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Revista Atlântica de cultura ibero-americanat

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Outras <strong>de</strong> animaes <strong>de</strong> caça, antas, veados, porcos monteses, &<br />

aquários, pacas, tatus, tamanduás, lebres, coelhos, & estes <strong>de</strong> 5 ou 6<br />

espécies. Outras <strong>de</strong> animaes <strong>de</strong> gosto, & recreação, monos, macacos,<br />

bugios, çaguíz, preguiças, cotias, & outras espécies sem conto.<br />

[Simão <strong>de</strong> Vasconcelos, Coisas do Brasil, 1663]<br />

Mas o que torna o macaco tão famoso e<br />

importante, tornando o seu uso indiscriminado e<br />

eterno? Agora até há o Macaco Photoblog, o<br />

Macaco M4 Robot Head, o Bio Macaco, o Macaco<br />

Capoeira, o Macaco Lyries, os Macaco banda<br />

musical...<br />

Há muito que as expressões populares promovem<br />

o bicho, mesmo que o simiesco politicamente<br />

correcto não esteja presente quando se<br />

manda a um hominí<strong>de</strong>o «pentear macacos»,<br />

sendo mais prazeiroso pôr «cada macaco no seu<br />

galho». Des<strong>de</strong> sempre se viu neste animal uma<br />

espécie <strong>de</strong> alter-ego do homem, usando-o para criticar<br />

o mundo às avessas, para relevar a infantilida<strong>de</strong><br />

perdida («são os animaes que mostrão mais<br />

instincto, pelos brincos, e acções que fazem»,<br />

Sebastião da Rocha Pita, História da América Portugueza,<br />

1730) ou para re<strong>de</strong>scobrir a alegria e a inocência<br />

(«alguns sam do tamanho <strong>de</strong> ratos, lindos, alegres,<br />

e estimados», Casal, Corografia Brazílica, 1817).<br />

Macacos são personagens <strong>de</strong> romances, <strong>de</strong><br />

contos, <strong>de</strong> lendas, <strong>de</strong> canções. De José <strong>de</strong> Alencar<br />

(O Guarany, 1857) a Mia Couto («Fábula do macaco<br />

e do peixe»), passando por Castro Alves (A Cachoeira<br />

<strong>de</strong> Paulo Afonso, 1876), Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong><br />

(Macunaíma, 1928) ou Graça Aranha (A Viagem<br />

Maravilhosa, 1929), todos se <strong>de</strong>ixam fascinar pela<br />

figura do macaco, relevando-lhe qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

entretenimento, diversão e fantasia, ou transmutando-os<br />

no papel dos homens («…enquanto A<strong>de</strong>lai<strong>de</strong><br />

e Azevedo se entretinhão na frívola conversação que acabámos <strong>de</strong><br />

ouvir, os outros estudantes grimpavão pelos galhos da jaboticabeira<br />

como verda<strong>de</strong>iros saguis, e enchião a copa dos chapéos dos<br />

mais doces e sazonados fructos» [Bernardo Guimarães, Rozaura a<br />

Engeitada, 1883]).<br />

E que dizer do uso do termo «macaco» com<br />

conotações pouco abonatórias, carregadas <strong>de</strong> sentidos<br />

infelizes? O próprio José Lins do Rêgo, no<br />

seu Bangué, enuncia este aspecto na fala do seu<br />

personagem: «Veria meu avô os negros do engenho<br />

como bichos? Um saguim, um porco, um<br />

cachorro?» Ainda hoje é vulgar insultar alguém,<br />

apodando-o <strong>de</strong> «seu macaco», repreen<strong>de</strong>r uma<br />

criança com um «não faças macacadas», ou caluniar<br />

o semelhante com o piropo «macaquinho <strong>de</strong><br />

imitação». Afinal, os homens é que querem<br />

mesmo ser macacos. Não imagino tais aproximações<br />

por parte da macacada, nem eles querem<br />

saber do Darwin para nada.<br />

Pior, pior, para o prestígio do símio é quererem<br />

cortar-lhe o rabo para o tornarem «elegante e<br />

gracioso», à boa maneira humana: «Até lhe digo<br />

mais. Se não fosse o seu rabo comprido, que tanto o <strong>de</strong>sfeia, parecia<br />

tão homem como eu», como aconteceu na História do<br />

Macaco <strong>de</strong> Rabo Cortado, enganado com a conversa do<br />

barbeiro. Pior para este que ficou sem a navalha,<br />

mas ainda hoje me pergunto o que teria mesmo<br />

acontecido ao macaco e à sua viola… Terá mesmo<br />

dado um salto para Angola?<br />

Ou ficou empe<strong>de</strong>rnido nas escarpas rochosas<br />

<strong>de</strong> Paimogo, pelas bandas da Lourinhã, on<strong>de</strong> ainda<br />

espera que o seu gran<strong>de</strong> corpo ganhe coragem<br />

para atravessar o oceano? É que à sua espera está o<br />

pequeno mico-leão-dourado, «… nos galhos mais<br />

altos do landí, mal penteado e careteiro, fazendo gatimanhas,<br />

chiando e dando pinotes». (Guimarães Rosa, Sagarana, 1946)<br />

1 Uma jazida situada na praia <strong>de</strong> Paimogo, no concelho da Lourinhã, revelou vestígios <strong>de</strong><br />

uma centena <strong>de</strong> ovos <strong>de</strong> dinossáurios terópo<strong>de</strong>s do Jurássico Superior. É neste anciano<br />

contexto que se distingue o gran<strong>de</strong> afloramento rochoso que conflui no extremo sul<br />

<strong>de</strong>ssa praia, com a forma <strong>de</strong> uma gigantesca cabeça <strong>de</strong> macaco vigilante que mira o<br />

infinito – o Macaco <strong>de</strong> Paimogo.<br />

O mico-leão-dourado<br />

é um pequeno<br />

e leve primata<br />

com pelagem<br />

da cor do fogo<br />

e uma juba à moda<br />

do rei da selva.

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