Pensar é transgredir
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_________________________ Lya Luft – Pensar é transgredir 5 O menino e sua mãe Faz uns trinta anos, um menino e sua mãe voltavam das compras no ônibus quase vazio. Ele segurava no colo o presente cobiçado: um microscópio “de verdade”, dado pelo pai, mas a mãe fora com ele comprar. De vez em quando ele passava a mão no pacote: “Parece mentira né, mãe?” Olhar sonhador. No meio do trajeto houve então um desses diálogos inesquecíveis: – Mãe, que igreja é essa? – Nossa Senhora Auxiliadora. – Por que tem tanta Nossa Senhora? Não era só uma? – É uma sim, filho, mas ela tem muitos nomes. – E o Nosso Senhor é são Pedro, né? – Não, é Jesus, ora. Quem casou com ela foi são José. São Pedro era amigo de Jesus. A mãe Suspirou: não praticar religião em casa dava nisso. 21
– Ah... e por que o José não é o Nosso Senhor, se era casado com Nossa Senhora? Os olhos azuis, calmos mas interrogativos, começavam a deixar a mãe inquieta. – Acho que é porque Jesus e Nossa Senhora são mais importantes, filho. – Mas o José não era o pai dele? – Não era de verdade, o pai dele era Deus, José era pai adotivo. – Ah... Então Jesus não nasceu da sementinha do José? O silêncio no ônibus começava a se tornar imenso. O menino falava em voz alta e clara, pra ele era tudo natural, assim ensinavam em casa. A mãe pensou por um momento, por que a gente inventou isso de falar das coisas como se fossem naturais? E, embora se considerasse uma mulher razoavelmente moderna, com uma visão saudável da vida – que estava transmitindo aos filhos num tempo em que o tema não era tão francamente abordado –, naquela hora quase duvidou de que fossem assim tão naturais. Afinal, estavam em público. O menino a seu lado porém aguardava resposta, respostas. _________________________ Lya Luft – Pensar é transgredir 22
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Lya Luft – <strong>Pensar</strong> <strong>é</strong> <strong>transgredir</strong><br />
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O menino e sua mãe<br />
Faz uns trinta anos, um menino e sua mãe voltavam<br />
das compras no ônibus quase vazio.<br />
Ele segurava no colo o presente cobiçado: um<br />
microscópio “de verdade”, dado pelo pai, mas a mãe<br />
fora com ele comprar. De vez em quando ele passava<br />
a mão no pacote: “Parece mentira n<strong>é</strong>, mãe?” Olhar<br />
sonhador.<br />
No meio do trajeto houve então um desses diálogos<br />
inesquecíveis:<br />
– Mãe, que igreja <strong>é</strong> essa?<br />
– Nossa Senhora Auxiliadora.<br />
– Por que tem tanta Nossa Senhora? Não era só uma?<br />
– É uma sim, filho, mas ela tem muitos nomes.<br />
– E o Nosso Senhor <strong>é</strong> são Pedro, n<strong>é</strong>?<br />
– Não, <strong>é</strong> Jesus, ora. Quem casou com ela foi são Jos<strong>é</strong>.<br />
São Pedro era amigo de Jesus.<br />
A mãe Suspirou: não praticar religião em casa dava<br />
nisso.<br />
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