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<strong>PRÁTICAS</strong> <strong>EDUCATIVAS</strong> <strong>NO</strong> <strong>CARIRI</strong> PARAIBA<strong>NO</strong>: MEMÓRIAS DA<br />
EDUCADORA ESTELITA ANTONI<strong>NO</strong> DE SOUZA (1950-1970)<br />
Francymara Antonino Nunes de Assis<br />
Tatiana Medeiros Santos<br />
Universidade Federal da Paraíba-UFPB<br />
Resumo<br />
Esta comunicação compõe uma pesquisa junto ao grupo HISTED-BR GT/PB e tem por<br />
objetivo analisar as práticas educativas de Estelita Antonino de Sousa, professora da<br />
Escola Profissional PIO XII, no município de Serra Branca. Na análise, privilegiam-se<br />
os anos de 1958 e 1959. A década de 1950 é marcada pela crescente inserção da mulher<br />
no magistério e em outros ambientes públicos, tanto no contexto serrabranquense, como<br />
no cenário brasileiro. A educadora Estelita Antonino, enquanto sujeito de memória e<br />
representação histórica, atuou na instituição escolar e em espaços religiosos,<br />
contribuindo para a formação de gerações de crianças e jovens na cidade. Na realização<br />
deste estudo pretende-se desvelar como a professora em foco construía sua relação com<br />
o mundo, observando, por meio das práticas educativas, saberes, valores, códigos e<br />
comportamentos presentes naquela realidade socioeducacional. Insere-se na abordagem<br />
teórico-metodológica da nova história cultural, com auxílio da história oral e da<br />
memória. As fontes documentais coletadas no acervo da educadora incluem cadernos,<br />
livros, manuscritos, fotografias e escritas pessoais. Estudar suas práticas permite<br />
configurar uma época sujeita aos equilíbrios e instabilidades das formas de se produzir<br />
as relações educativas cotidianas.<br />
Palavras-chave: Práticas Educativas; Educadora; Memória<br />
Considerações Iniciais<br />
Este trabalho vincula-se ao projeto Educação e Educadoras na Paraíba do<br />
Século XX: práticas, leituras e representações, do Grupo de Estudos e Pesquisas<br />
História, Sociedade e Educação no Brasil – GT/PB. O objetivo é analisar, por meio de<br />
relatos orais de vida, saberes e práticas educativas da educadora Estelita Antonino de<br />
Souza no Grupo Escolar Vasconcelos Brandão, localizado em Serra Branca/Paraíba<br />
(1950-1970).<br />
A cidade que é palco da atuação da educadora é terra de clima semi-árido,<br />
situada a 220 Km de João Pessoa, capital paraibana. A Serra do Jatobá, com sua face de<br />
rocha esbranquiçada, domina a paisagem e deu origem ao nome da cidade.
A escolha da educadora não se deu por acaso, pode-se dizer que sua atuação<br />
não se limitou ao universo escolar, estendendo-se por diversos espaços educativos.<br />
Desse modo, no decorrer deste estudo, desvelaram-se histórias de vida pessoal, escolar e<br />
profissional da educadora, situações imprescindíveis para o entendimento de seu fazer<br />
pedagógico.<br />
Desse modo, este estudo tem a intenção de investigar situações ligadas à<br />
história de vida pessoal, escolar e profissional, assim como as relacionadas com as<br />
representações, os saberes e as práticas da educadora, situações imprescindíveis para o<br />
entendimento do fazer pedagógico. Tal investigação permite destacar elementos,<br />
saberes e relações que estiveram presentes na formação e no exercício docente da<br />
educadora.<br />
A esse respeito, Goodson (1992, p.75) afirma que:<br />
Os estudos referentes à vida dos professores podem ajudar-nos a ver<br />
o indivíduo em relação com a história de seu tempo, permitindo-nos<br />
encarar a interseção da história de vida com a história da sociedade,<br />
esclarecendo, assim, as escolhas, contingências e opções que se<br />
deparam ao indivíduo.<br />
Nessa perspectiva, a análise das histórias de vida permite revelar a idéia de<br />
que as práticas educativas são construídas por meio de representações e saberes que são<br />
organizados não apenas nos cursos de formação, sofrendo influência de todo o percurso<br />
da vida escolar e profissional dos educadores. Portanto, os estudos que se utilizam das<br />
histórias de vida de professores conseguem captar muitas das representações que<br />
subsidiam as práticas docentes, permitindo identificar a lógica pedagógica e as<br />
influências que contribuem para a formação profissional.<br />
O referencial metodológico da pesquisa<br />
O presente estudo está inserido nos pressupostos teórico-metodológicos da<br />
Nova História Cultural, que permite não apenas compreender uma época, mas também<br />
resgatar, historicamente, saberes e práticas da educadora em destaque (BURKE, 2002).<br />
As contribuições trazidas pela Nova História Cultural alargaram sobremaneira os tipos e<br />
as utilizações das fontes pesquisadas, na perspectiva do enfoque da vida cotidiana.
Nesse sentido, Galvão (2001, p.102) enfatiza que “[...] as fontes não mais se restringem<br />
aos documentos oficiais escritos, ganhando tanta importância quanto esses a fotografia,<br />
a pintura, a literatura, a correspondência, os móveis e objetos utilizados, os depoimentos<br />
orais”.<br />
Nesse contexto, foram analisados, no território da memória, com o auxílio da<br />
metodologia da historia oral, saberes e práticas educativas rememoradas no depoimento<br />
da educadora Estelita Antonino, seus reflexos na educação local e nas formas de<br />
conceber o mundo vivenciado. Privilegiou-se o período de 1950 a 1970, período em que<br />
lecionou no Grupo Escolar Vasconcelos Brandão.<br />
Utilizou-se como principal fonte o depoimento da educadora, realizado no<br />
dia 08 de julho de 2009, em sua casa, na cidade de Serra Branca. A entrevista foi<br />
gravada e não seguiu um roteiro previamente definido, o que permitiu que outras<br />
memórias viessem à tona.<br />
No momento da entrevista, a educadora resgatou de seu arquivo particular<br />
documentos e fotos com a intencionalidade de ilustrar suas lembranças. O rico acervo<br />
da educadora é composto por livros, atas, cadernos de alunos, planos de aula,<br />
fotografias, revistas, publicações diversas, trabalhos escolares, correspondências, dentre<br />
outros documentos. Em meio a esse memorial, já disponibilizado para futuras pesquisas,<br />
optou-se pela narrativa referente à sua história de vida e atuação no Grupo Escolar<br />
Vasconcelos Brandão no período de 1950 a 1970.<br />
Traços Biográficos da Educadora Estelita Antonino de Souza<br />
Figura 1: Educadora Estelita Antonino de Souza
Fonte: Acervo pessoal da depoente (1950)<br />
Estelita Antonino de Souza nasceu no Sítio Ligeiro, município de Serra<br />
Branca/PB, no dia 09 de junho de 1931. O Ligeiro é uma comunidade rural formada por<br />
várias fazendas, habitadas pelos descendentes do mesmo tronco familiar da educadora.<br />
Os pais de Estelita Antonino, Francisco João de Souza e Eutália Maria de Souza,<br />
criaram dez filhos, dos quais apenas três, concluíram o curso superior.<br />
A educadora cursou o primário no sítio onde nasceu. O Curso Ginasial foi<br />
realizado no Colégio de Santa Rita, dirigido pelas irmãs Franciscanas, na cidade de<br />
Areia/PB, de 1947 a 1950. O Curso Médio foi realizado no Colégio Estadual do bairro<br />
da Prata, na cidade de Campina Grande. Em 1981, concluiu o curso de Licenciatura<br />
Plena em História na Faculdade de Arco Verde, Pernambuco.<br />
A atuação profissional da educadora Estelita Antonino teve início na década<br />
de 1950, na Escola Profissional Pio XII. Lecionou também no Grupo Escolar<br />
Vasconcelos Brandão e no Ginásio Comercial depois Colégio Wamberto Torreão,<br />
quando se aposentou em 1991.<br />
Saberes e Práticas Educativas no Cariri Paraibano<br />
Os saberes construídos no decorrer de vários momentos da vida contribuem<br />
para orientar a organização do trabalho pedagógico. Os comportamentos, as reações e a<br />
própria personalidade da criança são compreensíveis a partir da análise das primeiras<br />
relações sociais que se estabelecem na família (BERNARD LAHIRE, 2004).<br />
Nessa perspectiva conclui-se que o sujeito é entendido por meio da<br />
reconstituição das imbricações sociais com os outros.<br />
Essas imbricações, auxiliadas por orientações cognitivas, disposições<br />
culturais, pelas preferências, pelas práticas socializadoras, são abstraídas de nodo<br />
singular, fazendo com que a criança construa, a partir de sua vivência, o modo próprio<br />
de se relacionar com o mundo e interpretá-lo. As relações afetivas, sociais e culturais<br />
com os pais, irmãos, primos, tios, avós, o tipo de organização familiar, a socialização,<br />
costumes, ética, orientações, rotinas diárias, contribuem para o entendimento da<br />
formação da identidade pessoal, podendo repercutir na atuação profissional.
Desse modo, o resgate das experiências vividas na infância da educadora<br />
aponta acontecimentos importantes para a formação profissional. Oriunda de uma<br />
comunidade rural que vive da agricultura de subsistência e da pecuária, Estelita cresceu<br />
numa família marcada por sentimentos humanísticos e fraternais.<br />
A convivência na família permitiu ainda a formação de habitus religioso,<br />
levando à incorporação de modelos de relacionamento influenciados pela necessidade<br />
de colocar em prática, na vida cotidiana, princípios valorizados pela religião católica.<br />
O amor do pai ao se relacionar com os problemas do cotidiano familiar foi<br />
uma referência pedagógica, configurando-se, também, num saber orientador das práticas<br />
de ensino. É o que se revela no depoimento a seguir:<br />
Eu aprendi muito com papai, ele gostava muito de conversar, de<br />
contar história, ele conversava muito com as pessoas amigas. Isso foi<br />
um incentivo pra mim, já que nós (as irmãs) éramos muito fechadas.<br />
Ele valorizava muito a família, gostava de rezar. Como professora,<br />
aqueles exemplos que ele deu, de não bater, de conversar, sempre<br />
orientando de acordo com os valores cristãos, foi importante pra mim<br />
[...].<br />
Ao relembrar sua infância, a educadora menciona que na família não havia<br />
incentivo à leitura, e na escola, a ênfase se dava nas disciplinas de história, geografia e<br />
português.<br />
Em casa quase não tinha prática de leitura [...], por exemplo, a gente<br />
ia pra escola, quando chegava em casa, estudava o que marcava na<br />
escola, estudava aquelas lições que era muita coisa, de história,<br />
geografia, português [...] A gente quase não tinha apoio pra ir para a<br />
escola. A gente tinha a convicção que tinha que ir, não precisava<br />
ninguém mandar.<br />
A sua fala sinaliza que a educação recebida na família e as relações mantidas<br />
nesse contexto, se não contribuíram para a sua vida escolar, desenvolveram um<br />
conhecimento sobre a importância de assumir a escola como uma responsabilidade.<br />
Mais tarde, a jovem Estelita Antonino deixou a casa paterna para cursar o<br />
ginásio no internato do Colégio de Santa Rita, localizado na cidade de Areia/PB.<br />
Segundo a educadora, essa mudança foi possível graças à intervenção de seu<br />
irmão mais velho João Francisco, que notando o interesse da irmã pelos estudos,
investiu esforços para que pudesse dar continuidade a sua formação. As palavras da<br />
educadora revelam as dificuldades enfrentadas pela família nesse período e o papel<br />
marcante do irmão em sua vida:<br />
Eu saí de casa com 15 até os 19 anos, só vinha em casa nas férias [...]<br />
meu irmão se interessou em procurar um colégio (o Colégio Santa<br />
Rita, em Areia) porque via que eu era estudiosa [...] se fosse por<br />
papai ou mamãe a gente não tinha o interesse de sair não. Em 1947<br />
ele foi falar com a Madre Superiora, era muita exigência, naquele<br />
tempo se pagava uma mensalidade que pra gente era muito grande,<br />
mas ele conversou com a Madre Superiora, que não tinha condições,<br />
que meu pai era agricultor, morava no interior, aí ela fez uma<br />
diferença nas coisas. Ele ia me levar lá, foi um esforço muito grande<br />
dele [...]. Abaixo de Deus, eu devo tudo a ele [...] uma coisa que<br />
apareceu de Deus, porque naquela época ninguém estudava. Minhas<br />
irmãs não se interessavam muito em continuar a estudar, e mesmo<br />
assim, não dava pra todas.<br />
As lembranças rememoradas do início da vida escolar no Colégio de Santa<br />
Rita revelam marcas significativas desse período:<br />
Lá era assim, tudo era religioso, era a missa, era o terço, a gente<br />
assistia à missa todo dia, rezava o terço todo dia. A gente acordava<br />
seis horas, ia ao banheiro tomar banho e se preparava pra missa,<br />
depois tomava café e ia assistir aula até onze horas. Quando<br />
terminava a aula, a gente ia direto pra o refeitório, almoçava, passava<br />
aí até uma hora nesse recreio, fazendo trabalhos manuais e<br />
conversando também, mas sempre tendo uma ocupação, quando era<br />
uma hora em ponto, a gente subia para a sala de estudo, aí estudava<br />
até três horas. Depois descia pra merendar, passava um pouquinho,<br />
aí, subia de novo até cinco horas pra estudar. Quando dava cinco<br />
horas, a gente ia pra capela pra rezar o terço até às seis horas, aí<br />
direto para jantar, aí ficava um pouquinho por ali até no máximo oito<br />
horas, aí a companhia batia, a gente subia pra dormir, [...] pra todo<br />
canto que a gente ia tinha uma Irmã junto.<br />
Essas experiências e práticas inerentes à vida escolar direcionaram a<br />
educadora, ao assumir a docência, para a realização de modelos de ensino e práticas<br />
educativas vividas enquanto aluna. Estelita Antonino, a partir da percepção singular<br />
sobre o cotidiano da vida escolar e dos saberes vivenciados no Colégio de Santa Rita,<br />
parece haver incorporado ao seu fazer pedagógico a compreensão do valor da religião<br />
na vida de seus alunos. A fala a seguir sinaliza o modo como a educadora se apropriou
da realidade vivida, tomando-a como subsídio para a estruturação de práticas educativas<br />
na sua docência:<br />
Eu acho que (a escola) tem que estar dando sempre uma orientação<br />
do valor da Igreja. [...] a Igreja é fundada por Jesus Cristo, é orientada<br />
pela Bíblia, pelos Padres também, pelo Papa, pelos Bispos, com<br />
aquela orientação de cristão para a vida da pessoa, para a pessoa viver<br />
para fazer o bem.<br />
Na mesma linha, a educadora prossegue:<br />
[...] uma vez perguntaram a Pe. Romy Schneider ‘Quais são as duas<br />
coisas mais importantes na vida de uma pessoa?’, ele disse assim “É<br />
o amor e a oração”, aí pronto, (a religião é importante) para orientar,<br />
para a pessoa se entregar a Deus, pedir orientação dele na vida... para<br />
que haja paz, para que haja união.<br />
É possível inferir que os saberes da vida escolar utilizados para organizar o<br />
trabalho docente de Estelita Antonino foram constituídos, também, por conhecimentos<br />
que desencadearam boas recordações. A esse respeito, a educadora relata:<br />
Eu sempre gostei de estudar, minha professora que me ensinou as<br />
primeiras letras, eu segui por ela. Ela se doou ao Ligeiro e o Ligeiro<br />
se doou pra ela, era uma relação de amizade, de respeito, de amor.<br />
A prática dessa professora despertou em Estelita Antonino sua primeira<br />
identificação com o trabalho docente, cuja descoberta apenas aflorou no exercício<br />
profissional. A postura pedagógica dessa professora, e o sentimento desencadeado na<br />
aluna Estelita durante as aulas, tornaram-se fontes de saber, conduzindo seu trabalho.<br />
Posteriormente, a tendência para o ensino já se manifestava nas primeiras<br />
séries do ginásio. As colegas, ao perceberem sua capacidade de explicar e fazer com que<br />
as outras entendessem, pediam-lhe para ensinar as que tinham dificuldades. Assim, suas<br />
experiências da vida escolar contribuíram para a construção de saberes e concepções<br />
relacionadas ao trabalho docente. A fala a seguir ilustra a prática da educadora:<br />
Eu ensinava demais às minhas colegas, quando a gente subia para o<br />
dormitório tinha que fazer silêncio, mas as meninas me chamavam e<br />
o que eu sabia eu ensinava pra elas. Quando eu vim pra casa (no sítio<br />
Ligeiro) ensinava a quem precisava.
Permeadas por essa pluralidade de práticas, as lembranças rememoradas da<br />
vida profissional também trazem saberes significativos que expressam um perfil de<br />
educadora, bem como permitem a visualização dos conflitos e dos saberes utilizados<br />
para enfrentá-los.<br />
Para ilustrar esses momentos, a educadora relata as dificuldades do início da<br />
carreira docente:<br />
Eu não tinha experiência, nem tinha material [...] Dona Elça (a<br />
primeira diretora do Grupo Escolar Vasconcelos Brandão) era muito<br />
dinâmica, dava muita força pra gente. Ela foi ajudando, fazia as<br />
provas, me dava modelos de provas, isso foi me dando força. Padre<br />
Marques também passou aquele amor que ele tinha pelo ensino pra<br />
mim. Eu pegava os cadernos dos alunos que estudavam no colégio<br />
das freiras em Monteiro para me orientar e ensinava (aos alunos de<br />
Serra Branca).<br />
Percebe-se que esse momento da trajetória profissional foi marcado pela<br />
presença de obstáculos que foram enfrentados como desafios a serem vencidos. Nesse<br />
período, acontecem os primeiros ensaios para a conformação profissional e para a<br />
identificação explícita por algumas metodologias de trabalho, escolhendo certos estilos<br />
de ensino como modelo e descartando outros:<br />
O ensino era mais teórico. Ensinei muitos anos a 4ª série, era sistema<br />
métrico, fração, todo tipo de redação, nem sei como eu arranjava<br />
material para fazer um ensino seguro, bem feito.<br />
Essas situações de ensino, presentes na memória, elucidam o tipo de<br />
apropriação que a educadora realizou para organizar as próprias práticas.<br />
Nesse sentido, a apreciação das fotografias que retratam situações marcantes<br />
na docência possibilita a visualização concreta das manifestações profissionais. Permite,<br />
ainda, o conhecimento da familiarização com valores incorporados no decorrer do<br />
exercício docente, os quais estavam presentes na cultura escolar e pedagógica da<br />
educadora, influenciando seu ensino.<br />
Nas fotografias abaixo, vê-se que a cultura cívica e as festas escolares<br />
produzidas pela e para a escola através do desenvolvimento dos conteúdos e das práticas<br />
educativas das festas comemorativas ou de eventos relacionados à Pátria, com o uso de<br />
hinos brasileiros, hasteamento da bandeira, desfiles cívicos, festas folclóricas,
ocupavam lugar relevante na docência. Na figura 2, Estelita Antonino pode ser<br />
visualizada ao centro.<br />
Figura 2: Apresentação no Grupo Escolar<br />
Vasconcelos Brandão, década de 1970.<br />
Fonte: Arquivo pessoal da educadora.<br />
Figura 3: Desfile cívico do Grupo Escolar<br />
Vasconcelos Brandão, década de 1970.<br />
Fonte: arquivo pessoal da educadora.<br />
A educadora relembra o período das festas escolares organizadas pelo Centro<br />
Cívico do Grupo Escolar Vasconcelos Brandão, que presidiu durante anos:<br />
O Centro cívico funcionava no colégio aí eu presidi não sei quantos<br />
tempos. O centro fazia essas atividades (festas escolares e cívicas) no<br />
colégio [...] também se tivesse algum trabalho voluntário, faziam<br />
sempre alguma coisa pra ajudar.<br />
Além das práticas de ensino vinculadas às idéias relacionadas à educação e<br />
às experiências advindas do exercício da profissão docente, em seu depoimento,<br />
percebe-se que a educadora atuou movida, também, por sentimentos e afetos que<br />
possibilitam uma multiplicidade de tipos de ação educativa, formando a cultura<br />
profissional. Assim, pela prática pessoal e de ensino, desenvolveu certos habitus da<br />
profissão validados na realização do trabalho docente. A articulação dessas práticas<br />
forma uma ética própria de trabalho:<br />
Toda a vida tive vocação para a profissão e acho que a escola é a<br />
continuação da família [...] os dois têm que trabalhar junto. Eu<br />
sempre tive amor à profissão, nunca me arrependi um minuto de ser<br />
professora. Nunca saí de uma aula um minuto antes dela terminar.<br />
Quando faltava luz, eu levava uma vela para não perder a aula.
Essa ética docente valorizava as boas relações com os alunos, pais, colegas,<br />
autoridades educacionais e comprometia-se até com as condições das escolas, com a<br />
moradia dos alunos e com os hábitos dos pais em casa. Preocupava-se, também, com a<br />
vida das crianças fora da escola, com seu equilíbrio emocional e suas relações sociais.<br />
Considerações Finais<br />
As características principais e diferentes do trabalho docente de Estelita<br />
Antonino não foram apropriadas apenas na trajetória do curso de formação. Os saberes<br />
adquiridos na infância, na vida escolar, o exercício da própria docência, o contato com<br />
os alunos e a necessidade de enfrentar desafios, permitiu-lhe construir uma prática de<br />
ensino singular.<br />
A pesquisa em diversas fontes para inovar as estratégias educativas e<br />
descobrir outras maneiras de tornar o desenvolvimento de determinado conteúdo mais<br />
agradável, indicou-lhe novos caminhos de organização do trabalho docente.<br />
O conjunto de saberes originados dos vários momentos da trajetória de vida<br />
da educadora sempre recebeu análises e consequentemente, foram conduzidas a<br />
filtrarem os saberes compatíveis com sua personalidade, formação docente, experiência<br />
profissional e com os ideais educativos, para objetivá-los no cotidiano escolar.<br />
Referências<br />
BURKE, Peter (Org.) (2002). A escrita da história: Novas perspectivas. São Paulo-SP:<br />
Editora universidade Estadual Paulista.<br />
GALVÃO, Ana Maria de Oliveira & LOPES, Marta Teixeira. História da educação.<br />
Rio de Janeiro: DP&A, 2001.<br />
GOODSON, Ivor F. Dar voz ao professor: as histórias de vida dos professores e o seu<br />
desenvolvimento profissional. In: Nóvoa, A. (org.). Vidas de professores. 2 ed. Porto:<br />
Porto Editora, 1992.<br />
MEIHY, José Carlos Sebe Bom. Manual de história oral: o que é história oral?<br />
Loiyola. Ipiranga: São Paulo,1996.<br />
LANG, Alice Beatriz da Silva Gordo. História oral: muitas dúvidas, poucas certezas<br />
e uma proposta. In: MEIHY, José Carlos Sebe Bom. (Org.) (Re)introduzindo a
história oral no Brasil. São Paulo: Xamã. (Série Eventos), 1996.<br />
LAHIRE, Bernard. Retratos sociológicos: disposições e variações individuais. Trad.<br />
Didier Martin e Patrícia C. R. Reuillard. Porto Alegre, RS: Artmed, 2004.<br />
PERROT, Michelle. Mulheres ou os silêncios da história. Tradução Viviane<br />
Ribeiro. Bauru, S. P.: EDUSC, 2005.<br />
Fonte Oral:<br />
SOUZA, Estelita Antonino de. Ex-educadora do Grupo Escolar Vasconcelos Brandão.<br />
08/07/2009