Revista Atlântica de cultura ibero-americanat
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Nadie se olvida, Platko,<br />
no, nadie, nadie, nadie<br />
oso rubio <strong>de</strong> Hungría<br />
Ni el mar,<br />
que frente a ti saltaba<br />
sin po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>rte<br />
Ni la lluvia. Ni el viento,<br />
que era el que más regía<br />
Alberti escreveu esta o<strong>de</strong> a<br />
Platko após uma memorável partida<br />
entre bascos e catalães. Nesse<br />
dia, o guarda-re<strong>de</strong>s foi uma verda<strong>de</strong>ira<br />
muralha humana, um<br />
pára-raios, um polvo <strong>de</strong> mil tentáculos,<br />
um touro disposto a <strong>de</strong>ixar-se<br />
matar, mas não disposto a<br />
ver vencida a sua cerca. Em cima,<br />
em baixo, à direita, à esquerda,<br />
em todos os sítios estava Platko. E,<br />
mesmo sem sentidos, com a<br />
cabeça exausta, simulou, para não<br />
<strong>de</strong>ixar a bola na posse <strong>de</strong> ninguém,<br />
apertada como estava nos<br />
seus braços.<br />
A lista dos mágicos guarda-<br />
-re<strong>de</strong>s não é pequena. Ricardo<br />
Zamora, o «Divino», e Lev Yashin,<br />
a «aranha negra», são os primeiros<br />
da lista. E, no Peru, Juan Valdivieso,<br />
o inesquecível «Mago»,<br />
integra a história como o «genial<br />
pára-penalties» que num instante,<br />
em segundos, com a bola dominada<br />
entre as suas mãos, convertia<br />
a tristeza em alegria transbor-<br />
1 Texto lido no encontro <strong>de</strong> narradores e poetas organizado<br />
pela revista Ciberayllu, 9 <strong>de</strong> Agosto <strong>de</strong> 2005,<br />
na Casa <strong>de</strong> Mariátegui, em Lima.<br />
2 Poeta peruano que nasceu em Huancayo, em 1984,<br />
e morreu em Montevi<strong>de</strong>u, em 1925. Foi o criador do<br />
poli-ritmo, um canto dinâmico à vida. A epígrafe<br />
correspon<strong>de</strong> à sua «Loa al fútbol», inicialmente publicada<br />
como «Elogio lírico <strong>de</strong>l football», enquanto o seu canto a<br />
Gradín tem o título <strong>de</strong> «Polirritmo dinâmico a Gradín,<br />
jugador <strong>de</strong> fútbol». Ambos os trabalhos foram publicados<br />
na Antologia General <strong>de</strong> la Poesia Peruana, <strong>de</strong><br />
Alejandro Romualdo e Sebastián Salazar Bondy (1957).<br />
dante. Só com o olhar intimidava<br />
o atacante. Y a gozar se há dicho señores!<br />
Porque o futebol é antes <strong>de</strong><br />
tudo festa e diversão. Assim o<br />
sentiam os prestidigitadores da<br />
bola, assim o celebravam freneticamente<br />
as bancadas. Uma, duas,<br />
três evasivas, e aí vai a velha,<br />
como no bilhar, <strong>de</strong> um lado ao<br />
outro. E chegam os toques <strong>de</strong><br />
salão, o drible ziguezagueante pela<br />
direita, pela esquerda, o chapéu<br />
presunçoso, o túnel liquidador, o<br />
sonho do tacão, a majestosa chalaça.<br />
Um verda<strong>de</strong>iro trabalho <strong>de</strong><br />
joalharia. Aplausos, senhores, já<br />
aí vem o golo e, se não vem, que<br />
importa! A vista arregalou-se, a<br />
alegria transbordou e o estádio<br />
veio abaixo com a paixão <strong>de</strong>scontrolada<br />
da torcida.<br />
Quem não se <strong>de</strong>leitou com o<br />
trio Sotil-Perico-Cubillas, no<br />
Mundial <strong>de</strong> 70, no encontro com<br />
os seus pares brasileiros? Quem<br />
não recorda esse negrito vaidoso,<br />
Victor «Pitín» Zegarra, que,<br />
perante 40 mil almas, fazia o que<br />
queria com a bola? Ou, só para<br />
citar mais um nome, não nos<br />
inva<strong>de</strong> a nostalgia quando recordamos<br />
um Miguelito Loayza,<br />
borboleta <strong>de</strong> Surquillo, que com<br />
os seus truques e piruetas fez o<br />
que quis com os argentinos, brasileiros<br />
e uruguaios no Sul-Americano<br />
<strong>de</strong> 1959, para <strong>de</strong>pois, já<br />
3 Isabelino Gradín nasceu em Montevi<strong>de</strong>u a 8 <strong>de</strong> Julho<br />
<strong>de</strong> 1897 e faleceu a 21 <strong>de</strong> Dezembro <strong>de</strong> 1944. Foi um<br />
extraordinário jogador <strong>de</strong> futebol e o atleta mais rápido<br />
da América do Sul. Entre 1915 e 1921, jogou no Peñarol<br />
e, durante a primeira edição da Copa América,<br />
em 1916, na Argentina, foi um dos artífices das vitórias<br />
uruguaias que permitiriam a este país conquistar o título.<br />
Retirado do futebol, chegou a ser campeão<br />
da América do Sul dos 200 e 400 metros planos.<br />
4 Composição musical argentina <strong>de</strong> ritmo vivo e marcado<br />
em compasso <strong>de</strong> dois por quatro, que se parece<br />
com o tango. (N. da T.)<br />
em Lima, dar aos fleumáticos<br />
ingleses o baile das suas vidas?!<br />
Lamentavelmente, esse futebol<br />
praticamente já não existe. O<br />
«turbocapitalismo» dos nossos<br />
dias, que arrasa tudo, está a liquidá-lo.<br />
Os magos, com o seu fraque<br />
e cartola, foram esquecidos no<br />
banco. Aos negociantes da bola só<br />
interessam os resultados e não a<br />
magia, ou a diversão libertária.<br />
Agora procuram-se atletas, velocistas,<br />
sem imaginação nem verso,<br />
mas prontos a tatuarem o corpo e<br />
a encherem as orelhas <strong>de</strong> argolas.<br />
Metrossexuais são apelidados por<br />
uns, galácticos por outros. Quem<br />
sofre é a branca e negra que, <strong>de</strong><br />
pontapé em pontapé, já não ri<br />
nem canta e, quiçá, agora chora à<br />
espera <strong>de</strong> melhores dias.<br />
Mas nem tudo está perdido. Já<br />
o disse Jorge Valdano: o futebol<br />
tem algo <strong>de</strong> erva daninha, porque<br />
sempre sobrevive a tudo. Amantes<br />
do futebol <strong>de</strong> todo o mundo, uni-<br />
-vos! Para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a arte e a paixão<br />
pelo futebol, a sua magia, a sua<br />
beleza, a sua alegria. Que não nos<br />
tirem as ruas, que não nos arrebatem<br />
os <strong>de</strong>scampados, que nos <strong>de</strong>ixem<br />
os terrenos baldios livres,<br />
porque aí, no meio das rosas e dos<br />
cravos, das hortênsias e das flores<br />
<strong>de</strong> açafrão, aí, meus senhores, florescerá<br />
o futebol dos bons.<br />
Punta Piedra,Agosto <strong>de</strong> 2005<br />
5 Dança popular do Chile, do Peru e do Equador. (N. da T.)<br />
6 Nasceu na Hungria em 1898 e morreu em Santiago do Chile<br />
em 1982. Após ser titular indiscutível no Barcelona, em<br />
Espanha, dirigiu a mesma equipa, para <strong>de</strong>pois assumir as<br />
funções <strong>de</strong> treinador nos clubes sul-americanos <strong>de</strong> Colo Colo,<br />
River Plate, Wan<strong>de</strong>rers e Boca Juniors. O jogo que comoveu<br />
Rafael Alberti ocorreu a 20 <strong>de</strong> Maio <strong>de</strong> 1928, on<strong>de</strong> o Barcelona<br />
enfrentou a Real Sociedad para a Taça <strong>de</strong> Espanha.