segurança. A empresa<br />
tem como meta obter a certificação de todas<br />
as garagens.<br />
Hoje, com quadro funcio<strong>na</strong>l enxuto,<br />
processos internos moderniza<strong>do</strong>s, família de<br />
serviços e tarifas consolidada, transportan<strong>do</strong><br />
cerca de 800 mil passageiros por mês, entre<br />
os Esta<strong>do</strong>s de São Paulo, Mi<strong>na</strong>s Gerais, Paraná<br />
e Rio de Janeiro, num total de 7 milhões<br />
de quilômetros roda<strong>do</strong>s, numa média mensal<br />
de 28.915 viagens, pode-se dizer que a mítica<br />
Cometa reconquistou seu espaço e está pronta<br />
para subir mais e mais.<br />
<br />
131
Um sonho<br />
realiza<strong>do</strong>:<br />
o <strong>Instituto</strong> <strong>JCA</strong><br />
132<br />
<br />
<br />
<br />
“D
133
ano que<br />
nem caderno<br />
para estudar<br />
eu tinha. En-<br />
“Teve<br />
tão, eu passava<br />
rifa <strong>na</strong> escola, pedia à diretora que me<br />
deixasse vender salga<strong>do</strong>s, biscoitos… Eu fazia<br />
e levava para a escola…” E as professoras admiravam<br />
o esforço de Isabele Cristi<strong>na</strong> Fonseca<br />
Ramos para continuar no colégio, alcançan<strong>do</strong><br />
bons resulta<strong>do</strong>s, apesar das difíceis condições<br />
de vida da família. Com o pai, que não teve<br />
como continuar os estu<strong>do</strong>s, desemprega<strong>do</strong> há<br />
alguns anos, e a mãe trabalhan<strong>do</strong> numa creche,<br />
só mesmo com muita valentia para chegar<br />
aonde a jovem de 17 anos está. Isabele cursa o<br />
terceiro ano <strong>do</strong> ensino médio no Colégio Salesianos<br />
de Niterói, ao la<strong>do</strong> de filhos das famílias<br />
mais abastadas <strong>do</strong> município. E já sabe a<br />
profissão que quer seguir: vai ser advogada.<br />
134
Wallace da Silva Portugal tem 20 anos e<br />
um longo caminho pela frente. Concluí<strong>do</strong><br />
o ensino médio, <strong>do</strong>is anos atrás, o rapaz<br />
trabalhava como mecânico com o tio, num emprego<br />
informal, para o dia-a-dia, para a sobrevivência.<br />
Um curso de cinco meses mostrou<br />
para ele uma estrada que até então não conse-<br />
guia enxergar. Mas, como ele mesmo diz, essa<br />
curta experiência, que lhe deu um diploma em<br />
mecânica de motor a diesel, foi muito mais <strong>do</strong><br />
que um curso: “Aqui, não se fala em ensi<strong>na</strong>r<br />
a ser mecânico. Aqui, nos ensi<strong>na</strong>m a ser mais<br />
humanos. Ensi<strong>na</strong>m a lidar com as pessoas,<br />
trabalhar em grupo, em conjunto”.<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
135
Sheyla <strong>do</strong>s Santos Gomes está estudan<strong>do</strong><br />
matemática <strong>na</strong> biblioteca, discipli<strong>na</strong> que<br />
é oferecida como parte <strong>do</strong> curso de Pintura<br />
de Ônibus, que a fluminense, de 20 anos, está<br />
fazen<strong>do</strong>. Ela já mu<strong>do</strong>u os planos para o futuro.<br />
“Eu ia prestar vestibular para Turismo ou<br />
Moda, mas, agora, quero fazer algo relacio<strong>na</strong><strong>do</strong><br />
ao que estou aprenden<strong>do</strong> aqui.”<br />
136
“U<br />
ma das frases que ficaram é de seu Jelson.<br />
Ele diz que não era um homem<br />
excepcio<strong>na</strong>l, mas um homem com muita determi<strong>na</strong>ção.<br />
E essa frase eu tomei para a minha<br />
vida.” Fabio da Silva Rosa passava diante<br />
daquela obra, <strong>na</strong> Ro<strong>do</strong>via Amaral Peixoto,<br />
e não sabia o que era aquilo. Talvez uma biblioteca<br />
pública… Ainda bem que um dia ele<br />
entrou pela porta vermelha <strong>do</strong> prédio que subiu<br />
ali. O jovem, que há <strong>do</strong>is anos trabalhava<br />
num merca<strong>do</strong>, não por opção, mas por necessidade,<br />
encontrou a liberdade de escrever<br />
a própria história. Fabio hoje trabalha como<br />
programa<strong>do</strong>r <strong>na</strong> Auto Viação 1001.<br />
Henrique de Almeida Ferreira tem 16<br />
anos e cursa o primeiro ano <strong>do</strong> ensino<br />
médio, no Colégio Santa Mônica. Até então<br />
aluno <strong>do</strong> CIEP 412 Zerbini, em São Gonçalo,<br />
o garoto tirou boas notas assim que entrou <strong>na</strong><br />
nova escola e foi convida<strong>do</strong> a integrar a turma<br />
especial, mais puxada, muito trabalho. Desafio<br />
que ele parece tirar de letra, da<strong>do</strong> seu bom<br />
desempenho no histórico escolar e sua atitude<br />
diante da vida. Mesmo com tanto o que fazer,<br />
Henrique tomou a iniciativa de começar a dar<br />
aulas de matemática para um grupo de alunos<br />
da oitava série <strong>do</strong> ensino fundamental no<br />
Colégio em que estudava. Henrique quer ajudar<br />
os amigos a ter a oportunidade de, assim<br />
como ele, ingressar no <strong>Instituto</strong> <strong>JCA</strong> e também<br />
abrir uma nova janela para o mun<strong>do</strong>.<br />
<br />
Fortalecen<strong>do</strong> Trajetórias<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
137
138<br />
<br />
<br />
Fortalecen<strong>do</strong> Trajetórias<br />
<br />
<br />
Nem se falava em responsabilidade<br />
social quan<strong>do</strong> seu Jelson já a praticava.<br />
Era uma bolsa de estu<strong>do</strong>s para o filho<br />
aplica<strong>do</strong> de um funcionário, outra para um<br />
rapaz promissor, e, assim, chegou a custear<br />
os estu<strong>do</strong>s de 900 jovens. Sem que ninguém<br />
soubesse, nem familiares, nem funcionários,<br />
esse homem de origem humilde,<br />
que pouco pôde freqüentar a escola, compartilhava<br />
parte <strong>do</strong> que conquistou com<br />
pessoas que, como ele, vinham de famílias<br />
de poucos recursos, mas tinham potencial<br />
para crescer. E vencer.<br />
Era esse o perfil de Sílvia Cristi<strong>na</strong><br />
Rezende Nora Aceti, antiga beneficiária de<br />
uma das bolsas de estu<strong>do</strong>. Hoje, gerente de<br />
banco, ela reflete sobre sua trajetória de<br />
vida: “Quan<strong>do</strong> olho onde eu morava, a casa<br />
que eu tinha, e vejo onde moro hoje e a condição<br />
de vida que tenho, eu agradeço muito<br />
a esse homem.”<br />
Assim como a honradez, a garra no<br />
trabalho e a certeza <strong>do</strong> que queria, a preocupação<br />
em oferecer oportunidade a quem<br />
lutasse sempre esteve presente <strong>na</strong> vida de<br />
Jelson da Costa Antunes. E, quan<strong>do</strong> teve<br />
condições fi<strong>na</strong>nceiras, transformou essa<br />
preocupação em atitude.<br />
Em visita ao Pico de Itaboraí, seu<br />
Jelson ficou muito impressio<strong>na</strong><strong>do</strong> com o<br />
esta<strong>do</strong> lamentável da escola pública que<br />
deveria atender às crianças e aos jovens
que seriam os futuros homens e mulheres da<br />
terra <strong>na</strong>tal. Ali, a partir de um convênio estabeleci<strong>do</strong><br />
com a Secretaria de Educação <strong>do</strong><br />
Esta<strong>do</strong>, seu Jelson ergueu um colégio digno,<br />
que leva o nome de sua mãe: Grupo Escolar<br />
Maria das Dores Antunes.<br />
O <strong>Instituto</strong> <strong>JCA</strong> <strong>na</strong>sceu da vontade de<br />
apoiar pessoas esforçadas e capazes, para<br />
que possam estudar e se profissio<strong>na</strong>lizar.<br />
Para que adquiram ferramentas para construir<br />
a própria história, tor<strong>na</strong>n<strong>do</strong>-se cidadãos<br />
participantes.<br />
Em 2004, a idéia de criar uma entidade<br />
que desenvolvesse projetos nesse senti<strong>do</strong> era<br />
pauta de reuniões que envolviam professoras,<br />
psicólogas, assistentes sociais, pessoas próximas<br />
que apostavam nos insights de seu Jelson.<br />
Como nos negócios, ele sabia exatamente<br />
o que queria e já tinha em mente as diretrizes<br />
<strong>do</strong> <strong>Instituto</strong> e os contornos <strong>do</strong>s projetos Fortalecen<strong>do</strong><br />
Trajetórias e Ofici<strong>na</strong> <strong>do</strong> Ensino, ambos<br />
inspira<strong>do</strong>s <strong>na</strong> própria experiência de vida. No<br />
que ele sabia que lhe faltara e no que ele acreditava<br />
que o ajudara a ter sucesso.<br />
O Fortalecen<strong>do</strong> Trajetórias seria o investimento<br />
em jovens talentosos, com bom rendimento<br />
escolar, muita vontade e capacidade<br />
de cursar uma universidade e trabalhar <strong>na</strong><br />
construção de um mun<strong>do</strong> melhor. Já o Ofici<strong>na</strong><br />
de Ensino teria foco nos maiores de idade, que<br />
se formariam em diferentes áreas de manutenção<br />
de ônibus.<br />
Fortalecen<strong>do</strong> Trajetórias<br />
<br />
<br />
139
140
No mesmo ano de 2004, foi funda<strong>do</strong> o<br />
<strong>Instituto</strong> <strong>JCA</strong>. Não existia ainda a moder<strong>na</strong><br />
sede que começou a ser erguida em<br />
2005 – e hoje o abriga. De início, as atividades<br />
eram desenvolvidas <strong>na</strong> sala de trei<strong>na</strong>mento<br />
da Auto Viação 1001, com o apoio de diversas<br />
empresas, parceiras em cursos e <strong>na</strong> própria<br />
estrutura das ofici<strong>na</strong>s. Seu Jelson, que<br />
concebeu o instituto e acompanhava as obras<br />
de perto, não pôde presenciar a bela festa de<br />
i<strong>na</strong>uguração, que aconteceu <strong>na</strong> data já escolhida:<br />
9 de novembro de 2006. Dia em que ele<br />
completaria seus 79 anos.<br />
“É uma pe<strong>na</strong> que seu Jelson não tenha<br />
visto o prédio termi<strong>na</strong><strong>do</strong>, mas ele realizou o<br />
desejo de dar possibilidade a essas crianças<br />
que hoje estão <strong>na</strong> UFRJ, <strong>na</strong> UERJ, <strong>na</strong> PUC.<br />
Eu digo a eles: ‘Seu Jelson está <strong>na</strong> UFRJ, seu<br />
Jelson está <strong>na</strong> UERJ, seu Jelson está <strong>na</strong> PUC,<br />
o prédio sozinho não é <strong>na</strong>da’.” Quem faz tal<br />
afirmação é a assistente social Lucia Via<strong>na</strong>, filha<br />
de Itaboraí, como seu Jelson, e admira<strong>do</strong>ra<br />
de sua determi<strong>na</strong>ção e honestidade desde<br />
criança. Lucia fazia parte <strong>do</strong> grupo que o empresário<br />
reunia para trocar idéias sobre seus<br />
planos para o instituto e foi ela quem esteve à<br />
frente das atividades com seu Jelson, quan<strong>do</strong><br />
foram da<strong>do</strong>s os primeiros passos para construir<br />
a entidade.<br />
Fortalecen<strong>do</strong> Trajetórias<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
141
142<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
Tatia<strong>na</strong> Antunes, neta <strong>do</strong> funda<strong>do</strong>r e<br />
atual diretora-executiva da instituição, começou<br />
a se aproximar <strong>do</strong> projeto numa daquelas<br />
reuniões em que se traçavam os caminhos.<br />
Ela lembra que um <strong>do</strong>s desafios <strong>do</strong> Fortalecen<strong>do</strong><br />
Trajetórias era descobrir os “talentos”,<br />
como seu Jelson chamava esses jovens que se<br />
destacavam por sua capacidade de aprender,<br />
de lutar pelo que querem e precisavam de um<br />
apoio fi<strong>na</strong>nceiro para alcançar esse objetivo.<br />
Como chegar a eles e avaliá-los sem uma<br />
longa convivência? Optou-se por tomar como<br />
ponto de partida o rendimento escolar e o depoimento<br />
de pessoas que estivessem acompanhan<strong>do</strong><br />
o desenvolvimento desses alunos nos<br />
estu<strong>do</strong>s – professores e diretores de escolas<br />
públicas. Foi assim que a equipe <strong>do</strong> <strong>Instituto</strong><br />
<strong>JCA</strong> passou a receber indicações.<br />
O passo seguinte era a visita familiar<br />
para conhecer a origem <strong>do</strong> jovem, as dificuldades<br />
enfrentadas pela família e a disposição<br />
desta de apoiá-lo <strong>na</strong> superação <strong>do</strong> desafio<br />
que se colocava para ele a partir <strong>do</strong> ingresso<br />
no projeto. Hoje, como a demanda é muito<br />
grande, os candidatos se submetem a um teste<br />
para avaliar o nível básico em português e<br />
matemática. Um suporte nessas discipli<strong>na</strong>s<br />
é ofereci<strong>do</strong> aos selecio<strong>na</strong><strong>do</strong>s, para compensar<br />
a defasagem entre a escola de origem e a<br />
instituição de ensino em que passarão a estudar,<br />
custeada pelo instituto. São parceiras<br />
<strong>do</strong> <strong>Instituto</strong> <strong>JCA</strong> escolas privadas escolhidas
143
144<br />
<br />
<br />
entre as melhores de Niterói, São Gonçalo e<br />
Itaboraí, e que, de fato, podem contribuir <strong>na</strong><br />
preparação desses estudantes para ingressar<br />
<strong>na</strong> faculdade e encarar os desafios da vida.<br />
Além da mensalidade, os integrantes <strong>do</strong><br />
Fortalecen<strong>do</strong> Trajetórias recebem vale-transporte,<br />
auxílio-alimentação, material escolar,<br />
uniforme, além <strong>do</strong> acompanhamento constante<br />
de seu desenvolvimento, feito por uma<br />
equipe multidiscipli<strong>na</strong>r formada por uma<br />
orienta<strong>do</strong>ra pedagógica, uma psicóloga e uma<br />
assistente social. Detectada alguma dificuldade<br />
<strong>do</strong> aluno, ele é apoia<strong>do</strong> para resolvê-la.<br />
Caso o problema não atinja só o aluno <strong>do</strong> projeto,<br />
resultan<strong>do</strong> em uma deficiência da própria<br />
escola conveniada, a equipe <strong>do</strong> instituto<br />
cobra mudanças e as acompanha. Se o aluno<br />
tem bom desenvolvimento, mas um obstáculo<br />
específico, recebe suporte para superá-lo.<br />
Assim, alguns <strong>do</strong>s jovens que hoje participam<br />
<strong>do</strong> projeto receberam, por exemplo, bolsas de<br />
estu<strong>do</strong> para curso de inglês.<br />
Atenta ao desenvolvimento <strong>do</strong> jovem<br />
não só como bom aluno e futuro profissio<strong>na</strong>l,<br />
mas como pessoa, o instituto promove uma<br />
série de atividades que trabalham a integração,<br />
o respeito, a auto-estima, o olhar além da<br />
curva. Em reuniões periódicas <strong>do</strong> grupo, dificuldades<br />
emocio<strong>na</strong>is são tratadas conjuntamente.<br />
Ro<strong>do</strong>lfo, que, assim como seu Jelson,<br />
logo definiu um caminho, lembra que o empresário<br />
muitas vezes se emocio<strong>na</strong>va nesses
145
encontros e trazia sua experiência de batalha<strong>do</strong>r<br />
bem-sucedi<strong>do</strong>, para fortalecer os meninos<br />
e as meni<strong>na</strong>s que se empenhavam em<br />
seguir adiante. E reflete: “Quem está de fora<br />
pensa que é só custear o estu<strong>do</strong>. Mas não é só<br />
isso que faz o instituto. Aqui, você aprende<br />
a se relacio<strong>na</strong>r com outras pessoas, a conversar,<br />
se integrar mais. Sempre trazem coisas<br />
novas <strong>na</strong>s dinâmicas. A formação da gente<br />
como pessoa, as histórias que eles contam,<br />
tu<strong>do</strong> é aprendiza<strong>do</strong>”. Para Ro<strong>do</strong>lfo, o trabalho<br />
de auto valorização e a confiança transmitida<br />
pela equipe <strong>do</strong> projeto foram muito<br />
importantes, especialmente nos primeiros<br />
tempos da escola nova e, mais tarde, da universidade.<br />
“Lembro-me que não só eu, mas<br />
também os outros que estavam no grupo,<br />
tínhamos bastante me<strong>do</strong> de falar alguma<br />
coisa errada, de não gostarem. E, <strong>na</strong> escola<br />
também, foi muito difícil. Depois da primeira<br />
sema<strong>na</strong>, eu queria ir para casa, não queria<br />
ficar lá, porque era uma realidade totalmente<br />
diferente da que eu vivia. Eu, filho de<br />
pesca<strong>do</strong>r, sem falar com ninguém, queren<strong>do</strong><br />
sair… Eu não saí por vergonha, porque eu<br />
tirei a vaga de outra pessoa. Mas tive muita<br />
vontade de desistir, como deu vontade de<br />
largar a faculdade no primeiro mês. Não era<br />
aquilo que eu queria para mim. Porém, acabei<br />
me habituan<strong>do</strong> e gostan<strong>do</strong> muito. Porque<br />
as pessoas não vão gostar de você pelo<br />
que você tem, mas pelo que você é.”<br />
146
147
148
Assim como Henrique, no ensino médio<br />
Ro<strong>do</strong>lfo foi chama<strong>do</strong> a integrar uma turma<br />
especial, e ele confessa que teve me<strong>do</strong>. Superadas<br />
as dificuldades <strong>do</strong> primeiro momento,<br />
teria de se desempenhar ainda mais. E se falhasse?<br />
Se perdesse a bolsa? Não desistiu, não<br />
falhou e venceu.<br />
Estabelecer metas e pensar a longo prazo<br />
é atitude também estimulada pelo <strong>Instituto</strong><br />
<strong>JCA</strong>. Em uma longa entrevista registrada<br />
em vídeo durante a construção <strong>do</strong> prédio,<br />
seu Jelson falou da preocupacão com o consumismo<br />
e imediatismo <strong>do</strong>s jovens de hoje.<br />
“Antes de construir, gastam. Antes de planejar,<br />
querem conseguir.” Histórias como as<br />
de Ro<strong>do</strong>lfo, Isabele, Wallace, Sheyla, Fabio e<br />
Henrique mostram que o trabalho criterioso,<br />
sem clientelismo, valorizan<strong>do</strong> a trajetória de<br />
cada um e estimulan<strong>do</strong> o respeito mútuo, tem<br />
feito toda a diferença para que esses jovens<br />
compreendam que sonhos não se realizam da<br />
noite para o dia.<br />
Ro<strong>do</strong>lfo soube reconhecer seu valor<br />
e persistir. Isabele chegou a pensar em ser<br />
assistente social, mas decidiu por defender<br />
os direitos <strong>do</strong>s menos favoreci<strong>do</strong>s atuan<strong>do</strong><br />
como advogada. Henrique compartilha com<br />
os amigos a oportunidade de crescer. Wallace,<br />
Sheyla e Fábio ousaram investir num novo<br />
caminho, a partir <strong>do</strong> conhecimento adquiri<strong>do</strong><br />
no projeto Ofici<strong>na</strong> <strong>do</strong> Ensino, que proporcio<strong>na</strong><br />
a jovens com idade entre 18 e 24 anos cursos<br />
gratuitos <strong>na</strong>s áreas de mecânica, refrigeração,<br />
elétrica e pintura, com 4 horas de aula por dia,<br />
de segunda a sexta-feira, com duração de cinco<br />
meses e meio. As aulas práticas e teóricas<br />
são ministradas <strong>na</strong>s ofici<strong>na</strong>s instaladas no<br />
instituto. Também para os estudantes desse<br />
<br />
<br />
149
150<br />
projeto são oferecidas aulas de matemática<br />
e metrologia, já que, em<br />
muitas situações de trabalho, são<br />
necessários cálculos e medidas.<br />
Desde 2005, 55 jovens já foram<br />
beneficia<strong>do</strong>s pelo Fortalecen<strong>do</strong><br />
Trajetórias, sen<strong>do</strong> que 41 deles permanecem<br />
no projeto e três cursam<br />
a universidade. Pelo Ofici<strong>na</strong> de Ensino,<br />
já passaram 281 alunos e hoje<br />
59 jovens fazem os cursos – to<strong>do</strong>s<br />
estagian<strong>do</strong> em garagens de empresas<br />
<strong>do</strong> Grupo <strong>JCA</strong>, sob a supervisão<br />
da equipe <strong>do</strong> instituto, que mantém<br />
onze funcionários e é presidi<strong>do</strong> por<br />
Heloísa Antunes de Andrade desde o<br />
falecimento de seu Jelson. De 2004<br />
a 2008, 90 alunos <strong>do</strong> projeto foram<br />
emprega<strong>do</strong>s e 61 hoje se encontram<br />
trabalhan<strong>do</strong>.<br />
Além desses projetos, o <strong>Instituto</strong><br />
<strong>JCA</strong> realiza uma série de outras<br />
atividades, sempre abertas à comunidade,<br />
com o apoio de profissio<strong>na</strong>is<br />
voluntários e empresas parceiras.<br />
Mas a entidade tem fôlego e garra<br />
para crescer, e novos cursos estão<br />
sen<strong>do</strong> elabora<strong>do</strong>s para formar cada<br />
vez mais homens e mulheres comprometi<strong>do</strong>s<br />
com a construção de um<br />
mun<strong>do</strong> melhor. Como sonhava – e<br />
fez! – seu Jelson.
151
Agradecimentos<br />
<br />
<br />
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Agradecimentos especiais
Entrevistas com:<br />
Alexandre Antunes de Andrade<br />
Amaury de Andrade<br />
Antonio Alves<br />
Antonio José Lubanco<br />
Antonio Pedro Jayme<br />
Antonio Ribeiro<br />
Anuar Escove<strong>do</strong> Helayel<br />
Aristeu Jorge Antunes<br />
Arlito de Azeve<strong>do</strong>, “Bocaz”<br />
Arthur Mascioli<br />
Cassia Maria Barone Peres<br />
Carlos Otávio de Souza Antunes<br />
Charles José Car<strong>do</strong>so<br />
Dinorah Vargas de Souza Pereira<br />
Dirce Oliveira<br />
Elísia Amélia Granja da Siva<br />
Elmar Antunes de Faria<br />
Eugênio Luiz<br />
Heloísa Hele<strong>na</strong> Antunes de Andrade<br />
Heinz W. Kumm Júnior<br />
Ivan Comodaro<br />
Ivomar Campos<br />
José Carlos <strong>do</strong> Amor Divino<br />
João Roberto Coura<br />
José Lemos<br />
Leacyr da Silva<br />
Marcelo Garcia Antunes<br />
Murilo César Vieira de Moraes<br />
Re<strong>na</strong>to Garcia Justo<br />
Salva<strong>do</strong>r Monteiro<br />
Sueli Pláci<strong>do</strong><br />
Tatia<strong>na</strong> Antunes de Andrade<br />
Vera Lúcia Costa Rodrigues<br />
além de entrevista com seu Jelson,<br />
registrada em vídeo no ano de 2006.<br />
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- A<strong>na</strong> Silvia Bloise, Erika Nozawa e Jamile Piazenski,<br />
Pesquisa sobre a história da Viação Cometa, 2008.<br />
- Site brasilbus.fotopages.com.<br />
- Claudio Macha<strong>do</strong>, Aléxis Novellino: uma perda irreparável para Cabo Frio,<br />
em www.jor<strong>na</strong>ldesaba<strong>do</strong>.com.br.<br />
- Kal Macha<strong>do</strong>, Concessões de Ro<strong>do</strong>vias, mito e realidade, Prêmio, 2005.<br />
- America Magazine, edição especial Viação Cometa S. A., 1957.<br />
- entrevista Marcelo Garcia Antunes e Alexandre Antunes Andrade, Revista<br />
Technibus, agosto de 2008.<br />
- Encarte “Os Pioneiros”, em Revista ABRATI, nº 35, dezembro/ 2003;<br />
- Revista Abrati nºs: 35/ 2003; 54/ 2008.<br />
- InBus Transport, nºs: 01 e 02/ 2003; 20, 21 e 22 / 2008.<br />
- “O grande empreende<strong>do</strong>r, uma home<strong>na</strong>gem à lenda <strong>do</strong> transporte de<br />
passageiros no Brasil”, reprodução de entrevista de Jelson da Costa Antunes<br />
à edição especial de Revista Qutaro Rodas, outubro/ novembro de 2005.<br />
- Maiores & Melhores <strong>do</strong> Transporte & Logística, nº 18, 2005.<br />
- Ro<strong>do</strong><strong>na</strong>l, nº 18, 1986.<br />
- Revista Rei da Estrada, nº 87, 2000.<br />
- Revista 1001 – 40 anos, 1988.<br />
- Revista 50 anos de 1001, 1998.<br />
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Págs. 45, Macaense, foto de Rui Porto Filho.<br />
Págs. 38, 39 e 69, Rápi<strong>do</strong> Ribeirão Preto, fotos de Magno Mesquita.<br />
Págs. 48, 52/53, 74, 75 (baixo), 78, 79, 133, 134, 135, 136 (baixo), 137<br />
(esquerda), 138 (baixo), 139 (baixo), 143, 144, 145, 146, 147, 148, 150 e 151,<br />
fotos de Rodrigo Gorosito.<br />
As imagens utilizadas neste <strong>livro</strong> pertencem aos acervos de cada uma das<br />
empresas <strong>do</strong> Grupo <strong>JCA</strong> referenciadas, além <strong>do</strong>s acervos particulares de<br />
Dinorah Vargas de Souza Pereira, Elmar Antunes de Faria, Arthur Mascioli,<br />
Dirce Oliveira, Leacyr da Silva e da família Antunes.<br />
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Da<strong>do</strong>s Inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is de Catalogação <strong>na</strong> Publicação (CIP)<br />
(Câmara Brasileira <strong>do</strong> Livro, SP, Brasil)<br />
Sasahara, Aline<br />
Tu<strong>do</strong> começou com meio ônibus – A história <strong>do</strong> Grupo <strong>JCA</strong> / Aline Sasahara. – –<br />
São Paulo : Prêmio, 2008.<br />
Bibliografia.<br />
1. Tu<strong>do</strong> começou com meio ônibus – A história <strong>do</strong> Grupo <strong>JCA</strong> – História 2.<br />
Transporte de passageiros – São Paulo (SP) I. Título.<br />
08-10311 CDD- 388.3220981612<br />
Índice para catálogo sistemático:<br />
1. Tu<strong>do</strong> começou com meio ônibus – A história <strong>do</strong> Grupo <strong>JCA</strong> : São Paulo : Transportes<br />
por ônibus : História 388.3220981612<br />
ISBN 978-85-86193-43-9