Pensar é transgredir
Pensar é transgredir Pensar é transgredir
– Não, filho, Deus fez brotar a sementinha direto em Nossa Senhora, foi um milagre. – Ué, então não foi como nas pessoas? Agora o silêncio podia ser cortado com faca. – Não, filho, não foi. – Ah... A mãe se fez de distraída, olhava pela janela, sentindo os outros passageiros aguçando o ouvido, como será que ela vai se sair dessa? O menino pensava concentrado. – Mãe, como é que antigamente, assim beeeem antigamente, no tempo dos dinossauros por exemplo, as primeiras pessoas sabiam como se fazia pra ter bebê, se não tinham ninguém pra ensinar pra elas? – Essas coisas a natureza ensina. – Mas a natureza não é pessoa pra ensinar a gente... – Quer dizer, quando a gente cresce aprende por si. No olhar azul transparecia uma certa pena, quem sabe a mãe não era tão inteligente assim. O menino, generoso, resolveu mudar de assunto. – Mãe, olha, aí estava escrito rua Mozart. Será que ele mora aqui? – Ele quem, filho? _________________________ Lya Luft – Pensar é transgredir 23
– O MOZART, mãe, ora. Quem ia ser? – Não, filho, ele viveu na Europa. – Ah é? Até achei que era nos Estados Unidos. – Por que Estados Unidos? A mãe começava a se divertir, aliviada com aquele diálogo menos perigoso. – Ué, porque é lá que moram pessoas importantes, o presidente Kennedy e o Cyborg. – Ah... Finalmente desembarcaram; ainda segurando o pacote, o menino retomou seu ar sonhador. – Mãe, como eu tenho um pai bom, né? Mas aí pensou melhor, espiou de relance com arzinho maroto a mãe que levantava, sorrindo, um dedo em riste, e emendou bem depressa: – E mãe também, claro... _________________________ Lya Luft – Pensar é transgredir 24
- Page 2 and 3: _________________________ Lya Luft
- Page 4 and 5: Copyright © Lya Luft, 2004 Projeto
- Page 6 and 7: 25. Não somos santas 26. A velhinh
- Page 8 and 9: Não inventei ao dizer que meu leit
- Page 10 and 11: - Eu ia dizer que você me faz “m
- Page 12 and 13: _________________________ Lya Luft
- Page 14 and 15: Alegre. A gente passava de carro so
- Page 16 and 17: Que se começo a chorar sem motivo
- Page 18 and 19: _________________________ Lya Luft
- Page 20 and 21: no urso de pelúcia e prosseguir, n
- Page 22 and 23: _________________________ Lya Luft
- Page 26 and 27: _________________________ Lya Luft
- Page 28 and 29: O que sonha, na redoma da sua desme
- Page 30 and 31: _________________________ Lya Luft
- Page 32 and 33: Que seja vital: isso me parece uma
- Page 34 and 35: _________________________ Lya Luft
- Page 36 and 37: Meu pai se droga, minha mãe se pro
- Page 38 and 39: determinadas - feito hâmsteres que
- Page 40 and 41: nas lajes, e tudo o que fala muito
- Page 42 and 43: Use-o para pesquisar, para se comun
- Page 44 and 45: _________________________ Lya Luft
- Page 46 and 47: Juntos fazem a vida valer a pena -
- Page 48 and 49: Depois de ler num congresso de escr
- Page 50 and 51: _________________________ Lya Luft
- Page 52 and 53: Os dois sabíamos aonde ia levar aq
- Page 54 and 55: _________________________ Lya Luft
- Page 56 and 57: indevidas cobranças, entender que
- Page 58 and 59: asileira quanto minha amiguinha Ros
- Page 60 and 61: _________________________ Lya Luft
- Page 62 and 63: - Mas ninguém tem a originalidade
- Page 64 and 65: _________________________ Lya Luft
- Page 66 and 67: Há pouco veio me falar, com olhos
- Page 68 and 69: perdas forma em parte a nossa human
- Page 70 and 71: _________________________ Lya Luft
- Page 72 and 73: Criar personagens trágicos não si
– Não, filho, Deus fez brotar a sementinha direto em<br />
Nossa Senhora, foi um milagre.<br />
– U<strong>é</strong>, então não foi como nas pessoas?<br />
Agora o silêncio podia ser cortado com faca.<br />
– Não, filho, não foi.<br />
– Ah...<br />
A mãe se fez de distraída, olhava pela janela, sentindo<br />
os outros passageiros aguçando o ouvido, como será<br />
que ela vai se sair dessa?<br />
O menino pensava concentrado.<br />
– Mãe, como <strong>é</strong> que antigamente, assim beeeem<br />
antigamente, no tempo dos dinossauros por exemplo,<br />
as primeiras pessoas sabiam como se fazia pra ter<br />
bebê, se não tinham ningu<strong>é</strong>m pra ensinar pra elas?<br />
– Essas coisas a natureza ensina.<br />
– Mas a natureza não <strong>é</strong> pessoa pra ensinar a gente...<br />
– Quer dizer, quando a gente cresce aprende por si.<br />
No olhar azul transparecia uma certa pena, quem sabe<br />
a mãe não era tão inteligente assim. O menino,<br />
generoso, resolveu mudar de assunto.<br />
– Mãe, olha, aí estava escrito rua Mozart. Será que ele<br />
mora aqui?<br />
– Ele quem, filho?<br />
_________________________<br />
Lya Luft – <strong>Pensar</strong> <strong>é</strong> <strong>transgredir</strong><br />
23