17.04.2013 Views

Revista Atlântica de cultura ibero-americanat

Revista Atlântica de cultura ibero-americanat

Revista Atlântica de cultura ibero-americanat

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

ESTÁDIO DE SÍTIO 94<br />

«La pelota<br />

ríe y canta!<br />

¡La pelota<br />

zumba y vuela!» 1<br />

Juan Parra <strong>de</strong>l Riego 2<br />

95<br />

Isabelino Gradín 3 , um negro<br />

<strong>de</strong> ascendência africana, possivelmente<br />

congolês, angolano<br />

ou, porventura, mandinga, foi<br />

um <strong>de</strong>sses primeiros magos.<br />

Bastou que se aproximasse dos<br />

marinheiros ingleses que levaram<br />

o futebol a Montevi<strong>de</strong>u<br />

para, com os seus feitiços, se<br />

apropriar do ir e vir da bola e,<br />

<strong>de</strong>pois, ao ritmo dos endiabrados<br />

tambores do candombe,<br />

<strong>de</strong>spedaçar as cinturas dos seus<br />

adversários brancos.<br />

Ágil,<br />

sagaz,<br />

veloz,<br />

eléctrico,<br />

repentino,<br />

fulminante<br />

Este é Gradín aos olhos do<br />

surpreendido Parra <strong>de</strong>l Riego.<br />

Negro víbora que <strong>de</strong>saparece por<br />

momentos: esquiva-se, curva-se,<br />

flutua, para voltar a sair com a<br />

bola, e lá vai o fulgurante espadachim.<br />

E vai um, e vão dois, e vão<br />

três, quatro, cinco, sete jogadores<br />

estoqueados para, finalmente,<br />

chutar a bola com o pé, a alma, o<br />

peito, com a vida inteira, para<br />

que <strong>de</strong>scanse no fundo da re<strong>de</strong>.<br />

Gradín!, Gradín!, Gradín!,<br />

gritava o soberano, enquanto o<br />

mago, sorri<strong>de</strong>nte e prazenteiro,<br />

se dispunha a mostrar novos sortilégios:<br />

<strong>de</strong>ixou as cartas, agora<br />

tira os lenços…<br />

Senhores, é chegada a hora<br />

do hipnotismo. Ninguém melhor<br />

nesses momentos <strong>de</strong> transe que o<br />

peruano José María Lavalle. Nada<br />

por aqui, nada por lá. E ali está a<br />

bola: acaricia-a, beija-a, namora-a,<br />

uma finta, uma evasiva, sempre à<br />

margem direita, sempre à beira<br />

da linha <strong>de</strong> cal, lenço branco<br />

alçado e chuta! Ali vai o nené,<br />

cantando e rindo, prazenteiro<br />

pelo trato, à procura <strong>de</strong> outros<br />

malabaristas que o continuem a<br />

mimar; ou, se o mago assim o<br />

dispôs, directo, a colocar-se no<br />

fundo das re<strong>de</strong>s.<br />

Porque, isso sim, os magos<br />

nunca tratam a bola aos pontapés<br />

já que a diversão não passa pelo<br />

pontapé ardiloso. Há que acariciar<br />

a redondinha, dar-lhe ritmo <strong>de</strong><br />

samba, candombe, milonga 4 ,ou<br />

marinera 5 para que ela se ajuste ao<br />

que o ilusionista <strong>de</strong>seja. Recordam-se<br />

<strong>de</strong> Didi e sua folha seca?<br />

A bola ia on<strong>de</strong> esse negro admirável<br />

queria que fosse. Se não acreditam<br />

em mim, perguntem a Dom<br />

Rafael Asca, o guarda-re<strong>de</strong>s peruano<br />

que, em Abril <strong>de</strong> 1957, só<br />

conseguiu ver a trajectória <strong>de</strong> uma<br />

bola que foi colar-se exactamente<br />

no ângulo inalcançável da sua<br />

baliza, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> um raro efeito<br />

em pleno voo. O Peru inteiro<br />

emu<strong>de</strong>ceu. Morriam as ilusões do<br />

Mundial da Suécia, mas o próprio<br />

Maracanã também se calou <strong>de</strong><br />

espanto. «É coisa <strong>de</strong> bruxas», disse<br />

um a<strong>de</strong>pto, estupefacto.<br />

O próprio Waldir Pereira <strong>de</strong>u<br />

uma explicação para esse estranho<br />

idílio com a bola: «Se alguém não<br />

a trata com carinho, ela não obe<strong>de</strong>ce…<br />

Às vezes ela ia por aí e eu:<br />

“vem filhota”, e trazia-a. Dava-<br />

-lhe <strong>de</strong> calcanhar, <strong>de</strong> joanete e ela<br />

estava ali, obediente.»<br />

No entanto, não se pense<br />

que os magos só marcavam<br />

golos, também os evitavam, plantados<br />

sob as traves da baliza, sempre<br />

prontos a voar mesmo não<br />

tendo asas, a transformar os seus<br />

corpos em muralhas ou a converter<br />

as suas mãos em pinças. Nem<br />

o ar conseguia penetrar nas suas<br />

barreiras.<br />

O húngaro Franz Platko 6 foi<br />

um <strong>de</strong>sses ilusionistas. Rafael<br />

Alberti, o saudoso poeta espanhol,<br />

fala <strong>de</strong>le:

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!