Sociologia da adultez livro.pdf - Memoriamedia

O QUE É “SER ADULTO”? – PRÁTICAS E REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
2001). Defende-se um ambiente de pacificação e as mudanças verificadas no sistema
familiar transformam a família «num laboratório de inovação social, nomeadamente no
campo das relações intergeracionais» (Pais, 1998a, p. 50).
“Com efeito, nunca como hoje as relações intergeracionais terão sido tão pacíficas (…).
A existência de conflitos entre pais e filhos é de natureza mais esporádica do que
permanente (…). As situações geradoras de conflitos são pontuais e, na maioria dos
casos, parecem ser relativamente ultrapassáveis ou, pelo menos, tacitamente geridas.”
(Pais, 1998a, p.40).
A nova família relacional é composta por indivíduos que valorizam a qualidade das
suas relações e a construção da intimidade no seu universo privado. As relações tendem
a ser fundadas em processos de renegociação e nos valores de igualdade e confiança
recíproca (Pais, 1998a; Cicchelli, 2001; Galland, 2001; Singly, 2001; Ramos, 2002).
Continuando os filhos a ambicionar o reconhecimento, e os pais o respeito,
diminuem, porém, as punições corporais, a violência verbal, o ambiente de conflito, e o
ressentimento ou a “dramatização familiar” (o que não significa o seu total
desaparecimento). A relação familiar tem por base uma atitude de negociação e diálogo
que torna os conflitos mais abertos. O jovem, em vez de reivindicar, expõe os seus
pontos de vista e os pais, em vez de “obrigarem”, explicam a necessidade de se
cumprirem determinadas tarefas ou comportamentos. As punições são cada vez mais
simbólicas – o corte da mesada, as repreensões orais, as quebras de comunicação ou
determinadas proibições (Pais, 1998a) 24 .
O aumento das relações de tipo negocial tem ainda a ver com o facto de, entre
gerações, a estrutura de valores tornar-se cada vez mais fluida. No estudo sobre as
gerações e os valores da sociedade portuguesa 25 , Pais (1998a) conclui que as gerações
mais novas constituem-se como «um importante quadro de referência para as gerações
mais velhas, possibilitando uma certa horizontalidade intergeracional de valores» (p.40).
24 As relações intergeracionais enquadram-se, desta forma, no que Giddens (2001) refere como sendo a
potencial emergência da democratização emocional no domínio das relações de parentalidade, de
amizade e das relações amorosas e sexuais. Essa democracia emocional remete para o conceito de
relação pura (possível entre iguais e organizada através da comunicação) que promete «um elevado nível
de reconstrução ética e cívica no seu todo». Trata-se do tipo de democracia que induz «os indivíduos a
sentirem-se confortáveis em relação às suas emoções» sendo capazes de «simpatizar com as emoções dos
outros» (Giddens, 2001, p.183).
25 Onde se assume que os valores traduzem preferências opinativas subjectivamente interiorizadas que
nem sempre coincidem com as práticas (Pais, 1998a).
41