ANTRACNOSE DO MORANGUEIRO ("FLOR PRETA ... - Iapar
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ANO IX N°119 OUTUBRO/96 ISSN-0100-9508<br />
<strong>ANTRACNOSE</strong> <strong>DO</strong> <strong>MORANGUEIRO</strong><br />
("<strong>FLOR</strong> <strong>PRETA</strong>")<br />
CAUSADA POR Colletotrichum acutatum<br />
Bernardo Ueno¹<br />
A antracnose do morangueiro, também conhecida como "flor preta",<br />
foi encontrada em várias localidades produtoras de morangueiro no estado<br />
do Paraná no ano de 1996. Observações feitas em cultivos de morangueiro<br />
dos municípios de Londrina, Ibaiti e Pinhalão mostraram que essa doença<br />
pode causar sérios prejuízos para a cultura, pois ataca diretamente as<br />
flores e frutos, provocando grande queda de produção. Nestes locais, a doença<br />
estava associada principalmente com a cultivar IAC-Campinas, em<br />
plantios de mudas produzidas no Paraná e também provenientes de outros<br />
estados.<br />
O objetivo deste trabalho é fornecer esclarecimentos sobre a doença,<br />
abordando seu histórico, agente causai, sintomas, epidemiologia e medidas<br />
de controle.<br />
HISTÓRICO<br />
A antracnose do morangueiro causada por Colletotrichum acutatum<br />
Simmonds foi descrita pela primeira vez na Austrália (Simmonds, 1965).<br />
¹Eng. Agr., Bolsista do CNPQ. Área de Proteção de Plantas. IAPAR. Caixa Postal 481<br />
86001-970-Londrina-PR
Nos EUA, a sua ocorrência foi relatada pela primeira vez no estado do Mississippi<br />
em cultivo comercial implantado a partir de mudas provenientes de<br />
Arkansas, no ano de 1983. Foram observadas lesões em frutos, pecíolos e<br />
ocasionalmente no rizoma causando murcha e morte das plantas (Smith &<br />
Black, 1986). No Reino Unido, a doença foi constatada em cultivos comerciais<br />
implantados a partir de materiais provenientes da Califórnia em 1983 e,<br />
mais recentemente, em mudas oriundas do continente europeu (Simpson et al,<br />
1994).<br />
Essas mudas foram produzidas a partir de matrizes importadas da Califórnia.<br />
Além desses países, a ocorrência da antracnose já foi relatada na França<br />
(Denoyes & Baudry, 1995), África do Sul (Baxter et al., 1983 ), Brasil (Henz<br />
et al, 1992) e Japão (Ishikawa et al, 1992). No Japão, a antracnose causada<br />
por C. acutatum produz lesões nos pecíolos e estolhos, além de manchas irregulares<br />
nas folhas, mas não causa podridão de flores e frutos, nem lesões no<br />
rizoma, como descrito em outros países.<br />
No Brasil, apesar de existirem relatos sobre a ocorrência da antracnose<br />
("flor preta") (Igarashi, 1984; Henz & Reifschneider, 1990), o agente causai<br />
foi corretamente identificado somente em 1992 por Henz et al. (1992). A presença<br />
desta doença foi constatada no Distrito Federal e no estado de São Paulo<br />
(Henz et al, 1992; Dias, 1993). No Distrito Federal, o surto da antracnose<br />
ocorreu no cultivo de junho/outubro em 1989, acarretando prejuízos de 30 a<br />
68% na produção, devido a introdução de mudas infectadas provenientes do<br />
estado de São Paulo, presença de uma cultivar suscetível (IAC-Campinas) e<br />
condições ambientais favoráveis ao desenvolvimento da doença (Henz et al,<br />
1992). Informações de agricultores, sugerem que esta doença também já ocorreu<br />
no Paraná, além de outros estados como o Rio Grande do Sul e Minas<br />
Gerais. Apesar de não se encontrarem registros na literatura, há indicações de<br />
que esta doença já ocorre há um bom tempo no Brasil (A. Hashimoto, comunicação<br />
pessoal).<br />
AGENTE CAUSAL<br />
O agente causai da antracnose ("flor preta") do morangueiro é o Colletotrichum<br />
acutatum Simmonds (Simmonds, 1965). Esse fungo produz acérvulos,<br />
onde crescem os conídios e conidióforos, as vezes podendo apresentar<br />
setas escuras normalmente asseptadas (52 x 3,2 u.m). Os conídios são unicelulares,<br />
hialinos e com formato elipsóide-fusiforme (15x4 um), isto é, com as<br />
extremidades afuniladas (Fig. 1). Em meio de cultura o fungo tem coloração<br />
rosa-alaranjada, porém não apresenta a fase teleomórfica (Fig. 2). Em condições<br />
de alta umidade, pode haver formação de massa de esporos de coloração
Fig. 1 - Conídios de C. acutaíum.<br />
Fig. 2 - Colônias de C. acutatum isolado em meio de BDA.
osada sobre as lesões (Gunnell & Gubler, 1992). O C. acutatum pode ser<br />
diferenciado das espécies C. fragariae e C. gloeosporioides que também causam<br />
doenças em morangueiro pela morfologia dos conídios. Essas duas espécies<br />
de Colletotrichum possuem conídios cilíndricos com extremidades arredondadas<br />
(Smith & Black, 1990; Denoyes & Braudy, 1995).<br />
No Brasil, C. acutatum isolados a partir de morangos infectados apresentaram<br />
alta patogenicidade às flores de morangueiro, mas não foram patogênicos<br />
ao rizoma (Dias, 1993). Entre as três espécies de Colletotrichum que causam<br />
antracnose no morangueiro, o C. acutatum é a espécie predominante em<br />
infecções de flores e frutos (Wilson et ai, 1993). Além disso, essa espécie é<br />
considerada a mais agressiva na infecção destes órgãos da planta (Wilson et<br />
ai, 1993). O C. acutatum isolado de morangueiro pode infectar frutos de<br />
maçã, formando uma lesão na qual é observada a produção de massa rosada<br />
de esporos (B. Ueno, dados não publicados). Testes de inoculação com isolados<br />
de C. acutatum estabelecidos a partir de morangueiro com antracnose,<br />
indicaram que este patógeno pode causar lesões em tomate, tremoço, ciclamen,<br />
anêmona, espora e pimentão (Ishikawa et ai, 1992; Chikuo et al, 1993).<br />
SINTOMAS<br />
O principal sintoma observado no morangueiro em condições de campo é<br />
a necrose progressiva dos pedúnculos e demais partes dos órgãos florais,<br />
culminando com a seca e morte das flores ("flor preta") (Fig. 3). Os frutos<br />
pequenos e em crescimento também podem ser atacados adquirindo coloração<br />
escura e tornando-se mumificados (Henz & Reifschneider, 1990) (Fig. 4 e<br />
Fig. 5). Em condições de alta umidade e temperatura adequada, são observadas<br />
massas rosadas de esporos do patógeno sobre as lesões (Tanaka et ai,<br />
1994) (Fig. 5). Além das lesões em flores e frutos, podem ocorrer lesões necróticas<br />
deprimidas de cor castanha escura sobre pecíolos e estolhos e podridão<br />
de meristemas que normalmente causam a morte das plantas em poucos<br />
dias ou algumas semanas após o transplante das mudas no campo. Ocasionalmente<br />
são observadas massas rosadas de esporos sobre o meristema morto.<br />
Além disso, pode ocorrer podridão de rizoma que leva à murcha e posterior<br />
morte da planta. O C. acutatum também pode causar manchas irregulares nas<br />
folhas, sendo comum em folhas novas, iniciando a necrose pelas margens<br />
(Howard et al, 1992) (Fig. 6).
Fig. 3 - Órgãos florais com sintoma de "flor preta".<br />
Fig. 4 - Lesões necróticas em frutos novos.
Fig. 5 - Frutos mumificados e formação de massas rosadas de esporos do patógeno<br />
sobre as lesões.<br />
Fig. 6 - Manchas irregulares nas folhas.
EPIDEMIOLOGIA<br />
A ocorrência da antracnose ("flor preta") na cultura do morangueiro é<br />
favorecida por temperaturas entre 25 e 30°C e alta umidade (Tanaka et al,<br />
1994). Períodos chuvosos de 2 dias ou mais são extremamente favoráveis ao<br />
rápido desenvolvimento da doença, principalmente em cultivares suscetíveis<br />
(Howard et al., 1992). Em frutos imaturos, temperatura em torno de 25°C e 13<br />
horas de umidade contínua são condições suficientes para causar infecção em<br />
mais de 80% dos morangos (Wilson et al, 1990). A esporulação em frutos<br />
imaturos normalmente ocorre em 7 dias quando a temperatura está entre 25 e<br />
30°C(King et al., 1994).<br />
O inóculo primário de C. acutatum, em área sem histórico da ocorrência<br />
da antracnose, é proveniente de mudas contaminadas pelo patógeno (Howard<br />
et ai, 1992). Muitas vezes é difícil a detecção da presença de plantas infectadas<br />
no viveiro, pois frequentemente as plantas não apresentam sintomas. Apesar<br />
de estar com uma infecção latente, os sintomas de antracnose somente<br />
aparecerão quando ocorrerem condições climáticas favoráveis ao desenvolvimento<br />
da doença ( Simpson et al, 1994). Nas áreas onde já ocorreu a doença,<br />
a fonte de inóculo primário pode ser o próprio solo ou restos de cultura, pois o<br />
patógeno pode sobreviver por mais de 9 meses nesses locais (Eastburn &<br />
Gubler, 1990). Em frutos infectados ou mumificados, o patógeno consegue<br />
sobreviver por mais de 2 anos (Wilson et al, 1992). Com o desenvolvimento<br />
da doença, pecíolos, estolhos e folhas infectadas servirão de fonte de inóculo<br />
para outras partes da planta como flores e frutos. A disseminação do patógeno<br />
pode ser rápida quando não é feito um controle efetivo da doença através da<br />
aplicação preventiva de fungicidas e remoção de folhas, flores e frutos doentes,<br />
visando reduzir o potencial de inóculo dentro da cultura (Howard et al,<br />
1992).<br />
Respingos de chuvas são muito eficientes na dispersão de esporos de C.<br />
acutatum a partir de órgãos infectados da planta dentro da cultura do morangueiro<br />
(Yang et al, 1990). Desta forma, o sistema de irrigação por aspersão<br />
favorece a disseminação do patógeno dentro da cultura, pois tem o mesmo<br />
efeito de uma chuva (Ishikawa, 1994; Chikuo, 1994). No caso de C. acutatum<br />
no morangueiro, a irrigação por capilaridade tem reduzido muito a disseminação<br />
do patógeno e, conseqiientemente, o desenvolvimento da doença (Chikuo,<br />
1994).
MEDIDAS DE CONTROLE<br />
O controle da antracnose do morangueiro deve envolver diversas medidas<br />
para minimizar os danos causados pela doença. A seguir são apresentadas<br />
várias medidas que podem ser empregadas conjuntamente para o controle da<br />
doença:<br />
1) Uso de mudas sadias. Mudas infectadas tem sido a principal causa de<br />
introdução do patógeno em áreas isentas da doença (Howard et al, 1992). A<br />
maior dificuldade é a detecção da doença no de viveiro, pois muitas vezes a<br />
infecção é latente e as plantas não apresentam sintomas visíveis (Chikuo,<br />
1994; Simpson et al, 1994). Assim, é necessário adotar uma metodologia para<br />
detecção de infecção latente nas plantas de morangueiro. No Japão foi desenvolvida<br />
uma metodologia para detecção da antracnose causada por C. gloeosporioides<br />
que pode também ser empregada para C. acutatum (Ishikawa,<br />
1994). Nesta metodologia, folhas aparentemente sadias são coletadas, esterilizadas<br />
com etanol 70% por 30s, e, então lavadas em água esterilizada. As folhas<br />
são colocadas em placa de Petri sobre papel filtro umedecido e esterilizado.<br />
O material é incubado por 10 dias à 28°C para induzir a esporulação do<br />
patógeno, facilitando assim a sua identificação.<br />
2) Plantio em áreas livres da doença. Evitar o plantio de morangueiro<br />
em locais onde já tenha ocorrido a doença nos últimos 2 anos, pois o fungo<br />
pode sobreviver no solo e/ou restos de cultura por mais de 2 anos (Eastburn &<br />
Gluber, 1990; Wilson et al, 1992).<br />
3) Eliminação de órgãos doentes. Folhas, flores e frutos doentes devem<br />
ser coletados periodicamente. O material coletado deve ser eliminado através<br />
da sua queima. Após o final da safra, eliminar os restos de cultura para reduzir<br />
o potencial da inoculo no campo (Howard et al, 1992).<br />
4) Manejo da irrigação. A irrigação deve ser controlada , pois a alta<br />
umidade favorece a disseminação do patógeno e o desenvolvimento da doença<br />
(Tanaka et al, 1994; Yang et al, 1990). No caso de irrigação por aspersão,<br />
irrigar ao amanhecer. Desta forma, o período em que as plantas permanecem<br />
úmidas será reduzido. A irrigação por gotejamento é uma outra alternativa.<br />
Este sistema de irrigação não molha a parte aérea das plantas e também evita a<br />
dispersão de esporos dentro da cultura (Chikuo, 1994). Em áreas com irrigação<br />
por gotejamento associado ao cultivo protegido de chuvas através de estufas<br />
ou túneis de plástico, o controle da antracnose tem sido muito eficaz<br />
(Ishikawa et al, 1989).<br />
5) Uso de cutivares resistentes. As cultivares IAC-Campinas e IAC-<br />
Guarani tem mostrado alta suscetibilidade à antracnose. Em contraste, as cultivares<br />
IAC-Princesa Isabel, Sequóia, Botucatu e Chandler tem apresentado<br />
8
maiores níveis de resistência (Tanaka et al, 1994). As cultivares Flórida 90,<br />
Flórida Belle e Dover são muito resistentes, tanto em fruto como em flores,<br />
pecíolos e estolhos (Howard et al, 1992).<br />
6) Controle químico. Embora existam poucos fungicidas registrados<br />
para a cultura do morangueiro no Brasil, o captan (120g/100 litros de água) e<br />
o folpet (135g/100 litros de água) são os produtos registrados que tem apresentado<br />
maior eficiência no controle da antracnose. Esses fungicidas podem<br />
ser aplicados alternadamente 1 ou 2 vezes por semana, conforme a severidade<br />
da doença (Andrei, 1996). Como estes produtos são protetivos e preventivos,<br />
as aplicações devem ser em alto volume de calda cobrindo todas as partes da<br />
planta, principalmente as flores. No Brasil, já foram testados diversos outros<br />
fungicidas que mostraram eficiência para o controle da antracnose ("flor preta")<br />
(Sinigaglia, 1996). Entre esses produtos, o fluazinan (que já possui registro<br />
para a cultura do morango e previsão de entrar no mercado em meados do<br />
segundo semestre de 1996) apresentou alta eficiência no controle da antracnose<br />
(Sinigaglia, 1996).<br />
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