Pensar é transgredir
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_________________________ Lya Luft – Pensar é transgredir 48 Pensar é viver Não tenho nenhuma receita, nenhum facilitador para se entender a vida: ela é confusão mesmo. A gente avança no escuro, teimosamente, porque recuar não dá. Nesse labirinto a gente encontra o fio de um afeto, pontos de criatividade, explosões de pensamento ou ação que nos iluminem, por um momento que seja. Coisas que nos justifiquem enquanto seres humanos. Tenho talvez a ingenuidade de acreditar que tudo faz algum sentido, e que nós precisamos descobrir – ou inventá-lo. Qualquer pessoa pode construir a sua “filosofia de vida”. Qualquer pessoa pode acumular vida interior. Sem nenhuma conotação religiosa, mas ética: o que valho, e os outros, o que valem para mim? O que estou fazendo com a minha vida, o que pretendo com ela? Essa capacidade de refletir, ou de simplesmente aquietar-se para sentir, faz de nós algo além de cabides de roupas ou de idéias alheias. Sempre foi duro vencer o espírito de rebanho, mas esse conflito se tornou esquizofrênico: de um lado precisamos ser 177
como todo mundo, é importante adequar-se, ter seu grupo, pertencer; de outro lado é necessário preservar uma identidade e até impor-se, às vezes transgredir, para sobreviver. Discernir e escolher fica mais difícil, porque o excesso de informações nos atordoa, a troca de mitos nos esvazia, a variedade de solicitações nos exaure. Para ter algum controle de nossa vida é necessário descobrir quem somos ou queremos ser – à revelia dos modelos generalizantes. Dura empreitada, num momento em que tudo parece colaborar para que se aceitem modelos prontos para servir. Pensamento independente passou a ser excentricidade, quando não agressão. Família, escola e sociedade deviam desenvolver o distanciamento crítico e a capacidade de avaliar – e questionar – para poder escolher. Mas, embora a gente se pense tão moderno, não é o que acontece. Alunos (e filhos) questionadores podem ser um embaraço. Preferimos nos tornar membros da vasta confraria da mediocridade, que cultua o mais fácil, o mais divertido, o que todo mundo pensa ou faz, e abafa qualquer inquietação. Por sorte nossa, aqui e ali aquele olho da angústia mais saudável entreabre sua pesada pálpebra e nos encara irônico: como estamos vivendo a nossa vida, 178 _________________________ Lya Luft – Pensar é transgredir
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Lya Luft – <strong>Pensar</strong> <strong>é</strong> <strong>transgredir</strong><br />
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<strong>Pensar</strong> <strong>é</strong> viver<br />
Não tenho nenhuma receita, nenhum facilitador para<br />
se entender a vida: ela <strong>é</strong> confusão mesmo.<br />
A gente avança no escuro, teimosamente, porque<br />
recuar não dá. Nesse labirinto a gente encontra o fio<br />
de um afeto, pontos de criatividade, explosões de<br />
pensamento ou ação que nos iluminem, por um<br />
momento que seja. Coisas que nos justifiquem<br />
enquanto seres humanos.<br />
Tenho talvez a ingenuidade de acreditar que tudo faz<br />
algum sentido, e que nós precisamos descobrir – ou<br />
inventá-lo. Qualquer pessoa pode construir a sua<br />
“filosofia de vida”.<br />
Qualquer pessoa pode acumular vida interior. Sem<br />
nenhuma conotação religiosa, mas <strong>é</strong>tica: o que valho,<br />
e os outros, o que valem para mim? O que estou<br />
fazendo com a minha vida, o que pretendo com ela?<br />
Essa capacidade de refletir, ou de simplesmente<br />
aquietar-se para sentir, faz de nós algo al<strong>é</strong>m de<br />
cabides de roupas ou de id<strong>é</strong>ias alheias. Sempre foi<br />
duro vencer o espírito de rebanho, mas esse conflito<br />
se tornou esquizofrênico: de um lado precisamos ser<br />
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