Revista Atlântica de cultura ibero-americanat
Revista Atlântica de cultura ibero-americanat
Revista Atlântica de cultura ibero-americanat
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
A INVENÇÃO DA AMÉRICA 70<br />
71<br />
insuficientes para consolidar verda<strong>de</strong>iras<br />
<strong>de</strong>mocracias no continente; emergem<br />
novos actores sociais e políticos <strong>de</strong> feição<br />
contestatária face a estas «<strong>de</strong>mocracias <strong>de</strong><br />
baixa <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong>», através <strong>de</strong> modalida<strong>de</strong>s e<br />
li<strong>de</strong>ranças renovadoras que vêm dar voz<br />
aos «invisíveis» ancestrais dos regimes<br />
anteriores (indígenas, pobres, negros,<br />
mulheres, sectores marginalizados em<br />
geral, etc.) e exigir o cumprimento, longamente<br />
adiado, das suas legítimas exigências<br />
<strong>de</strong> justiça, tanto em matéria política e<br />
social como <strong>cultura</strong>l;<br />
2) As posturas anti-imperialistas e um<br />
anti norte-americanismo profundo (entendido<br />
não como uma ruptura face ao povo<br />
<strong>de</strong>ssa nação, mas como uma rejeição profunda<br />
das práticas contrárias ao Direito e à<br />
Comunida<strong>de</strong> internacionais, adoptadas pela<br />
administração ultradireitista do presi<strong>de</strong>nte<br />
Bush), expan<strong>de</strong>m-se, como há décadas não<br />
ocorria no continente, impulsionando posturas<br />
nacionalistas e <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> soberanias<br />
agredidas;<br />
3) O consenso acrítico reinante nos<br />
anos 90 sobre as bonda<strong>de</strong>s pouco menos<br />
que indiscutíveis do receituário liberal ortodoxo,<br />
emanado dos organismos financeiros<br />
internacionais, cada vez gera mais críticas<br />
e contestação, além <strong>de</strong> que muitas <strong>de</strong>las<br />
resultam mais firmes nos discursos <strong>de</strong> oposição<br />
do que nos conteúdos das políticas<br />
implementadas, uma vez chegados ao<br />
exercício do governo; entre outros fenómenos<br />
que po<strong>de</strong>riam ser citados.<br />
ALGUMAS VIAS POSSÍVEIS PARA<br />
UMA NOVA ORDEM PÓS-LIBERAL<br />
NA AMÉRICA DO SUL<br />
As linhas <strong>de</strong> força <strong>de</strong>sta or<strong>de</strong>m que<br />
bem po<strong>de</strong>ria classificar-se <strong>de</strong> «pós-neoliberal»,<br />
na região, traduzem-se efectivamente<br />
em triunfos eleitorais tão espectaculares<br />
como impensáveis há alguns anos. As<br />
razões <strong>de</strong>sta viragem histórica po<strong>de</strong>m<br />
encontrar-se em múltiplos factores. Tendo<br />
em conta os eixos anteriormente referidos,<br />
<strong>de</strong>staquemos só três dos mais importantes,<br />
no seio <strong>de</strong> uma ampla série:<br />
1) A rejeição dos efeitos <strong>de</strong> uma política<br />
exterior dos EUA para o continente<br />
caracterizada tanto pela persistência <strong>de</strong> um<br />
intervencionismo <strong>de</strong>senfadado (os exemplos<br />
são múltiplos e não <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> suce<strong>de</strong>r-se),<br />
como por um <strong>de</strong>sinteresse efectivo<br />
em planos alternativos <strong>de</strong> cooperação, propícios<br />
a um <strong>de</strong>senvolvimento minimamente<br />
viável para os países do continente. Neste<br />
sentido, concorrem tanto os conteúdos<br />
inaceitáveis da sua proposta da ALCA,<br />
como a sua atitu<strong>de</strong> cada vez mais prescindível<br />
em termos <strong>de</strong> cooperação.<br />
2) O fracasso cada vez mais aceite da<br />
implementação das reformas impulsionadas<br />
pelos organismos financeiros internacionais<br />
durante os últimos anos, pela mão<br />
do receituário emanado do chamado<br />
«Consenso <strong>de</strong> Washington». Neste sentido,<br />
tanto as análises académicas como as provenientes<br />
<strong>de</strong> estudos dos mesmos organismos<br />
financeiros internacionais resultam<br />
consensuais na consi<strong>de</strong>ração <strong>de</strong> que a<br />
implementação das chamadas «reformas<br />
<strong>de</strong> primeira geração», durante os anos 90,<br />
culminou em <strong>de</strong>sempenhos muito pobres,<br />
em particular nos tópicos fundamentais da<br />
criação <strong>de</strong> emprego genuíno, no combate à<br />
pobreza e à indigência, no crescimento<br />
económico e na construção institucional.<br />
3) O agravamento <strong>de</strong> cenários <strong>de</strong> pauperização<br />
e marginalização social, pela<br />
mão <strong>de</strong> Estados «<strong>de</strong>sertores» ou «suicidas»<br />
como o que alienou Menem durante o seu<br />
longo <strong>de</strong>cénio no governo da Argentina<br />
(postulado pelo FMI em 1998 como o seu<br />
«melhor aluno» na região). Neste quadro,<br />
os processos renovados <strong>de</strong> pauperização<br />
vieram a tornar mais dramáticas e inocultáveis<br />
as injustiças não só sociais e económicas,<br />
como também políticas, <strong>cultura</strong>is e<br />
étnicas em países como o Brasil ou a Bolívia,<br />
para citar apenas dois exemplos particularmente<br />
assinalados. Para ilustrar a gravida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>stes processos e a situação dos<br />
diversos países do continente, basta consultar<br />
os indicadores da evolução do investimento<br />
social na região, assim como as<br />
estatísticas dos relatórios da CEPAL.<br />
O aprofundamento da rejeição popular<br />
nas socieda<strong>de</strong>s sul-americanas da política<br />
exterior norte-americana, em geral, e, em<br />
particular, na região, a crítica crescente às<br />
políticas «neoliberais» e aos seus <strong>de</strong>fensores<br />
no subcontinente e o agravamento dos