Agnaldo José Martins - Supremo Tribunal Federal
Agnaldo José Martins - Supremo Tribunal Federal
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Programa<br />
Joaquim Nabuco<br />
Programa Joaquim Nabuco 1
1 SUPERVISOR:<br />
Nayse Hillesheim<br />
Assessoria de Assuntos Internacionais<br />
E-mail: nayseh@stf.jus.br<br />
Telefone: + 55 XX (61) 3217-4012<br />
2 COORDENADOR:<br />
Erismar Souza Freitas Filho<br />
Assessoria de Assuntos Internacionais<br />
E-mail: erismar.filho@stf.jus.br<br />
Telefone: + 55 XX (61) 3217-6505<br />
PROGRAMA JOAQUIM NABUCO<br />
- SERVIDORES 1º/2011 -<br />
3 SERVIDOR INTERCAMBISTA<br />
Nome: <strong>Agnaldo</strong> <strong>José</strong> <strong>Martins</strong><br />
Nacionalidade: brasileiro<br />
<strong>Tribunal</strong> de origem: <strong>Supremo</strong> <strong>Tribunal</strong> <strong>Federal</strong> do Brasil<br />
Período: 6/6/2011 a 16/6/2011<br />
E-mail: agnaldoj@stf.jus.br<br />
Alocação: Corte Suprema de Justicia del Paraguay<br />
Programa Joaquim Nabuco 3
ÍNDICE<br />
Programa Joaquim Nabuco 4<br />
A Corte Suprema de Justiça Paraguaia .............................................................................................................................................................. 5<br />
Sistema Nacional de Facilitadores Judiciais e a Corte Suprema de Justiça ......................................................................................... 6<br />
Atual Sistema Penal Paraguaio – Parte 1 ........................................................................................................................................................... 8<br />
Atual Sistema Penal Paraguaio – Parte 2 .........................................................................................................................................................10<br />
Juízo Oral no <strong>Tribunal</strong> Penal de Assunção .......................................................................................................................................................11<br />
Visita à Área de Controle de Gestão ..................................................................................................................................................................13<br />
Visita à Direção de Direitos Humanos e ao Centro Internacional de Estudos Judiciais ................................................................16<br />
Visita à Direção de Comunicação e ao Palácio da Justiça ........................................................................................................................19<br />
Visita à Direção de Assuntos Internacionais e Integridade Institucional e à Oficina de Mediação ..........................................21
A CORTE SUPREMA DE JUSTIÇA PARAGUAIA<br />
Programa Joaquim Nabuco 5<br />
Assunção, 6 de junho de 2011<br />
<strong>Agnaldo</strong> <strong>José</strong> <strong>Martins</strong><br />
<strong>Supremo</strong> <strong>Tribunal</strong> <strong>Federal</strong><br />
Brasília - Brasil<br />
O primeiro dia de atividades na visita institucional à Corte Suprema de Justiça (CSJ) paraguaia teve<br />
início com as palavras de boas-vindas do Ministro Víctor Nuñez. O membro da mais alta Corte do país<br />
ressaltou a importância do programa na busca da meta comum dos membros dos países do<br />
MERCOSUL, que é a excelência na prestação dos serviços jurisdicionais aos seus cidadãos. O Ministro<br />
assinalou também que, por meio de tal projeto, a troca de experiências positivas entre os países<br />
possibilita o desenvolvimento conjunto do sistema judicial da região. De maneira bastante solícita,<br />
Doutor Nuñez colocou-se à disposição ainda para ouvir nossas observações, críticas e sugestões ao<br />
longo do nosso período de atividades nas dependências da Corte.<br />
Posteriormente, o servidor Christian Díaz Acosta, Coordenador de Assuntos Internacionais e<br />
Integridade Institucional da Corte, fez um pequeno apanhado histórico do órgão máximo do sistema<br />
judicial paraguaio e explicou sua estrutura e funcionamento, tanto na área técnico-administrativa<br />
como judicial.<br />
Com a presença da Doutora Monica Paredes, Diretora de Assuntos Internacionais da CSJ, seguiu-se<br />
com a apresentação de um panorama dos sistemas penal, civil e trabalhista do país. No que tange à<br />
área criminal, foi destacada a mudança de paradigma trazida pela nova constituição do país, com<br />
regulamentação dada pelo novo código processual penal pátrio. De um sistema inquisitivo do<br />
passado, a justiça paraguaia tem se balizado agora pelo modelo acusatório, em que ganha ênfase o<br />
princípio da inocência do acusado e da humanização das penas. Nesse contexto, também foi<br />
destacada a função do Ministério Público, que deixou a posição meramente consultiva, passando à<br />
titularidade da ação penal e à fiscalização da correta aplicação da lei. Destacou-se ainda o<br />
surgimento do juiz de garantia como mais um instituto dessa nova conformação processual-penal.<br />
Diferentemente do sistema judicial brasileiro, a Corte Suprema do Paraguai exerce a<br />
superintendência sobre todos os organismos do Poder Judiciário daquele país e resolve, em instância<br />
única, todos os conflitos de jurisdição e competência. Cada um de seus nove ministros, além de<br />
compor as salas civil, penal e constitucional, também tem atribuições administrativas no âmbito das<br />
quinze circunscrições departamentais. Como conseqüência de o Paraguai ser um Estado Unitário,<br />
não há divisão de sua Justiça comum em âmbitos federal e estadual, como no caso brasileiro.<br />
Outro fato que chama a atenção é o de o Presidente, além das funções administrativas, comuns aos<br />
seus pares, também julgar processos judiciais. Ele é, por exemplo, um dos três membros da Sala<br />
Penal e seu presidente. Também é superintendente de circunscrições departamentais do interior do<br />
país.<br />
O panorama do sistema de administração da Justiça do país anfitrião de nosso intercâmbio,<br />
apresentado no primeiro dia juntamente com a programação, nos pareceu bastante promissor<br />
quanto a uma estada em Assunção com ótimo aproveitamento e com possibilidade de aquisição de<br />
muitos conhecimentos acerca da cultura jurídica do país. A calorosa recepção e a gentileza dos<br />
servidores e autoridades, sempre disponíveis para ouvir as dúvidas, prestar esclarecimentos e<br />
fornecer o suporte necessário às nossas atividades, trouxeram, igualmente, expectativas auspiciosas<br />
quanto ao contato humano e a experiência pessoal da viagem.
Programa Joaquim Nabuco 6<br />
SISTEMA NACIONAL DE FACILITADORES JUDICIAIS E A CORTE SUPREMA DE<br />
JUSTIÇA<br />
Assunção, 7 de junho de 2011<br />
<strong>Agnaldo</strong> <strong>José</strong> <strong>Martins</strong><br />
<strong>Supremo</strong> tribunal <strong>Federal</strong><br />
Brasília - Brasil<br />
No segundo dia de intercâmbio na Corte Suprema de Justiça, conhecemos o Sistema Nacional de<br />
Facilitadores Judiciales. Com a presença do Ministro Miguel Bajac, que nos apresentou o projeto e de<br />
demais coordenadores, ouvimos que se trata de uma experiência que teve início na Nicarágua e<br />
que, por meio de acordo técnico com a Organização dos Estados Americanos (OEA) em 2007, foi<br />
possível implementá-lo no Paraguai. Com tal medida, a CSJ passou a integrar a Rede Interamericana<br />
de Facilitadores Judiciais Rurais. Essa é a segunda experiência do programa na América Latina.<br />
Tal programa, que se insere no marco de um conjunto de políticas públicas de acesso à Justiça para<br />
grupos em situação de vulnerabilidade, tem por objetivo a formação de facilitadores em todo o país<br />
e visa a franquear à população, principalmente de áreas isoladas, que não conta a presença do<br />
Estado, uma Justiça rápida e eficiente. O intuito é levar cidadania a todos, reduzir os conflitos sociais<br />
e descongestionar o sistema judicial.<br />
A população alvo do programa, como nos explicou o Ministro Bajac, vive em estado de grande<br />
fragilidade social, em áreas rurais ou suburbanas. Ademais, sofrem com altos níveis de violência e<br />
impunidade. A regra nessas comunidades é o desconhecimento dos mecanismos, processos e<br />
funções dos órgãos jurisdicionais do Estado.<br />
Os facilitadores, em que pese cumprirem funções com respaldo do Poder Judiciário, não formam<br />
parte do corpo de servidores do Estado. São pessoas que exercem liderança natural em suas<br />
comunidades e que gozam de confiança e respeitabilidade entre seus pares. Eleitos em assembleias<br />
comunitárias, atuam como ponte entre os operadores do direito e os cidadãos. Eles canalizam os<br />
casos que podem ser resolvidos por meio de métodos alternativos de resolução de conflitos e<br />
difundem uma cultura jurídico-cidadã, tendo com ferramenta tanto a autocomposição, como o uso<br />
do Direito e das instituições do Estado como possibilidades de pacificação social.<br />
Uma vez eleitos, prestam juramento ante o juiz de paz da localidade, aos quais se vinculam, e são<br />
capacitados pela CSJ sobre noções básicas de desenvolvimento pessoal, além de noções de direito<br />
civil, penal, constitucional e de família. Seu papel é difundir uma cultura cívica na comunidade em<br />
que residem e atuam, por meio do acompanhamento da solução de diferentes tipos de conflitos.<br />
Presentes hoje em nove departamentos do país e em sessenta e sete cidades, os mais de mil<br />
facilitadores colaboram ainda com as campanhas de emissão de documentos, inclusive certidões de<br />
nascimento.<br />
Chamou particularmente atenção no programa a ênfase dada à presença da mulher facilitadora, que<br />
representa cerca de quarenta por cento do grupo. Esse componente de gênero tem refletido,<br />
segundo os responsáveis pelo projeto, na prevenção e mesmo na resolução de muitos casos de<br />
violência doméstica, antes permanecidos ocultos, tanto pelo temor de represália sexista, quanto pela<br />
falta de conscientização de que tal problema não deve ser tratado só no âmbito da esfera privada.<br />
O foco de tal iniciativa é relevante, pois na medida em que a mulher se capacita e toma consciência<br />
de seus direitos e dos meios legais de que pode se valer para vê-los respeitados, ela pode refletir<br />
sobre as assimetrias das relações de gênero no âmbito da comunidade em que vive e no seio de sua<br />
própria família. O favorecimento dessa representação subjetiva da violência atua no seu<br />
apoderamento e na mudança das relações intrafamiliares, com superação da situação de
Programa Joaquim Nabuco 7<br />
desigualdade e alcance de status de respeitabilidade no seu meio social. Além do fato de a presença<br />
da mulher facilitadora ter um profundo efeito educativo sobre o conjunto das mulheres da sua<br />
comunidade, ela altera a própria dinâmica de uma casa e de uma família, o que favorece a redução<br />
da escalada de violência e gera coesão social.<br />
O grande mérito de tal projeto, para além dos efeitos práticos de se reduzir os custos materiais e<br />
humanos dos Tribunais, está, assim, na possibilidade de participação direta da sociedade civil na<br />
resolução de seus próprios conflitos. Esse mecanismo de participação cidadã vai ao encontro do<br />
compromisso assumido pela CSJ de fortalecer sua missão institucional, aproximando-se das pessoas<br />
que mais necessitam da atenção do Estado, com oferecimento de uma Justiça mais acessível e<br />
satisfatória aos cidadãos.<br />
Num momento em que a nação paraguaia comemora seu bicentenário de independência política,<br />
tais iniciativas, ao levarem cidadania a grupos socialmente mais vulneráveis e historicamente<br />
desassistidos, ajudam a consolidar o Estado de Direito e o sistema democrático, trazendo<br />
expectativas mais promissoras rumo a um futuro de desenvolvimento e de justiça social para o país.
ATUAL SISTEMA PENAL PARAGUAIO – PARTE 1<br />
Programa Joaquim Nabuco 8<br />
Assunção, 8 de junho de 2011<br />
<strong>Agnaldo</strong> <strong>José</strong> <strong>Martins</strong><br />
<strong>Supremo</strong> <strong>Tribunal</strong> <strong>Federal</strong><br />
Brasília - Brasil<br />
No terceiro dia de nossa jornada, tivemos uma manhã de atividades com o Dr. Emiliano Rolón,<br />
membro de uma das salas criminais do <strong>Tribunal</strong> de Apelação de Assunção e juiz da Corte Suprema de<br />
Justiça. O magistrado nos falou sobre a atual estrutura do sistema penal paraguaio. Foi-nos<br />
explicado que a nova Constituição do país, que data do ano de 1992, foi a primeira que vigeu num<br />
sistema democrático e de repartição de poderes de forma harmônica. O magistrado ressaltou que a<br />
Lei Máxima do país, sob a qual se elaborou o código penal (1997) e de processo penal (1998),<br />
propiciou uma renovação ideológica desse ramo do ordenamento jurídico, estabelecendo-se um<br />
modelo de garantias individuais até então ausente. Tal sistema, voltado à dignificação do ser<br />
humano, ao sair de um posicionamento vertical e se horizontalizar, põe um freio à arbitrariedade<br />
estatal e à proeminência do Poder Executivo e coloca a defesa da vida em primeiro plano.<br />
Nesse âmbito de renovação de conceitos e práticas no trato do sistema penal e processual penal e de<br />
aproximação aos anseios da sociedade, apontaram-se como os desafios mais urgentes na<br />
administração da justiça a necessidade de imposição de uma autocrítica no que tange ao maior<br />
acesso à justiça, à razoabilidade na duração dos processos e de maior demanda pela sua oralidade.<br />
Questionado sobre o sistema de execução da pena e sobre eventuais programas existentes que se<br />
relacionassem com a ressocialização dos condenados, o magistrado lamentou ser esse um desafio<br />
ainda pendente, pois não há nenhuma iniciativa governamental em tal direção.<br />
Diferentemente do Paraguai, a legislação penal e processual penal brasileira é anterior à Constituição<br />
vigente, a qual, assim como no país vizinho, é a primeira a estabelecer marcos verdadeiramente<br />
democráticos, no que diz respeito ao sistema criminal. Assim, aqui temos que interpretar tal<br />
legislação à luz dos princípios constitucionais que regem essa nova perspectiva de dignidade da<br />
pessoa humana, lá já absorvidas pelas normas infraconstitucionais.<br />
Os dois países dispõem de um sistema penal de garantias individuais. Percebe-se, no entanto, que os<br />
desafios na sua implementação são comuns e igualmente gigantescos. Mas certas iniciativas aqui<br />
existentes, como o Programa Começar de novo, do Conselho Nacional de Justiça, que atua na<br />
sensibilização da sociedade para o oferecimento de oportunidades de trabalho aos presos e egressos<br />
do sistema carcerário, são um indicativo de que boas práticas governamentais podem ser conhecidas<br />
e compartilhadas.<br />
No fim da manhã, fizemos uma visita guiada à sede do Ministério Público Paraguaio. Na instituição,<br />
conhecemos o centro de capacitação de seus membros e servidores, o laboratório forense e também<br />
um dos projetos de sua área estratégica de motivação organizacional. Acompanhados da Diretora de<br />
Comunicação e Imprensa da instituição, Senhora Elida Fragole, assistimos a parte de uma simulação<br />
da pratica dos promotores no julgamento de uma causa de lavagem de dinheiro e, ainda no centro<br />
de treinamento, assistimos a uma capacitação de servidores para o recebimento de denúncias de<br />
cidadão.<br />
No laboratório forense, fomos recebidos pelo promotor de justiça, Dr. Edgar Sanchez, que nos<br />
explicou que tal unidade é dividida em Departamento técnico, operativo e científico. Sua construção,<br />
que se insere num contexto de fortalecimento do Ministério Público na luta contra a corrupção e em<br />
prol do Estado de Direito, foi financiada pelo programa Umbral, administrado pela Agência Norte-<br />
Americana para o Desenvolvimento Internacional (USAID).<br />
Como parte desse projeto, conhecemos uma das duas unidades móveis da área operativa, às quais se<br />
deslocam às cenas dos crimes. Servem à cidade de Assunção e a localidades próximas. O veículo é
Programa Joaquim Nabuco 9<br />
equipado com gerador de energia e equipamentos que permitem coletar evidências, inclusive<br />
amostras biológicas. No Departamento Científico, tivemos a oportunidade de assistir a uma<br />
demonstração do trabalho dos peritos da área de papiloscopia e identificação. Também vimos a<br />
operacionalização do trabalho investigativo de análise balística e de autenticidade de documentos.<br />
A servidora da área química e biológica informou que o Ministério Público é responsável por um<br />
banco de dados que armazena informações genéticas de crianças abandonadas para que essas<br />
informações sejam cotejadas com as de pais que procuram seus filhos. A instituição conta ainda com<br />
uma área de informática forense, apta a investigar crimes cibernéticos, como os financeiros e os<br />
relacionados à pedofilia. Atua ainda na recuperação de dados de correio eletrônico e internet. Por<br />
fim, conhecemos a Central de Dados, que interconecta informações das 89 unidades do Ministério<br />
Público espalhadas pelo país. O recinto também abriga o comando de defesa cibernética do país, no<br />
âmbito de toda a rede governamental.<br />
Em decorrência do fato de o Estado paraguaio ser unitário e de não haver uma Justiça<br />
institucionalmente estruturada em várias especializações, seu Ministério Público não possui uma<br />
divisão de ramos de atuação, como no Brasil. Em ambos os países, no entanto, a Constituição<br />
Nacional de 1992 ampliou bastante seu rol de atribuições e lhe franqueou autonomia funcional e<br />
administrativa. Cabe ao Ministério Público paraguaio a defesa da sociedade diante dos órgãos<br />
jurisdicionais do Estado, a titularidade da ação penal pública, a defesa do patrimônio público, do<br />
meio ambiente, dos povos indígenas e de outros interesses difusos.<br />
Conforme expressa determinação do código de processo penal do país (art. 52), cabe ao Ministério<br />
Público o comando das investigações de fatos puníveis segundo a legislação do país. No Brasil,<br />
diferentemente, a direção do inquérito policial é atribuição da polícia judiciária dos Estados ou da<br />
Polícia <strong>Federal</strong>, sendo que até há pouco havia certa celeuma acerca dos limites de atuação<br />
investigativa do Ministério Público. Recentemente, no entanto, o STF pacificou essa questão no HC<br />
91.661/PE, julgado pela Segunda Turma em 2009, o qual dá respaldo constitucional a essa<br />
prerrogativa do Parquet.<br />
A visita proporcionou-nos uma boa impressão acerca da atuação do Ministério Público Paraguaio.<br />
Contando com boas instalações e equipamentos modernos, chamou particularmente atenção a<br />
preocupação da instituição em proporcionar aos membros e servidores boas condições de trabalho e<br />
atualização profissional constante, como pôde ser percebido no acompanhamento das oficinas de<br />
capacitação.
ATUAL SISTEMA PENAL PARAGUAIO – PARTE 2<br />
Programa Joaquim Nabuco 10<br />
Assunção, 9 de junho de 2011<br />
<strong>Agnaldo</strong> <strong>José</strong> <strong>Martins</strong><br />
<strong>Supremo</strong> <strong>Tribunal</strong> <strong>Federal</strong><br />
Brasília – Brasil<br />
No quarto dia, tivemos a oportunidade de conhecer mais um pouco do sistema penal paraguaio e sua<br />
evolução, sendo uma delas a implantação dos juicios orales e os princípios que os embasam. Para<br />
tanto, visitamos o Juzgado Penal de Garantía de Assunção, onde fomos recebidos pelo Juiz Pedro<br />
Mayor Martínez, em seu Gabinete.<br />
O magistrado abordou o paradigma inaugurado pela Constituição Nacional de 1992, que representa<br />
um redirecionamento da política e do sistema judicial do país no que tange ao sistema penal. De um<br />
modelo inquisitivo, em que tudo se resolvia a portas fechadas, passou-se ao desenho de um modelo<br />
constitucional de direitos, com fortalecimento da posição do imputado e das garantias individuais.<br />
Segundo o magistrado, persiste, no entanto, um grande desafio, que é o de mudar os esquemas<br />
mentais dos juízes, formados em sua grande parte na vigência de um sistema autoritário, que além<br />
de concentrar numa só autoridade o papel de investigar e julgar o fato delituoso, não era submetido<br />
a nenhum controle fiscalizatório.<br />
Ao entrar numa fase final de transição, o novo sistema penal paraguaio passa, assim, por um<br />
processo de adaptação estrutural, que inclui desde a construção de salas de audiência, dispensável<br />
no antigo desenho institucional, até a figura do investigador independente e a imputação escrita.<br />
Ganha relevo nesse contexto o papel do Ministério Público. Essa divisão de atribuições poderia<br />
parecer, numa primeira análise, uma perda de poder do magistrado. Mas, segundo entendimento do<br />
Dr. Martínez, ocorre justamente o contrário: seu papel se amplia, já que, além de decidir as causas,<br />
procura garantir a todos um livre julgamento, no sentido de que sobre o indivíduo não sejam<br />
exercidas pressões ilegais e inconstitucionais.<br />
É nesse contexto que a oralidade se estabelece como mecanismo de garantia do indivíduo, pois<br />
permite o direito de enfrentamento das partes em litígio e o controle das audiências por parte da<br />
comunidade. Enquanto no processo meramente escrito, existiam prazos estanques e peremptórios<br />
para manifestação, no sistema oral a discussão é pública e se dá de forma rápida e transparente,<br />
abreviando o processo.<br />
No modelo apresentado, a oralidade é utilizada na instrução do processo não só no julgamento de<br />
mérito, mas em todo tipo de incidente, inclusive na fase de execução. O código de processo penal<br />
exige audiências orais, com presença das partes, por exemplo, para concessão de medidas<br />
cautelares, decisão sobre questões interlocutórias e para quaisquer fatos que digam respeito à<br />
análise probatória.<br />
A consolidação de tal modelo encontra algumas resistências. Como ressaltado pelo magistrado, o<br />
membro do Ministério Público ainda não se adaptou plenamente a essa dinâmica e o juiz ainda<br />
acaba se apegando demasiadamente à formalidade dos documentos escritos. De forma geral, falta<br />
preparo aos operadores do direito, incluindo os advogados, para uma intervenção oral adequada na<br />
própria audiência e, no que tange ao juiz, sentenciar oralmente ao fim dos trabalhos de instrução do<br />
processo, sem interrupções.<br />
Outro desafio imposto pela oralidade é a capacitação dos profissionais que atuam no fórum para<br />
utilização do idioma guarani, segunda língua oficial do país, conforme determinação constitucional.<br />
Falada principalmente pela população de origem rural e de ancestralidade indígena, o pleno manejo<br />
desse signo lingüístico pelos operadores do direito é um imperativo do sistema jurídico paraguaio,<br />
pois só assim as partes poderão ser plenamente ouvidas e compreendidas, condição imprescindível<br />
para exercício pleno de seu direito à tutela jurisdicional do Estado.
JUÍZO ORAL NO TRIBUNAL PENAL DE ASSUNÇÃO<br />
Programa Joaquim Nabuco 11<br />
Assunção, 10 de junho de 2011<br />
<strong>Agnaldo</strong> <strong>José</strong> <strong>Martins</strong><br />
<strong>Supremo</strong> <strong>Tribunal</strong> <strong>Federal</strong><br />
Brasília - Brasil<br />
Como parte das atividades de apresentação do panorama do sistema penal paraguaio, assistimos, no<br />
quinto dia, a um juízo oral - como é chamada, no sistema judicial paraguaio, a audiência de instrução<br />
e julgamento, realizado no <strong>Tribunal</strong> Penal de Assunção, que se localiza no prédio da Corte Suprema<br />
de Justiça do País. Tratava-se do julgamento de um caso de tráfico de drogas, em que a ré era uma<br />
cidadã boliviana presa em flagrante por, supostamente, trazer consigo pouco mais de um quilo de<br />
cocaína escondidos num recipiente que armazena tererê, bebida a base de ervas muito consumida<br />
no país.<br />
A audiência foi presidida pelos juízes Daniel Ferro, Maria Fleitas e Maria Gonzalez. Com a ré<br />
presente, acompanhamos a oitiva das testemunhas. A atividade foi bastante interessante, pois<br />
permitiu conferir, na prática, a aplicação do modelo de oralidade e do sistema de garantias que<br />
embasa a nova ordem jurídico-constitucional do país. Além disso, foi possível marcar sensíveis<br />
diferenças com o nosso modelo.<br />
No sistema processual penal paraguaio, o julgamento, desde a primeira instância, é feito por um<br />
colegiado de três juízes. Prevalece o decidido pela maioria, inclusive nas questões incidentais. Essa é<br />
uma determinação que abrange todos os feitos criminais, mesmo os crimes dolosos contra a vida. O<br />
instituto do <strong>Tribunal</strong> do Júri não tem previsão constitucional no país.<br />
Chamou atenção ainda a disposição física das pessoas presentes na sala de audiência. Para além da<br />
cancela, que separa o público dos profissionais envolvidos no julgamento, o representante do<br />
Ministério Público se posiciona à direita do advogado de defesa e do réu. Ambos as partes do<br />
processo ficam de frente para a mesa na qual se sentam os três juízes do processo. As testemunhas<br />
se posicionam entre as duas partes, também de frente para os magistrados.<br />
Não há intermediação do juiz para o registro da fala das testemunhas, como ocorre no nosso<br />
sistema. Mesmo com a recente reforma do código de processo penal brasileiro, em que se permite<br />
aos advogados e ao representante do Ministério Público a interpelação direta do réu e das<br />
testemunhas, percebemos que no sistema processual paraguaio a ênfase que se dá ao instituto da<br />
oralidade deixa a testemunha muito mais livre para se expressar, sem muito controle e maiores<br />
interrupções de suas falas.<br />
Conforme estabelece o modelo de oralidade, a sentença deve ser dada ao término da audiência. No<br />
julgamento em questão, no entanto, não foi possível acompanhar seu desfecho, pois o Ministério<br />
Público não providenciou a notificação do perito para falar em juízo acerca do material apreendido. A<br />
audiência foi remarcada para a segunda-feira seguinte, data em que a ré seria ouvida e a sentença,<br />
finalmente, prolatada.<br />
Ao fim dos trabalhos, o advogado da ré, o defensor público Garcia Aquino Fidel veio conversar<br />
conosco e nos deu mais detalhes do caso, nos explicando que foi designado recentemente para o<br />
processo e que o julgamento se dava na Capital, em que pese os fatos terem ocorrido na região do<br />
Chaco paraguaio, ao norte do país, pois aquela região ainda não contava com órgão jurisdicional<br />
instalado. Também nos falou sobre o grave problema das drogas no país e de ser a região onde<br />
houve a interceptação policial uma rota do tráfico internacional de entorpecentes que parte da<br />
Bolívia.
Programa Joaquim Nabuco 12<br />
Quando já nos preparávamos para deixar a sala de julgamento, fomos gentilmente convidados por<br />
um dos juízes do processo, Dr. Daniel Ferro, para uma conversa em seu Gabinete. O magistrado deunos<br />
maiores detalhes do processo, enfatizou as recentes mudanças no sistema processual do país,<br />
em conformidade com a explanação das autoridades em atividades anteriores, e colocou-se à<br />
disposição para que pudéssemos dirimir eventuais dúvidas.<br />
Ficamos muito bem impressionados, ao longo dessa primeira semana, com os esforços da CSJ, que<br />
gere todo o sistema judicial do país, em implementar o modelo de garantias delineado pelo<br />
legislador. Tivemos a oportunidade de conhecer algumas iniciativas que criam condições para sua<br />
efetividade, tanto no que tange as instalações físicas das circunscrições judiciais, quanto no que diz<br />
respeito à capacitação de seus membros e servidores segundo a nova perspectiva constitucional.
VISITA À ÁREA DE CONTROLE DE GESTÃO<br />
Programa Joaquim Nabuco 13<br />
Assunção, 13 de junho de 2011<br />
<strong>Agnaldo</strong> <strong>José</strong> <strong>Martins</strong><br />
<strong>Supremo</strong> <strong>Tribunal</strong> <strong>Federal</strong><br />
Brasília - Brasil<br />
Iniciamos a segunda semana de intercâmbio na Corte Suprema de Justiça do Paraguai com uma visita<br />
a sua Área de Controle da Gestão. Inicialmente conhecemos a Oficina de Quejas y Denúncias. Os<br />
servidores Ovidio Villalba e María Gímenez de Barrios, assessor e chefe da unidade, respectivamente,<br />
nos disseram que tal unidade faz parte de uma política de transparência e participação do cidadão na<br />
Administração do sistema de justiça do país. Os procedimentos envolvem a recepção, o registro e a<br />
análise preliminar de queixas e denúncias apresentadas contra a atuação de magistrados, servidores<br />
e auxiliares de justiça<br />
Segundo os responsáveis por esse núcleo, o cidadão pode denunciar casos de mal atendimento,<br />
corrupção, extravio ou morosidade dos processos, além da ausência de funcionários no serviço. As<br />
queixas podem se referir ao mau funcionamento ou falta de um serviço no âmbito do Poder<br />
Judiciário. O denunciante deve se identificar, mas seus dados são mantidos em sigilo. Deve relatar o<br />
fato e as circunstâncias que o caracterizam e apresentar provas, se as possui.<br />
As linhas gerais para a criação desse modelo de transparência advieram, segundo os expositores, das<br />
diretrizes delineadas pela Constituição de 1992, fonte do marco democrático da vida institucional do<br />
país. Até então, a Corte Suprema não dispunha de estruturação em termos de controle da gestão. O<br />
grande desafio das autoridades consiste, no entanto, em superar caldo de cultura autoritário, ainda<br />
recente na memória institucional do país, o que ainda causa um certo temor ou mesmo descrença<br />
por parte do cidadão comum em se manifestar sobre os desvios de conduta dos servidores e agentes<br />
do Estado.<br />
Os principais casos que chegam à Oficina de Quejas y Denúncias dizem respeito à falta ou ausência<br />
dos servidores em seu local de trabalho durante o expediente. Só em 2010, houve, segundo os<br />
expositores, mais de 700 denúncias por tal motivo, quase metade do total. A razão de tal estatística<br />
estaria em certo costume ancestral permissivo, fruto justamente da falta de profissionalização e<br />
controle das atribuições dos servidores do Estado.<br />
As sanções disciplinares previstas incluem desde a advertência (a juízes e a servidores) à destituição<br />
do servidor cargo. No caso dos auxiliares de justiça, pode haver o cancelamento da matrícula e a<br />
vedação permanente da profissão. O órgão responsável por aplicar as sanções é o Conselho de<br />
Superintendência da Corte, composto por seu presidente e os dois vice-presidentes da instituição.<br />
Em seguida a essa explanação, passamos à Diretoria Geral de Auditoria de Gestão Judicial, a cujo<br />
respeito nos falou o servidor Mario Elizeche. Sua função é colaborar com o Conselho de<br />
Superintendência, a título de recomendação, para assegurar uma tramitação eficiente dos<br />
julgamentos. As várias unidades de tal Diretoria têm como foco o controle do trabalho judicial nas<br />
diversas Varas espalhadas pelo país (339 no total) - denominadas despachos judiciales, com o<br />
propósito de assegurar um bom funcionamento do sistema de administração de justiça.<br />
Para alcançar tal propósito, tais unidades exercem as atividades de compilação de informação<br />
estatística das diversas varas, alimentação e administração de uma base de dados, administração de<br />
um sistema de riscos e elaboração de um plano anual de auditorias. No que tange à auditoria de<br />
campo, faz-se uma revisão dos procedimentos, avalia-se os elementos de controle interno da gestão<br />
e investiga-se a origem das deficiências encontradas. Também compete a tal Diretoria exercer o<br />
controle reativo, com investigação do alcance das denúncias feitas.
Programa Joaquim Nabuco 14<br />
A terceira Diretoria à qual fomos apresentados, e que também atua na referida área de controle da<br />
gestão, foi a de Auditoria Interna, responsável pelo controle da gestão administrativa e financeira da<br />
CSJ. Sua missão, segundo o Diretor Miguel Fornells, é aperfeiçoar o processo de transparência e<br />
eficiência da gestão administrativa e resguardo do patrimônio da Corte.<br />
O setor é uma das unidades da Corte contempladas pelo programa UMBRAL, administrado pela<br />
Agência Norte-americana para o Desenvolvimento Internacional (USAID), cujo apoio, no âmbito do<br />
Poder Judiciário, se dá por meio de investimentos que contemplem a consolidação dos sistemas de<br />
controle da gestão judicial e disciplinar e o fortalecimento dos sistemas de controle interno<br />
administrativo e financeiro e do <strong>Tribunal</strong> de Contas. Estando já na segunda fase do programa, a<br />
ênfase está no controle estratégico, de gestão e de avaliação. As atividades incluem participação em<br />
reuniões de trabalho, cursos de capacitação, atualização de manuais, adequação de espaço físico e<br />
adoção de equipamentos tecnológicos de ultima geração, de maneira a agilitar os trabalhos.<br />
Suas principais funções são a avaliação, a detecção e a recomendação a partir dos dados coletados<br />
nas auditorias de gestão administrativa, financeira, registral e da verificação das denúncias. Não há<br />
participação nos processos operativos. Para tanto, goza de independência, vinculando-se a normas<br />
internacionais de Auditoria, em harmonia com as Exigências da CSJ.<br />
Também é de sua alçada a verificação das denúncias de natureza administrativo-financeira<br />
provenientes da Oficina de Quejas y Denúncias, da Superintendência Geral de Justiça, ou do próprio<br />
do Conselho de Superintendência da CSJ, como marco do novo sistema de controle disciplinar da<br />
instituição.<br />
Em consonância com tal propósito, a maioria das recomendações feitas ao Conselho de<br />
Superintendência se traduziram, segundo o responsável pela Unidade, em disposições para<br />
implementá-las. Isso tem proporcionado a melhora da gestão administrativo-financeira das<br />
diferentes dependências que compõem a administração da Corte, além de fortalecer a imagem<br />
institucional. A Diretoria Geral de Auditoria Interna tem logrado, segundo relato do responsável pela<br />
unidade, ser um referente institucional nos procedimentos de controle interno, o que contribui para<br />
a melhora da imagem da Corte Suprema de Justiça ante os diferentes grupos de interesse da<br />
sociedade.<br />
A última atividade do dia foi uma visita à Oficina de Ética Judicial. Como nos explicou o servidor<br />
Esteban Kriskovich, diretor da unidade, a Oficina é o órgão encarregado de implementar o Código de<br />
Ética Judicial. Tal documento, promovido pela própria CSJ, é resultado de um processo de elaboração<br />
participativo, que incluiu magistrados, consultores, representantes de organizações civis, além de<br />
pesquisas feitas com os cidadãos e usuários do sistema judicial.<br />
Datado de 2006, trata-se do primeiro código de ética judicial do Paraguai e tem o propósito de<br />
buscar a excelência no serviço de Justiça, com indicação dos valores da função judicial no Paraguai e<br />
regulação dos deveres éticos do juiz, protegendo os bens morais da sociedade.<br />
O Escritório de Ética Judicial tem a seu cargo a tramitação de denúncias e consultas éticas, assim<br />
como a promoção e difusão geral do código de ética judicial. Entre suas atividades se incluem,<br />
igualmente, o suporte e a coordenação das atividades do <strong>Tribunal</strong> de Ética Judicial (cuja medida<br />
sancionatória é a responsabilização ética) e do Conselho Consultivo do Código de Ética Judicial (que<br />
responde a questões éticas formuladas por membros do Poder Judiciário e entidades representativas<br />
da sociedade civil).<br />
As medidas éticas se aplicam aos juízes paraguaios de qualquer instância, inclusive aos membros da<br />
Corte Suprema. Entre tais medidas estão a recomendação, a advertência e censura. Segundo o<br />
servidor responsável pelo núcleo de Ética Judicial da CSJ, o ponto forte desse sistema está<br />
justamente na ausência de caráter sancionador, de cunho jurisdicional. Em que pese não haver<br />
aplicação de sanções penais, administrativas ou civis, seus juízos e conclusões têm eficácia moral, de<br />
forte valor simbólico, e depende principalmente do reconhecimento de sua legitimidade, advindo de
Programa Joaquim Nabuco 15<br />
diferentes atores sociais. Sua eficácia também radicaria no elevado nível de correção moral e<br />
formação intelectual de seus artífices, assim como no modelo destacado de eleição de seus<br />
membros, que se realiza de forma independente do Poder Judiciário.<br />
Como a Corte Suprema de Justiça do Paraguai é responsável pela supervisão administrativa,<br />
funcional e financeira de todo o sistema judicial do país, suas atribuições não encontram<br />
correspondentes exatos no modelo brasileiro. Considerando essa peculiaridade, pode-se dizer que a<br />
área de Controle da Gestão engloba as atribuições que aqui, corresponderiam à Corregedoria no<br />
âmbito dos Tribunais de Segunda instancia e, no caso do STF, de sua Secretaria de Controle Interno.<br />
Dentre as unidades da área de controle da gestão da CSJ, chamou particularmente atenção a Oficina<br />
de Quejas y Denúncias, núcleo voltado à participação do cidadão para a correção de rumos do<br />
sistema judicial. Tal iniciativa é um exercício de autocrítica e demonstra a preocupação da Corte em<br />
ouvir a sociedade sobre a atuação tanto de seus juízes, quanto de servidores. Trata-se de uma<br />
política comunicacional louvável, pois ao garantir o acesso à informação sobre o Poder Judiciário,<br />
caminha na direção de uma Justiça democrática, transparente e inclusiva, colocada a serviço da<br />
pessoa. Essa deve ser a essência de um Estado de Direito democrático.<br />
No âmbito do STF, com atuação mais ampla, temos a Central do Cidadão, que igualmente estabelece<br />
uma via de comunicação direta com o jurisdicionado e tem como propósito melhorar a prestação<br />
jurisdicional. No caso do órgão de cúpula do Poder Judiciário brasileiro, são recebidos e processados,<br />
além de respondidos, pedidos de informação, providência jurisdicionais relativas à tutela da<br />
liberdade, sugestões, solicitações, reclamações acerca da morosidade judicial, além de críticas<br />
relacionadas com a atuação do STF. Seu objetivo é elevar os padres de transparência, presteza e<br />
segurança das atividades do <strong>Supremo</strong>.<br />
No que diz respeito à Diretoria Geral de Auditoria de Gestão Judicial e à Controladoria Interna,<br />
ambas também subordinadas à Área de Controle da Gestão da CSJ, seus equivalentes aproximados<br />
no âmbito do Poder Judiciário brasileiro, são as corregedorias no âmbito dos tribunais de justiça<br />
estaduais e regionais federais e as unidades de Controle Interno de cada um desses órgãos,<br />
respectivamente.<br />
Considerando as características de repartição de competências próprias de um Estado Federado, não<br />
é atribuição constitucional do STF exercer auditoria da gestão judicial de processos que não sejam<br />
aqueles afeitos à sua alçada. Igualmente, como consequência lógica desse desenho institucional,<br />
cabe a ele, tão somente, o exercício de auditoria e controle relacionados às suas funções<br />
administrativas e financeiras. Os padrões a serem observados seguem, obviamente, as mesmas<br />
linhas mestras.
Programa Joaquim Nabuco 16<br />
VISITA À DIREÇÃO DE DIREITOS HUMANOS E AO CENTRO INTERNACIONAL DE<br />
ESTUDOS JUDICIAIS<br />
Assunção, 14 de junho de 2011<br />
<strong>Agnaldo</strong> <strong>José</strong> <strong>Martins</strong><br />
<strong>Supremo</strong> <strong>Tribunal</strong> <strong>Federal</strong><br />
Brasília - Brasil<br />
No nosso sétimo dia de atividades na Corte Suprema de Justiça, conhecemos a Dirección de Derechos<br />
Humanos e o Centro Internacional de Estudios Judiciales.. Também tivemos a oportunidade de<br />
conhecer o Centro de Documentação e Arquivo (Museu da Justiça). Tais unidades estão vinculadas à<br />
Área de Estratégia e Apoio Institucional da Corte.<br />
A Dirección de Derechos Humanos, conforme apresentação dos servidores Julia Fernandez e Ramón<br />
Cervín, foi criada como organismo técnico administrativo especializado da CSJ, com funções de<br />
monitoramento, informação, investigação, análise e difusão. Em 2006 teve suas funções ampliadas,<br />
passando às tarefas de assessoria técnica, articulação e promoção em capacitação. Não se trata, pois,<br />
segundo ressaltaram os expositores, de um órgão para recebimento de denúncias. Para tais<br />
demandas, há outros foros adequados, como o Ministério Público.<br />
Suas áreas temáticas prioritárias são a infância e a adolescência, gênero, questões indígenas e casos<br />
internacionais ante o sistema americano de Direitos Humanos. Suas linhas de ação estratégicas são a<br />
elaboração e o estímulo de programas e projetos de intervenção focados de acordo com as áreas<br />
temáticas. Também fornece assessoria técnica aos operadores judiciais acerca da doutrina de<br />
Direitos Humanos e sua aplicabilidade na administração da justiça. Além disso, realiza ações de<br />
investigação e monitoramento a respeito de denúncias contra o Estado paraguaio ante o Sistema<br />
Internacional de Proteção dos Direitos Humanos.<br />
O objetivo da Oficina é o desenvolvimento de uma ação institucional de promoção e proteção dos<br />
direitos humanos na rede estatal, enfocada essencialmente na administração da justiça. Essa<br />
perspectiva de ação é levada adiante por meio de um trabalho conjunto com diversas instâncias<br />
governamentais e não-governamentais, combinado com o desenvolvimento de uma capacidade para<br />
brindar soluções a problemas imediatos que os operadores de Justiça enfrentam diariamente, por<br />
meio do assessoramento técnico multidisciplinar e de um trabalho de investigação e análise em<br />
matéria doutrinária.<br />
A Corte Suprema de Justiça do Paraguai concentra várias iniciativas e serviços que não encontram<br />
correspondência em uma Corte constitucional, no sentido mais estrito do termo. A conformação da<br />
Dirección de Derechos Humanos, por exemplo, está mais próxima das atividades de um órgão do<br />
Poder Executivo brasileiro, já que se destina a consultas técnicas e a formulação de políticas públicas<br />
na área de direitos humanos. No caso brasileiro, tanto o Ministério da Justiça, no âmbito federal,<br />
quanto, mais recentemente, o Conselho Nacional de Justiça, são alguns dos órgãos responsáveis por<br />
tais programas.<br />
Mas essa unidade também é responsável pelo suporte técnico em decisões judiciais que envolvam<br />
conhecimento multidisciplinar nas áreas de saúde, psicologia e serviço social, principalmente no<br />
âmbito de direito de família, da infância e da juventude. Assim, exerce papel similar aos dos núcleos<br />
de assistência psicossocial forense existente na Justiça comum estadual, que atuam no apoio técnico<br />
às Varas correlatas.<br />
A segunda atividade do dia foi a apresentação da Divisão de Investigação, Legislação e Publicações,<br />
pertencente ao Centro Internacional de Estudos Judiciais, também integrante da Área de Estratégia e<br />
Apoio Institucional da Corte. Fomos recebidos pelas servidoras Carmen Montanía, Rosa Di Martino e
Programa Joaquim Nabuco 17<br />
Mirian Santos. Além de nos apresentarem as instalações da unidade, foram nos explicadas as linhas<br />
gerais de seu trabalho.<br />
O Centro Internacional de Estudos Judiciais da Corte Suprema de Justiça foi criado em 1996 e tem<br />
como principais atribuições a publicação de obras jurídicas com a finalidade de prestar serviços à<br />
magistratura e à comunidade jurídica nacional; elaborar compilações normativas; difundir a<br />
jurisprudência da Corte, além de sistematizar suas resoluções; e também organizar cursos e jornadas<br />
de estudos em diversas matérias.<br />
São quatro as áreas em que atua essa unidade: base de dados de jurisprudência, publicações,<br />
biblioteca virtual e serviço de assessoria técnica e informação documental. A base de dados,<br />
disponível ao público em geral pelo endereço http:// www.csj.gov.py/jurisprudencia, é um sistema<br />
de informação que contém acórdãos e sentenças das Salas Civil, Penal e Constitucional da CSJ.<br />
No que tange às publicações, são elaboradas obras jurídicas, resultado de pesquisas de membros de<br />
tal unidade e também de magistrados e juristas convidados. São disponibilizadas em formato papel e<br />
em DVD. Também é publicada uma revista trimestral de doutrina e jurisprudência relevante<br />
produzida pela CSJ.<br />
A Biblioteca Virtual é um website no qual são publicados, no formato “livro digital”, obras jurídicas<br />
acerca de assuntos variados nas áreas constitucional, civil, processual civil, penal, processual penal,<br />
infância, adolescência e temas correlatos. Esse material está disponível para download gratuito por<br />
meio do link: www.pj.gov.py/ebook. Há a opção de aquisição impressa de tais obras, franqueada aos<br />
interessados a preço de custo. Acerca do serviço de assessoria técnica, a Unidade provê as demandas<br />
dos membros do Poder Judiciário de informações jurídicas relativas a legislação e jurisprudência da<br />
Corte.<br />
No STF, a área responsável pelas atividades que são correlatas às desenvolvidas pela Divisão de<br />
Investigação, Legislação e Publicações é a Secretaria de Documentação, que igualmente conta com<br />
uma Coordenadoria de Biblioteca e de Divulgação de Jurisprudência. Nossa Biblioteca Digital<br />
disponibiliza, em meio digital, documentos de diversas áreas do <strong>Supremo</strong> de interesse da sociedade.<br />
As informações são apresentadas em diferentes suportes, como livros, fotografias e outros.<br />
Igualmente contamos com um serviço de pesquisa de jurisprudência, franqueado tanto ao público<br />
externo quanto aos Ministros da Corte.<br />
A última atividade do dia incluiu uma visita ao Centro de Documentación y Archivo para La Defensa<br />
de los Derechos Humanos, onde se localiza o “Museu da Justiça”. Nesse espaço, se encontra uma<br />
mostra permanente de 17 vitrines, contendo maquetes, desenhos e fotografias. Ali tivemos a<br />
oportunidade, por meio da explanação do servidor Santiago Riera, de conhecer a história das<br />
instituições judiciais paraguaias, desde a “Justiça” tribal do povo guarani, passando pela época<br />
colonial, consolidação da independência, até a época atual. Chama particularmente a atenção o<br />
período marcado pelos últimos governos ditatoriais do país, nos quais a violação dos direitos<br />
humanos, por meio da repressão policial às manifestações, mesmo pacíficas, de pessoas<br />
ideologicamente não identificadas com o regime, era a regra.<br />
Há no museu réplica de aparatos de tortura, fotografias, além de registro de relatos de vítimas desse<br />
longo período de exceção institucional no país. Importante registro de uma época nada auspiciosa,<br />
esses fatos históricos somente podem ser contados hoje, pois o povo paraguaio vive um regime<br />
democrático e tem lutado pelo fortalecimento de suas instituições.<br />
É importante ressaltar que o “Museu da Justiça”, que constitui uma memória viva tanto do passado<br />
pré-colonial, quanto da recente história institucional do país, é um espaço de visitação de crianças e<br />
demais estudantes de diferentes níveis de ensino de todo o país, que podem, de forma simples e<br />
didática, se interar da evolução histórica da administração da justiça paraguaia. Nesse sentido,
Programa Joaquim Nabuco 18<br />
cumpre sua função de custodiar um grande patrimônio documental, fortalecendo o acesso dos<br />
cidadãos à informação histórica, o que contribui para a não repetição de tais acontecimentos.<br />
Posteriormente, fomos conhecer a sala que guarda os “arquivos do terror” paraguaio. Trata-se de<br />
documentos que faziam parte do acervo do Departamento de Investigações e que foram resgatados<br />
e submetidos a custodia judicial no fim do ano de 1992. Compõem-se de fichas policiais das pessoas<br />
presas durante o regime militar daquele país.<br />
Tais documentos, cerca de dez mil fichas, foram inventariados e classificados e estão à disposição dos<br />
familiares das vítimas desaparecidas, de estudiosos, dos governos e da sociedade em geral. Seu<br />
conteúdo, catalogado em cerca de 200 pastas, contém informações sobre o papel repressor da<br />
polícia durante o último Regime ditatorial do país. Abrange desde prontuários de presos, livros<br />
apreendidos pela polícia, de áudio e fotografias também apreendidas pela repressão estatal. Além<br />
dos originais impressos, a documentação se encontra microfilmada e digitalizada, totalizando cerca<br />
de um milhão de imagens, o que permite a consulta e impressão de tais documentos, preservandoos.<br />
Segundo os responsáveis pelo acervo, recentemente o referido arquivo foi incluído no Registro do<br />
Programa Memória do Mundo como “Patrimônio Intangível da Humanidade”. E, conforme nos<br />
informou a servidora Rosa Palau, diferentemente de outros Arquivos similares na América Latina, há<br />
algumas características que o fazem único, entre elas o fato de franquear acesso irrestrito ao público<br />
e sua custódia pelo Poder Judiciário.<br />
O que particularmente mais chamou a atenção na visita foi a ficha policial, que incluía fotografia de<br />
identificação e digitais, de uma menina de 12 anos, presa e imputada criminalmente como adulta, no<br />
não tão distante ano de 1982. Depois que seus pais, agricultores, terem sido detidos após irem à<br />
Capital para protestarem contra a expropriação de suas terras, a jovem acabou nas mãos da polícia<br />
do Regime e ficou presa por vários meses para averiguações. Esse documento, reproduzido e exposto<br />
numa das paredes do Museu, além de representar o ápice da derrocada das instituições, é o símbolo<br />
máximo da loucura totalitária, sempre usurpadora dos direitos básicos da cidadania.<br />
Tais arquivos encerram quase meio século da história oculta do Paraguai e da América Latina.<br />
Constituem fonte inesgotável para estudos e investigações, não só de cunho histórico, mas também<br />
no âmbito das reparações cíveis e de retribuição penal. Além disso, corrobora para manter viva a<br />
memória recente do país e para impedir que se permita o relaxamento da vigilância contra a<br />
repetição de processos que levem à deterioração do Estado democrático de Direito e, por<br />
conseguinte, ao retorno de tal estado de coisas. A iniciativa deveria seguir de exemplo para os<br />
demais países da região, que têm uma história institucional comum. A manutenção do sigilo dos<br />
documentos que registram os fatos dessa época mascara um período de graves violações dos direitos<br />
humanos por parte do Estado.
Programa Joaquim Nabuco 19<br />
VISITA À DIREÇÃO DE COMUNICAÇÃO E AO PALÁCIO DA JUSTIÇA<br />
Assunção, 15 de junho de 2011<br />
<strong>Agnaldo</strong> <strong>José</strong> <strong>Martins</strong><br />
<strong>Supremo</strong> <strong>Tribunal</strong> <strong>Federal</strong><br />
Brasília - Brasil<br />
No penúltimo dia de atividades, conhecemos o trabalho da Dirección de Comunicaciones,<br />
unidade integrante da Área de Estratégia e Apoio Institucional da Corte Suprema de Justiça. Segundo<br />
o coordenador da unidade, servidor Luis Gimenez, com sua criação a Corte pretendeu fortalecer sua<br />
imagem perante a opinião pública. O foco é tanto a comunicação externa, quanto interna. Além<br />
disso, tem especial destaque o trabalho de interface com os meios de comunicação do país.<br />
No que tange à comunicação externa, chamou especialmente atenção o servicio de comunicación<br />
ciudadana y marketing social. Mediante um programa denominado Educando en Justicia, a CSJ<br />
promove o acesso às crianças em idade escolar, assim como a jovens e adultos interessados, a<br />
informações sobre o funcionamento do Poder Judiciário paraguaio.<br />
A Visita Educativa al Palacio de Justicia inclui um passeio guiado às principais repartições da Corte<br />
em Assunção, às salas de julgamento, além de um bate-papo com os próprios juízes e ministros.<br />
Outro módulo do programa particularmente interessante é o Juez que yo quiero y que necesitamos.<br />
Essa atividade, também a cargo da Dirección de Comunicaciones, consiste em visitas às escolas, onde<br />
se desenvolvem oficinas para professores e alunos sobre a administração da Justiça, da qual<br />
participam defensores públicos e juízes locais.<br />
Em tal espaço são abordados temas sobre os direitos e deveres das crianças, além das atribuições e<br />
responsabilidades dos magistrados. Ademais, as crianças têm a oportunidade de se manifestarem, de<br />
forma lúdica, sobre a representação social que têm do Poder Judiciário. Os materiais produzidos são<br />
recolhidos e passam a formar parte do mural da campanha.<br />
Segundo nos informou o coordenador do programa, além de instruir professores e alunos acerca dos<br />
canais de acesso à cidadania, tal projeto é importante pois, além de fornecer um panorama sobre a<br />
percepção do homem comum sobre o sistema de administração da Justiça, pode colher in loco as<br />
principais demandas da comunidade e receber denúncias sobre potenciais violações de direitos de<br />
crianças e adolescentes.<br />
Quaisquer iniciativas que promovam a aproximação do cidadão comum com os meios de defesa de<br />
seus direitos devem ser valorizadas e multiplicadas. Tais políticas são precipuamente importantes em<br />
sociedades carentes da presença do Estado e onde as instituições ainda são frágeis e desprovidas de<br />
credibilidade perante os cidadãos. Nesse sentido, percebe-se o esforço da CSJ de não só mudar a<br />
imagem de desconfiança e desalento do povo paraguaio em relação as suas instituições,<br />
profundamente associadas à corrupção de seus membros e à ineficiência de seus serviços, como<br />
também de melhorar a prestação jurisdicional do Estado, particularmente aos mais pobres e menos<br />
assistidos, mesmo nas regiões mais isoladas do país.<br />
Ao se traçar um paralelo com as atribuições da área de comunicação do STF, verifica-se que as<br />
atividades da Dirección de Comunicaciones da CSJ são mais e diversificadas. Além das iniciativas já<br />
mencionadas, há as atividades de comunicação interna, por meio de noticias disponibilizadas pela
Programa Joaquim Nabuco 20<br />
página web da instituição e informes impressos sobre o dia a dia da CSJ. E também abarca a<br />
comunicação institucional com a “ruidosa” mídia do país.<br />
Nesse último ponto, o trabalho parece ser particularmente intenso já que, assim como no STF, a<br />
Corte disponibiliza aos diferentes meios de comunicação do país uma sala de imprensa nas próprias<br />
dependências da instituição. E como a constituição do país garante o livre trabalho da imprensa, são<br />
comuns as denúncias de desvios éticos e legais por parte dos magistrados e as polêmicas acerca de<br />
certas decisões judiciais. Em todos esses casos, a Dirección de Comunicaciones é chamada a se<br />
manifestar sobre o posicionamento institucional da CSJ sobre tais fatos.<br />
A impressão sobre o trabalho da área de comunicação da CSJ foi, em geral, bastante positiva. Elevada<br />
ao status de área estratégica e engajada na missão institucional de se construir a imagem de um<br />
Poder Judiciário transparente, eficiente e atento às demandas do cidadão comum, os programas<br />
implementados indicam, para que o caminho em tal direção está sendo construído com êxitos<br />
visíveis.<br />
Impressão parecida, no que diz respeito à transparência e profissionalização do corpo funcional da<br />
CSJ, foi deixada na visita que fizemos à Dirección de Recursos Humanos. A diretora de Administração<br />
de Pessoal da Unidade gentilmente nos recebeu em seu gabinete de trabalho. Interessada acerca do<br />
funcionamento da área no STF, fez um apanhado do seu trabalho à frente do desafio de administrar<br />
o dia a dia funcional de mais de quatro mil servidores judiciais de todo o país. Em que pese haver<br />
certa descentralização administrativa no âmbito das quinze circunscrições no interior do país, a<br />
administração burocrática da área, assim como as decisões estratégicas, ficam em Assunção.<br />
Foi ressaltada na visita a implementação de uma política de meritocracia no que diz respeito à<br />
ocupação dos cargos técnico-administrativos da CSJ e o estabelecimento de maior rigor no âmbito<br />
disciplinar, dado o histórico de clientelismo na Administração Pública e pouca afeição dos servidores<br />
ao cumprimento de seus deveres funcionais. Para tanto, a ocupação dos cargos, em seus diferentes<br />
níveis de complexidade, tem sido feita por meio de provas de conhecimento e exames psicotécnicos.<br />
Segundo a Diretora, essa é uma política recente da instituição, o que a coloca na vanguarda frente<br />
aos outros poderes do Estado, cujas políticas de admissão de pessoal são menos transparentes.<br />
O estabelecimento de critérios objetivos de admissão de pessoal, baseados na competência técnica<br />
dos candidatos, é um avanço no caminho da profissionalização do corpo funcional da instituição.<br />
Feita a ponderação de que, mesmo compartilhando o ambiente democrático, a realidade<br />
institucional dos países é distinta, pois são sujeitas às peculiaridades político-culturais dos seus<br />
povos, o que deve ser respeitado em qualquer exercício comparativo, percebe-se que a ausência de<br />
concurso público para o preenchimento de cargos efetivos da CSJ - e de publicidade e isonomia a ele<br />
inerentes no nosso sistema -, são fatores de entrave ao seu intento de melhor profissionalizar seus<br />
quadros e de fragilização da própria imagem da instituição.<br />
Tal sistemática vai de encontro a várias iniciativas exitosas da CSJ de combate à corrupção judicial, de<br />
dar transparência ao seu sistema de Administração da Justiça e de se aproximar do jurisdicionado por<br />
meio de programas de facilitação de acesso à Justiça.
Programa Joaquim Nabuco 21<br />
VISITA À DIREÇÃO DE ASSUNTOS INTERNACIONAIS E INTEGRIDADE<br />
INSTITUCIONAL E À OFICINA DE MEDIAÇÃO<br />
Assunção, 16 de junho de 2011<br />
<strong>Agnaldo</strong> <strong>José</strong> <strong>Martins</strong><br />
<strong>Supremo</strong> <strong>Tribunal</strong> <strong>Federal</strong><br />
Brasília - Brasil<br />
No último dia de visita institucional à Corte Suprema de Justiça, conhecemos o trabalho da Dirección<br />
de Asuntos Internacionales e Integridad Institucional e da Oficina de Mediación.<br />
A primeira unidade faz parte da Área de Estratégia e Apoio Institucional da Corte. É a autoridade<br />
central do país no que tange à tramitação de Cartas Rogatórias. Conforme nos relatou o servidor<br />
Christian Acosta, coordenador da unidade, a Dirección de Asuntos Internacionales, depois de<br />
estabelecido o canal diplomático entre o Poder Judiciário Estrangeiro e a Chancelaria respectiva com<br />
o Ministério de Relações Exteriores do Paraguai, é a responsável por fornecer as informações<br />
judiciais - de competência dos distintos julgados do interior ou da capital e em qualquer instância,<br />
requeridas pelo Estado estrangeiro.<br />
Chama atenção o fato de, em que pese haver um Ministro supervisor da atividade, o fato de uma<br />
Unidade administrativa ter autonomia para tal atribuição, o que diminui sensivelmente os prazos de<br />
tramitação dos processos dessa natureza, corroborando no propósito de desburocratizar o sistema e<br />
desafogar os Ministros do vasto leque de suas atribuições administrativas. Além dessa atividade, que<br />
no Brasil desde a Emenda Constitucional de Reforma do Judiciário é de competência do Superior<br />
<strong>Tribunal</strong> de Justiça, a Dirección de Asuntos Internacionales e Integridad Institucional é também<br />
responsável pela assistência aos magistrados e ministros da CSJ no âmbito das atribuições de sua<br />
alçada.<br />
Em tal incumbência, atua no fortalecimento da presença da Corte perante organismos e eventos<br />
internacionais de caráter judicial, na propositura e análise de projetos de colaboração bilateral ou<br />
multilateral e como fonte de consulta permanente para magistrados no que tange ao direito<br />
internacional comparado. Ocupa o dia a dia dos servidores dessa unidade também toda a logística<br />
de idealização, de propositura e de viabilização da participação dos integrantes do Poder Judiciário<br />
local em congressos, seminários e cursos de caráter internacional;<br />
Oportuno considerar que a Unidade é uma das poucas da CSJ que tem autonomia orçamentária para<br />
gerir tais atribuições, o que revela sua importância estratégica para a instituição, assim como o alto<br />
grande de comprometimento de seu corpo técnico ante tão vastas e complexas atividades. Com<br />
pequena estrutura, poucos profissionais e recursos modestos, a Dirección de Assuntos<br />
Internacionales realiza um trabalho excepcional no âmbito da Corte, o que, no que tange ao presente<br />
intercâmbio, pôde ser constatado tanto na idealização das atividades, quanto no cumprimento da<br />
programação e no suporte que nos foi dado nesse período de visita institucional à CSJ.<br />
A última atividade de nosso intercâmbio consistiu numa visita à Oficina de Mediación, em que<br />
tivemos a oportunidade de, além de conversar com os mediadores acerca dos aspectos teóricos do<br />
programa, assistir a uma simulação de atendimento com os próprios profissionais e discutir as
Programa Joaquim Nabuco 22<br />
questões afeitas às principais dificuldades e desafios no atendimento aos cidadãos que procuram o<br />
serviço.<br />
A mediação é um procedimento no qual um terceiro imparcial ajuda as partes a resolver seus<br />
conflitos. Diferencia-se da conciliação porque não se realiza diante de um juiz e ao mediador não lhe<br />
é dado propor soluções às partes. Na mediação, as partes conservam a responsabilidade e o controle<br />
a respeito da controvérsia e não transferem ao mediador o poder da tomada de decisões<br />
Diante do aumento progressivo dos conflitos e da tendência de judicialização de grande número de<br />
fenômenos sociais, desde os mais prosaicos, as iniciativas de resolução alternativa de disputas, que<br />
favorecem o diálogo e a busca de acordo entre as partes, num processo menos custoso, mais rápido<br />
e participativo, se afirmam como parte importante do sistema de Administração de Justiça de uma<br />
sociedade.<br />
Em tal contexto, busca-se, com a mediação, “desafogar” os tribunais, além de reduzir o custo e a<br />
demora na resolução dos conflitos; incrementar a participação da comunidade; facilitar o acesso à<br />
Justiça e oferecer à sociedade uma fórmula mais efetiva de resolução de disputas. Foi no âmbito<br />
dessa filosofia, conforme nos foi relatado pelas mediadoras, que a CSJ criou a Oficina de Mediación<br />
del Poder Judicial em 2000. A Oficina tem como objetivo ser um serviço efetivo de acesso à Justiça,<br />
que permita aos cidadãos que judicializaram seus conflitos, resolvê-los cooperativamente, por meio<br />
de acordos mutuamente aceitáveis.<br />
Ressalte-se que é possível a transferência de uma lide para a oficina de mediación em qualquer fase<br />
do processo, até o momento que antecede a sentença definitiva. E o juiz deve orientar as partes da<br />
existência do programa e da vantagem da mediação para a autocomposição do litígio. Existe também<br />
a possibilidade de ao menos uma das partes em conflito procurar voluntariamente o serviço de<br />
mediação antes de darem início a um processo judicial. O caminho extrajudicial da mediação é<br />
estimulado quando o cidadão procura o Ministério Público, a Defensoria Pública ou qualquer outro<br />
órgão do Estado para relatar seu problema e pedir ajuda. Para tanto, há um trabalho coordenado de<br />
divulgação do programa em diferentes instituições e setores da sociedade.<br />
Além dos casos extrajudiciais, as causas que podem ser submetidas à Oficina de Mediación, são<br />
procedentes das varas cível e comercial, e família, da infância e juventude, trabalhista, justiça de paz<br />
e, desde 2006, abre a possibilidade de atuação no âmbito penal, no que tange aos casos de ação<br />
penal privada. Os resultados têm sido considerados bastante satisfatórios já que das audiências que<br />
se realizam, o índice de acordos tem superado 60% dos casos ao longo da implementação do<br />
programa.<br />
Ao lado do Sistema Nacional de Facilitadores Judiciales, o programa de mediação judicial, levado a<br />
cabo pelas Oficinas de Mediaciones, é uma das ações da CSJ que mais trouxe impressões positivas<br />
acerca do sistema de administração de justiça paraguaio. Elaboradas em consonância com as<br />
peculiaridades políticas, sociais e étnicas do país, que ainda padece de baixo nível de<br />
institucionalização e escassa participação da sociedade civil nas instâncias de controle, tais iniciativas<br />
revigoram um dos Poderes do Estado.<br />
Paralelamente à missão constitucional do Poder Judiciário de prestar a jurisdição a quem a ele<br />
recorra, vislumbra-se com tais políticas, uma ação positiva de apoderamento, de promoção da
Programa Joaquim Nabuco 23<br />
cidadania por meio da conscientização das pessoas acerca de seus direitos e da reestruturação das<br />
relações sociais - com valoração da responsabilidade individual, o que culmina em maiores êxitos na<br />
prevenção de novos conflitos.<br />
Em cotejo com o Estado brasileiro, os nossos juizados especiais cíveis e criminais, tanto no âmbito<br />
estadual quanto federal, apresentam pontos de contato com o sistema de mediação do país vizinho.<br />
O incentivo à oralidade, celeridade e informalidade dos procedimentos judiciais tiveram o escopo de<br />
aproximar a Justiça do cidadão comum e, por meio das audiências preliminares de conciliação,<br />
afastar os também elevados índices de judiciliazação dos fenômenos sociais, também comuns por<br />
aqui.<br />
A legislação brasileira não prevê, no entanto, a possibilidade de mediação extrajudicial de conflitos<br />
sociais nos moldes experimentados pelo país guarani. Igualmente, as possibilidades de conciliação<br />
por aqui se circunscrevem a direitos patrimoniais. Causas envolvendo direito de família, infância e<br />
juventude e de direito penal estão fora do alcance de meios alternativos à atuação de juiz investido<br />
de jurisdição e competência específica na matéria.<br />
Em que pese a ausência de similitude legislativa e a peculiaridade dos desenhos institucionais de<br />
cada país, o intercâmbio de experiências, que permita o debate acerca das estruturas próprias dos<br />
sistemas de administração de justiça e das políticas públicas de promoção de direitos e de livre<br />
acesso à Justiça são sempre enriquecedores. Se bem compreendidos e difundidos, culminam no<br />
fortalecimento das relações bilaterais e das próprias instituições dos países parceiros.<br />
Outra decorrência necessária de programas de intercâmbio profissional como o ora vivido, é o<br />
amadurecimento de um espírito de respeito às diferenças culturais e de estreitamento das relações<br />
de amizade entre nossos países. Isso se torna mais premente se considerarmos os laços históricos<br />
que nos une e os desafios comuns de superação da pobreza e de consolidação de nossa jovem<br />
democracia. E é só numa sociedade que tenha um Poder Judiciário austero, íntegro e transparente,<br />
com compromissos firmados com o cidadão, que tais metas podem ser alcançadas.<br />
Nesse sentido mais abrangente, o programa cumpriu satisfatoriamente seus objetivos.