Desdobramentos do Socioconstrutivismo na Prática da ... - aedb

Desdobramentos do Socioconstrutivismo na Prática da ... - aedb Desdobramentos do Socioconstrutivismo na Prática da ... - aedb

17.04.2013 Views

com a intenção de fazer cumprir uma ordem de apresentação de conteúdos (letras, fonemas ou sílabas) acreditando ser possível determinar o momento em que todos os alunos apreenderão um conceito específico. Para eles, a não utilização das cartilhas é um risco: sugere um não saber-fazer, um ficar-sem- rumo. Embora se compreenda que a alfabetização por um processo tradicional não dá conta da formação de um cidadão letrado, é preciso reconhecer o valor das experiências dos professores e não desqualificar, generalizadamente, suas práticas. A segunda situação sugere o sucesso das políticas de divulgação das novas propostas de alfabetização, por se referir a professores que já se apropriaram de um discurso progressista, inovador. Porém, a grande questão se dá na contradição entre seus depoimentos e suas práticas, que se constituem a partir de atividades, em sua maioria tradicionais, não condizentes com a teoria que verbalizam. Cabe refletir os motivos pelos quais assumem tal postura. Em princípio, é possível dizer que, embora já tenha ocorrido a apropriação do discurso, há indícios da falta de compreensão real dos professores sobre os novos referenciais teóricos. Assim, desenvolvem uma prática na qual se observa uma maioria de procedimentos tradicionais e apenas algumas atividades pertinentes ao que se propõe hoje. Por fim, ainda acreditam estar realmente alfabetizando de acordo com as diretrizes teóricas atuais. Há de se compreender a posição delicada das alfabetizadoras, pois “ao sabor das mudanças de governo e das equipes pedagógicas, são por vezes levadas a mudar seus procedimentos habituais, a adotar um novo referencial teórico, a trocar o certo pelo duvidoso” (CARVALHO, 2005, p. 112). No âmbito da presente pesquisa, é possível reconhecer que a postura da professora corresponde, de forma preponderante, à situação em análise. Em seus discursos iniciais, a regente foi bastante segura ao afirmar que, embora já alfabetize a partir das matrizes construtivistas, algumas de suas práticas continuam bem tradicionais e no que concerne às demais disciplinas, seu trabalho é totalmente conservador. Tal situação é bastante complexa na medida em que demonstra, por parte dos professores, um conhecimento equivocado ou bastante superficial a respeito do referencial adotado. Isto sugere que durante sua formação inicial não tiveram acesso a essas teorias, bem como em sua trajetória profissional não tiveram oportunidades de formação continuada. Ainda vale ressaltar, neste emaranhado de possibilidades, que as políticas de estudo desenvolvidas pelas Secretarias de Educação com vistas a esclarecer e aprofundar as teorias adotadas não garantem , de fato, a apropriação do conhecimento. 6

De maneira secundária, é propício refletir sobre o distanciamento entre discurso e prática dos professores sob uma outra ótica: aquela em que a prática tradicional representa um ato voluntário. Isto implica admitir uma decisão consciente em não construir uma prática pertinente ao discurso. E então, o que se pretende com esta postura? Para que se possa refletir nesta direção, é recomendável admitir os critérios de valor e juízo de cada professor, construídos ao longo de sua trajetória de vida. Isto porque, as possibilidades de compreensão referem-se a atitudes que estão diretamente relacionadas às limitações e razões de cada um. Nesta perspectiva, cita-se a resistência às mudanças como uma forma de entender um comportamento tão adverso; a escolha pela aplicação do que considera ser mais fácil e menos trabalhoso; o juízo da sua verdade como única e absoluta; a certeza de que as condições reais do contexto escolar não favorecem um trabalho mais inovador e coletivo; a idéia de que não há reconhecimento e recompensa pelo bom profissional etc. Em contrapartida, é preciso lembrar que os professores não são sujeitos que passaram apenas por uma formação acadêmica para que pudessem alfabetizar, mas também são atores sociais, que interagem com o contexto transformando-o e sendo transformados por ele. Assim, é necessário considerar a realidade profissional desses docentes que têm pouco ou nenhum tempo para estudar, por conta de trabalharem em vários turnos e serem mal remunerados, bem como o fato de não terem condições financeiras para investir continuamente em sua formação; ou ainda, terem de aceitar e passar por várias reformas institucionais, como se as novas propostas tivessem a sua participação efetiva. A última situação a ser analisada refere-se a uma postura não menos complexa que as anteriores. Neste caso, os professores reconhecem a importância de se alfabetizar numa perspectiva ferreiriana, a partir de referenciais construtivistas, e por conta disto assumem um discurso firme e inovador. Nota-se que há empenho e esforço em aproximar suas falas à originalidade teórica admitida, como se isso pudesse garantir a legitimidade do processo de alfabetização. Sendo assim, mantêm-se sempre atentos às novidades publicadas a respeito do assunto, trocam experiências e demonstram interesse em consultar publicações sobre o tema. Suas práticas têm se constituído através dos ideais defendidos em seus discursos com a certeza de que “é possível alfabetizar letrando” (SOARES, 2003). Carvalho (2005) identifica o aumento da tolerância em relação aos erros das crianças e a aceitação da escrita espontânea como alguns aspectos positivos da herança emiliana. 7

com a intenção de fazer cumprir uma ordem de apresentação de conteú<strong>do</strong>s (letras,<br />

fonemas ou sílabas) acreditan<strong>do</strong> ser possível determi<strong>na</strong>r o momento em que to<strong>do</strong>s os<br />

alunos apreenderão um conceito específico. Para eles, a não utilização <strong>da</strong>s cartilhas é um<br />

risco: sugere um não saber-fazer, um ficar-sem- rumo.<br />

Embora se compreen<strong>da</strong> que a alfabetização por um processo tradicio<strong>na</strong>l não dá<br />

conta <strong>da</strong> formação de um ci<strong>da</strong>dão letra<strong>do</strong>, é preciso reconhecer o valor <strong>da</strong>s experiências<br />

<strong>do</strong>s professores e não desqualificar, generaliza<strong>da</strong>mente, suas práticas.<br />

A segun<strong>da</strong> situação sugere o sucesso <strong>da</strong>s políticas de divulgação <strong>da</strong>s novas<br />

propostas de alfabetização, por se referir a professores que já se apropriaram de um<br />

discurso progressista, inova<strong>do</strong>r. Porém, a grande questão se dá <strong>na</strong> contradição entre seus<br />

depoimentos e suas práticas, que se constituem a partir de ativi<strong>da</strong>des, em sua maioria<br />

tradicio<strong>na</strong>is, não condizentes com a teoria que verbalizam. Cabe refletir os motivos pelos<br />

quais assumem tal postura. Em princípio, é possível dizer que, embora já tenha ocorri<strong>do</strong> a<br />

apropriação <strong>do</strong> discurso, há indícios <strong>da</strong> falta de compreensão real <strong>do</strong>s professores sobre os<br />

novos referenciais teóricos. Assim, desenvolvem uma prática <strong>na</strong> qual se observa uma<br />

maioria de procedimentos tradicio<strong>na</strong>is e ape<strong>na</strong>s algumas ativi<strong>da</strong>des pertinentes ao que se<br />

propõe hoje. Por fim, ain<strong>da</strong> acreditam estar realmente alfabetizan<strong>do</strong> de acor<strong>do</strong> com as<br />

diretrizes teóricas atuais. Há de se compreender a posição delica<strong>da</strong> <strong>da</strong>s alfabetiza<strong>do</strong>ras,<br />

pois “ao sabor <strong>da</strong>s mu<strong>da</strong>nças de governo e <strong>da</strong>s equipes pe<strong>da</strong>gógicas, são por vezes leva<strong>da</strong>s<br />

a mu<strong>da</strong>r seus procedimentos habituais, a a<strong>do</strong>tar um novo referencial teórico, a trocar o<br />

certo pelo duvi<strong>do</strong>so” (CARVALHO, 2005, p. 112).<br />

No âmbito <strong>da</strong> presente pesquisa, é possível reconhecer que a postura <strong>da</strong> professora<br />

corresponde, de forma preponderante, à situação em análise. Em seus discursos iniciais, a<br />

regente foi bastante segura ao afirmar que, embora já alfabetize a partir <strong>da</strong>s matrizes<br />

construtivistas, algumas de suas práticas continuam bem tradicio<strong>na</strong>is e no que concerne às<br />

demais discipli<strong>na</strong>s, seu trabalho é totalmente conserva<strong>do</strong>r.<br />

Tal situação é bastante complexa <strong>na</strong> medi<strong>da</strong> em que demonstra, por parte <strong>do</strong>s<br />

professores, um conhecimento equivoca<strong>do</strong> ou bastante superficial a respeito <strong>do</strong> referencial<br />

a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong>. Isto sugere que durante sua formação inicial não tiveram acesso a essas teorias,<br />

bem como em sua trajetória profissio<strong>na</strong>l não tiveram oportuni<strong>da</strong>des de formação<br />

continua<strong>da</strong>. Ain<strong>da</strong> vale ressaltar, neste emaranha<strong>do</strong> de possibili<strong>da</strong>des, que as políticas de<br />

estu<strong>do</strong> desenvolvi<strong>da</strong>s pelas Secretarias de Educação com vistas a esclarecer e aprofun<strong>da</strong>r<br />

as teorias a<strong>do</strong>ta<strong>da</strong>s não garantem , de fato, a apropriação <strong>do</strong> conhecimento.<br />

6

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!