Pensar é transgredir
Pensar é transgredir Pensar é transgredir
O que sonha, na redoma da sua desmemória? Quando inventa palavras, o que realmente quer dizer... ou não quer dizer mais nada? Embora dominada pela enfermidade que lhe trava cérebro e corpo, ela resiste ao tempo e ao meu desejo de ao menos mais algum contato – resiste até mesmo à morte. Às vezes eu a pressinto, a Senhora Morte, à espreita num canto do aposento. Preguiçosa ou cruel, lixa as longas unhas roxas e cobre a cara com seus cabelos brancos de melancólica Rapunzel.Tem tempo, sabe esperar – espera demais. Aconchegada na sua cápsula do tempo, da última vez que estive com a velha dama, ela, que há muito não falava, entreabriu os olhos e disse baixinho para si mesma, para alguém – para ninguém: – Que bom estar assim, tão leve e tão jovem. E voltou a enrolar-se no xale do seu enigma. Um dia finalmente a Senhora Morte há de se compadecer: sem dor nem alarde soprará a chamazinha tênue, fechando a última porta desse corredor demasiado, e levará consigo essa que apenas perdura. Mas o riso alegre, o passo enérgico, o perfume, a voz – e aquelas rosas – permanecerão comigo: imagens _________________________ Lya Luft – Pensar é transgredir 27
inapagáveis de quem na verdade já partiu, mesmo que ainda não tenham baixado todas as cortinas. _________________________ Lya Luft – Pensar é transgredir 28
- Page 2 and 3: _________________________ Lya Luft
- Page 4 and 5: Copyright © Lya Luft, 2004 Projeto
- Page 6 and 7: 25. Não somos santas 26. A velhinh
- Page 8 and 9: Não inventei ao dizer que meu leit
- Page 10 and 11: - Eu ia dizer que você me faz “m
- Page 12 and 13: _________________________ Lya Luft
- Page 14 and 15: Alegre. A gente passava de carro so
- Page 16 and 17: Que se começo a chorar sem motivo
- Page 18 and 19: _________________________ Lya Luft
- Page 20 and 21: no urso de pelúcia e prosseguir, n
- Page 22 and 23: _________________________ Lya Luft
- Page 24 and 25: - Não, filho, Deus fez brotar a se
- Page 26 and 27: _________________________ Lya Luft
- Page 30 and 31: _________________________ Lya Luft
- Page 32 and 33: Que seja vital: isso me parece uma
- Page 34 and 35: _________________________ Lya Luft
- Page 36 and 37: Meu pai se droga, minha mãe se pro
- Page 38 and 39: determinadas - feito hâmsteres que
- Page 40 and 41: nas lajes, e tudo o que fala muito
- Page 42 and 43: Use-o para pesquisar, para se comun
- Page 44 and 45: _________________________ Lya Luft
- Page 46 and 47: Juntos fazem a vida valer a pena -
- Page 48 and 49: Depois de ler num congresso de escr
- Page 50 and 51: _________________________ Lya Luft
- Page 52 and 53: Os dois sabíamos aonde ia levar aq
- Page 54 and 55: _________________________ Lya Luft
- Page 56 and 57: indevidas cobranças, entender que
- Page 58 and 59: asileira quanto minha amiguinha Ros
- Page 60 and 61: _________________________ Lya Luft
- Page 62 and 63: - Mas ninguém tem a originalidade
- Page 64 and 65: _________________________ Lya Luft
- Page 66 and 67: Há pouco veio me falar, com olhos
- Page 68 and 69: perdas forma em parte a nossa human
- Page 70 and 71: _________________________ Lya Luft
- Page 72 and 73: Criar personagens trágicos não si
- Page 74 and 75: Corte, mas algumas davam cursos pú
- Page 76 and 77: Questionar é um bom começo. Para
O que sonha, na redoma da sua desmemória? Quando<br />
inventa palavras, o que realmente quer dizer... ou não<br />
quer dizer mais nada?<br />
Embora dominada pela enfermidade que lhe trava<br />
c<strong>é</strong>rebro e corpo, ela resiste ao tempo e ao meu desejo<br />
de ao menos mais algum contato – resiste at<strong>é</strong> mesmo<br />
à morte.<br />
Às vezes eu a pressinto, a Senhora Morte, à espreita<br />
num canto do aposento. Preguiçosa ou cruel, lixa as<br />
longas unhas roxas e cobre a cara com seus cabelos<br />
brancos de melancólica Rapunzel.Tem tempo, sabe<br />
esperar – espera demais.<br />
Aconchegada na sua cápsula do tempo, da última vez<br />
que estive com a velha dama, ela, que há muito não<br />
falava, entreabriu os olhos e disse baixinho para si<br />
mesma, para algu<strong>é</strong>m – para ningu<strong>é</strong>m:<br />
– Que bom estar assim, tão leve e tão jovem.<br />
E voltou a enrolar-se no xale do seu enigma.<br />
Um dia finalmente a Senhora Morte há de se<br />
compadecer: sem dor nem alarde soprará a<br />
chamazinha tênue, fechando a última porta desse<br />
corredor demasiado, e levará consigo essa que apenas<br />
perdura.<br />
Mas o riso alegre, o passo en<strong>é</strong>rgico, o perfume, a voz<br />
– e aquelas rosas – permanecerão comigo: imagens<br />
_________________________<br />
Lya Luft – <strong>Pensar</strong> <strong>é</strong> <strong>transgredir</strong><br />
27