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quem me dera agora eu tivesse a viola pra cantar - Universidade ...

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“QUEM ME DERA AGORA EU TIVESSE A VIOLA PRA CANTAR”<br />

RAÍZES CAIPIRAS DA MÚSICA SERTANEJA<br />

INTRODUÇÃO<br />

A escolha das músicas caipira e sertaneja enquanto objeto de<br />

pesquisa não ocorr<strong>eu</strong> ao acaso e os motivos que conduziram a este<br />

estudo monográfico foram vários. Pri<strong>me</strong>ira<strong>me</strong>nte, porque faz parte<br />

das minhas raízes, pois, <strong>me</strong>us pais nasceram no interior e, no sertão,<br />

trabalharam como cortadores de mato e assim, como <strong>me</strong>us avós e<br />

bisavós, eram caipiras. Sempre ouvia as histórias dos <strong>me</strong>us avós de<br />

como era a vida no sertão antiga<strong>me</strong>nte e dos <strong>me</strong>us pais, até hoje,<br />

ouço as histórias do s<strong>eu</strong> passado.Tive, também, a oportunidade de<br />

sentir, por um tempo, essa vida que eles vivenciaram, <strong>me</strong>smo que em<br />

um outro contexto histórico, pois em minhas férias sempre vou para o<br />

lugar onde <strong>me</strong>us pais nasceram, sentindo muita animação quando para<br />

lá viajo. Não há como negar, pois o sangue caipira corre em minhas<br />

veias e por mais que nunca tenha morado no interior, a minha alma se<br />

regozija de alegria quando vou para o “<strong>me</strong>io do mato” e ando a cavalo,<br />

sentindo o cheiro dos animais ou paro para uma pescaria, geral<strong>me</strong>nte<br />

ouvindo uma boa música caipira de raiz. Sempre <strong>me</strong> identifiquei com a<br />

vida no interior e por viver em um paradoxo entre o campo e a cidade,<br />

essas raízes <strong>me</strong> instigaram a desenvolver este trabalho. Outro motivo<br />

que despertou o interesse pelo objeto de pesquisa é a empatia com<br />

a música caipira, e devido a isso, co<strong>me</strong>cei a perceber que muitas<br />

pessoas já não gostavam tanto deste estilo musical, pois preferiam a<br />

música sertaneja.<br />

Autor: Rodrigo Costa Mota<br />

Orientadora: Viviane Zeni<br />

Dessa forma, o objetivo central desta pesquisa concentrou-se em<br />

discutir até que ponto a música sertaneja se difere da música caipira<br />

de raiz e as suas possíveis relações.<br />

E para tanto, as indicações teóricas de Roger Chartier, Bronislaw<br />

Baczko, Eric Hobsbawm e Clifford Geertz foram de extrema importância<br />

para o desenvolvi<strong>me</strong>nto do trabalho.<br />

Roger Chartier e as suas consi<strong>dera</strong>ções sobre o mundo como<br />

representação, tornou-se funda<strong>me</strong>ntal para as reflexões sobre as<br />

várias representações atribuídas ao caipira, além de que o conceito<br />

de apropriação permitiu estabelecer a relação entre as músicas caipira<br />

e sertaneja, e como a segunda se apropriou de ele<strong>me</strong>ntos da pri<strong>me</strong>ira<br />

com o objetivo único de vendagem.<br />

O conceito de imaginação social de Bronislaw Baczko fornec<strong>eu</strong> as<br />

bases para perceber como o imaginário social da cultura caipira, sua<br />

identidade, representações, anseios e desejos desta coletividade, foi<br />

construído, reconstruído e renovado.<br />

Ao se estabelecer as relações entre a música caipira e a música<br />

sertaneja, o conceito de tradição inventada de Eric Hobsbawm<br />

tornou-se útil para as discussões sobre a música caipira, ele<strong>me</strong>nto<br />

funda<strong>me</strong>ntal dentro da cultura caipira, e que <strong>me</strong>smo que tenha sido<br />

transportada para a cidade e passado por algumas modificações, tal<br />

tradição continuou sendo <strong>pra</strong>ticada em um outro contexto histórico,<br />

estabelecendo assim, a sua relação com o passado.<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 235<br />

| História | 2011


Clifford Geertz também foi importante para as reflexões<br />

que nortearam este trabalho, posto que por intermédio de suas<br />

interpretações pôde-se compreender a sociedade caipira, uma vez que<br />

o autor identifica cultura como um conjunto de idéias, valores, ações e<br />

emoções que traduzem assim “como nosso sistema nervoso, produtos<br />

culturais – na verdade, produtos manufaturados a partir de tendências,<br />

capacidades e disposições com as quais nascemos [...]. 1<br />

Além das indicações teóricas, outros autores que trabalharam<br />

com esta temática foram utilizados neste estudo. Entre eles, podem<br />

ser citados como exemplo, José Roberto Zan, Rosa Nepomuceno,<br />

Martha Tupinambá de Ulhôa. Alguns relatos publicados por cantores<br />

e compositores, tanto da música caipira quanto da sertaneja,<br />

apresentaram-se como fontes significativas. Porém, as composições<br />

de vários artistas, foram de grande valia para analisar estes dois<br />

estilos musicais, uma vez que, através de suas letras foram possíveis<br />

perceber as diferenças, bem como as relações existentes.<br />

Após a análise e reflexão dos referenciais teóricos, bibliográficos<br />

e do conjunto docu<strong>me</strong>ntal, o presente trabalho foi dividido em dois<br />

capítulos. O pri<strong>me</strong>iro capítulo tece uma análise da cultura caipira<br />

através de s<strong>eu</strong> imaginário social, num esforço de interpretação<br />

das representações atribuídas ao ho<strong>me</strong>m do sertão. Além disso,<br />

buscou-se demonstrar o percurso da música caipira para a sertaneja<br />

romântica que <strong>me</strong>smo ao sair do campo para penetrar em um<br />

novo cenário, em um pri<strong>me</strong>iro mo<strong>me</strong>nto procurou manter as suas<br />

tradições e enviar das bandas do sertão, lembranças da vibração<br />

de uma nova hora.<br />

Já o segundo capítulo aborda a importância da <strong>viola</strong> para a<br />

inspiração dos compositores, partindo após para a apropriação da<br />

música caipira pelos representantes da música sertaneja. Importa aqui<br />

consi<strong>dera</strong>r que a música caipira de raiz, ao ser incorporada e inserida<br />

ao ambiente urbano, receb<strong>eu</strong> o no<strong>me</strong> de música sertaneja romântica, a<br />

qual acabou descaracterizando a música de raiz.<br />

Durante toda a trajetória apresentada, as músicas caipiras<br />

conseguiram expressar versos simples, os quais valorizavam o ho<strong>me</strong>m<br />

do campo, o s<strong>eu</strong> jeito simples de falar e a sua responsabilidade<br />

diante da vida e do <strong>me</strong>io ambiente. Ao contrário da música sertaneja<br />

romântica, que inserida em outro cenário, já não mais se lembra<br />

do cheiro mato, pois está envolvida em um ambiente que prioriza o<br />

individual em detri<strong>me</strong>nto do coletivo.<br />

E consi<strong>dera</strong>ndo a canção de Almir Sater e Renato Teixeira que<br />

inspiram a ideia de que cada um de nós compõe a sua própria história<br />

e cada ser em si carrega o dom de ser capaz de ser feliz, a partir<br />

desse mo<strong>me</strong>nto, a todos que compartilharem da leitura deste trabalho<br />

será apresentado o percurso de um estilo musical produzido por uma<br />

cultura na qual o amanhecer ainda é uma lição do universo que nos<br />

ensina que é preciso renascer.<br />

1 DAS BANDAS DO RURAL VÃO AS<br />

LEMBRANÇAS DE UMA NOVA HORA<br />

1.1 Quem dor<strong>me</strong> em mim é o <strong>me</strong>u sertão:<br />

sobre a cultura caipira<br />

Nóis aprendemo na roça a fazê tudo o que possa, tudo o que<br />

pude fazê, sangrando os calo da mão <strong>pra</strong> nunca fartá o pão prá<br />

ingrato como <strong>me</strong>cê. O caipira, sinhá dona, dor<strong>me</strong> num saco de lona<br />

coberto, quase não tem de dia o roçado <strong>pra</strong>nta, de noite na <strong>viola</strong><br />

canta e é feliz como ninguém [...]. 2<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 236<br />

| História | 2011


Esse frag<strong>me</strong>nto dos versos de “Caipira” na visão do músico Elpídio<br />

dos Santos 3 demonstra o modo de viver do caipira, o universo que esse<br />

ho<strong>me</strong>m está inserido, o ho<strong>me</strong>m do campo e s<strong>eu</strong> jeito de falar, co<strong>me</strong>r,<br />

plantar. Um ho<strong>me</strong>m com sangue de índio misturado ao sangue do<br />

colonizador e dos escravizados africanos que resultou em um “ho<strong>me</strong>m<br />

forte”, capaz de moldar-se a situações das mais diversas. Segundo o<br />

sociólogo José de Souza Martins, esse ho<strong>me</strong>m vivia em uma economia<br />

de “mínimos vitais”, o que significa estar inserido em um tipo de<br />

sociedade de auto-subsistência, sendo so<strong>me</strong>nte o excedente passivo<br />

de ser convertido em uma relação de troca. 4 Dentro desta sociedade, o<br />

ho<strong>me</strong>m do sertão brasileiro interagiu com o <strong>me</strong>io urbano, mas sem que<br />

com isso alterasse o cotidiano, no qual planta, colhe, e festeja cantando<br />

ao final de cada colheita. Este modo de ser, pensar e agir se contrapõe<br />

a imagem do ho<strong>me</strong>m dos grandes centros urbanos que, movido pela<br />

aceleração do tempo e pela modernização, enxerga o sertanejo, ou<br />

para muitos, o caipira com uma visão preconceituosa que os consi<strong>dera</strong><br />

atrasados. Estas visões, nem sempre generalizadas, foram destacadas<br />

por Renato Teixeira em sua composição “Rapaz Caipira” que já na<br />

pri<strong>me</strong>ira estrofe anuncia o preconceito existente sobre o jeito de ser<br />

do ho<strong>me</strong>m do interior.<br />

Rapaz caipira5 (Renato Teixeira)<br />

Qui m’importa, qui m’importa<br />

o s<strong>eu</strong> preconceito,<br />

qui m’importa...<br />

Você diz que <strong>eu</strong> sou muito<br />

esquisito<br />

E <strong>eu</strong> às vezes sinto a sua ira<br />

Mas na verdade<br />

Assim é que <strong>eu</strong> fui feito<br />

É só o jeito de um rapaz caipira<br />

Se você quer maiores<br />

aventuras<br />

Vá prá cidade grande<br />

qualquer dia<br />

Eu sou da terra<br />

e não creio em magia<br />

È só o jeito<br />

De um rapaz caipira<br />

Qui m’importa...<br />

Pode-se perceber que, o compositor ao destacar os senti<strong>me</strong>ntos<br />

dicotômicos existentes em relação ao caipira, que para muitos é<br />

vislumbrado como muito esquisito, aponta para a simplicidade do<br />

sertanejo que foi assim feito e tem apenas o jeito de um rapaz<br />

caipira. Esta indicação re<strong>me</strong>te as consi<strong>dera</strong>ções de Max Weber<br />

sobre a produção do social através de uma rede de sentidos, uma<br />

vez que:<br />

a vida social é produtora de valores e normas e, ao <strong>me</strong>smo tempo<br />

de sistemas de representações que as fixam e traduzem. Assim<br />

se define um código coletivo segundo o qual se expri<strong>me</strong>m as<br />

necessidades e as expectativas, as esperanças e as angústias dos<br />

agentes sociais. Por outras palavras, as relações sociais nunca se<br />

reduzem aos s<strong>eu</strong>s componentes físicos e materiais. 6<br />

Importa aqui lembrar que no Brasil, desde a década de 1870, os<br />

intelectuais passaram a pensar na imagem do brasileiro, em busca de<br />

uma compreensão sobre a brasilidade. Até este mo<strong>me</strong>nto, predominava<br />

a ideia de que a cultura <strong>eu</strong>ropeia era superior à cultura brasileira, no<br />

entanto, <strong>me</strong>smo que timida<strong>me</strong>nte o brasileiro passou a ser inserido<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 237<br />

| História | 2011


nos cantos, contos, poesias, e reconhecido na figura do indígena, do<br />

africano, do <strong>eu</strong>rop<strong>eu</strong> e do <strong>me</strong>stiço.<br />

Em 1902, Euclides da Cunha publicou Os sertões, consi<strong>dera</strong>ndo o<br />

sertanejo como sendo símbolo da nacionalidade. A raça e a terra foram<br />

resgatadas pelo autor como fator da originalidade cultural brasileira.<br />

Isso d<strong>eu</strong> ao fato de a Geração de 1870 defender uma literatura nativa<br />

inspirada no sertanismo, no indianismo em tudo o que era da “nossa<br />

terra”. 6<br />

No Brasil do início do século XX, por intermédio dos ideais do<br />

Modernismo, procurou-se consolidar uma identidade nacional através<br />

de uma imagem do brasileiro nato, de origem e cultura genuina<strong>me</strong>nte<br />

nacional. Estava se consolidando a ideia de valorização do caboclo<br />

brasileiro que se identificaria como ele<strong>me</strong>nto do povo. Dentro deste<br />

viés, compartilha-se das indicações de Eric Hobsbawm, sobre a<br />

necessidade de os grupos sociais, inventarem as suas tradições, pois<br />

como nos alerta o historiador:<br />

Por tradição inventada entende-se um conjunto de práticas,<br />

normal<strong>me</strong>nte reguladas por regras tácitas ou aberta<strong>me</strong>nte aceitas;<br />

tais práticas, de natureza ritual ou simbólica, que visam inculcar<br />

certos valores e normas de comporta<strong>me</strong>nto através da repetição,<br />

o que implica, automatica<strong>me</strong>nte uma continuidade em relação ao<br />

passado. 7<br />

Esta tradição inventada para o caboclo, buscou ressignificar uma<br />

cultura rústica e dar-lhe um novo formato que nem sempre obteve<br />

o resultado esperado frente ao processo do “desencanta<strong>me</strong>nto<br />

do mundo do sertão” apresentado em vários movi<strong>me</strong>ntos políticos<br />

e sociais que se desencadearam no Brasil no início da República.<br />

Porém, ao recorrer às indicações de Antônio Cândido que define<br />

“cultura rústica” como o: universo das culturas tradicionais do ho<strong>me</strong>m<br />

do campo, que por sua vez “resultou do ajusta<strong>me</strong>nto do colonizador<br />

ao Novo Mundo”, logo a cultura rústica não é uma cultura isolada ou<br />

fechada em si <strong>me</strong>sma, mas de sociedade parcial dotada de cultura<br />

parcial, ou seja, um pedaço de sociedade global per<strong>me</strong>ado pela<br />

cultura primitiva e pela cultura da cidade. 8<br />

No caso do Brasil, especifica<strong>me</strong>nte, a cultura é chamada<br />

“rústica” devido à ausência de leis e regras de organização destas<br />

sociedades.<br />

Existem várias definições sobre a cultura popular, e para se<br />

obter um consenso foram necessárias algumas análises sobre a<br />

interpretação e alguns estudos já existentes. A palavra cultura<br />

re<strong>me</strong>te a um conceito de ideias que pode diversificar o s<strong>eu</strong> sentido<br />

confor<strong>me</strong> é empregada para determinar algo que expresse uma<br />

organização social, um sistema de ideias, de comporta<strong>me</strong>ntos e<br />

atitudes caracterizadas por uma determinada sociedade.<br />

Dentro do conceito de culturas há um sistema de ideias,<br />

conheci<strong>me</strong>ntos, padrões de comporta<strong>me</strong>nto que caracterizam<br />

determinada sociedade, ou um estágio de desenvolvi<strong>me</strong>nto, um<br />

conjunto de obras de um povo em um determinado período.<br />

A cultura pode ser identificada como parte integrante de uma<br />

sociedade e sobre esta temática, Clifford Geertz, aponta que:<br />

[...] a cultura é <strong>me</strong>lhor vista não como complexos de padrões<br />

concretos de comporta<strong>me</strong>nto – costu<strong>me</strong>s, usos, tradições, feixes<br />

de hábitos -, (...), mas como um conjunto de <strong>me</strong>canismos de<br />

controle – planos, receitas, regras, instruções (o que os engenheiros<br />

chamam de “programas”) – para governar o comporta<strong>me</strong>nto.<br />

A segunda idéia é que o ho<strong>me</strong>m é precisa<strong>me</strong>nte o animal mais<br />

desesperada<strong>me</strong>nte dependente de tais <strong>me</strong>canismos de controle,<br />

extragenéticos, fora da pele, de tais programas culturais, para<br />

ordenar s<strong>eu</strong> comporta<strong>me</strong>nto. 9<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 238<br />

| História | 2011


Essa concepção de que a cultura é um <strong>me</strong>canismo de controle,<br />

característica e exclusiva de um determinado povo, está ligada a uma<br />

representatividade para um determinado grupo social e um universo<br />

simbólico dentro da sociedade. De acordo com os autores Berger e<br />

Luckmann, em s<strong>eu</strong>s estudos sobre o problema da construção social da<br />

realidade a partir dos alicerces do conheci<strong>me</strong>nto na vida cotidiana, o<br />

universo simbólico:<br />

Ordena a história, pois, localiza todos os aconteci<strong>me</strong>ntos<br />

coletivos numa unidade coerente, que inclui o passado, o presente<br />

e o futuro. Com relação ao passado, estabelece uma <strong>me</strong>mória<br />

que é compartilhada por todos os indivíduos socializados na<br />

coletividade [...]. 10<br />

Assim sendo, esse universo cristaliza-se na sociedade da <strong>me</strong>sma<br />

forma como se dá a acumulação de conheci<strong>me</strong>nto. Em outras palavras,<br />

os universos simbólicos são produtos sociais e culturais que têm a<br />

sua história influenciando direta<strong>me</strong>nte no comporta<strong>me</strong>nto dos atores<br />

sociais e na maneira em que se dá a legitimação das representações<br />

sociais. Estas representações, segundo Roger Chartier, designam o<br />

modo pelo qual em diferentes lugares e mo<strong>me</strong>ntos uma determinada<br />

realidade é construída, pensada e dada a ler por diferentes grupos<br />

sociais. 11 São variáveis segundo as disposições dos grupos ou classes<br />

sociais; aspiram à universalidade, mas são sempre determinadas pelos<br />

interesses dos grupos que as forjam. O poder e a dominação estão<br />

sempre presentes. As representações não são discursos n<strong>eu</strong>tros:<br />

produzem estratégias e práticas tendentes a impor uma autoridade, e<br />

<strong>me</strong>smo a legitimar escolhas. Por isso, é certo que elas se colocam no<br />

campo da concorrência e da luta. Nas lutas de representações tenta-se<br />

impor a outro ou ao <strong>me</strong>smo grupo sua concepção de mundo social, 12<br />

como pode-se perceber na canção já citada de Renato Teixeira, afinal<br />

o rapaz caipira é da terra e não crê em magia e se qualquer um quiser<br />

maiores aventuras que se desloque para a cidade grande qualquer dia.<br />

Portanto, dentro do mundo de representação, deve ser levado em<br />

consi<strong>dera</strong>ção o ponto de vista que cada cultura tem dentro de uma<br />

<strong>me</strong>sma sociedade. Para cada grupo social, o fato pode configurar uma<br />

diferente representação porque o s<strong>eu</strong> modo de leitura é particular. O<br />

mundo enquanto representação significa um mundo diferente do qual<br />

ele é, a representação quer se passar como a verdade de s<strong>eu</strong> referente,<br />

mas não é a <strong>me</strong>sma para todos, pois passa por variações, e isto implica<br />

na multiplicação do significado que muda o s<strong>eu</strong> “sentido real.” 13<br />

Em relação à vida rural, o universo simbólico que a per<strong>me</strong>ia está<br />

representado em cada traço das manifestações populares. Mesmo nos<br />

dias atuais, quando o sistema de plantio e colheita, os <strong>me</strong>lhores grãos,<br />

as safras mais rendosas estão subordinadas às regras do <strong>me</strong>rcado<br />

internacional, o ho<strong>me</strong>m do campo não deixou os s<strong>eu</strong>s tradicionais<br />

saberes. Ao olhar o céu para descobrir o período de chuvas ou esperar<br />

o <strong>me</strong>lhor mês para o plantio, ou ainda, pedir as bênçãos dos santos<br />

para uma boa colheita através de festas, rezas e procissões, o caipira<br />

põe em prática séculos de conheci<strong>me</strong>ntos acumulados pelos s<strong>eu</strong>s<br />

ancestrais, e que ao longo do tempo foram transmitidos às gerações<br />

mais jovens.<br />

Tais ações estão intima<strong>me</strong>nte ligadas ao “retorno de situações e<br />

atos que a <strong>me</strong>mória grupal reforça atribuindo-lhes valor”. 14 Ou seja,<br />

sendo a cultura popular toda cultura cultivada pelo povo, ela pode<br />

ser vivida em zonas rurais, pequenas cidades marginais, algumas<br />

zonas mais pobres, e também em algumas cidades maiores. Logo,<br />

pode-se afirmar que a cultura popular é uma cultura específica de<br />

uma determinada sociedade e está sempre em constante mudança<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 239<br />

| História | 2011


apresentando as suas particularidades em relação ao tempo e espaço.<br />

Mas, segundo Antonio Augusto Arantes, deve-se definir “cultura<br />

popular” no plural, uma vez que,<br />

São muitos os s<strong>eu</strong>s significados e bastante heterogêneos e<br />

variáveis os eventos que essa expressão recobre. Ela re<strong>me</strong>te, [...],<br />

a um amplo espectro de concepções e pontos de vista que vão<br />

desde a negação (implícita ou explícita) de que os fatos por ela<br />

identificados contenham alguma forma de “saber”, até o extremo<br />

de atribuir-lhes o papel de resistência contra a dominação de<br />

classe.” 15<br />

Tendo em <strong>me</strong>nte as noções diferenciadas de “cultura rústica” e<br />

popular, busca-se entender a partir destas, a cultura especifica<strong>me</strong>nte<br />

caipira, de “raiz” que está inserida dentro do cenário cultural<br />

brasileiro.<br />

Nesse sentido, cabe aqui salientar que, ao longo do século XX,<br />

o modo de vida do ho<strong>me</strong>m rural foi incorporado na música popular<br />

brasileira. Em alguns mo<strong>me</strong>ntos históricos, os habitantes dos sertões<br />

brasileiros recorriam às temáticas rurais ou práticas musicais que<br />

o ho<strong>me</strong>m urbano identificou como o camponês, sitiante, caboclo,<br />

sertanejo e caipira. Essa prática está associada às manifestações<br />

dos imaginários sociais, que se pode entender como o produto de<br />

um discurso no qual as representações se efetivam através de uma<br />

linguagem. 16 E ao compartilhar das indicações de Bronislaw Baczko,<br />

pode-se inferir que:<br />

Os imaginários sociais constituem outros tantos pontos de<br />

referência no vasto sistema simbólico que qualquer coletividade<br />

produz e através da qual [...], ela se percepciona, divide e elabora os<br />

s<strong>eu</strong>s próprios objetivos. É assim que, através dos s<strong>eu</strong>s imaginários<br />

sociais, uma coletividade designa a sua identidade; elabora uma<br />

certa representação de si; estabelece a distribuição dos papéis e<br />

das posições sociais [...]. 17<br />

Diante deste viés interpretativo, ao estudar a história do Brasil,<br />

verifica-se que a cultura caipira é bastante peculiar e localizada, e que<br />

ocorr<strong>eu</strong> uma reinterpretação da cultura que se consolidou no período<br />

colonial.<br />

A população localizada no interior do Brasil possui uma vida social<br />

que expri<strong>me</strong> as suas necessidades e expectativas através de sua<br />

própria cultura, e como exemplo destas manifestações, a música se<br />

torna parte integrante desta cultura caipira, pois por s<strong>eu</strong> intermédio,<br />

os caipiras expressam as suas vidas, costu<strong>me</strong>s e valores.<br />

Inserida no cenário cultural brasileiro, a cultura caipira apresenta<br />

uma riqueza de tradições, crenças, rituais, e no <strong>me</strong>io rural, os caipiras<br />

convivem por <strong>me</strong>io de festas religiosas, mutirões, como o Cururu, o<br />

Catererê, as Folias de Reis e as Danças de São Gonçalo, o que garante<br />

a reprodução da sociabilidade de s<strong>eu</strong>s componentes, na qual a música<br />

é um elo funda<strong>me</strong>ntal.<br />

Segundo Nepomuceno, o Cururu é um exemplo da tradição<br />

caipira. O Cururu nasc<strong>eu</strong> como canto religioso marcado por batidas<br />

de pé como dança em que se formavam rodas e rezavam cantando.<br />

O Cururu é um repente-caipira, entre violeiros-cantadores, que fazem<br />

rodas e cantam improvisada<strong>me</strong>nte por cerca de <strong>me</strong>ia-hora, rimando as<br />

palavras. Aquele que faz a <strong>me</strong>lhor rima, ganha a simpatia da platéia,<br />

que torce e aplaude. Já aquele que perde pode ser “atacado”, por <strong>me</strong>io<br />

de brincadeiras, nas quais é chamado de pinguço ou preguiçoso, entre<br />

outros adjetivos. 18<br />

O Cateretê, por sua vez também conhecido como catira, nasc<strong>eu</strong><br />

de uma dança religiosa indígena. Essa manifestação foi introduzida nas<br />

festas de Santa Cruz, Divino Espírito Santo, Nossa Senhora e São<br />

Gonçalo para substituir a divindade indígena Tupã pelo D<strong>eu</strong>s católico.<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 240<br />

| História | 2011


Tal manifestação foi difundida em várias regiões do Brasil como<br />

Goiás, Mato Grosso, Amazônia, São Paulo e Minas Gerais. O catira<br />

é um canto em forma de versos, em solo e coro, acompanhado de<br />

sapateado e pal<strong>me</strong>ado. São dois violeiros-cantadores que, geral<strong>me</strong>nte<br />

varam a noite, junta<strong>me</strong>nte com vários dançadores, conhecidos como<br />

pal<strong>me</strong>iros. O catira é uma moda de <strong>viola</strong> que narra fatos e histórias de<br />

santos e quando co<strong>me</strong>ça o sapateado, a cantoria é exaltada e os s<strong>eu</strong>s<br />

participantes chegam ao clímax. 19<br />

O artista e compositor Chico Lobo20 , em s<strong>eu</strong> disco No Braço<br />

Dessa Viola, sua música catira, explicou esta dança:<br />

Pra se dançar o catira.Tem que se bater o pé. Vem depois um<br />

pal<strong>me</strong>ado. Só não dança <strong>quem</strong> não quer. Pro catira sair gostoso.<br />

Tem que ser bem animado. Pra se dançar o catira. Tem que ter bons<br />

violeiros. Nós tocando de <strong>viola</strong>. Podem vir os catireiros. 21<br />

A Folia de Reis é o folgueto mais popular junta<strong>me</strong>nte com o catira.<br />

Reproduzindo a viagem dos Reis Magos a Belém, com cortejos de<br />

festeiros portando bandeiras coloridas, comandados por <strong>me</strong>stres,<br />

capitães e violeiros, a Folia de Reis, acontece ainda em muitas regiões<br />

do país, especial<strong>me</strong>nte no interior de São Paulo, Minas Gerais, Paraná,<br />

Mato Grosso e Goiás. Essa festa religiosa tem início no dia 24 de<br />

dezembro e se estende até dia 6 de janeiro, Dia de Reis. Uma folia em<br />

que os participantes peregrinam de casa em casa no <strong>me</strong>io das ruas, com<br />

s<strong>eu</strong>s tocadores de <strong>viola</strong>, rezando e cantando com as famílias. Em cada<br />

mo<strong>me</strong>nto há um canto específico: à porta das casas, na saudação do<br />

presépio, no pedido de ofertas, no agradeci<strong>me</strong>nto e na despedida. Em<br />

alguns casos essa folia é tão animada que se tornou atração turística,<br />

como por exemplo, na cidade de Pirenópolis, em Goiás. Ainda, na Folia<br />

de Reis, ocorrem outras atrações, como corridas de jegue, de porco ou<br />

galinha, procissões, missas, campeonato de truco, do maior chupador<br />

de manga, de aboios, ou seja, é o sagrado e o profano unidos em um<br />

só festejo. 22<br />

As Danças de São Gonçalo também trouxeram ele<strong>me</strong>ntos da<br />

música caipira. Estas surgiram no século XVII, no vale do Rio Douro,<br />

em Portugal, devido às co<strong>me</strong>morações ao violeiro Santo de Amarante,<br />

e no Brasil adquiriram novas formas. A festa de São Gonçalo<br />

geral<strong>me</strong>nte é realizada no dia 10 de janeiro. Nos finais de colheita,<br />

festas de cu<strong>me</strong>eira, com os agradeci<strong>me</strong>ntos pelas graças recebidas<br />

e cumpri<strong>me</strong>ntos de votos feitos. No entanto, a celebração pode ser<br />

feita em qualquer data, nos terreiros e quintais, também pode ter a<br />

presença de famílias, devotos e de violeiros. Depois de uma reza se<br />

iniciam os cantos de louvação, com danças evoluindo em rodas em<br />

torno do altar. Segundo a crença, o Santo tem grande atuação no que<br />

se refere à conquista de casa<strong>me</strong>nto e devido a isso, é muito popular<br />

entre as mulheres. Portanto, quanto mais rodas elas fazem, mais<br />

chances têm de conseguir um marido. 23<br />

Os Fados, as viras portuguesas e as modinhas <strong>eu</strong>ropeias, também<br />

inspiraram as cantigas e toadas com s<strong>eu</strong>s acordes <strong>me</strong>lancólicos e<br />

deixaram marcas na alma caipira. 24 Esses cantos, rezas, danças,<br />

devoções, diversões, se multiplicaram e mudaram de forma e jeito nas<br />

regiões do Brasil. Porém, o ele<strong>me</strong>nto comum em todas essas tradições<br />

e costu<strong>me</strong>s de caipira é a <strong>viola</strong>: expressão típica da sociedade rural.<br />

Os escravizados africanos também tiveram uma grande influência<br />

na cultura, tradições e costu<strong>me</strong>s caipiras, sobretudo em relação à<br />

música da roça. Ritmos e danças com instru<strong>me</strong>ntos de percussão,<br />

lundus, batuques e congadas somaram-se aos ele<strong>me</strong>ntos de gêneros<br />

caipiras. Nas plantações, os negros e os caipiras conviviam juntos<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 241<br />

| História | 2011


trocando experiências, afinal eram “irmãos” na pobreza, no tipo<br />

de vida e na paixão pela música. Nesse convívio, foram trocadas e<br />

ressignificadas as crenças, os enfeites, as indu<strong>me</strong>ntárias, a percussão,<br />

os requebros e a <strong>viola</strong>.<br />

Nas regiões do interior paulista e mineiro, as congadas ganharam<br />

força como manifestação cultural africana. O calango também foi<br />

resultado do convívio entre negros e caipiras. Um arrasta-pé animado<br />

em que se casou a <strong>viola</strong> com a sanfona, pandeiro, caixa, reco-reco,<br />

chocalho, violão e cavaquinho. 25<br />

Portanto, tendo em vista essa cultura brasileira de “raiz”, se faz<br />

necessário expressar o imaginário social deste povo do sertão, que por<br />

sua vez, estabelece uma relação de fronteira entre o s<strong>eu</strong> mundo rural<br />

com o mundo civilizado.<br />

1.2 Qui m´importa se sou muito esquisito: as<br />

representações sobre o caipira<br />

[...] e assim vou tocando/ essa<br />

vida marvada/ É que a <strong>viola</strong> fala<br />

alto no <strong>me</strong>u/peito humano/E toda<br />

moda é um remédio/pros <strong>me</strong>us<br />

desengano/È toda mágoa é um<br />

mistério/fora deste plano/Pra<br />

todo aquele que só fala que/<strong>eu</strong><br />

não sei viver/Chega lá em casa/<br />

pruma visitinha/Que no verso e no<br />

reverso/da vida inteirinha/Hai de<br />

<strong>me</strong> encontrar/num cateretê[...] 1<br />

Pode-se notar que o compositor Rolandro Boldrin em sua<br />

composição “Vide, Vida Marvada”, destaca a importância da <strong>viola</strong> que<br />

fala alto no <strong>me</strong>u peito humano e toda moda é um remédio pros <strong>me</strong>us<br />

desengano, e para aqueles que dizem que o caipira não sabe viver,<br />

chega lá em casa pruma visitinha e hai de <strong>me</strong> encontrar num cateretê.<br />

Desde o início da colonização o sertão foi de certa forma, visto de<br />

uma maneira negativa, como um espaço sem civilização, um habitat<br />

de índios bravios, onde a pobreza era um dos traços característicos<br />

desta região. 27<br />

Para se entender o imaginário social acerca do caipira, denominamos<br />

pri<strong>me</strong>ira<strong>me</strong>nte alguns conceitos sobre esta personagem.<br />

O termo tem uma provável origem indígena. Caa que na língua<br />

tupi significa mato, e o caipora é um habitante das matas. Mas o<br />

autor Alexandre Leontsinis, em s<strong>eu</strong> estudo sobre linguagem ecológica,<br />

entende que o caipira provém de cai que significa tímido e pyra que<br />

seria cru, verde, ou seja, é o matuto, o envergonhado, o tímido, conclui<br />

o autor. 28<br />

O caipira está ligado à vida rural que tem suas especificações<br />

na cultura brasileira e no imaginário social. Nesse mo<strong>me</strong>nto importa<br />

destacar que:<br />

O imaginário social é cada vez <strong>me</strong>nos consi<strong>dera</strong>do como uma<br />

espécie de orna<strong>me</strong>nto de uma vida material consi<strong>dera</strong>da como a<br />

única “real. É comum associar a imaginação e a política, o imaginário<br />

e o social. Assim a vida social se torna um modelo que tem s<strong>eu</strong>s<br />

valores e normas, onde possui ao <strong>me</strong>smo tempo um sistema de<br />

representações que as fixam e traduzem. 29<br />

Retomando ao significado de caipira, segundo o Dicionário do<br />

Folclore Brasileiro, de Luiz Câmara Cascudo, a palavra designa “ho<strong>me</strong>m<br />

ou mulher que não mora em povoação, que não tem instrução ou trato<br />

social, que não sabe vestir-se ou apresentar-se em público. Habitante<br />

do interior, tímido e desajeitado”. 30 Já no dicionário Aurélio o caipira<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 242<br />

| História | 2011


está definido como o “habitante do campo ou da roça, particular<strong>me</strong>nte<br />

os de pouca instrução e de convívio e modos rústicos”. 31<br />

Cornélio Pires, jornalista e violeiro, define o termo caipira no s<strong>eu</strong><br />

livro “Conversas ao pé do fogo” da seguinte maneira:<br />

Por mais que rebusque o étimo de caipira, nada tenho deduzido<br />

com fir<strong>me</strong>za. Caipira seria o aldeão; neste caso encontramos o tupiguarani<br />

capiâbiguâara. Caipirismo<br />

é acanha<strong>me</strong>nto, gesto de ocultar o<br />

rosto, neste caso temos a raiz ‘caí’,<br />

que quer dizer gesto de macaco<br />

ocultando o rosto. Capipiara, que<br />

quer dizer o que é do mato. Capiã, de<br />

dentro do mato, faz lembrar o capiau<br />

mineiro. Caapiára quer dizer lavrador<br />

e o caipira é sempre lavrador. Creio<br />

ser este último o mais aceitável,<br />

pois caipira quer dizer roceiro, isto é,<br />

lavrador. 32<br />

Figura 1 – Caipira picando fumo<br />

Para o jornalista, o caipira é o roceiro,<br />

aquele que mora em uma região e a<br />

partir do s<strong>eu</strong> espaço é influenciado pelas<br />

características do s<strong>eu</strong> modo de vida. No<br />

entanto este modo de viver se distingue<br />

do modo de vida urbano, pois, é no <strong>me</strong>io<br />

rural que as pessoas, convivem por <strong>me</strong>io de<br />

mutirões, práticas religiosas e festivas, que<br />

garantem a reprodução da sociabilidade de<br />

s<strong>eu</strong>s componentes, na qual a música se torna<br />

um elo funda<strong>me</strong>ntal.<br />

Essas práticas estão associadas a uma<br />

tradição que se pode entender como uma<br />

FONTE: ALMEIDA JUNIOR. Caipira picando fumo.1 óleo sobre<br />

tela, 1893. Color: 202 x 141 cm. Pinacoteca do Estado de São<br />

Paulo. Acesso em: 15 de mar. de 2010.<br />

reprodução de sua cultura em outro espaço, ou como nos indica Eric<br />

Hobsbawm como a forma que os grupos sociais se utilizam:<br />

(...) de ele<strong>me</strong>ntos antigos na elaboração de novas tradições<br />

inventadas, [pois] sempre se pode encontrar no passado de<br />

qualquer sociedade um amplo repertório de ele<strong>me</strong>ntos e sempre há<br />

uma linguagem elaborada, composta de práticas e comunicações<br />

simbólicas. 33<br />

De uma forma geral, existem várias<br />

definições para a palavra caipira, mas<br />

algumas sugerem um tom pejorativo, como o<br />

do ho<strong>me</strong>m urbano que a partir do s<strong>eu</strong> ponto<br />

de vista, e por não vivenciar a realidade do<br />

<strong>me</strong>io rural, julga a vida urbana como <strong>me</strong>lhor<br />

do que a vida no <strong>me</strong>io rural. É necessário<br />

relativizar tal posiciona<strong>me</strong>nto e reconhecer a<br />

distinção cultural brasileira, pois o <strong>me</strong>io rural<br />

possui s<strong>eu</strong>s próprios personagens e estes os<br />

s<strong>eu</strong>s valores, anseios e modos específicos<br />

de viver.<br />

Segundo a historiadora Etelvina<br />

Trindade, a colonização portuguesa foi<br />

prepon<strong>dera</strong>nte<strong>me</strong>nte masculina. Os<br />

portugueses aqui chegaram sem a companhia<br />

de suas mulheres, o que lhes impediu, a<br />

princípio, de desdobrar, integral<strong>me</strong>nte, a<br />

cultura familiar lusitana. E, sem dúvida, a<br />

miscigenação alterou a rígida organização<br />

social, tal como era prevista pelas leis e<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 243<br />

| História | 2011


costu<strong>me</strong>s portugueses. Isso não significa que, no período colonial<br />

houvesse uma polarização na camada senhorial de famílias legal<strong>me</strong>nte<br />

estruturadas e que o restante da população <strong>tivesse</strong> vida promíscua e<br />

devassa. A interação de costu<strong>me</strong>s diferenciados do índio, do <strong>eu</strong>rop<strong>eu</strong>,<br />

e do negro fez com que em nosso passado colonial coexistissem<br />

múltiplos arranjos domésticos e familiares.<br />

Na composição e reelaboração das tradições lusitana e autóctone,<br />

foi criada outra forma de viver, o modo caipira, que passou a ser o<br />

modo de vida da população livre e pobre, de uma massa anônima. 34<br />

Essas culturas mantiveram a forma itinerante do roçar indígena,<br />

incorporou, para fins ali<strong>me</strong>ntares ou <strong>me</strong>dicinais, frutos da terra, como<br />

a mandioca, o milho, o feijão, e a erva-mate, moldou-se ao costu<strong>me</strong><br />

de transportar e conservar ali<strong>me</strong>ntos em cestos de fibras e taquaras<br />

trançadas, utilizando-se delas também para confeccionar armadilhas<br />

para apresar animais, dentre tantas outras coisas35 .<br />

Há também autores que expressaram a sua visão sobre o caipira,<br />

embora de uma forma unilateral, como por exemplo, Saint-Hilaire,<br />

botânico francês que permanec<strong>eu</strong> no Brasil de 1816 a 1822. Em suas<br />

viagens à Província de São Paulo, o botânico afirmou que os caipiras<br />

eram: “(...) ho<strong>me</strong>ns embrutecidos pela ignorância, pela preguiça,<br />

pela falta de convivência com s<strong>eu</strong>s se<strong>me</strong>lhantes e, talvez, por<br />

excessos venéreos primários, não pensam: vegetam como árvores,<br />

como as ervas do campo”. 36 Tal consi<strong>dera</strong>ção se deve ao fato de o<br />

viajante ter sido observado por horas por um sertanejo, que por sua<br />

vez, não dirigiu uma palavra a ele, enquanto analisava as plantas que<br />

tinha recolhido pelo caminho, o que o conduziu a perceber o caipira<br />

como um ho<strong>me</strong>m incapaz de entender e exprimir em palavras o que<br />

vê e/ou escuta.<br />

Retomando a construção da ideia de cultura caipira, recorr<strong>eu</strong>-se<br />

neste mo<strong>me</strong>nto ao trabalho de Monteiro Lobato. Segundo o professor<br />

de História e <strong>me</strong>stre Edilson Chaves, Lobato era reconhecido como um<br />

excelente editor e tornou-se uma das personagens funda<strong>me</strong>ntais para<br />

a implantação do <strong>me</strong>rcado editorial brasileiro. Lobato aprofundou um<br />

discurso que se tornaria a peça chave para o entendi<strong>me</strong>nto do caráter<br />

do povo brasileiro ao construir uma figura pejorativa do ho<strong>me</strong>m rural,<br />

presente na personagem Jeca Tatu, que se tornou um tipo humano<br />

presente no Brasil pós “nasci<strong>me</strong>nto” da República, ao não ser capaz de<br />

realizar tarefas simples num mundo baseado no cientificismo.<br />

Em s<strong>eu</strong> livro “Urupês”, Lobato descreve Jeca Tatu como um<br />

indivíduo ignorante, sem conheci<strong>me</strong>ntos de leitura e escrita, como se<br />

pode perceber no texto abaixo:<br />

O senti<strong>me</strong>nto de pátria lhe é desconhecido. Não tem sequer a noção<br />

do país em que vive. Sabe que o mundo é grande, que há sempre<br />

terras para diante, que muito longe está a Corte com os graúdos<br />

e mais distante ainda a Bahia, donde vêm baianos pernósticos e<br />

cocos. [...] Vota. Não sabe em <strong>quem</strong>, mas vota. Esfrega a pena<br />

no livro eleitoral, arabescando o aranhol de gatafunhos a que<br />

chama “sua graça”.[...] O fato mais importante de sua vida é sem<br />

dúvida votar no governo. Tira nesse dia da arca a roupa preta do<br />

casa<strong>me</strong>nto, sarjão furadinho de traça e todo vincado de dobras;<br />

entala os pés num alentado sapatão de bezerro (...) vai pegar o<br />

diploma de eleitor às mãos do chefe Coisada, que lhe retém para<br />

maior garantia da fidelidade partidária. 37<br />

Com a abolição da escravatura no Brasil em 1888, os grandes<br />

proprietários buscam colonos para o trabalho nas lavouras. Uma das<br />

opções era apelar para a mão-obra dos ribeirinhos, mas essa já de<br />

início estava fadada a não dar certo, pois, “Parasitas do rio e da leziria,<br />

olhavam as fazendas com horror, e daí, na boca dos fazendeiros, a<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 244<br />

| História | 2011


sua má fama de indolentes. Indolentes e ruins, incapazes, restolho<br />

de gente, lesmões humanos. Era unâni<strong>me</strong> esta opinião na lavoura<br />

circunjacente, caída em modorra por falta de braços”. 38<br />

Figura 2 – Jeca Tatu De Monteiro Lobato<br />

FONTE: http://www.fototecadojean2.blogger.com.br/jecatatu.gif. Acesso em: 19 de mar. de<br />

2010.<br />

Alguns frades franceses, que aqui chegaram neste mo<strong>me</strong>nto,<br />

procuraram converter o caipira com fama de preguiçoso em um ho<strong>me</strong>m<br />

apto para o trabalho, no entanto, para o autor:<br />

Em vez, porém, de tomá-lo como o encontravam, alquebrado<br />

pela má ali<strong>me</strong>ntação, pela má habitação, roído pelo ancilóstomo<br />

exhaustivo, e pô-lo na enxada com o feitor atrás, tiveram a luminosa<br />

idéia de proceder às avessas: pri<strong>me</strong>iro atucharam-lhe fibra com<br />

ali<strong>me</strong>ntação abundante; depois abrigaram-no em casas higiênicas<br />

construídas em lugares secos e os curavam nos limites do possível.<br />

Resultado: Uma ressurreição” 39<br />

Ao contrário de Monteiro Lobato, o autor Antônio Cândido mostra<br />

e resgata a dignidade e a importância social do caipira, revelando um<br />

lado de luta pela sobrevivência por parte desses personagens dentro<br />

do cenário de miserabilidade do período, que não será aqui discutido<br />

por fugir aos propósitos deste trabalho. O que por hora importa aqui<br />

destacar é que o caipira por estar inserido na cultura brasileira, é um<br />

ser rico em tradições, crenças e culturas, como explica o autor Carlos<br />

Rodrigues Brandão ao se referir sobre os caipiras paulistas. Estes,<br />

nas palavras do autor, são “(...) proprietários de terras e, estáveis,<br />

vivem uma vida de trabalho e cultura em bairros rurais; outros ‘vivem<br />

do trabalho em terra alheia’, ora como lavradores parceiros, ora como<br />

agregados, ‘camaradas’”. 40<br />

Já, Inezita Barroso, cantora e apresentadora do programa “Viola<br />

Minha Viola”, ao definir o caipira explica por que o senso comum<br />

adotou uma visão preconceituosa:<br />

Como o caipira ficou um termo pejorativo, durante muito tempo<br />

todo mundo tinha vergonha de ser caipira. Por quê? Porque não<br />

era real<strong>me</strong>nte o significado da palavra, que é o ho<strong>me</strong>m do interior.<br />

Então, o caipira era uma mulher mal vestida, era um cara doente,<br />

sem dente, descalço. 41<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 245<br />

| História | 2011


E comple<strong>me</strong>nta dizendo que: “falar caipira é pecado. Chamar de<br />

caipira é pecado”. 42 Argu<strong>me</strong>nto confirmado pelo compositor e violeiro<br />

Almir Sater ao lembrar que quando “Alguém falava: o cara lá é caipira,<br />

esse respondia: <strong>eu</strong> não sou caipira, não”. 43 A negativa indica que para<br />

muitos é uma ofensa chamar alguém de caipira. O que corrobora<br />

a ideia de que o estereótipo criado para o caipira é negativo. Por<br />

<strong>me</strong>io de sua forma de viver do caipira, o professor José Roberto Zan<br />

exemplifica o “ser caipira”. Deixemos o professor e compositor falar:<br />

Esse tipo humano, que denominamos caipira, estava ligado a um<br />

modo de vida muito particular. Ocupava uma pequena área de<br />

terra, desenvolvia uma agricultura diversificada, voltada para o<br />

consumo próprio, criava alguns animais, comple<strong>me</strong>ntava sua dieta<br />

ali<strong>me</strong>ntar através da caça e da pesca, e <strong>pra</strong>ticava artesanato<br />

doméstico. 44<br />

Em contraponto com o citadino, a escritora para o público infantojuvenil<br />

Vanda Catarina P. Donadio, faz uma análise mais detalhada<br />

sobre o caipira45 :<br />

Para o citadino o caipira virou motivo de diverti<strong>me</strong>nto, quando<br />

deveria ser o exemplo de amor à terra. Do antepassado Índio<br />

ele herdou a familiaridade com a mata, o faro na caça, a arte<br />

das ervas, o encanta<strong>me</strong>nto das lendas. Do branco a língua,<br />

costu<strong>me</strong>s, crenças e a <strong>viola</strong>, que acabou sendo um dos símbolos<br />

de sua resistência pacífica. Muitos são os ritmos executados na<br />

<strong>viola</strong>, da valsa ao cateretê. Temos Cateretê baião; Chula polca;<br />

Toada de reis: Cateretê- batuque, Landú, Toada; Pagode, etc.<br />

Apesar de parecer um ho<strong>me</strong>m rústico, de evolução lenta, nas<br />

suas mãos calejadas, ele mantém o equilíbrio e a poesia da fusão<br />

de duas etnias. E traduz s<strong>eu</strong> senti<strong>me</strong>nto acompanhado da <strong>viola</strong>,<br />

companheira do peito, onde canta suas esperanças, tristezas, e<br />

as belezas do nosso país. A música rural, criativa, contrapõe-se<br />

aos modismos vindos do exterior. Ainda é uma forma resistente<br />

de brasilidade, feita por um povo que conhece muito o chão do<br />

nosso país. 46<br />

Esta forma resistente de brasilidade como indica a autora, pode<br />

ser percebida nas inú<strong>me</strong>ras canções caipiras. Entre elas destaca-se<br />

como exemplo Amanhec<strong>eu</strong>, Peguei a Viola de Renato Teixeira:<br />

Amanhec<strong>eu</strong>, peguei a <strong>viola</strong>47 (Renato Teixeira)<br />

Amanhec<strong>eu</strong> peguei a <strong>viola</strong><br />

Botei na sacola e fui viajar<br />

Sou cantador e tudo nesse<br />

mundo<br />

Vale prá que <strong>eu</strong> cante<br />

e possa <strong>pra</strong>ticar<br />

A minha arte<br />

sapateia as cordas<br />

E esse povo gosta<br />

de <strong>me</strong> ouvir <strong>cantar</strong><br />

Amanhec<strong>eu</strong>…<br />

Ao <strong>me</strong>io dia <strong>eu</strong> tava<br />

em Mato Grosso<br />

Do sul ou do norte,<br />

não sei explicar<br />

Só sei dizer<br />

que foi de tardezinha<br />

Eu já tava cantando<br />

em Belém do Pará.<br />

Amanhec<strong>eu</strong>…<br />

Em Porto Alegre um tal de<br />

coronel<br />

Pediu que <strong>eu</strong> musicasse um<br />

verso que ele fez<br />

Para uma China, que pela<br />

poesia<br />

Nem lá em Pequim se vê tanta<br />

altivez<br />

Amanhec<strong>eu</strong>…<br />

Parei em Minas prá trocar as<br />

cordas<br />

E segui direto para o Ceará<br />

E no caminho fui pensando,<br />

lindo<br />

Essa grande aventura de poder<br />

<strong>cantar</strong><br />

Amanhec<strong>eu</strong>…<br />

Chegou a noite e <strong>me</strong> pegou<br />

cantando<br />

num bailão, lá no norte do<br />

Paraná<br />

Daí para frente ninguém mais<br />

se espanta<br />

E o resto da noitada <strong>eu</strong> não<br />

posso contar.<br />

Anoitec<strong>eu</strong> e <strong>eu</strong> voltei prá casa<br />

Que o dia foi longo e o sol<br />

quer descansar.<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 246<br />

| História | 2011


Apesar de parecer um ho<strong>me</strong>m rústico, percebe-se que o caipira<br />

viaja pelo mundo para que possa <strong>pra</strong>ticar a sua arte, traduzindo s<strong>eu</strong><br />

senti<strong>me</strong>nto acompanhado da <strong>viola</strong>, companheira de peito, e que<br />

cantando em Belém do Pará, em Porto Alegre, em Minas, Ceará, norte<br />

do Paraná, ou seja, por todo o nosso país, até <strong>me</strong>smo “musicando”<br />

um verso para uma China, que nem lá do outro lado do mundo se vê<br />

tanta altivez.<br />

Por esta breve interpretação, pode-se inferir que nos dias atuais a<br />

cultura caipira sobrevive no imaginário nacional, sobretudo em letras<br />

de músicas, quase sempre produzidas pelo ho<strong>me</strong>m urbano. Essa<br />

música procurou ao longo dos anos se desfazer das imagens negativas<br />

do caipira e traduzir para o imaginário coletivo um Brasil rural cheio de<br />

histórias e virtudes.<br />

1.3 O que adianta viver na cidade, se a felicidade não<br />

<strong>me</strong> acompanhar? a transição da música caipira<br />

para a sertaneja<br />

A terra é a mãe / e isso não é<br />

segredo / O que se planta /<br />

esse chão dá/Uma pro<strong>me</strong>ssa<br />

/ a São Miguel Arcanjo / prá<br />

mandar chuva / pro milho<br />

brotar... 2<br />

Esses versos da música “Quebra de Milho”, composta pelos<br />

compositores Tom Andrade e Manuelito, demonstra o conheci<strong>me</strong>nto<br />

do caipira em relação à terra, sua fé, suas esperanças e pro<strong>me</strong>ssas<br />

para cada mês do ano, dizendo que a terra é a mãe, isso não é segredo,<br />

o que se planta esse chão nos dá.<br />

A música caipira, chamada música de raiz, ou música do interior, é<br />

caracterizada por sua temática rural, letras românticas e cantos tristes<br />

que comovem os seres humanos.<br />

Mais que um ritmo ou estilo, a música raiz está repleta de um<br />

simbolismo que dinamiza o universo caipira transportando-o do <strong>me</strong>io<br />

rural para o urbano. A bagagem cultural, trazida pelos trabalhadores<br />

do campo que buscavam na cidade <strong>me</strong>lhores condições de vida, é rica<br />

em ele<strong>me</strong>ntos significativos para os caipiras que ressignificavam esses<br />

traços culturais, com o objetivo de preservar as suas tradições.<br />

Como no caso do caipira que chega à cidade com sua bagagem<br />

cultural, mas não deixa de vivê-la, o que altera é o espaço, mas dá<br />

continuidade aos s<strong>eu</strong>s rituais, <strong>me</strong>smo que esta tradição se adapte a<br />

este novo espaço.<br />

Afinal, como indica Hobsbawm:<br />

[...] na <strong>me</strong>dida em que há referência a um passado histórico, as<br />

tradições inventadas caracterizam-se por estabelecer com ele<br />

uma continuidade bastante artificial. Em poucas palavras, elas são<br />

reações a situações novas que, ou assu<strong>me</strong>m a forma de referência<br />

a situações anteriores, ou estabelecem s<strong>eu</strong> próprio passado<br />

através da repetição quase que obrigatória. 49<br />

Dessa forma, os ele<strong>me</strong>ntos identificadores desse gênero musical<br />

são: as letras que narram os “causos” do cotidiano, sua interpretação<br />

que costu<strong>me</strong>ira<strong>me</strong>nte é cantada em dueto na distância de uma terça<br />

(três notas) 50 e o acompanha<strong>me</strong>nto da <strong>viola</strong> caipira, instru<strong>me</strong>nto<br />

insubstituível para o estilo musical. 51<br />

No Brasil, especifica<strong>me</strong>nte, existem vários gêneros musicais<br />

que revelam múltiplas identidades, como a música caipira, a música<br />

sertaneja, a música popular, entre outros. Esses diferentes gêneros<br />

musicais expressam as distintas maneiras dos grupos sociais se<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 247<br />

| História | 2011


econhecerem e se situarem em s<strong>eu</strong> contexto específico. Por isso que<br />

com a música, a partir dos conteúdos contidos nas letras e ritmos<br />

adotados, uma classe social, grupo étnico, por exemplo, podem ser<br />

reconhecidos, pois, cada grupo possui um gênero musical específico,<br />

no caso do Brasil, reconhecidos no vasto repertório musical brasileiro.<br />

Especifica<strong>me</strong>nte a música caipira e a música sertaneja, são compostas<br />

de produções que re<strong>me</strong>tem a um estilo de vida do ho<strong>me</strong>m do campo no<br />

interior das regiões do Brasil e as suas tradições.<br />

A música sertaneja, inicial<strong>me</strong>nte conhecida como música caipira ou<br />

de “raiz foi original<strong>me</strong>nte “centrada em valores católicos, patriarcais e<br />

logo, tradicionais, que enfatizam uma sociabilidade em torno de uma<br />

família extensa, da solidariedade comunitária e da obrigação religiosa<br />

herdada e vitalícia.” 52<br />

A música sertaneja está sempre em constante transformação,<br />

e com isso, suas raízes vêm sendo deixadas de lado. As pessoas se<br />

espelham nessa nova referência de música caipira e sertaneja que<br />

não condiz com suas raízes como: a temática das letras, o vestuário,<br />

a instru<strong>me</strong>ntação, entre outros aspectos. Como já citado, a música<br />

caipira é caracterizada pela temática rural, letras românticas, cantos<br />

tristes e comoventes. Já para Inezita Barroso:<br />

Sertanejo é um tema essencial<strong>me</strong>nte nordestino que a gente aprend<strong>eu</strong><br />

com a vinda do Luiz Gonzaga para o Sul. Então, está certo que ele<br />

cha<strong>me</strong> de sertanejo a música rural nordestina, porque é um sertão.<br />

Aqui (em São Paulo) não se fala ‘vou para o sertão de São José, vou<br />

para o sertão de Taubaté. Então você fala ‘vou para o interior, <strong>eu</strong> vou<br />

para a roça, <strong>eu</strong> vou para a fazenda, no máximo. Então, não se aplica.<br />

Mas, isso acontec<strong>eu</strong> porque o caipira virou um termo pejorativo. 53<br />

Esta consi<strong>dera</strong>ção da compositora está relacionada ao senso<br />

comum que no século XX associa para a região nordeste a palavra<br />

sertão e para demais regiões brasileiras do interior. No entanto, o<br />

autor Sérgio Buarque de Holanda 54 explica a influência litorânea que<br />

os portugueses <strong>pra</strong>ticavam e que ainda persiste até aos dias atuais,<br />

pois, os portugueses encontraram mais facilidade no fato de se achar<br />

a costa habitada de uma única família de indígenas, que de norte a sul<br />

falava um <strong>me</strong>smo idioma, mas: “Quando hoje se fala em “interior”,<br />

pensa-se, como no século XVI, em região escassa<strong>me</strong>nte povoada e<br />

apenas atingida pela cultura urbana. 55<br />

Assim sendo, verifica-se que o tipo de caipira bem como sua cultura<br />

tiveram origem no contato com os colonizadores (os bandeirantes)<br />

com os nativos a<strong>me</strong>ríndios (ou gentios da terra, ou bugres). 56<br />

Nesse sentido, pode-se dividir a população caipira em quatro<br />

categorias, confor<strong>me</strong> indica Cornélio Pires em sua análise sobre esta<br />

temática:<br />

Para o autor, há o Caipira caboclo descendente de indígenas<br />

catequizados pelos jesuítas. Este tipo de caipira foi à fonte de<br />

inspiração para o personagem Jeca Tatu de Monteiro Lobato e para a<br />

criação do Dia do Caboclo, co<strong>me</strong>morado em 24 de junho, dia de São<br />

João Evangelista;<br />

O segundo é o Caipira negro, descendente dos escravizados<br />

africanos, também conhecido como Caipira Preto. Este foi<br />

imortalizado pelas figuras folclóricas da Mãe-preta e do Pretovelho<br />

ho<strong>me</strong>nageado por Tião Carreiro e Pardinho, nas músicas<br />

“Preto inocente” e “Preto Velho”. De maneira geral, são pessoas<br />

pobres que sofrem até hoje, as conseqüências da escravização;<br />

O Caipira branco insere-se na terceira categoria: descendente dos<br />

bandeirantes, de uma nobreza decaída, mas que se orgulha de s<strong>eu</strong><br />

sobreno<strong>me</strong> bandeirante: os Pires, os Camargos, os Paes Le<strong>me</strong>s, os<br />

Prados, os Siqueiras, entre outros. Estes geral<strong>me</strong>nte eram católicos<br />

e se miscigenaram com os colonos italianos. Também são de origem<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 248<br />

| História | 2011


humilde, mas se tornaram proprietários de pequenos lotes de terras<br />

rurais, os chamados sítios.<br />

Por último, há o Caipira mulato, descendente de africanos com<br />

<strong>eu</strong>rop<strong>eu</strong>s e rara<strong>me</strong>nte chegou a obter grandes propriedades. 57<br />

Independente da categoria, espaço e temporalidade, os caipiras<br />

não per<strong>dera</strong>m sua identidade, (como nos afirma Renato Teixeira que é<br />

um dos únicos músicos que acredita que a música caipira não perd<strong>eu</strong> a<br />

sua essência), <strong>me</strong>smo os caipiras modernos, pois são bem-sucedidos,<br />

humildes e representam o sonho do brasileiro no campo.<br />

Já o educador e escritor Paulo Freire e o violeiro e compositor<br />

Roberto Corrêa dizem que essas músicas caipiras urbanizadas não<br />

têm nenhuma ligação com a música original. Essa passagem da<br />

música caipira para a sertaneja fez com que a pri<strong>me</strong>ira deixasse de ser<br />

so<strong>me</strong>nte arte, expressão da alma do povo, para se transformar em uma<br />

gigante indústria, sustentada por vendagens astronômicas e capaz de<br />

recompensar os vencedores com muito dinheiro e fama. Com isso, o<br />

caipira já perdia sua ingenuidade e a roça, s<strong>eu</strong> encanto. 58<br />

Rolando Boldrin, filho assumido da cultura rural “tradicional”, é<br />

um defensor da preservação das características originais da música<br />

interiorana. Em s<strong>eu</strong>s programas que visavam preservar as tradições,<br />

convidava pessoas para <strong>cantar</strong> a música raiz, modas de <strong>viola</strong>, pedindo<br />

a todos que se apresentassem normal<strong>me</strong>nte sem usar as roupas de<br />

shows, pois para o compositor e cantor:<br />

Modernizar não é você pegar uma música a<strong>me</strong>ricana e chupar os<br />

arranjos, pegar a <strong>me</strong>xicana e botar letra em português. A gente<br />

tem que modernizar o que é da gente”. 59<br />

Percebe-se, assim, a crítica às influências de todo o tipo, absorvidas<br />

pelos artistas ditos sertanejos, influências estas representadas pelas<br />

maquiagens, indu<strong>me</strong>ntárias, acessórios, que contribuíram por também<br />

descaracterizar a música de “raiz”. “É certo que mudou muita coisa”,<br />

disse Inezita Barroso, “(...) o caipira não é mais caipira, as cidades<br />

pequenas cresceram. Mas, por isso, você se esquece de falar s<strong>eu</strong><br />

idioma? Esquece o perfu<strong>me</strong> do campo? Não, isso é nossa <strong>me</strong>mória e<br />

não podemos perdê-la”. 60<br />

Figura 3 - Inezita Barroso<br />

FONTE: jairodelimaalves.blogspot.com/2008_08_01_arch.... Acesso em: 15 de abr. de 2010.<br />

As palavras de Inezita re<strong>me</strong>tem as orientações de Roger Chartier,<br />

sobre a construção das representações do mundo social que embora<br />

aspirem à universalidade de um diagnóstico fundado na razão, sempre<br />

são determinadas pelos interesses de grupo que as forjam. 61<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 249<br />

| História | 2011


No entanto, alerta o historiador: a relação de representação não<br />

pode ser confundida pela ação da imaginação, que faz tornar o logro<br />

pela verdade, que ostenta os signos visíveis como provas da realidade<br />

que não é. 62<br />

No decorrer do tempo, a moda caipira deixou de se aperfeiçoar,<br />

motivo pelo qual muitos não procuram mais falar sobre um passado<br />

que é rico e serve de exemplo para a música atual.<br />

2 SEGUINDO A VIDA E<br />

TOCANDO EM FRENTE...<br />

2.1 Amanhec<strong>eu</strong>, peguei a <strong>viola</strong>:<br />

o violeiro e suas composições<br />

Quem não conhece o anoitecer<br />

/ lá na roça / Da porta de<br />

uma paioça / vendo a mata<br />

escurecê / A lua cheia / vem lá<br />

por trás do cerrado / Espiando<br />

o namorado/procurando se<br />

escondê / Quem não escuita<br />

o galo / rei do terreiro / Ele<br />

canta no puleiro / vendo o<br />

dia clareá / [...] A lua bate /<br />

no seio virge da serra / Que<br />

enfeita o corpo da terra/ que<br />

a natureza tem / A poesia que<br />

nasc<strong>eu</strong> / do seresteiro / Deste<br />

sertão brasileiro / D<strong>eu</strong>s é<br />

caboclo também. 1<br />

Por muito tempo o sertão inspirou os violeiros para as suas<br />

composições, os quais de um modo muito puro e simples escreviam<br />

letras e criavam <strong>me</strong>lodias para retratar a vida sertaneja. Nesse sentido,<br />

pode-se como exemplo, citar a música “Lá no Sertão” interpretada por<br />

Tonico e Tinoco na década de 1960, que demonstra a riqueza, a pureza<br />

e a beleza da música caipira, carregada de experiências específicas da<br />

vida interioriana. Ao escutar a <strong>me</strong>lodia e atentar à letra, o ouvinte é<br />

convidado a se reportar ao sertão brasileiro e imaginar o anoitecer lá<br />

na roça, onde pode ver a mata escurecê, escutar o galo rei do terreiro<br />

a <strong>cantar</strong> no puleiro e ver o dia clareá, sentindo a riqueza que a natureza<br />

tem, afinal o s<strong>eu</strong> Criador é caboclo também.<br />

A música para o caipira representa os s<strong>eu</strong>s valores, anseios, tradições<br />

e todo o conjunto que compõe a sua cultura, pois apresenta o s<strong>eu</strong> cotidiano,<br />

sua gente, vida, trabalho, amores, tristezas, alegrias, enfim tudo que faz<br />

parte de suas sensibilidades. Assim sendo, o estudo da música caipira<br />

pressupõe um breve conheci<strong>me</strong>nto do <strong>me</strong>io rural, pois muitas vezes ela é<br />

vista como simplória e desprovida de conheci<strong>me</strong>nto científico, e por isso<br />

tornou-se alvo de críticas por parte de diferentes grupos sociais. Porém,<br />

cabe aqui lembrar que a formação da música e da cultura caipira está<br />

relacionada a todo o processo de ocupação do território brasileiro que<br />

avançava para o interior estabelecendo assim, uma dicotomia entre o<br />

mundo “civilizado” e o “atrasado”, “ao <strong>me</strong>smo tempo em que favorecia a<br />

sua mistura, da qual nasceria a cultura caipira”. 67<br />

Nesse sentido, para entender o significado deste estilo musical,<br />

torna-se necessário a análise dos ele<strong>me</strong>ntos simbólicos que compõem<br />

o universo da vida rural.<br />

A música caipira é originária do <strong>me</strong>io rural e de maneira geral,<br />

contempla temáticas restritas ao ho<strong>me</strong>m do campo. Normal<strong>me</strong>nte é<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 250<br />

| História | 2011


cantada em duas vozes e acompanhada pela <strong>viola</strong>, alguns violões, a<br />

chamada “moda de <strong>viola</strong>”. No período colonial, as letras tratavam sobre<br />

as lendas indígenas e canções religiosas portuguesas. Com o tempo, as<br />

músicas caipiras passaram a retratar as histórias dos desbravadores.<br />

Na década de 20, essa moda chegou às rádios por intermédio de<br />

Cornélio Pires que financiou as gravações de músicas compostas por<br />

duplas sertanejas, não mais priorizando as várias vozes que entoavam<br />

as canções, devido à dificuldade de os estúdios suportarem um nú<strong>me</strong>ro<br />

muito grande de pessoas. Por esse motivo, so<strong>me</strong>nte duas vozes<br />

passaram a gravar as composições, tornando-se com o tempo uma das<br />

principais características da música sertaneja. 68<br />

Já com relação à origem do ritmo da música caipira, José Roberto<br />

Zan destaca a <strong>viola</strong> como o principal instru<strong>me</strong>nto musical deste estilo.<br />

A <strong>viola</strong>, de acordo com o professor, é uma derivação do instru<strong>me</strong>nto<br />

português chamado <strong>viola</strong> de ara<strong>me</strong> ou <strong>viola</strong> braguesa (possivel<strong>me</strong>nte<br />

originária de Braga). A moda ou a poesia cantada em duas vozes<br />

com o acompanha<strong>me</strong>nto da <strong>viola</strong>, foram características herdadas das<br />

cantigas de gesta e do romanceiro tradicional ibérico. E enquanto uma<br />

narrativa dramática:<br />

[...] normal<strong>me</strong>nte conta um caso extraordinário, sensacional, ou<br />

descreve um fenô<strong>me</strong>no relevante do cotidiano caipira. É bastante<br />

se<strong>me</strong>lhante ao que os nordestinos chamam de romance. O canto<br />

em duas vozes, em intervalo de terça, característico das duplas<br />

caipiras, é outra herança <strong>eu</strong>ropéia. Mas é provável que as vozes<br />

agudas dos cantores tenha raízes a<strong>me</strong>ríndias. 69<br />

Já o sociólogo Waldenyr Caldas, entende a música caipira como<br />

uma canção anônima e que tem a ver com o folclore, ou seja, uma música<br />

com funções sociais que apresenta a tradição de um povo, enquanto<br />

a música sertaneja é aquela já produzida no <strong>me</strong>io urbano-industrial. 70<br />

Por <strong>me</strong>io deste viés, esta indicação re<strong>me</strong>te as consi<strong>dera</strong>ções de Roger<br />

Chartier sobre o conceito de apropriação, uma vez que:<br />

A apropriação [...], tem por objetivo uma história social das<br />

interpretações, re<strong>me</strong>tidas para as suas determinações funda<strong>me</strong>ntais<br />

(que são sociais, institucionais, culturais) e inscritas nas práticas<br />

específicas que as produzem. [...] daí o reconheci<strong>me</strong>nto das<br />

práticas de apropriação cultural como formas diferenciadas de<br />

interpretação. 71<br />

Assim sendo, a apropriação consiste em uma forma de mudança<br />

do que era original. O indivíduo está exposto a um contexto histórico<br />

que com relativa autonomia se apropria dos valores e símbolos<br />

convencionais correntes nesse <strong>me</strong>io cultural. Mas nesta transição<br />

cultural, certos valores e símbolos podem acabar por representar<br />

formas diferentes, ou seja, a apropriação da experiência é a<br />

construção de um sentido que pode variar em significado a coisa<br />

original. 72<br />

A música caipira facilita as relações sociais entre a comunidade, o<br />

que permite a aproximação e uma maior sociabilidade entre os caipiras.<br />

Essas normal<strong>me</strong>nte são criações coletivas, sobretudo, quando nos<br />

sertões, os artistas populares reúnem-se nas festas religiosas, com<br />

milhares de pessoas e passam a compor músicas a partir destes<br />

aconteci<strong>me</strong>ntos que estão vivenciando, seja na elaboração de uma<br />

letra, uma <strong>me</strong>lodia ou através da união das duas para aguçar a sua<br />

criatividade e inspiração.<br />

Os no<strong>me</strong>s dos autores de muitas músicas caipiras acabam por serem<br />

substituídos pelo no<strong>me</strong> da cidade ou pelo no<strong>me</strong> de um determinado<br />

povoado onde foi criada a canção, como por exemplo, as canções<br />

intituladas: “Cana-verde de Piracicaba”, “Recortado de Olímpia”,<br />

“Cururu de Tietê” entre outras. Alguns no<strong>me</strong>s de compositores se<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 251<br />

| História | 2011


per<strong>dera</strong>m pela falta de registros, e com isso, tais canções foram sendo<br />

incorporadas ao folclore da região.<br />

Como já citado, na música caipira há sempre um acompanha<strong>me</strong>nto<br />

vocal, pois os rituais religiosos e as músicas de trabalho e de lazer do<br />

canto rural guardam a tradição das cantorias coletivas, portanto, essa<br />

música é produto das relações sociais entre as pessoas que compõem<br />

o cenário da “cultura rústica”.<br />

O tempo de duração destas músicas geral<strong>me</strong>nte é muito longo,<br />

e devido a isso, tais canções não teriam chances de fazer sucesso<br />

na indústria fonográfica, por se tornarem monótonas ao gosto dos<br />

ouvintes. Para que uma canção caipira ob<strong>tivesse</strong> sucesso, teria que<br />

se adaptar as exigências da indústria cultural fonográfica. No entanto,<br />

esta adaptação a descaracterizaria, uma vez que alteraria as suas<br />

formas originais, conduzindo-a consequente<strong>me</strong>nte, a perder a sua<br />

identidade enquanto um produto da cultura rústica.<br />

Outro traço que identifica a música caipira envolve as questões<br />

técnicas, como por exemplo, os s<strong>eu</strong>s instru<strong>me</strong>ntos musicais (<strong>viola</strong>,<br />

triângulo, surdo, e pandeiro). No entanto, como já <strong>me</strong>ncionado, a <strong>viola</strong><br />

é um dos símbolos mais significantes deste estilo musical. Muitos<br />

cancioneiros, musicólogos, entre outros estudiosos afirmam que não<br />

basta estudar e treinar para ser um bom violeiro, afinal como disse<br />

Chico Lobo, “deve-se recorrer aos santos ou ao capeta se preferir, mas<br />

principal<strong>me</strong>nte deve-se aceitar s<strong>eu</strong> destino”. 73<br />

Todavia, segundo as tradições, de nada adianta os pactos, simpatias<br />

e crenças, se o violeiro não tiver as suas inspirações, e é o <strong>me</strong>io em que<br />

vive o violeiro que fornece a estrutura perfeita para as suas inspirações<br />

e conseqüente composições. A relevância da inspiração na hora de<br />

compor uma música, pode ser confirmada por <strong>me</strong>io de relato do cantor<br />

Valdo da dupla com s<strong>eu</strong> irmão Vael:<br />

É, <strong>eu</strong> acho que tem um fator interessante para <strong>quem</strong> compõe,<br />

porque de repente você está ali, você inspira uma música. Aí<br />

você pega caneta e papel e co<strong>me</strong>ça. Rapidinho você está com a<br />

música pronta. E, de repente, você pega para escrever,: “<strong>eu</strong> tenho<br />

que fazer uma música aqui porque <strong>eu</strong> preciso dela...”, e você não<br />

consegue fazer. Às vezes <strong>eu</strong> já acordei no <strong>me</strong>io da noite e fiz uma<br />

música, rapidinho. E já peguei também para fazer e não consegui<br />

fazer. Aí tem que parar, largar para lá. Então, o compositor vive de<br />

inspiração, tem que estar inspirado para compor. E a inspiração<br />

não é a hora que você quer que ela venha, não. Não é chamar e<br />

ela vir. Ela tem que acontecer natural<strong>me</strong>nte. E na hora que parece<br />

que a inspiração vem, o compositor... tem que deixar o que ele tiver<br />

fazendo para cuidar dela. Às vezes [a gente] busca inspiração e<br />

acaba não encontrando na hora que quer... 74<br />

Viver de inspiração como relatou Valdo explica como esta ação que<br />

está intima<strong>me</strong>nte ligada à vida psíquica e social do violeiro compositor.<br />

E por intermédio do s<strong>eu</strong> modo de viver é que os tocadores de <strong>viola</strong>, os<br />

ho<strong>me</strong>ns do sertão pedem para o povo brasileiro chegar mais perto e<br />

ouvir as suas vozes que trazem as notícias do s<strong>eu</strong> mundo através de<br />

suas composições conhecidas como as famosas “modas de <strong>viola</strong>”.<br />

Na canção a seguir, pode-se perceber o espaço no qual o violeiro<br />

vive e como surgem as suas inspirações:<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 252<br />

| História | 2011


O violeiro toca75<br />

(Almir Sater / Renato Teixeira)<br />

Quando uma estrela cai<br />

No escurão da noite<br />

E um violeiro toca suas<br />

Mágoas<br />

Então os olhos dos bichos<br />

Vão ficando iluminados<br />

Rebrilham neles estrelas<br />

De um sertão enluarado<br />

Quando o amor termina<br />

Perdido numa esquina<br />

E um violeiro toca sua sina<br />

Então os olhos dos bichos<br />

Vão ficando entristecidos<br />

Rebrilham neles lembranças<br />

Dos amores esquecidos<br />

Tudo é sertão, tudo é paixão<br />

Se um violeira toca<br />

A <strong>viola</strong> e o violeiro<br />

E o amor se tocam<br />

Quando o amor co<strong>me</strong>ça<br />

Nossa alegria chama<br />

E um violeiro toca em nossa<br />

Cama<br />

Então os olhos dos bichos<br />

São os olhos de <strong>quem</strong> ama<br />

Pois a natureza é isso<br />

Sem <strong>me</strong>do, nem dó,<br />

nem drama<br />

Esse frag<strong>me</strong>nto da música de <strong>viola</strong> apresenta os senti<strong>me</strong>ntos do<br />

violeiro em relação ao s<strong>eu</strong> <strong>me</strong>io e a sua arte na qual tudo é sertão,<br />

paixão uma vez que a <strong>viola</strong>, o violeiro e o amor estão conectados e<br />

através desta conexão o violeiro em suas composições expõe as suas<br />

sensibilidades e experiências de vida. Dentro desta cadência, o violeiro<br />

demonstra uma outra identidade e cultura e nos re<strong>me</strong>te a um Brasil<br />

profundo, de raiz, fornecendo assim, um caráter regional e universal à<br />

música brasileira.<br />

Cornélio Pires em um de s<strong>eu</strong>s sonetos de 1910 conseguiu traduzir<br />

os desejos e ideais do violeiro, mas deixemos o próprio compositor<br />

apresentar:<br />

Ideal de Caboclo 76<br />

(Cornélio Pires)<br />

Ai, s<strong>eu</strong> moço, <strong>eu</strong> só quiria<br />

Pra minha filicidade,<br />

Um bão fandango por dia,<br />

E um pala de qualidade<br />

Pórva, espingarda e cutia,<br />

Um facão fala-verdade<br />

E uma <strong>viola</strong> de harmonia<br />

Pra chorá minha sódade<br />

Um rancho na bêra d´água,<br />

Vará de anzó, pôca mágoa,<br />

Pinga boa e bão café...<br />

Fumo forte de sobejo...<br />

Pra compretá <strong>me</strong>u desejo,<br />

Cavalo bão – e muié!<br />

Neste poema, é possível visualizar a vida, o desejo, a felicidade do<br />

caipira, tendo um fandango como parte do s<strong>eu</strong> ritual, um facão, a <strong>viola</strong>,<br />

um rancho com um açude, ou um lago onde possa pescar, uma pinga,<br />

um café, um fumo, sem deixar de lado um dos s<strong>eu</strong>s “companheiros”<br />

que é o cavalo, e para completar, uma muié.<br />

Tal modo de viver pode ser comprovado também em um soneto<br />

clássico da literatura regionalista de Tonico e Walter Amaral,<br />

interpretado pela dupla Tonico e Tinoco ao demonstrar o cotidiano<br />

simples de um violeiro:<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 253<br />

| História | 2011


Brasil Caboclo77 (Tonico e Walter Amaral)<br />

Amanhecer na minha roça,<br />

vem surgindo o clarão<br />

Caboclo deixa a palhoça<br />

<strong>pra</strong> fazer a plantação<br />

O carro de boi ge<strong>me</strong>ndo<br />

no arco do chapadão<br />

Os passarinho cantando<br />

fazendo um barulhão<br />

Esse é o Brasil caboclo<br />

esse é <strong>me</strong>u Sertão<br />

Casinha de palha<br />

lá no ribeirão<br />

Uma linda cabocla<br />

e um cavalo bom<br />

Som de uma <strong>viola</strong><br />

alegra a solidão<br />

Este é o Brasil caboclo,<br />

este é o <strong>me</strong>u sertão [...]<br />

Este frag<strong>me</strong>nto da música “Brasil caboclo” relata o universo<br />

simbólico da vida rural, a vida simples do caipira violeiro retratando o<br />

Brasil do sertão, onde o som de uma <strong>viola</strong> alegra a solidão no arco do<br />

chapadão.<br />

Percebe-se nas canções acima citadas que a <strong>viola</strong> é a principal<br />

companheira dos violeiros nas horas de suas composições, pois é o<br />

instru<strong>me</strong>nto que lhes dá vida, sendo consi<strong>dera</strong>da a alma da música<br />

ruralista. E é justa<strong>me</strong>nte a <strong>viola</strong> que identifica a tradição caipira e suas<br />

raízes.<br />

Cabe ressaltar que, o encordoa<strong>me</strong>nto da <strong>viola</strong> se diferencia do<br />

tradicional violão, sendo <strong>me</strong>nor e com cintura mais acentuada. De<br />

maneira geral, possui dez cordas, seja de aço ou algumas revestidas<br />

de <strong>me</strong>tal, sendo estas agrupadas duas a duas. Muitos destes<br />

instru<strong>me</strong>ntos, geral<strong>me</strong>nte são confeccionados de forma artesanal.<br />

Um dos raros “fabricadores” de <strong>viola</strong>s e rabecas no Brasil é Zé Coco<br />

do Riachão, artesão que utiliza uma cola feita de banana do mato,<br />

conhecida também por sumaré. No tampo da <strong>viola</strong>, o artista costuma<br />

usar a madeira emburana de espinho; o braço é feito de cedro; o<br />

espelho, cravelhas e orna<strong>me</strong>ntos de caviúna (candeia) e a lateral feita<br />

de pinho, a qual na maioria das <strong>viola</strong>s encontradas é a madeira mais<br />

utilizada para o tampo, pois, de acordo com os violeiros, o pinho é a<br />

madeira que dá a <strong>viola</strong> uma <strong>me</strong>lhor sonoridade. 79 Afinal como cantam<br />

Marcos e Sérgio Paulo Valle a “<strong>viola</strong> em noite enluarada no sertão é<br />

como espada e esperança”. 80<br />

No campo ou na cidade, a <strong>viola</strong> é a sempre presente companheira<br />

do violeiro que a ela devota o s<strong>eu</strong> amor. Tanto nas horas boas quanto<br />

nas ruins, a <strong>viola</strong> sempre será a grande amada, pois é ela:<br />

Que leva alegria ao sertão inteiro<br />

Trazendo saudade dos que já morreram<br />

Nas noites de lua, no chão do terreiro<br />

Consolando a mágoa do triste violeiro. 81<br />

A <strong>viola</strong> cabocla é brasileira e sua <strong>me</strong>lodia atravessou fronteira,<br />

Levando a beleza <strong>pra</strong> terra estrangeira<br />

No nosso sertão é a <strong>me</strong>nsageira<br />

É o verdadeiro amarelo<br />

Da nossa bandeira. 82<br />

Afinal o timbre da <strong>viola</strong> cabocla não falha, pois,<br />

Criada no mato como a samambaia<br />

Veio <strong>pra</strong> cidade com chapéu de palha<br />

E trouxe sucesso vencendo a batalha<br />

Voltou pro sertão trazendo a <strong>me</strong>dalha! 82<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 254<br />

| História | 2011


Chegando à cidade, o violeiro junto de sua <strong>viola</strong> encontra muitas<br />

pessoas que mantém um estigma de preconceito quanto ao interior, o<br />

sertão, a música ruralista, sem entender a relação que há entre a <strong>viola</strong><br />

e o violeiro, mas <strong>me</strong>smo assim, o violeiro e a <strong>viola</strong> vencendo a batalha,<br />

voltaram pro sertão trazendo a <strong>me</strong>dalha, e disseram que:<br />

Tem gente que não gosta da classe de violeiro<br />

No braço desta <strong>viola</strong> defendo <strong>me</strong>us companheiros<br />

Pra destruir nossa classe tem que matar pri<strong>me</strong>iro<br />

Mesmo assim depois de morto ainda <strong>eu</strong> atrapaio<br />

Morre um ho<strong>me</strong>m, fica a fama e minha fama dá trabaio. 83<br />

2.2 E... <strong>me</strong>xe, <strong>me</strong>xe que é bom:<br />

e a roça chega à cidade<br />

Galo cantou / Madrugada na<br />

Campina / Manhã <strong>me</strong>nina / Tá<br />

na flor do <strong>me</strong>u jardim / Hoje<br />

é domingo / Me desculpe <strong>eu</strong><br />

to sem pressa / Nem preciso<br />

de conversa / Não há nada<br />

prá cumprir / Passar o dia /<br />

Ouvindo o som de uma <strong>viola</strong> 85<br />

Quando se observa as diferenciações entre a música sertaneja,<br />

entendida aqui como a música produzida para o <strong>me</strong>rcado fonográfico<br />

e a música caipira ou de raiz, que neste caso é vislumbrada como<br />

um <strong>me</strong>io de oração e lazer, de autoria anônima<br />

quando religiosa ou de compositor conhecido da<br />

comunidade quando de caráter profano (festas,<br />

mutirões, trabalho); percebe-se que esses<br />

gêneros musicais expressam sempre concepções<br />

coletivas. 86 E é desta forma que o violeiro se defende dizendo que todos que<br />

nasce no mundo tem s<strong>eu</strong> destino traçado assim como o destino de ser<br />

um violeiro, e que junto de sua <strong>viola</strong> não pode ser<br />

derrotado.<br />

A <strong>viola</strong> caipira é a alma da música ruralista, o<br />

ele<strong>me</strong>nto essencial da tradição e é através dela que<br />

se identifica as raízes da música caipira. Diante de<br />

todas estas colocações Rosa Nepomuceno afirma<br />

E esta percepção pode ser comprovada<br />

que “[...] a <strong>viola</strong> é o coração da música brasileira, ela<br />

se colocadas em evidência duas composições<br />

que dá forma as <strong>me</strong>lodias e às poesias que definem<br />

distintas como, por exemplo, “Tristeza do Jeca”,<br />

o perfil musical do povo da terra”.<br />

composta em 1918 por Angelino de Oliveira e que<br />

chegou às rádios através das vozes de Tonico e<br />

Tinoco na década de 30.<br />

84 Figura 4 – Viola Caipira Rozini<br />

Desta forma,<br />

é a união harmoniosa entre a <strong>viola</strong> e o violeiro, que<br />

compõe e fornece a vida à música caipira. Porém,<br />

ao longo do tempo, essa relação receb<strong>eu</strong> uma nova<br />

roupagem, voltada para o <strong>me</strong>rcado fonográfico,<br />

que passou a se chamar música sertaneja, como<br />

FONTE: http://www.ccbhinos.com.br/<br />

foto_/23072008115400.JPG. Acesso em: 21 de<br />

será abordado a seguir.<br />

abr. de 2010.<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 255<br />

| História | 2011


Tristeza do Jeca87 (Angelino de Oliveira)<br />

Nestes versos tão singelos<br />

Minha bela, <strong>me</strong>u amor<br />

Pra você quero contar<br />

O <strong>me</strong>u sofrer e a minha dor<br />

Sô igual a um sabiá<br />

Quando canta é só tristeza<br />

Desde um gaio onde ele está<br />

Nesta <strong>viola</strong> canto e gemo de verdade<br />

Já o outro exemplo, corresponde a “Eu e D<strong>eu</strong>s no sertão” de Victor<br />

Chaves, interpretada por Victor e Léo em 2009.<br />

Eu e D<strong>eu</strong>s no Sertão88 (Victor Chaves)<br />

Nunca vi ninguém viver tão feliz<br />

Como <strong>eu</strong> no sertão<br />

Perto de uma mata e de um ribeirão<br />

D<strong>eu</strong>s e <strong>eu</strong> no sertão<br />

Ao analisar as composições, pode-se inferir que essas<br />

demonstram um apreço atemporal pela música sertaneja e suas<br />

inconfundíveis figuras emblemáticas que mantêm um público fiel à<br />

tradição da música rural formando assim, um elo entre o campo e<br />

a cidade.<br />

Da <strong>me</strong>sma forma que o modo de viver do caipira, retrata o<br />

universo no qual ele está inserido, algumas dessas características se<br />

tornaram funda<strong>me</strong>ntais para identificar a música sertaneja. Mesmo<br />

que essa tenha recebido uma nova roupagem, o pop-sertanejo ou<br />

o sertanejo romântico, nos quais foram incorporados instru<strong>me</strong>ntos<br />

eletrônicos, (como a guitarra no lugar da <strong>viola</strong> caipira, o teclado no<br />

da sanfona), a música sertaneja não deixou de lado os s<strong>eu</strong>s versos<br />

simples ao falar do amor, da saudade, da mulher amada, da família,<br />

da terra e de fazer <strong>me</strong>nção às figuras emblemáticas como o boi, o<br />

vaqueiro e o sertanejo.<br />

No entanto, no que concebe a diferenciação entre a música<br />

caipira e a sertaneja, alerta o professor Roberto Zan que:<br />

É importante lembrar que esse estilo de música popular,<br />

identificado como sertanejo ou caipira, nos re<strong>me</strong>te a um<br />

determinado modo de vida ou a um tipo de sociedade que, na<br />

atualidade, <strong>pra</strong>tica<strong>me</strong>nte desaparec<strong>eu</strong>. O desenvolvi<strong>me</strong>nto do<br />

capitalismo no Brasil, acompanhado pela industrialização e pela<br />

urbanização da sociedade brasileira, especial<strong>me</strong>nte ao longo<br />

do século 20, provocou o rompi<strong>me</strong>nto do “equilíbrio ecológico e<br />

social” desse modo de vida. Mas, apesar da sua desintegração,<br />

aspectos dessa cultura ainda sobrevivem na <strong>me</strong>mória de boa<br />

parcela da população brasileira. 89<br />

Ao longo do século XX, os aspectos do modo de vida do ho<strong>me</strong>m<br />

rural foram incorporados na música popular brasileira. Por volta do<br />

ano de 1910, época em que<br />

o <strong>me</strong>rcado fonográfico se instaurava no Brasil, já se ouvia falar<br />

sobre o estilo musical sertanejo raiz. Em 1929, o jornalista Cornélio<br />

Pires decidiu gravar o pri<strong>me</strong>iro disco de música caipira na gravadora<br />

Columbia no Brasil e a partir desta produção, a indústria fonográfica<br />

se interessou em explorar esse novo seg<strong>me</strong>nto fonográfico. Devido<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 256<br />

| História | 2011


a esse interesse surgiram vários compositores e duplas como: Raul<br />

Torres, Teddy Vieira, João Pacífico, Jararaca e Ratinho, Alvarenga e<br />

Ranchinho, Tonico e Tinoco, Tião Carreiro e Pardinho, entre outros<br />

representantes da música sertaneja de “raiz”. 90<br />

Figura 5 - A turma caipira de Cornélio Pires - foto de 1929 - da esquerda para a direita, em<br />

pé: Ferrinho, Sebastião Ortiz de Camargo, Caçula e Arlindo Santana. Sentados: Mariano,<br />

Cornélio Pires E Zico Dias.<br />

FONTE: http://www.lucianopires.com.br/idealbb/view.asp?topi.... Acesso em: 23 de abr. de<br />

2010.<br />

Figura 6 - Foto <strong>me</strong>morável de artistas famosos, onde além de tonico e tinoco, ao centro,<br />

aparecem agachados, Nhá Neide, Antonio e Antoninho e Sertãozinho.<br />

FONTE: http://www.widesoft.com.br/users/pcastro4/fotostt.htm. Acesso em: 23 de abr. de<br />

2010.<br />

Para o professor, o <strong>me</strong>rcado fonográfico brasileiro passou por<br />

um boom devido à música sertaneja ou “sertaneja romântica” e o<br />

apog<strong>eu</strong> desse gênero ocorr<strong>eu</strong>, principal<strong>me</strong>nte, no período entre 1989<br />

a 1992. 91 A produção deste novo estilo atraiu um grande público por<br />

estar composta por:<br />

[...] duplas mais suscetíveis às novas influências estilísticas.<br />

São artistas populares que vão produzir para um público de<br />

massa também suscetível às mudanças, à “modernização” da<br />

música sertaneja. Produtores, diretores artísticos e profissionais<br />

de marketing fonográfico que atuam em gravadoras conhecem<br />

o público e indicam as inovações para garantir a vendagem de<br />

discos. 92<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 257<br />

| História | 2011


Além disso, continua o professor, ocorr<strong>eu</strong> uma ressignificação da<br />

imagem atribuída ao ho<strong>me</strong>m do sertão uma vez que:<br />

A antiga imagem estereotipada do caipira mal vestido, banguela,<br />

com chapéu de palha foi superada. As novas duplas usam roupas<br />

de grife, cabelo bem-cortado, têm os dentes tratados, etc. As<br />

mudanças estilísticas também têm apelo co<strong>me</strong>rcial destinado a um<br />

público ávido por novidades. A <strong>viola</strong> foi substituída por instru<strong>me</strong>ntos<br />

eletrônicos como guitarra, o contra-baixo elétrico e teclados,<br />

além de bateria e, eventual<strong>me</strong>nte, bancada e instru<strong>me</strong>ntos de<br />

percussão. 93<br />

Mesmo com todas estas mudanças e diferenças entre a música<br />

caipira de raiz e a sertaneja, é importante destacar que:<br />

Tanto as composições como os arranjos apresentam ele<strong>me</strong>ntos da<br />

música urbana de massa, especial<strong>me</strong>nte das baladas românticas da<br />

Jovem Guarda. Portanto, da música caipira de fato restam poucos<br />

aspectos. Talvez, as vozes agudas dos cantores e, os duetos em<br />

terça, porém empregados de modo mais econômico. 94<br />

A música sertaneja, para o professor, “não é uma onda passageira,<br />

não é um modismo, assim como foi a lambada, por exemplo, a música<br />

sertaneja com as canções românticas cantadas por vozes agudas<br />

obtiveram um público fiel.” 95<br />

Esse estilo musical está inserido em um outro contexto social.<br />

Mesmo que apresente ele<strong>me</strong>ntos poético-musicais similares aos da<br />

música caipira, o s<strong>eu</strong> objetivo e a sua produção têm como finalidade<br />

a vendagem de discos. Afinal, a música sertaneja “[...] não <strong>me</strong>deia as<br />

relações sociais na sua qualidade de música, mas na sua qualidade de<br />

<strong>me</strong>rcadoria [...]. É diversa da música caipira porque circula revestida da<br />

forma de valor de troca, sendo esta a sua di<strong>me</strong>nsão funda<strong>me</strong>ntal.” 96<br />

Diante desta afirmação, pode-se constatar que a indústria e<br />

o <strong>me</strong>rcado de discos forçaram as modificações em s<strong>eu</strong>s aspectos<br />

formais e em conteúdos a música sertaneja. Agora os compositores<br />

não mais se orientam pelo s<strong>eu</strong> <strong>me</strong>io de vivência para compor as suas<br />

músicas, e sim pelas tendências de <strong>me</strong>rcado que definem os temas e<br />

os estilos que devem seguir para garantir a maior vendagem possível. 97<br />

Nesta categoria, as composições muito longas não se adequam mais<br />

ao gosto do consumidor que hoje vive a cultura do descartável.<br />

Provavel<strong>me</strong>nte muitas modalidades de música caipira não foram<br />

incorporadas pela indústria fonográfica, e as que foram, sofreram<br />

adaptações aos padrões técnicos de produção. 98<br />

Para ilustrar esse contexto de mudanças no epicentro da música<br />

caipira e sua adaptação a música sertaneja, Roberto Zan apresenta um<br />

trecho do depoi<strong>me</strong>nto da dupla Tonico e Tinoco concedido ao programa<br />

Ensaio da TV Cultura de São Paulo. Para Tinoco:<br />

[...] hoje o mundo mudo muito [...] então nóis tivemo que evolui<br />

também. Não saimo do estilo mais fazemo umas <strong>me</strong>nsaginha mais<br />

curta e mais alegrinha, porque o povo, hoje, eles ouve uma música<br />

assim, olhando no relógio, sempre tem o que fazê. [...] Mais hoje<br />

então, a <strong>me</strong>nsage é mais curta: é co<strong>me</strong>ço, <strong>me</strong>io e fim. Antiga<strong>me</strong>nte,<br />

<strong>eu</strong> com o Tonico, nóis cantava ‘romance’, com bolinho e tudo de cor.<br />

[...] Nóis tinha diversos ‘romance’ que nóis cantava lá na fazenda<br />

e era bem apreciado. 99<br />

Percebe-se neste depoi<strong>me</strong>nto que a modalidade de música caipira<br />

foi modificada, pois, antiga<strong>me</strong>nte nóis cantava romance, 100 e <strong>agora</strong><br />

eles fazem umas <strong>me</strong>nsaginha mais curta, pois, o povo, hoje, vive<br />

compromissado com o relógio moral inserido em suas vidas. Portanto,<br />

a música caipira, ao ser incorporada pelo disco, passou a sofrer<br />

mutilações e diluições para poder se adaptar ao <strong>me</strong>rcado fonográfico<br />

de produção, em que se insere em um novo modo de fruição da música,<br />

ou seja, o ouvir desinteressado. 101<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 258<br />

| História | 2011


Figura 7 – Show de Tonico e Tinoco e s<strong>eu</strong> amigo Nho Zé – 1940<br />

FONTE: www.widesoft.com.br/users/pcastro4/fotostt.htm. Acesso em: 24 de abr. de 2010.<br />

Outra passagem interessante refere-se ao modo de <strong>cantar</strong><br />

dos antigos violeiros, como relatou a dupla Tonico e Tinoco. No afã<br />

de preservar as suas músicas e cantá-las em s<strong>eu</strong>s novos estilos, ao<br />

chegarem nos estúdios da Continental, enfrentaram novos obstáculos;<br />

mas deixemos a dupla falar:<br />

A gente tava acostumado a <strong>cantar</strong> na roça, pros amigos, nunca<br />

tinha entrado num estúdio. Chegamo, ajeitamo a goela, o peito,<br />

e abrimo a boca. Pronto, o microfone estourou. O técnico veio,<br />

<strong>me</strong>x<strong>eu</strong> e re<strong>me</strong>x<strong>eu</strong> e disse ‘tá estourado’. De castigo gravemo só<br />

um lado do disco [...] 102<br />

O que se pode notar diante destes co<strong>me</strong>ntários, é que <strong>me</strong>smo com<br />

todas as transformações, a música sertaneja preservou traços de suas<br />

matrizes principais vindas da música caipira, como o canto com um registro<br />

vocal agudo e em duas vozes com intervalos de terça, a <strong>viola</strong> caipira como<br />

acompanha<strong>me</strong>nto instru<strong>me</strong>ntal e uma variedade razoável de ritmos. 103<br />

Figura 8 – Cartão postal de Tonico e Tinoco a dupla coração do Brasil<br />

FONTE: www.widesoft.com.br/users/pcastro4/fotostt.htm. Acesso em: 24 de abr. de 2010.<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 259<br />

| História | 2011


Com relação às letras, algumas composições ainda utilizam dos<br />

romances, tanto no aspecto formal quanto no temático. Mas por outro<br />

lado, a música sertaneja assimilou ele<strong>me</strong>ntos temáticos, estilísticos<br />

e performáticos de outros gêneros. A sátira política, a guarânia, a<br />

polca paraguaia, a rancheira, o bolero <strong>me</strong>xicano, o xote, o baião, hoje<br />

também comple<strong>me</strong>ntam o repertório de algumas duplas, além do<br />

country music, baladas italianas e as músicas da Jovem Guarda dos<br />

anos 60. 104<br />

Compartilhando das indicações de José Roberto Zan, torna-se<br />

difícil identificar com precisão o mo<strong>me</strong>nto exato em que as fusões<br />

de ele<strong>me</strong>ntos musicais e temáticos de outros gêneros co<strong>me</strong>çaram<br />

a se processar na música sertaneja, porém é correto afirmar que,<br />

desde o mo<strong>me</strong>nto o qual a música caipira foi apropriada pela indústria<br />

fonográfica ela co<strong>me</strong>çou o s<strong>eu</strong> processo de desenraiza<strong>me</strong>nto, e:<br />

[...] Rompidos os s<strong>eu</strong>s laços com o <strong>me</strong>io rural tradicional, [...]<br />

caiu num novo espaço indiferenciado e sem fronteiras, ou seja:<br />

o <strong>me</strong>rcado. Agora, as condições para as diluições e reciclagem<br />

de estilos tornaram-se mais propícias. Porém, tudo indica que<br />

os traços estilísticos que caracterizam a atual música sertaneja<br />

romântica co<strong>me</strong>çaram a se manifestar ainda nos anos 50. 105<br />

No final dos anos 1960 teve início a fase moderna da música<br />

sertaneja, na qual foram introduzidas a guitarra elétrica e o ritmo<br />

da Jovem Guarda. Nessa fase, os cantores em forma de dueto<br />

ou solo apresentavam canções muitas vezes em ritmo de balada<br />

com letras românticas que tratavam de amor com clara inspiração<br />

urbana. Em algumas canções sertanejas, interpretadas por solistas,<br />

foi dispensado o recurso tradicional da dupla. Os artistas que<br />

representaram essa tendência foram: Chitãozinho e Xororó, Leandro<br />

e Leonardo, Zezé di Camargo e Luciano, Christian e Ralf, Trio Parada<br />

Dura, Chico Rei e Paraná, João Mineiro e Marciano, Nalva Aguiar e<br />

Roberta Miranda. 106<br />

Portanto, como já citado, houve uma internacionalização gradual<br />

do gênero desde as modas tradicionais uma vez que passou pela<br />

adição de ritmos latino a<strong>me</strong>ricanos (guarânia, rasqueado, canção<br />

ranchera, corrido e bolero <strong>me</strong>xicanos) e pela influência do rock<br />

(o chamado ritmo jovem) e por fim, da indústria musical em que<br />

incorporou a balada internacional e, nos anos 90, de ele<strong>me</strong>ntos do<br />

country estadunidense. 107<br />

Mesmo que os ritmos, os contornos <strong>me</strong>lódicos e a instru<strong>me</strong>ntação<br />

<strong>tivesse</strong>m sido incorporados no estilo musical sertanejo, não são<br />

estes que a caracterizam, pois, “a música sertaneja mantém sua<br />

consistência como gênero no emprego do estilo vocal e na letra com<br />

ênfase no cotidiano.” 108 Como alerta a professora Martha Tupinambá<br />

de Ulhôa ao analisar a música sertaneja na década de 1990:<br />

A música sertaneja raiz ou música caipira era inspirada pela vida<br />

no campo, pela chamada tradição rústica dos bairros rurais. Ela<br />

conectava nostalgica<strong>me</strong>nte o migrante às suas raízes. A música<br />

sertaneja moderna, ou música sertaneja romântica, refletiu as<br />

mudanças que ocorreram na vida rural: proletarização do ho<strong>me</strong>m<br />

do campo, acesso i<strong>me</strong>diato aos modelos urbanos através da<br />

televisão, consumismo etc. S<strong>eu</strong>s temas mudaram de épicos e<br />

bucólicos para líricos e realistas. O migrante do campo ainda<br />

relembra com pesar os “velhos tempos”; s<strong>eu</strong>s filhos já são outra<br />

coisa, nasceram, cresceram e vivem na cidade. 109<br />

Além disso, “muitas das letras das músicas raiz denunciam a<br />

transferência de pobreza de áreas rurais para áreas urbanas.” 110 Ou<br />

seja, é a música sertaneja refletindo as mudanças que ocorreram<br />

na vida rural. E assim de acordo com a musicóloga, a maioria das<br />

canções caipiras das décadas de 1930 e 1940, “enaltecia a vida<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 260<br />

| História | 2011


dura do peão ou lavrador e a natureza rural; canções caipiras<br />

mais recentes se referem ao caráter comunitário da vida no<br />

campo. Já as letras das músicas sertanejas românticas são de<br />

caráter individualista e senti<strong>me</strong>ntal. O sentido de pertencer a uma<br />

comunidade se perd<strong>eu</strong>. 111<br />

Além da música sertaneja ser representada pelo caráter<br />

individualista e senti<strong>me</strong>ntal, suas letras sertanejas possuem como<br />

predominante a narrativa que é cheia de repetições es<strong>quem</strong>áticas.<br />

A diferença com a música caipira de raiz centra-se em valores<br />

católicos patriarcais tradicionais que enfatizavam a família extensa<br />

e a solidariedade comunitária. Quando o caipira foi “transportado”<br />

para a cidade, essa estrutura se modificou, <strong>me</strong>smo que os valores<br />

culturais de certa forma permanecessem, e com isso, aqueles laços<br />

de parentesco extenso se reduziram ao núcleo familiar mínimo, ou<br />

seja, ao casal, portanto, não é a toa que o tema mais predominante<br />

na música sertaneja romântica seja a relação amorosa. 112<br />

Importa aqui lembrar que, entre os anos 60 e 70 do século XX,<br />

algumas tentativas desencadearam novos movi<strong>me</strong>ntos musicais no<br />

Brasil e contribuíram também para a configuração da nova música<br />

sertaneja. Um exemplo dessa contribuição, foi o interesse que a<br />

indústria fonográfica apresentou ao tornar esse estilo musical mais<br />

adequado ao gosto do consumidor de classe média, por intermédio<br />

de eventos como o Festival da Viola promovido pela TV Tupi de São<br />

Paulo em 1970. O Festival contou com a participação do maestro<br />

Júlio Medaglia e através dessa iniciativa, procurou-se dar um novo<br />

trata<strong>me</strong>nto harmônico, <strong>me</strong>lódico e temático à música sertaneja,<br />

inspirado, de certa forma, nas perspectivas abertas pela música<br />

“Disparada” de Théo de Barros e Geraldo Vandré.<br />

Disparada 113<br />

(Geraldo Vandré / Théo Barros)<br />

Prepare o s<strong>eu</strong> coração<br />

Prás coisas<br />

Que <strong>eu</strong> vou contar<br />

Eu venho lá do sertão<br />

Eu venho lá do sertão<br />

Eu venho lá do sertão<br />

E posso não lhe agradar...<br />

Aprendi a dizer não<br />

Ver a morte sem chorar<br />

E a morte, o destino, tudo<br />

A morte e o destino, tudo<br />

Estava fora do lugar<br />

Eu vivo prá consertar...<br />

Na boiada já fui boi<br />

Mas um dia <strong>me</strong> montei<br />

Não por um motivo <strong>me</strong>u<br />

Ou de <strong>quem</strong> comigo houvesse<br />

Que qualquer querer <strong>tivesse</strong><br />

Porém por necessidade<br />

Do dono de uma boiada<br />

Cujo vaqueiro morr<strong>eu</strong>...<br />

Boiadeiro muito tempo<br />

Laço fir<strong>me</strong> e braço forte<br />

Muito gado, muita gente<br />

pela vida segurei<br />

Seguia como num sonho<br />

E boiadeiro era um rei...<br />

Mas o mundo foi rodando<br />

Nas patas do <strong>me</strong>u cavalo E nos<br />

sonhos<br />

Que fui sonhando As visões<br />

se clareando As visões se<br />

clareando<br />

Até que um dia acordei...<br />

Então não pude seguir<br />

Valente em lugar tenente<br />

E dono de gado e gente<br />

Porque gado a gente marca<br />

Tange, ferra, engorda e mata<br />

Mas com gente é diferente...<br />

Se você não concordar Não<br />

posso <strong>me</strong> desculpar Não canto<br />

prá enganar Vou pegar minha<br />

<strong>viola</strong><br />

Vou deixar você de lado Vou<br />

<strong>cantar</strong> noutro lugar.<br />

As novas composições consi<strong>dera</strong>das por muitos estudiosos<br />

como canções engajadas, contavam com arranjos mais sofisticados<br />

e uma maior variedade de instu<strong>me</strong>ntos, porém sem deixar de lado a<br />

<strong>viola</strong>. Além dessas incorporações, as letras co<strong>me</strong>çaram a apresentar<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 261<br />

| História | 2011


construções estético-poéticas mais elaboradas e um considerável<br />

toque de engaja<strong>me</strong>nto político.<br />

A composição de Goiá e Biá, “Saudade de Minha Terra” ilustra<br />

bem essas transformações ao tratar das migrações populacionais que<br />

ocorriam no país:<br />

Saudade de Minha Terra114 (Goiá e Biá)<br />

De que <strong>me</strong> adianta viver na<br />

cidade<br />

Se a felicidade não <strong>me</strong><br />

acompanhar<br />

Ad<strong>eu</strong>s paulistinha do <strong>me</strong>u<br />

coração<br />

Lá pro <strong>me</strong>u sertão <strong>eu</strong> quero<br />

voltar<br />

Ver na madrugada quando a<br />

passarada<br />

Fazendo alvorada co<strong>me</strong>ça a<br />

<strong>cantar</strong><br />

Com satisfação arreio o burrão<br />

Cortando o estradão saio a<br />

galopar<br />

E vou escutando o gado<br />

berrando<br />

Sabiá cantando no jequitibá<br />

Por Nossa Senhora <strong>me</strong>u<br />

sertãoquerido<br />

Vivo arrependido por ter te<br />

deixado<br />

Esta nova vida, aqui na cidade<br />

De tanta saudade <strong>eu</strong> tenho<br />

chorado<br />

Aqui tem alguém diz que <strong>me</strong><br />

quer bem<br />

Mas não <strong>me</strong> convém <strong>eu</strong> tenho<br />

pensado<br />

Eu fico com pena mas esta<br />

morena<br />

Não sabe o sistema em que fui<br />

criado<br />

Tô aqui cantando de longe<br />

escutando<br />

Alguém está chorando com o<br />

rádio ligado<br />

Ao apresentar o caipira no novo cenário, a composição aponta para<br />

o desencanta<strong>me</strong>nto deste frente ao novo modo de viver e as diferenças<br />

entre o sistema em que foi criado e a nova vida na cidade que o faz<br />

reviver com nostalgia e se arrepender de ter deixado para trás o s<strong>eu</strong><br />

sertão querido.<br />

Diante de um mo<strong>me</strong>nto de crise, o s<strong>eu</strong> imaginário o re<strong>me</strong>te as<br />

doces experiências de sua vida no sertão e a saudade do campo aflora<br />

as suas sensibilidades quando completa o s<strong>eu</strong> <strong>cantar</strong>, falando que:<br />

Aos domingos ia passear de<br />

canoa<br />

Na linda lagoa de águas<br />

cristalinas<br />

Que doce lembrança daquelas<br />

festanças<br />

Onde tinha danças e lindas<br />

<strong>me</strong>ninas<br />

Eu vivo hoje em dia sem ter<br />

alegria<br />

O mundo judia mas também<br />

ensina<br />

Estou contrariado mas não<br />

derrotado<br />

Eu sou bem guiado pelas mãos<br />

divinas<br />

Pra minha mãezinha já<br />

telegrafei<br />

Que já <strong>me</strong> cansei de tanto<br />

sofrer<br />

Nesta madrugada estarei de<br />

partida<br />

Pra terra querida que <strong>me</strong> viu<br />

nascer<br />

Já ouço sonhando o galo<br />

cantando<br />

O inhambu piando no escurecer<br />

A lua <strong>pra</strong>teada, clareando as<br />

estradas<br />

A relva molhada desde o<br />

anoitecer<br />

Eu preciso ir <strong>pra</strong> ver tudo alí<br />

Foi lá que nascí lá quero<br />

morrer 3<br />

Portanto, diante do novo cenário que este caipira se encontra em<br />

s<strong>eu</strong> imaginário aflora a certeza de que não adianta viver na cidade se a<br />

felicidade não lhe acompanhar e ao viver arrependido por ter deixado<br />

a vida que levava no sertão de lado. Por essas razões, o caipira quer<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 262<br />

| História | 2011


voltar ao lugar que tanto ama e na madrugada estará de partida <strong>pra</strong><br />

terra querida que o viu nascer, pois foi lá que nasc<strong>eu</strong> e lá quer morrer.<br />

A transição entre os dois modos de vida pode ser também<br />

incorporada através da célebre música intitulada “Fuscão Preto”:<br />

Fuscão Preto115 (Almir Rogério)<br />

Me disseram que ela foi vista<br />

com outro<br />

Num fuscão preto pela cidade<br />

a rodar<br />

Bem vestida igual à dama da<br />

noite<br />

Cheirando a álcool e fumando<br />

sem parar<br />

M<strong>eu</strong> D<strong>eu</strong>s do céu, diga que isso<br />

é <strong>me</strong>ntira<br />

Se for verdade esclareça por<br />

favor<br />

Daí a pouco <strong>eu</strong> <strong>me</strong>smo vi o<br />

fuscão<br />

E os dois juntos se<br />

desmanchando de amor<br />

Fuscão preto você é feito de<br />

aço<br />

Fez o <strong>me</strong>u peito em pedaço<br />

E também aprend<strong>eu</strong> matar<br />

Fuscão preto com o s<strong>eu</strong> ronco<br />

maldito<br />

M<strong>eu</strong> castelo tão bonito<br />

Você fez desmoronar...<br />

A música Fuscão Preto é consi<strong>dera</strong>da por muitos estudiosos como<br />

uma canção de transição entre a caipira de raiz e a sertaneja romântica,<br />

pois aponta que o “símbolo da modernidade”: o fuscão já faz parte do<br />

novo cenário no qual o caipira está inserido, e sem acreditar nesta<br />

nova realidade que até ele chega, precisa que alguém esclareça o que<br />

ele está vendo, se for verdade, pois, o fuscão preto com o s<strong>eu</strong> ronco<br />

maldito, fez s<strong>eu</strong> castelo tão bonito desmoronar. A partir deste mo<strong>me</strong>nto<br />

as canções passaram a apresentar diversas variáveis que <strong>me</strong>sclam o<br />

mundo tradicional do sertão ao mundo moderno das grandes cidades<br />

que individualizaram os s<strong>eu</strong>s habitantes. E tal individualização podese<br />

sentir nas composições sertanejas românticas que, como já citado,<br />

adotam os senti<strong>me</strong>ntos individuais em detri<strong>me</strong>nto do comunitário. A<br />

música “É o amor” é um exemplo deste mo<strong>me</strong>nto de ruptura:<br />

É o amor116 (Zezé di Camargo e Carlos Cezar)<br />

Eu não vou negar<br />

Que sou louco por você<br />

“Tô” maluco <strong>pra</strong> te ver<br />

Eu não vou negar<br />

Eu não vou negar<br />

Sem você tudo é saudade<br />

Você trás felicidade<br />

Eu não vou negar<br />

Eu não vou negar<br />

Você é <strong>me</strong>u doce <strong>me</strong>l<br />

M<strong>eu</strong> pedacinho de céu<br />

Eu não vou negar<br />

Você é minha doce amada<br />

Minha alegria<br />

M<strong>eu</strong> conto de fadas, minha<br />

fantasia<br />

A paz que <strong>eu</strong> preciso <strong>pra</strong><br />

sobreviver<br />

Eu sou o s<strong>eu</strong> apaixonado<br />

De alma transparente<br />

Um louco alucinado<br />

Meio inconsequente<br />

Um caso complicado de se<br />

entender<br />

É o Amor<br />

Que <strong>me</strong>xe com minha cabeça<br />

E <strong>me</strong> deixa assim<br />

Que faz <strong>eu</strong> pensar em você<br />

E esquecer de mim<br />

Que faz <strong>eu</strong> esquecer<br />

Que a vida é feita <strong>pra</strong> viver<br />

É o Amor<br />

Que veio como um tiro certo<br />

No <strong>me</strong>u coração<br />

Que derrubou a base forte<br />

Da minha paixão<br />

E fez <strong>eu</strong> entender que a vida<br />

É nada sem você<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 263<br />

| História | 2011


Em outras palavras, a nova música sertaneja passou a falar do amor, da<br />

Esse movi<strong>me</strong>nto que tentou conquistar um nú<strong>me</strong>ro maior de<br />

consumidores junto aos setores médios da população ao <strong>me</strong>smo<br />

tempo que cultivava a nostalgia do mundo rural ressignificado a<br />

partir do ponto de vista urbano, promovia uma “espécie de ‘limpeza”<br />

da música sertaneja daqueles ele<strong>me</strong>ntos de rusticidade que ainda a<br />

identificavam com o mundo caipira.” 118<br />

relação amorosa entre os casais e com isso, o sertão já não desponta mais<br />

como um universo pertencente a um todo. Nesse sentido, a vida simples<br />

e de raiz do caipira sai de cenário para dar lugar a saudade do sertão, a<br />

cidade e s<strong>eu</strong>s fuscões pretos cheirando a álcool e depois as doces amadas,<br />

que <strong>agora</strong> se tornaram a alegria, o conto de fadas e a fantasia.<br />

Ainda em 1970, uma outra experiência para cooptar um público Com o passar dos anos, as temáticas da música sertaneja<br />

mais amplo ocorr<strong>eu</strong> por iniciativa do maestro Rogério Du<strong>pra</strong>t, que romântica foram se tornando mais urbanas, sendo muitas delas<br />

tinha planos de criar uma moda country a ser lançada na FENIT (Feira inspiradas nos fil<strong>me</strong>s de bang-bang ítalo-a<strong>me</strong>ricanos. A imagem<br />

da Indústria Textil de São Paulo). Nesta, o maestro do Tropicalismo dos cantores também sofreram mudanças radicais. Neste cenário, o<br />

procurou inaugurar um movi<strong>me</strong>nto denominado por ele de “Nhô Look” cavalo foi substituído por motocicletas e os antigos ternos listrados<br />

cuja intenção era incorporar à música sertaneja novas sonoridades,<br />

e em desalinho trocados por roupas de cowboy estadunidense.<br />

novos instru<strong>me</strong>ntos e arranjos, visando a conquistar um público<br />

Como um dos remanescentes da Jovem Guarda, o cantor<br />

de classe média urbana até então<br />

e compositor Sérgio Reis, em<br />

refratário a esse estilo de música<br />

1973, gravou diversos discos pela<br />

popular. Com isso, Rogério Du<strong>pra</strong>t<br />

pretendia,<br />

RCA, com canções clássicas do<br />

repertório sertanejo mas dando-lhes<br />

um novo trata<strong>me</strong>nto. Sérgio Reis<br />

[...] promover uma certa<br />

socialização do gosto musical<br />

utilizou instru<strong>me</strong>ntos eletrônicos<br />

através da introdução de<br />

e preocupou-se em consolidar um<br />

ele<strong>me</strong>ntos que pudessem<br />

transformar aquele tipo<br />

de canção num produto<br />

estilo de interpretação com sotaque<br />

urbano corrigindo os eventuais<br />

consumível por seg<strong>me</strong>ntos<br />

“erros” de português contidos nas<br />

sociais médios ou <strong>me</strong>smo<br />

de elite. Propunha, portanto,<br />

letras originais. Embora regravando<br />

uma “música de <strong>me</strong>diação”,<br />

canções do repertório tradicional,<br />

ou seja, um tipo de música<br />

capaz de ser aceito tanto pelo<br />

s<strong>eu</strong> público tradicional como<br />

como por exemplo a música<br />

“Menino da Porteira”, ele passou a<br />

pelo de MPB. interpretá-las com um registro vocal<br />

117<br />

Figura 9 – Gravação de Sérgio Reis para o programa Mosaicos – TV Cultura – s/d.<br />

FONTE: http://sergioreis.uol.com.br/ho<strong>me</strong>.asp. Acesso em: 25 de abr. de 2010<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 264<br />

| História | 2011


mais próximo ao dos cantores de boleros e sem duetos. Vestido<br />

como um cowboy, Sérgio Reis transformou-se num dos precursores<br />

da moda country que veio a se consolidar nos anos 80 em todo o<br />

país. 120<br />

A partir deste contexto, co<strong>me</strong>çou a se definir uma certa<br />

seg<strong>me</strong>ntação da música sertaneja. De um lado, as duplas mais<br />

antigas e tradicionais passavam a ser identificadas com a “música<br />

sertaneja raiz”. De outro lado, as duplas intérpretes mais jovens,<br />

por se mostrarem mais predispostas às inovações, eram vistas<br />

como representantes da “música sertaneja romântica” ou “música<br />

sertaneja jovem”. 121<br />

Gradativa<strong>me</strong>nte, os artistas sertanejos foram ampliando os<br />

s<strong>eu</strong>s espaços nos <strong>me</strong>ios de comunicação de massas. Os programas<br />

exclusivos desse seg<strong>me</strong>nto se multiplicaram na televisão e nas<br />

rádios, e o cinema também passou a ser um novo campo de<br />

intervenção desses artistas. A dupla Tonico e Tinoco, por exemplo,<br />

chegou a atuar em diversos fil<strong>me</strong>s ao longo de sua carreira e o cantor<br />

Sérgio Reis participou, com relativo sucesso, dos fil<strong>me</strong>s “Menino<br />

da Porteira” e “Mágoa de Boiadeiro”, o que contribuiu para ampliar<br />

ainda mais a vendagem de s<strong>eu</strong>s discos. Seguindo esse seg<strong>me</strong>nto, a<br />

dupla Milionário e José Rico também teve participação significativa<br />

no cinema. Dentre os diversos fil<strong>me</strong>s que realizaram destaca-se a<br />

produção de 1979 dirigida por Nelson Pereira dos Santos intitulada<br />

“Estrada da Vida.” 122<br />

Assim, foi que nos anos 80 a nova música sertaneja se consolidou,<br />

uma vez que:<br />

A explosão das vendas fez com que as grandes gravadoras se<br />

interessassem ainda mais pelo gênero. Polygram, Sony Music,<br />

Warner e BMG – Ariola, passaram a disputar os grandes astros<br />

sertanejos e investir pesado em novos lança<strong>me</strong>ntos. Aos poucos,<br />

esse tipo de canção popular passou a conquistar novos espaços<br />

como trilhas de telenovelas, estações de rádio de FM, musicais<br />

especiais de televisão e as grandes casas de espetáculos de São<br />

Paulo e Rio de Janeiro. 123<br />

A partir desse mo<strong>me</strong>nto, co<strong>me</strong>çaram a se definir novas tendências<br />

da música sertaneja. Uma delas foi a que culminou num seg<strong>me</strong>nto<br />

que garantiu elevados índices de vendagem de discos a partir dos<br />

anos 80 com as duplas Chitãozinho e Xororó, Zezé di Camargo e<br />

Luciano, Leandro e Leonardo, Gian e Giovani, dentre outras duplas<br />

de sucesso. Estes são artistas que produziam o “sertanejo pop”,<br />

“sertanejo romântico” ou “neo-sertanejo”, que eram dirigidos a um<br />

público suscetível à modernização da música sertaneja, a qual está<br />

viva até os dias atuais. 124<br />

Figura 10 – Show de Zezé Di Camargo e Luciano - Olimpia - 2009<br />

FONTE: musica.uol.com.br/ultnot/2010/03/01/para-fas-... Acesso em: 15 de mai. de 2010<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 265<br />

| História | 2011


Figura 11 – Show de Zezé Di Camargo e Luciano em Manaus - 2010<br />

FONTE: liquidamanaus2010.wordpress.com. Acesso em: 15 de mai. De 2010<br />

Em termos gerais pode-se dizer que estes novos estilos de<br />

sertanejo apresentam as seguintes características:<br />

[...] vozes bem casadas,[...] com o <strong>me</strong>smo tipo de pronúncia, ataque<br />

e entonação vocal; [...] aguda e alta. [...] o nível de glissando (quando<br />

a voz desliza de uma nota para outra), que se intensifica de pouco no<br />

exemplo raiz, para algum no exemplo de transição e proeminente no<br />

exemplo de música sertaneja romântica [pois], o glissando possibilita<br />

uma maior fluência da <strong>me</strong>lodia, que na música sertaneja romântica tem<br />

contorno ondulado, sendo própria para a exaltação senti<strong>me</strong>ntal [...]. 125<br />

Portanto, por um lado existe um contexto histórico, com a inserção<br />

de práticas musicais populares no formato co<strong>me</strong>rcial, refletindo e<br />

<strong>me</strong>diando a trajetória cultural e migrante do sertão para a cidade; por<br />

outro lado há um contexto estrita<strong>me</strong>nte musical, com a utilização e<br />

valorização de um estilo vocal característico, com demandas técnicas<br />

específicas. Música sertaneja não é “artística” mas é arte, porque<br />

bonita, segundo os padrões de avaliação de s<strong>eu</strong> público. Arte no<br />

sentido de cuidado, perícia e sensibilidade específica ao lidar com a<br />

voz. Arte no sentido do domínio de um repertório e na capacidade de<br />

incorporar novas sonoridades ao gênero. Tudo isso sem deixar de lado<br />

o s<strong>eu</strong> conteúdo, compro<strong>me</strong>tido com os arquétipos relacionados com<br />

a <strong>me</strong>mória longa e expressos nas letras que tratam da sobrevivência<br />

humana, seja nas letras “raiz” que apontam para uma sociabilidade rural<br />

coletiva, e seja nas letras “românticas” que tratam da sociabilidade<br />

urbana e individualista. 126<br />

CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />

No transcorrer desta pesquisa, o foco principal esteve<br />

direta<strong>me</strong>nte ligado à música caipira e à música sertaneja, explorando<br />

também s<strong>eu</strong>s ele<strong>me</strong>ntos específicos e o universo simbólico que<br />

per<strong>me</strong>ia esses dois estilos musicais. Ao concentrar a pesquisa no<br />

enfoque da música caipira de raiz, perceb<strong>eu</strong>-se que hoje ela não é<br />

a <strong>me</strong>sma, pois o mundo tradicional do sertão foi aos poucos sendo<br />

cooptado pelos “encantos” da modernização, trazendo junto os<br />

interesses individuais; no caso específico da música caipira, o s<strong>eu</strong><br />

estilo musical ced<strong>eu</strong> o lugar para a música sertaneja romântica,<br />

devido as exigências do <strong>me</strong>rcado fonográfico, permitindo que o<br />

espaço onde se mantinham as suas tradições e as suas raízes fosse<br />

descaracterizado.<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 266<br />

| História | 2011


As sociedades ao vivenciarem a “cultura do descartável”<br />

possibilitaram que essa raiz ficasse fragilizada. Assim como uma árvore<br />

precisa da chuva para não morrer, a música caipira também necessita<br />

desse cuidado. Nos dias de hoje, essa música não está sendo mais<br />

regada, já não é mais sentida e valorizada como era há muito tempo.<br />

Os relatos de algumas duplas caipiras re<strong>me</strong>teram ao mundo de<br />

transição entre o campo e a cidade e durante a exposição de s<strong>eu</strong>s<br />

senti<strong>me</strong>ntos, constatou-se que a vida da música caipira de raiz está<br />

<strong>pra</strong>tica<strong>me</strong>nte enterrada, pois as temáticas que a caracterizavam já<br />

não existem mais, afinal o campo não chama tanta atenção quanto o<br />

espaço urbano. Não se fala mais do cheiro do mato, da galinha caipira,<br />

do anoitecer e amanhecer na roça ou dos bichos do sertão. E onde<br />

se encontra o rancho a beira de um rio? Os passarinhos cantando e<br />

alegrando o sertão? As letras que eram inspiradas pela vida no campo?<br />

Agora só restou a saudade daqueles “tempos” simples, puros e<br />

transparentes, “tempos” esses que mudaram e o que era apreciado lá<br />

no campo, se perd<strong>eu</strong>, pois não há mais tempo, muito <strong>me</strong>nos paciência<br />

para ouvir e sentir a vida lá do sertão. E rompidos os laços com o<br />

<strong>me</strong>io rural tradicional, o <strong>me</strong>rcado fonográfico, os interesses do <strong>me</strong>io<br />

urbano cada vez mais deixaram de lado aquela cultura que era vivida<br />

no campo, para dar lugar à vida anônima e solitária nas cidades.<br />

É preciso valorizar a música e a cultura caipira, para que estas<br />

despertem nas futuras gerações o senti<strong>me</strong>nto de saudade do campo<br />

e do mato, dos passeios de canoa, das festanças, das danças, para<br />

que estas valorizem o solo que estão pisando, pois, de uma forma<br />

ou de outra é o solo de uma terra que por muito tempo foi “regada”<br />

pela cultura caipira, mas que se desnorteou ao longo dos anos com os<br />

avanços e novas criações humanas.<br />

Diante destas consi<strong>dera</strong>ções, cabe aqui lembrar que, durante<br />

o transcorrer deste trabalho, constatou-se que a música caipira e a<br />

música sertaneja possuem suas diferenças, sendo que a música caipira<br />

como raiz, é um estilo musical que possui objetivos específicos, os quais<br />

estão pautados no interior de uma coletividade destituída de interesses<br />

co<strong>me</strong>rciais e financeiros, e tais objetivos são concretizados enquanto<br />

forma de tradição da cultura caipira. No entanto, a apropriação deste<br />

estilo musical, originou a música sertaneja romântica, que de certa<br />

forma descaracterizou a música de raiz, ao ter por um único objetivo, a<br />

venda das músicas por <strong>me</strong>io do <strong>me</strong>rcado fonográfico.<br />

Por fim, a temática música caipira apresenta um terreno fértil para<br />

que futura<strong>me</strong>nte sejam desenvolvidos e aprofundados novos estudos,<br />

sobre esta cultura de raiz inserida no cenário brasileiro que nos motiva<br />

a ir <strong>agora</strong> para um lugar todinho nosso, buscar uma rede preguiçosa<br />

para deitar e ter em volta uma sinfonia de pardais cantando para a<br />

majestade, o sabiá.<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 267<br />

| História | 2011


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doc.<br />

Notas de rodapé<br />

1 SANTOS. ap. NEPOMUCENO, Rosa. Música caipira: da roça ao rodeio. São Paulo: 34, 1999. p. 99.<br />

2 Elpídio dos Santos foi músico, tocador de violão, criador de valsas, sambas e dobrados. Era sempre requisitado por Mazzaropi para produzir<br />

músicas-tema de s<strong>eu</strong>s fil<strong>me</strong>s. Elpídio contribuiu com sua música para a formação e o enriqueci<strong>me</strong>nto de um repertório ao <strong>me</strong>smo tempo caipira<br />

e diversificado que pode ser compreendido como uma reflexão acerca da identidade em transformação, numa época marcada pelo intenso<br />

êxodo rural.<br />

3 MARTINS, José de Souza. Viola Quebrada. In: Revista Debate & Crítica. São Paulo: Hucitec Ltda, n.4, 1974. p. 23-47<br />

4 TEIXEIRA, Renato. Rapaz Caipira. In: Renato Teixeira & Pena Branca e Xavantinho ao vivo em Tatuí. Rio de Janeiro: Kuarup, 1992. KCD-53.<br />

5 WEBER. ap. BACZKO, Bronislaw. Imaginação Social. In: Enciclopédia Einaudi. Lisboa: Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1985. p. 307.<br />

6 VELOSO, Mônica P. O Modernismo e a questão nacional. In: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucilia de A.N. (org.). O Brasil Republicano: O<br />

tempo do liberalismo excludente. 2. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006. p. 356-357.<br />

7 HOBSBAWM, Eric; RANGER, Terence. A invenção das tradições. São Paulo: Paz e Terra,1997. p.9.<br />

8 HERMANN, Jacqueline. Religião e política no alvorecer da República: os movi<strong>me</strong>ntos de Juazeiro, Canudos e Contestado. In: FERREIRA,<br />

Jorge (org.). O tempo do liberalismo excludente: da Proclamação da República à Revolução de 1930. 2.ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira;<br />

2006. p. 126.<br />

9 GEERTZ, Clifford. Interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: Zahar, 1978. p. 56.<br />

10 BERGER, Peter L.; LUCKMAN, Thomas. A construção social da realidade. 22. ed. Petrópolis: Vozes, 1985. p. 140.<br />

11 CHARTIER, Roger. Por uma sociologia histórica das práticas culturais. In:_____. A História Cultural: Entre práticas e representações. Rio de<br />

Janeiro: Bertrand Brasil, 1990. p. 245.<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 271<br />

| História | 2011


12 id. ibid., p. 17.<br />

13 id. ibid., p. 18.<br />

14 BOSI, Alfredo. Plural, mas não caótico. In:_____. Cultura brasileira: temas e situações. São Paulo: Ática, 1987. p. 11.<br />

15 ARANTES, Antonio Augusto. O que é Cultura Popular. 3. ed. São Paulo: Brasiliense, 1982. p. 7.<br />

16 BACZKO, Bronislaw. Imaginação Social... op.cit. p. 311.<br />

17 BACZKO, Bronislaw. Imaginação Social... op.cit. p. 309.<br />

18 NEPOMUCENO, Rosa. Música caipira: da roça ao rodeio. São Paulo: 34, 1999. p. 58.<br />

19 id. ibid., p. 58-59.<br />

20 Chico Lobo foi influenciado no gosto pela música por s<strong>eu</strong> pai seresteiro e pelo avô “multi instru<strong>me</strong>ntalista”, maestro de banda. E pelas<br />

“Folias de Reis“ que ainda freqüentam sua casa. Optou pela música como modo de vida, objetivando divulgar e ampliar o público para a <strong>viola</strong><br />

caipira.<br />

21 LOBO. ap. NEPOMUCENO, Rosa. Música caipira... id. ibid., p. 61.<br />

22 NEPOMUCENO. id. ibid., p. 59.<br />

23 id. ibid., p. 61-62.<br />

24 id. ibid., p. 63.<br />

25 id. ibid., p. 66-67.<br />

26 BOLDRIN, Rolando. Vide, Vida Marvada. In: Renato Teixeira & Pena Branca e Xavantinho ao vivo em Tatuí. Rio de Janeiro: Kuarup, 1992.<br />

KCD-53.<br />

27 MELLO E SOUZA, Laura de. Desclassificados do ouro: a pobreza mineira no século XVIII. 2. ed. Rio de Janeiro: Graal, 1986. p. 2.<br />

28 LEONTSINIS, Alexandre P. O tupi, nossa linguagem ecológica. Rio de Janeiro: Biblioteca Stassa Leontsinis, 1992. p. 231.<br />

29 BACZKO, Bronislaw. Imaginação Social... op. cit. p. 298.<br />

30 CÂMARA CASCUDO, Luiz. Dicionário do folclore brasileiro. São Paulo: Melhora<strong>me</strong>nto, 1979. p. 175-76.<br />

31 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio século XXI: O dicionário da língua portuguesa. 3. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,<br />

1999. p. 364.<br />

32 PIRES, C. ap. Brandão. Conversas ao pé do fogo. São Paulo: Fac. Similar, 1983. p. 11.<br />

33 HOBSBAWM, Eric; RANGER,T. A invenção das tradições.São Paulo:Paz e Terra, 1997. p. 14.<br />

34 TRINDADE, Etelvina Maria de Castro; ANDREAZZA, Maria Luiza. Cultura e educação no Paraná. Curitiba: SEED, 2001. p. 16<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 272<br />

| História | 2011


35 CHMYZ. ap. TRINDADE, Etelvina Maria de Castro; ANDREAZZA, Maria Luiza. Cultura e educação no Paraná. Curitiba: SEED, 2001. p. 16.<br />

36 SAINT-HILAIRE. Viagem à Província de São Paulo. Editora: Livraria Martins. São Paulo: 1972. p. 95.<br />

37 CHAVES, Edilson. A música Caipira em Aulas De História: Questões e Possibilidades. 2006. Curitiba. Disponível em: http://www.ppg<strong>eu</strong>fpr.pr.gov.br/arquivos/file/dissertacoes_2006/2006_chaves.pdf.<br />

Acesso: 19 de mar. de 2010.<br />

38 id. ibid., Acesso em: 19 de mar. de 2010.<br />

39 id. ibid., Acesso em: 19 de mar. de 2010.<br />

40 BRANDÃO, Carlos R. ap. Disponível em: http://screamyell.com.br/outros/monografia_mac.pdf. p. 19. (Faculdade Estadual de Filosofia,<br />

Ciências e Letras de Jacarezinho)<br />

41 MONTEIRO, Ana C. M.; FERNANDES, CARLOS E.; Costa, Marcelo S. Do Caipira ao Sertanejo: Cultura, Música e Indústria Cultural. São<br />

Paulo,1998. Monografia (Bacharelado em Publicidade e Propaganda). Setor de Comunicação Social, <strong>Universidade</strong> de Taubaté. p. 19. Disponível<br />

em: http://screamyell.com.br/outros/monografia_mac.pdf. Acesso em: 22 de mar. de 2010.<br />

42 id. ibid., p.19.<br />

43 id. ibid., p.19.<br />

44 ZAN, José Roberto. Do êxodo rural à indústria cultural. (Entrevista). Disponível em: www.unicamp.br/unicamp/Jornal da Unicamp. Acesso<br />

em: 25 de mar de 2010.<br />

45 O caipira é uma denominação tipica<strong>me</strong>nte paulista. Nascida da pri<strong>me</strong>ira miscigenação entre o branco e o índio. “Kaai ‘pira” na língua indígena<br />

significa, o que vive afastado, (“Kaa”-mato) (“Pir” corta mata) e (“pira”- peixe)”. O falar errado do caipira não é proposital (...).<br />

46 DONADIO, Vanda Catarina. O caipira. Disponível em: http://www.<strong>viola</strong>tropeira.com.br/origem.htm. Acesso em: 25 de mar. de 2010.<br />

47 TEIXEIRA, Renato. Amanhec<strong>eu</strong>, Peguei a Viola. In: Renato Teixeira & Pena Branca e Xavantinho ao vivo em Tatuí. Rio de Janeiro: Kuarup,<br />

1992. KCD-53.<br />

48 ANDRADE, Tom; MANUELITO.Quebra de Milho.In: Renato Teixeira & Pena Branca e Xavantinho ao vivo em Tatuí. Rio de Janeiro: Kuarup,<br />

1992. KCD-53.<br />

49 HOBSBAWM, Eric. A invenção das tradições... op. cit. p. 10.<br />

50 Em que um cantor canta em um tom mais grave, mais conhecida como segunda voz, e o outro canta três notas acima da voz mais grave,<br />

fazendo então, a nota mais aguda.<br />

51 ULHÔA, Martha T. Música Sertaneja em Uberlândia na década de 1990. In: Revista Artcultura, nº 9, 2004. Uberlândia: <strong>Universidade</strong> Fe<strong>dera</strong>l<br />

de Uberlândia, Instituto de História. p. 58.<br />

52 ULHÔA, Martha T. Música Sertaneja em Uberlândia... id. ibid., p. 58.<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 273<br />

| História | 2011


53 MONTEIRO, Ana C. M.; FERNANDES, CARLOS E.; Costa, Marcelo S. Do Caipira ao Sertanejo...op. cit. p.19. Disponível em: http://screamyell.com.br/outros/monografia_mac.pdf.<br />

Acesso em: 29 de mar. de 2010.<br />

54 HOLANDA, Sérgio Buarque. O Se<strong>me</strong>ador e o ladrilhador. In. Raízes do Brasil. 26ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p.101.<br />

55 Os portugueses, esses criavam todas as dificuldades às entradas terra adentro, receosos de que com isso se despovoasse a marinha. No<br />

regi<strong>me</strong>nto do pri<strong>me</strong>iro governador-geral do Brasil, Tomé de Souza, estipula-se, expressa<strong>me</strong>nte, que pela terra fir<strong>me</strong> adentro não vá tratar pessoa<br />

alguma sem licença especial do governador ou do provedor-mor da fazenda rela, acrescentando-se ainda que tal licença não se dará, senão<br />

a pessoa que possa ir “ao bom recado e que de sua ida e tratos se não seguirá prejuízo algum.<br />

56 QUEIROZ, Renato da Silva. Caipiras Negros no Vale do Ribeira. São Paulo: Edusp, 1983.<br />

57 PIRES, Cornélio. Conversas ao pé do fogo. IMESP. Ed. Fac-similar, 1984.<br />

58 MONTEIRO, Ana C. M.; FERNANDES, CARLOS E.; Costa, Marcelo S. Do Caipira ao Sertanejo... op. cit. p. 23.<br />

59 id. ibid., p. 23.<br />

60 id. ibid., p. 23.<br />

61 CHARTIER, Roger. Por uma sociologia histórica das práticas culturais. In:_____. A História Cultural: Entre práticas e representações. Rio de<br />

Janeiro: Bertrand Brasil, 1990. p. 17.<br />

62 CHARTIER, Roger. A História Cultural... op. cit. p. 22.<br />

Monografias - <strong>Universidade</strong> Tuiuti do Paraná 274<br />

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