Poder e Violência: Hannah Arendt e a Nova Esquerda
Poder e Violência: Hannah Arendt e a Nova Esquerda Poder e Violência: Hannah Arendt e a Nova Esquerda
ilusão “de que o sistema de metabolismo social do capital pudesse ser efetiva, duradoura e definitivamente controlado, regulado e fundado num compromisso entre capital e trabalho mediado pelo Estado” (ANTUNES, 2002, p. 378). Cumpre ressaltar que tal progresso econômico esteve intimamente ligado ao amplo desenvolvimento tecnológico característico do pós-guerra. Nesse período a pesquisa científica assume um lugar de destaque para o processo produtivo. Pesquisas e desenvolvimento tornaram-se fundamentais para o crescimento econômico, daí exigirem cada vez mais e maiores investimentos. Em verdade, a revolução tecnológica seria cada vez mais respaldada pela visão cosmocientífica, a qual passa a ser hegemônica nas sociedades ocidentais industrializadas. Ou seja, a tecnologia, bem como o cientificismo, passaram a dominar o imaginário social como expressões do desenvolvimento que levaria a um conseqüente progresso da humanidade. Nesse contexto, a razão científica passaria a ser o parâmetro de toda sociedade moderna. No plano político, os países centrais fortaleceram suas democracias parlamentares, baseando-se no sufrágio universal pleno. Por outro lado, os regimes burocráticos repressivos que exerciam domínio sobre o proletariado na União Soviética e na Europa Oriental passaram por sucessivas crises e ajustes após a morte de Stálin, em 1953 (ANDERSON, 1989, p. 44). Já, o discurso político dos países capitalistas estava intimamente relacionado com a defesa incondicional da Democracia, que era apresentada em oposição aos regimes totalitários. Tratava-se de combater a opressão à liberdade. Nesse sentido, a democracia aparecia como um valor a ser perseguido por todos (CHAUÍ, 1997, p. 430). Desse modo, em meio ao dinamismo do capitalismo e de sua relativa estabilidade durante os anos dourados (1950-1970), as previsões clássicas de derrota do capitalismo por meio de uma crise iminente pareciam ter caído por terra. Com efeito, como aponta Jacoby (2001), surgiu no cenário intelectual um coro de vozes, orquestrada por Raymond Aron, proclamando o fim das ideologias ou, o que dá no 34
mesmo para o referido autor, o fim da utopia. “Um depois outro, os autores proclamavam, celebravam e às vezes lamentavam o fim das ideologias e da utopia” (JACOBY, 2001, p. 17). As mudanças políticas e sociais decorrentes da prosperidade econômica se constituíram em reformas para os teóricos contrários ao “radicalismo visionário”. O Estado previdenciário, o poder descentralizado, o sistema de economia mista e o pluralismo político, em suma, deveriam ser assegurados em favor do pluralismo e da liberdade individual e, também, do pluralismo político (JACOBY, 2001, p. 19). Assim, nos grandes textos reformistas desse período, escritos entre 1956 e 1960, entre os quais se insere “O fim da ideologia” de Daniel Bell, encontra-se a presunção da crescente harmonia interna da sociedade satisfatória, isto é, de uma economia de consenso social organizado (HOBSBAWM, 1995, p.280). Nesse contexto, segundo Jacoby (2001), entre os pensadores liberais e anticomunistas, recobrar radicalismo político ou unidade entre teoria e prática revolucionária não passava de pura ideologia, e o radicalismo político surgia como um fantasma do passado, que precisava ser exorcizado. Se por um lado as gerações dos mais velhos, acostumados a tempos de aperto e desemprego, amorteciam suas insatisfações por conta da consciência de viver numa época melhor, e entendiam serem desnecessárias mobilizações radicais, as gerações do pós-guerra, da sociedade que combinava pleno emprego e consumo de massa não sentiam o mesmo. Ao contrário, essas gerações sentiam que tudo podia ser diferente e melhor (HOBSBAWM, 1995, p. 295-296). No bojo dessa nova geração, entre 1960 e 1962, surgia uma “nova esquerda” que recolocava o radicalismo na ordem do dia. A guerra do Vietnã (principal responsável pelo desgaste interno nos EUA), a corrida armamentista, os confrontos e a segregação racial nos Estados Unidos, por exemplo, faziam intensificar a desconfiança frente ao sistema capitalista. Nessa perspectiva, a Rebelião Estudantil, bem como os movimentos pelos direitos civis, black 35
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mesmo para o referido autor, o fim da utopia. “Um depois outro, os autores proclamavam,<br />
celebravam e às vezes lamentavam o fim das ideologias e da utopia” (JACOBY, 2001, p. 17).<br />
As mudanças políticas e sociais decorrentes da prosperidade econômica se<br />
constituíram em reformas para os teóricos contrários ao “radicalismo visionário”. O Estado<br />
previdenciário, o poder descentralizado, o sistema de economia mista e o pluralismo político,<br />
em suma, deveriam ser assegurados em favor do pluralismo e da liberdade individual e,<br />
também, do pluralismo político (JACOBY, 2001, p. 19).<br />
Assim, nos grandes textos reformistas desse período, escritos entre 1956 e 1960, entre<br />
os quais se insere “O fim da ideologia” de Daniel Bell, encontra-se a presunção da crescente<br />
harmonia interna da sociedade satisfatória, isto é, de uma economia de consenso social<br />
organizado (HOBSBAWM, 1995, p.280).<br />
Nesse contexto, segundo Jacoby (2001), entre os pensadores liberais e anticomunistas,<br />
recobrar radicalismo político ou unidade entre teoria e prática revolucionária não passava de<br />
pura ideologia, e o radicalismo político surgia como um fantasma do passado, que precisava<br />
ser exorcizado.<br />
Se por um lado as gerações dos mais velhos, acostumados a tempos de aperto e<br />
desemprego, amorteciam suas insatisfações por conta da consciência de viver numa época<br />
melhor, e entendiam serem desnecessárias mobilizações radicais, as gerações do pós-guerra,<br />
da sociedade que combinava pleno emprego e consumo de massa não sentiam o mesmo. Ao<br />
contrário, essas gerações sentiam que tudo podia ser diferente e melhor (HOBSBAWM, 1995,<br />
p. 295-296).<br />
No bojo dessa nova geração, entre 1960 e 1962, surgia uma “nova esquerda” que<br />
recolocava o radicalismo na ordem do dia. A guerra do Vietnã (principal responsável pelo<br />
desgaste interno nos EUA), a corrida armamentista, os confrontos e a segregação racial nos<br />
Estados Unidos, por exemplo, faziam intensificar a desconfiança frente ao sistema capitalista.<br />
Nessa perspectiva, a Rebelião Estudantil, bem como os movimentos pelos direitos civis, black<br />
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