Versões e Ficções: O seqüestro da História - DHnet
Versões e Ficções: O seqüestro da História - DHnet
Versões e Ficções: O seqüestro da História - DHnet
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
PAULO MOREIRA LEITE<br />
lado, não há dúvi<strong>da</strong> de que o filme fez sua opção. O<br />
torturador tem direito a um conflito interior, a honra<br />
de uma angústia. O coman<strong>da</strong>nte do <strong>seqüestro</strong> é um robô<br />
fanático sob a pele de esquerdista. Como observou a<br />
crítica Helena Salem, “em suas angústias o torturador é<br />
mais humano”.<br />
Elbrick morreu em 1983 e, em janeiro deste ano,<br />
sua filha, Valery Elbrick, assistiu ao filme numa sessão<br />
priva<strong>da</strong> em Nova York. “Bruno Barreto fez um trabalho<br />
excepcional”, disse ela. Veja ouviu dois militantes<br />
que participaram do <strong>seqüestro</strong> e assistiram ao filme em<br />
pré-estréias. Um deles, Manoel Cyrillo, 50 anos, foi quem<br />
acertou uma coronha<strong>da</strong> na cabeça do embaixador norteamericano,<br />
no momento <strong>da</strong> captura. Preso um mês<br />
depois, Cyrillo cumpriu dez anos de prisão. O que ele<br />
acha do filme:<br />
— Ninguém precisa me explicar a diferença entre<br />
reali<strong>da</strong>de e ficção. É claro que sei o que é<br />
isso. Também sei que é possível fazer uma ficção<br />
histórica, misturando fatos reais e invenção. Não<br />
é disso que reclamo. Mas este é um filme que<br />
tende demais para o outro lado, contra nós. Tudo<br />
é a favor do governo, do Exército. Até o<br />
torturador é inteligente, pode se explicar. Nós,<br />
não.<br />
— Se o filme é assim tão ruim, de quem é a culpa?<br />
— É nossa culpa, minha culpa. Nós nunca contamos<br />
nossa versão. Nunca escrevi o que vi, o<br />
que passei. Então, os outros contam.<br />
57