O Infinito - Departamento de Matemática da Universidade do Minho
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O paraíso que Cantor criou Capítulo 4<br />
“Se eu pu<strong>de</strong>r correspon<strong>de</strong>r, elemento por elemento, <strong>do</strong>is conjuntos bem <strong>de</strong>fini<strong>do</strong>s M<br />
e N por uma operação unívoca (e, quan<strong>do</strong> se po<strong>de</strong> fazê-lo duma maneira, po<strong>de</strong>-se fazê-<br />
lo também <strong>de</strong> muitas outras) (…) digo que estes conjuntos têm a mesma potência, ou<br />
ain<strong>da</strong> que eles são equivalentes”. (Cantor, 1883 [1887])<br />
Segun<strong>do</strong> esta <strong>de</strong>finição, po<strong>de</strong> procurar-se a equivalência <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s conjuntos, como<br />
o <strong>do</strong>s lugares <strong>de</strong> um estádio e o <strong>do</strong>s especta<strong>do</strong>res que os ocupam para assistir a qualquer<br />
acontecimento: se houver especta<strong>do</strong>res sem lugar, ou se sobrarem lugares não ocupa<strong>do</strong>s,<br />
os <strong>do</strong>is conjuntos não são equivalentes; caso contrário, são.<br />
A <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> Cantor não exige que contemos, ou mesmo que conheçamos, as<br />
populações <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is conjuntos para <strong>de</strong>terminar se são ou não equivalentes.<br />
Como diz Radice (1981), Cantor teve a ousadia intelectual, que duzentos e cinquenta<br />
anos antes faltou a Galileu Galilei, <strong>de</strong> aplicar a <strong>de</strong>finição infantil <strong>de</strong> igual<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong><br />
número cardinal <strong>de</strong> <strong>do</strong>is conjuntos ao caso <strong>de</strong> conjuntos infinitos, afirman<strong>do</strong> que uma<br />
parte po<strong>de</strong> ser equivalente ao to<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> se trata <strong>de</strong> conjuntos infinitos.<br />
Na obra <strong>de</strong> Galileu Diálogos <strong>de</strong> Duas Novas Ciências, escrita <strong>do</strong>is séculos e meio<br />
antes <strong>de</strong> Cantor, o gran<strong>de</strong> cientista italiano chamou a atenção para a correspondência, <strong>de</strong><br />
um para um, entre o conjunto <strong>do</strong>s números naturais e os seus quadra<strong>do</strong>s, embora<br />
intuitivamente parecesse haver muito menos quadra<strong>do</strong>s <strong>do</strong> que números naturais.<br />
A contradição que se <strong>de</strong>parou a Galileu resolve-se com facili<strong>da</strong><strong>de</strong>, ten<strong>do</strong> apenas em<br />
atenção que o mesmo adjectivo, igual, po<strong>de</strong> ser empregue com <strong>do</strong>is significa<strong>do</strong>s<br />
diferentes.<br />
Um <strong>de</strong>les, com origem em Aristóteles, baseia-se no facto <strong>de</strong> a parte não po<strong>de</strong>r ser<br />
igual ao to<strong>do</strong>, na medi<strong>da</strong> em que no to<strong>do</strong> existe pelo menos um elemento que não está<br />
na parte.<br />
O outro, cantoriano, consi<strong>de</strong>ra que a parte po<strong>de</strong> ser igual em número ao to<strong>do</strong>.<br />
Assim, Cantor não só afirmou que a correspondência, <strong>de</strong> um para um, entre o<br />
conjunto <strong>do</strong>s números naturais e os seus quadra<strong>do</strong>s <strong>de</strong>veria ser literalmente aceite, como<br />
também provou que o conjunto <strong>do</strong>s números pares, <strong>do</strong>s ímpares, <strong>do</strong>s números<br />
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