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Revista Atlântica de cultura ibero-americanat

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10 Cancelado <strong>de</strong>finitivamente<br />

o projecto da barragem<br />

do Vale do Côa foram<br />

constituídos o «Parque<br />

Arqueológico do Vale<br />

do Côa», e um projecto<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento<br />

para a região, o PROCÔA.<br />

RIOS PROFUNDOS 82 83<br />

E ainda hoje em muito assim é.<br />

Porém, na opinião <strong>de</strong> Pinharanda<br />

Gomes, «o retrato <strong>de</strong> corpo inteiro tirado<br />

do natural» do nosso Côa só ficou disponível<br />

a partir do projecto científico do geógrafo<br />

Carlos Alberto Marques, <strong>de</strong> que nasceram<br />

duas obras indispensáveis (<strong>de</strong> 1936<br />

e 1939), reeditadas pela Assírio & Alvim<br />

(Lisboa, 1995) num único volume intitulado<br />

A Bacia Hidrográfica do Côa seguido <strong>de</strong><br />

Algumas Notas Etnográficas <strong>de</strong> Riba Côa.<br />

Ribacu<strong>de</strong>nse, natural <strong>de</strong> Vale <strong>de</strong> Espinho, o<br />

autor relata, para além da geografia física,<br />

da flora e da fauna, pormenores da vida<br />

dos homens: a caça, a pesca, as touradas, as<br />

festas joaninas, o contrabando, os santos e<br />

as matanças. Dos anos trinta até hoje, com<br />

Como se, na áspera ascese<br />

do seu percurso final, o rio<br />

assumisse o enigmático<br />

sentido da História<br />

e se constituísse sentinela<br />

perene <strong>de</strong> um património<br />

miraculosamente<br />

conservado a transmitir<br />

aos vindouros.<br />

a emigração e as mutações económicas,<br />

parte disto per<strong>de</strong>u expressão ou feneceu,<br />

mas em termos científicos este é, ainda<br />

hoje, um testemunho incontornável para a<br />

história do Rio.<br />

Mas, avaro e secreto, o Côa entesourou<br />

um segredo velho <strong>de</strong> milénios.<br />

Vindo do fundo dos tempos, sisudo e<br />

constante, correndo teimoso entre invernos e<br />

estiagens, ora caudaloso ora parco, foi cioso<br />

guardador da memória que os Homens, na<br />

aurora dos seus dias, lhe entregaram.<br />

São as gravuras rupestres, só verda<strong>de</strong>iramente<br />

<strong>de</strong>scobertas em 1989, aquando <strong>de</strong><br />

um estudo ambiental realizado por exigências<br />

da construção <strong>de</strong> uma barragem a<br />

efectuar junto à sua foz 10 .<br />

Os núcleos conhecidos esten<strong>de</strong>m-se<br />

pelo Vale do Côa e <strong>de</strong> alguns dos seus<br />

afluentes ao longo <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> 17 km do<br />

seu percurso final. No entanto, estando<br />

ainda em curso os estudos especializados,<br />

não se conhece por ora o número <strong>de</strong>finitivo<br />

e total das gravuras que enriquecem o<br />

vale, calculadas já em vários milhares. É um<br />

cenário <strong>de</strong> fascínio da arte rupestre,<br />

«museu <strong>de</strong> história da arte ao ar livre<br />

como não há outro no mundo com esta<br />

profundida<strong>de</strong> temporal e on<strong>de</strong> é possível<br />

reconstituir toda a história da região a partir<br />

do comportamento artístico dos povos<br />

que a habitaram». São manifestações artísticas<br />

que atravessam diversas fases da Pré-<br />

-História e da História. Sinais <strong>de</strong> percursos<br />

cinegéticos, vitais para a sua sobrevivência,<br />

<strong>de</strong> estágios ou êxodos do Homem<br />

Paleolítico, elas parecem participar da<br />

natureza simbólica do próprio rio, configurando<br />

a seu modo a existência humana<br />

e o seu curso, com a sucessão dos seus<br />

eventos, sentimentos, intenções, temores e<br />

preitos. De algum modo, a flui<strong>de</strong>z das formas<br />

parece ter a ver com o fluir das águas,<br />

mas, por outro lado, não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> marcar,<br />

in<strong>de</strong>levelmente, no Tempo que corre (entre<br />

a Vida e a Morte, como o rio entre a Nascente<br />

e a Foz) a presença do Homem vivo<br />

e universal.<br />

Subindo o rio até ao Douro, vão-se<br />

suce<strong>de</strong>ndo, quais «santuários» apelando a<br />

estudiosa romagem, os sítios da arte rupestre<br />

paleolítica: Faia, Quinta da Barca,<br />

Penascosa, Ribeira <strong>de</strong> Piscos, Vale <strong>de</strong> Figueira,<br />

Vale Vi<strong>de</strong>iro, Canada do Inferno,<br />

Canada do Amendoal e Vale dos Moinhos.<br />

Após a realização <strong>de</strong> trabalhos <strong>de</strong> prospecção<br />

com vista à localização <strong>de</strong> possíveis<br />

sítios <strong>de</strong> habitat humano contemporâneo<br />

das gravuras, chegou-se, em 1995, à i<strong>de</strong>ntificação<br />

dos primeiros sítios arqueológicos<br />

datados do Paleolítico Superior, revelando<br />

um <strong>de</strong>les uma ocupação <strong>de</strong> há cerca<br />

<strong>de</strong> 22 000 anos. A datação <strong>de</strong>ste enorme<br />

património artístico do vale do Côa pressupôs<br />

vários critérios e levou à constatação<br />

<strong>de</strong> que as gravuras foram executadas em<br />

diversas épocas, apresentando-se muitas<br />

vezes em configurações sobrepostas. A<br />

i<strong>de</strong>ntificação das espécies animais figuradas,<br />

como o cavalo, o auroque (antepassado<br />

dos nossos bois domésticos), a cabra<br />

montês e os veados, levou, por exemplo, à<br />

<strong>de</strong>terminação do Paleolítico Superior

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