Pensar é transgredir
Pensar é transgredir Pensar é transgredir
determinadas – feito hâmsteres que se alimentam de sua própria agitação. Ficar sossegado é perigoso: pode parecer doença. Recolher-se em casa ou dentro de si mesmo, ameaça quem leva um susto cada vez que examina sua alma. Estar sozinho é considerado humilhante, sinal de que não se arrumou ninguém – como se amizade ou amor se “arrumasse” em loja. Com relação a homem pode até ser libertário: enfim só, ninguém pendurado nele controlando, cobrando, chateando. Enfim, livre! Mulher, não. Se está só, em nossa mente preconceituosa é sempre porque está abandonada: ninguém a quer. Além do desgosto pela solidão, temos horror à quietude. Logo pensamos em depressão: quem sabe terapia e antidepressivo? Criança que não brinca ou salta nem participa de atividades frenéticas está com algum problema. O silêncio nos assusta por retumbar no vazio dentro de nós. Quando nada se move nem faz barulho, notamos as frestas pelas quais nos espiam coisas incômodas e mal resolvidas, ou se enxerga outro ângulo de nós mesmos. Nos damos conta de que não somos apenas figurinhas atarantadas correndo entre casa, trabalho e bar, praia ou campo. _________________________ Lya Luft – Pensar é transgredir 37
Existe em nós, geralmente nem percebido e nada valorizado, algo além desse que paga contas, transa, ganha dinheiro, e come, envelhece, e um dia (mas isso é só para os outros!) vai morrer. Quem é esse que afinal sou eu? Quais seus desejos e medos, seus projetos e sonhos? No susto que essa idéia provoca, queremos ruído, ruídos. Chegamos em casa e ligamos a televisão antes de largar a bolsa ou pasta. Não é para assistir a um programa: é pela distração. Mas, se a gente aprende a gostar um pouco de sossego, descobre – em si e no outro – regiões nem imaginadas, questões fascinantes e não necessariamente ruins. Nunca esqueci a experiência de quando alguém botou a mão no meu ombro de criança e disse: – Fica quietinha, um momento só, escuta a chuva chegando. E ela chegou: intensa e lenta, tornando tudo singularmente novo. A quietude pode ser como essa chuva: nela a gente se refaz para voltar mais inteiro ao convívio, às tantas frases, às tarefas, aos amores. Então, por favor, me dêem isso: um pouco de silêncio bom para que eu escute o vento nas folhas, a chuva _________________________ Lya Luft – Pensar é transgredir 38
- Page 2 and 3: _________________________ Lya Luft
- Page 4 and 5: Copyright © Lya Luft, 2004 Projeto
- Page 6 and 7: 25. Não somos santas 26. A velhinh
- Page 8 and 9: Não inventei ao dizer que meu leit
- Page 10 and 11: - Eu ia dizer que você me faz “m
- Page 12 and 13: _________________________ Lya Luft
- Page 14 and 15: Alegre. A gente passava de carro so
- Page 16 and 17: Que se começo a chorar sem motivo
- Page 18 and 19: _________________________ Lya Luft
- Page 20 and 21: no urso de pelúcia e prosseguir, n
- Page 22 and 23: _________________________ Lya Luft
- Page 24 and 25: - Não, filho, Deus fez brotar a se
- Page 26 and 27: _________________________ Lya Luft
- Page 28 and 29: O que sonha, na redoma da sua desme
- Page 30 and 31: _________________________ Lya Luft
- Page 32 and 33: Que seja vital: isso me parece uma
- Page 34 and 35: _________________________ Lya Luft
- Page 36 and 37: Meu pai se droga, minha mãe se pro
- Page 40 and 41: nas lajes, e tudo o que fala muito
- Page 42 and 43: Use-o para pesquisar, para se comun
- Page 44 and 45: _________________________ Lya Luft
- Page 46 and 47: Juntos fazem a vida valer a pena -
- Page 48 and 49: Depois de ler num congresso de escr
- Page 50 and 51: _________________________ Lya Luft
- Page 52 and 53: Os dois sabíamos aonde ia levar aq
- Page 54 and 55: _________________________ Lya Luft
- Page 56 and 57: indevidas cobranças, entender que
- Page 58 and 59: asileira quanto minha amiguinha Ros
- Page 60 and 61: _________________________ Lya Luft
- Page 62 and 63: - Mas ninguém tem a originalidade
- Page 64 and 65: _________________________ Lya Luft
- Page 66 and 67: Há pouco veio me falar, com olhos
- Page 68 and 69: perdas forma em parte a nossa human
- Page 70 and 71: _________________________ Lya Luft
- Page 72 and 73: Criar personagens trágicos não si
- Page 74 and 75: Corte, mas algumas davam cursos pú
- Page 76 and 77: Questionar é um bom começo. Para
- Page 78 and 79: “Não conta pra sua mãe que queb
- Page 80 and 81: fiquei um pouco aliviada: os meus p
- Page 82 and 83: antigos. A Idade Média. As Cruzada
- Page 84 and 85: _________________________ Lya Luft
- Page 86 and 87: Por que uma velha dama não pode mo
Existe em nós, geralmente nem percebido e nada<br />
valorizado, algo al<strong>é</strong>m desse que paga contas, transa,<br />
ganha dinheiro, e come, envelhece, e um dia (mas isso<br />
<strong>é</strong> só para os outros!) vai morrer. Quem <strong>é</strong> esse que<br />
afinal sou eu? Quais seus desejos e medos, seus<br />
projetos e sonhos?<br />
No susto que essa id<strong>é</strong>ia provoca, queremos ruído,<br />
ruídos.<br />
Chegamos em casa e ligamos a televisão antes de<br />
largar a bolsa ou pasta. Não <strong>é</strong> para assistir a um<br />
programa: <strong>é</strong> pela distração.<br />
Mas, se a gente aprende a gostar um pouco de<br />
sossego, descobre – em si e no outro – regiões nem<br />
imaginadas, questões fascinantes e não<br />
necessariamente ruins.<br />
Nunca esqueci a experiência de quando algu<strong>é</strong>m botou<br />
a mão no meu ombro de criança e disse:<br />
– Fica quietinha, um momento só, escuta a chuva<br />
chegando.<br />
E ela chegou: intensa e lenta, tornando tudo<br />
singularmente novo. A quietude pode ser como essa<br />
chuva: nela a gente se refaz para voltar mais inteiro ao<br />
convívio, às tantas frases, às tarefas, aos amores.<br />
Então, por favor, me dêem isso: um pouco de silêncio<br />
bom para que eu escute o vento nas folhas, a chuva<br />
_________________________<br />
Lya Luft – <strong>Pensar</strong> <strong>é</strong> <strong>transgredir</strong><br />
38