Instabilidade atlanto-axial na síndrome de Down - SPR
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Boëchat MCB et al. / <strong>Instabilida<strong>de</strong></strong> <strong>atlanto</strong>-<strong>axial</strong> <strong>na</strong> <strong>síndrome</strong> <strong>de</strong> <strong>Down</strong>: o que o radiologista precisa conhecer?<br />
ocorrem em mães com mais <strong>de</strong> 35 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> [16,17] .<br />
Estudos epi<strong>de</strong>miológicos recentes <strong>na</strong> América do Sul,<br />
realizados pelo grupo Estudo Colaborativo Latino Americano<br />
<strong>de</strong> Malformações Congênitas (ECLAMC), apontaram<br />
para uma mortalida<strong>de</strong> infantil <strong>na</strong> SD <strong>de</strong> 26%,<br />
tanto em estabelecimento hospitalar público como no<br />
privado [18] . Outros estudos [19,20] epi<strong>de</strong>miológicos têm<br />
<strong>de</strong>monstrado aumento <strong>na</strong> expectativa <strong>de</strong> vida nessa <strong>síndrome</strong>,<br />
passando <strong>de</strong> 25 anos em 1983 para 49 anos em<br />
1997. O controle das infecções, o diagnóstico precoce e<br />
o tratamento das cardiopatias congênitas, freqüentes<br />
nesses pacientes, parecem ser os fatores que mais contribuíram<br />
para este aumento <strong>na</strong> expectativa <strong>de</strong> vida [10] .<br />
Logo após o <strong>na</strong>scimento, a SD po<strong>de</strong> ser suspeitada<br />
clinicamente [10] . Anomalias congênitas cardíacas, gastrintesti<strong>na</strong>is<br />
e urinárias, bem como alterações músculoesqueléticas,<br />
endócri<strong>na</strong>s, hematológicas, oftalmológicas,<br />
auditivas e imunológicas po<strong>de</strong>m estar associadas [10] . As<br />
cardiopatias congênitas estão presentes em 40% a 60%<br />
das crianças com esta <strong>síndrome</strong> e representam a principal<br />
causa mortis nos dois primeiros anos <strong>de</strong> vida [16,20] .<br />
As anomalias do sistema gastrintesti<strong>na</strong>l ocorrem em 14%<br />
dos casos [10,21] . Nos últimos anos, o amplo uso da ultrasonografia<br />
abdomi<strong>na</strong>l tem <strong>de</strong>monstrado prevalência<br />
maior <strong>de</strong> litíase biliar e lama biliar nesses pacientes [22,23] .<br />
Dentre as alterações músculo-esqueléticas <strong>de</strong>stacam-se<br />
a frouxidão ligamentar, as diversas alterações<br />
ósseas (alargamento da asa do ilíaco, displasia acetabular,<br />
encurtamento dos <strong>de</strong>dos, clinodactilia, presença <strong>de</strong><br />
11 pares <strong>de</strong> costelas) e as alterações morfológicas da<br />
colu<strong>na</strong> cervical, principalmente a hipoplasia do arco<br />
posterior do atlas, a displasia e a hipoplasia do odontói<strong>de</strong>.<br />
As alterações ósseas da colu<strong>na</strong> cervical e a frouxidão<br />
dos ligamentos <strong>de</strong>sta região nos interessam particularmente,<br />
por estarem relacio<strong>na</strong>das com a IAA [10] .<br />
A INSTABILIDADE ATLANTO-AXIAL<br />
E A SÍNDROME DE DOWN<br />
A IAA é <strong>de</strong>finida como uma maior mobilida<strong>de</strong> da<br />
primeira vértebra cervical, o atlas, sobre a segunda, o<br />
áxis. Diferentes termos têm sido empregados para <strong>de</strong>finir<br />
a perda da estabilida<strong>de</strong> da articulação <strong>atlanto</strong>-<strong>axial</strong>,<br />
por exemplo, subluxação; entretanto, a tendência atual<br />
é a utilização <strong>de</strong> instabilida<strong>de</strong> [24] .<br />
A primeira publicação sobre a associação entre a SD<br />
e a IAA foi feita em 1961 por Spitzer [1–5] . Em março <strong>de</strong><br />
1983, pouco antes dos jogos paraolímpicos, o Comitê<br />
Paraolímpico Americano <strong>de</strong>finiu medidas preventivas<br />
para atletas com SD, visando a evitar o comprometimento<br />
neurológico secundário à exposição da região<br />
172<br />
crânio-cervical durante a prática <strong>de</strong> <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>dos esportes<br />
e passou a exigir que todo atleta com SD, antes<br />
<strong>de</strong> participar <strong>de</strong>sses jogos, fosse exami<strong>na</strong>do clinicamente<br />
e submetido a um estudo radiográfico da colu<strong>na</strong> cervical<br />
em perfil para avaliação da distância atlas-odontói<strong>de</strong><br />
(DAO). Qualquer alteração neurológica ou radiográfica<br />
impediria o atleta <strong>de</strong> participar <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s esportivas<br />
como ginástica, mergulho, pentatlo, futebol, alguns<br />
estilos <strong>de</strong> <strong>na</strong>tação, e outros que colocassem em risco a<br />
região cervical [14] .<br />
Em 1984, a Aca<strong>de</strong>mia America<strong>na</strong> <strong>de</strong> Pediatria [14]<br />
revisou as recomendações propostas por aquele Comitê<br />
para a realização <strong>de</strong>sse “screening” clínico-radiológico<br />
e sua interpretação e, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> então, muitos estudos têm<br />
sido publicados <strong>na</strong> tentativa <strong>de</strong> se estabelecer um protocolo<br />
<strong>de</strong> investigação e acompanhamento <strong>de</strong>ssa alteração<br />
ósteo-articular. Entretanto, persistem algumas dúvidas<br />
sobre a real necessida<strong>de</strong> da avaliação clínico-radiológica<br />
e sobre a evolução da forma assintomática da IAA<br />
para a forma sintomática diante da prática <strong>de</strong> <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>dos<br />
esportes. Em 2001, o Comitê <strong>de</strong> Genética da<br />
Aca<strong>de</strong>mia America<strong>na</strong> <strong>de</strong> Pediatria [25] apresentou diversas<br />
recomendações para o acompanhamento das crianças<br />
com SD, <strong>de</strong>ntre as quais o estudo radiográfico da<br />
colu<strong>na</strong> cervical em torno dos três a cinco anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong><br />
para pesquisa da IAA, ressaltando que a real necessida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>sse “screening” continua sendo questio<strong>na</strong>da.<br />
CARACTERÍSTICAS ANATÔMICAS<br />
DA ARTICULAÇÃO ATLANTO-AXIAL<br />
A região crânio-vertebral é formada pela base do<br />
crânio e pelas duas primeiras vértebras cervicais, o atlas<br />
e o áxis, constituindo as articulações <strong>atlanto</strong>-occipital e<br />
<strong>atlanto</strong>-<strong>axial</strong>. Estas vértebras cervicais diferem entre si<br />
e das <strong>de</strong>mais quanto à sua a<strong>na</strong>tomia e ao seu processo<br />
<strong>de</strong> ossificação, pois apresentam núcleos <strong>de</strong> ossificação<br />
primitivos <strong>de</strong> origem cartilaginosa. O atlas (C1) é formado<br />
por um arco anterior e um arco posterior e não<br />
tem corpo; o áxis (C2) apresenta um arco posterior e um<br />
pequeno corpo com uma projeção óssea localizada superiormente,<br />
conhecida como processo odontói<strong>de</strong> (Figs.<br />
1 e 2). O arco anterior do atlas e os arcos posteriores do<br />
atlas e do áxis apresentam porções cartilaginosas; o<br />
odontói<strong>de</strong> é formado a partir <strong>de</strong> dois núcleos <strong>de</strong> ossificação<br />
primitivos que formarão a sua base e <strong>de</strong> um terceiro<br />
núcleo <strong>de</strong> ossificação que irá formar a sua extremida<strong>de</strong><br />
superior [26–28] .<br />
A estabilida<strong>de</strong> da articulação <strong>atlanto</strong>-<strong>axial</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong><br />
da integrida<strong>de</strong> dos elementos ósseos da colu<strong>na</strong> cervical,<br />
principalmente do odontói<strong>de</strong>, e da integrida<strong>de</strong> do liga-<br />
Rev Imagem 2006;28(3):171–179