Poder e Violência: Hannah Arendt e a Nova Esquerda
Poder e Violência: Hannah Arendt e a Nova Esquerda
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se assentava na relação de mando-obediência, e que não identificava poder e<br />
domínio ou lei a mando (ARENDT, 1994, p. 34).<br />
Conforme Duarte, este é o paradigma de compreensão e exercício da política e do<br />
poder que, para <strong>Arendt</strong>, se adequa o mais perfeitamente às “condições fundamentais do ser do<br />
homem”. Para este autor, <strong>Arendt</strong> recorre à polis grega com o intuito de buscar uma<br />
manifestação mais originária do fenômeno político, afastando de si a premissa básica a partir<br />
da qual poder e violência são identificados (1994, p. 85). 20<br />
Conforme salienta Perissinato (2004), <strong>Arendt</strong> volta-se para a polis grega buscando<br />
resgatar o fundamento do consentimento para elaborar a sua teoria de poder.<br />
<strong>Arendt</strong> chega, mesmo, a reconhecer que entre os gregos falava-se em obediência mas,<br />
em sua interpretação, esta obediência referia-se às leis e não aos homens: leis para as quais os<br />
cidadãos haviam dado o seu consentimento. Pode-se notar que é sob o modelo da polis grega<br />
que <strong>Arendt</strong> busca elementos para fundamentar seu conceito de poder, já que, no seu<br />
entendimento, essa tradição não concebe o poder a partir da relação entre mando e obediência.<br />
Os gregos teriam desenvolvido um “conceito de poder e de lei cuja essência não se<br />
assentava na relação mando-obediência, e que não identificava poder e domínio ou lei e<br />
mando”. No entender de <strong>Arendt</strong>, a isonomia da cidade-Estado ou a civitas dos romanos, se<br />
constituía numa forma de governo, uma república, na qual a obediência se dava em respeito às<br />
leis e não aos homens (ARENDT, 2000, p. 34).<br />
A obediência às leis corresponderia, então, a um tipo de apoio dado pelos cidadãos<br />
com base no consentimento. Dessa forma, segundo <strong>Arendt</strong>, “é o apoio do povo que confere<br />
poder às instituições de um país, e este apoio não é mais do que a continuação do<br />
consentimento que trouxe as leis à existência”. Portanto, as instituições políticas são<br />
20 Cumpre ressaltar, no entanto, que a Democracia grega não prescinde do trabalho escravo. Na Grécia<br />
Antiga, conforme mostra a própria autora em Entre o passado e futuro, os gregos estabeleciam duas esferas da<br />
vida: a pública (polis) e a privada (a qual se constituía em reino das necessidades). Na polis – comunidade de<br />
iguais – a vida política não é caracterizada pela dominação, contudo, na esfera privada, no âmbito da e com<br />
relação aos escravos era admitido ao senhor se comportar como um déspota, um tirano.<br />
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