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Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra

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Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />

e “reduzia, momentaneamente, pelo menos, os riscos <strong>de</strong> isolamento internacional numa época em que<br />

as críticas à gestão salazarista e à sua política ultramarina subiam <strong>de</strong> tom.” 391 Salazar continuava a<br />

frisar a insignificância continental <strong>de</strong> Portugal, pois, “quem nos examina no mapa, o país po<strong>de</strong> até dar a<br />

impressão <strong>de</strong> querer separar-se da terra firme e <strong>de</strong> tentar lançar-se pelos oceanos fora.” 392<br />

Com Marcelo Caetano surgem algumas opiniões, <strong>de</strong>ntro do próprio regime, partidárias <strong>de</strong> uma<br />

aproximação ao projecto europeu, mas que não passaram disso mesmo. O Governo sentiu, mais uma<br />

vez, a premência económica para uma abertura - <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ada pelo enfraquecimento da EFTA - o que<br />

levou ao acordo comercial <strong>de</strong> 1972. É mais uma viragem para a Europa, mas que continua a ser<br />

impulsionada pela necessida<strong>de</strong> económica, com o novo chefe <strong>de</strong> governo a rejeitar uma plena<br />

associação ao MC, que “implicava uma integração económica, social e, no futuro, também política,” 393<br />

o que não se coadunava com a condição atlântica <strong>de</strong> Portugal.<br />

Estes passos <strong>de</strong> abertura à Europa foram meras respostas a uma situação <strong>de</strong> contingência<br />

económica. O regime, sob a batuta <strong>de</strong> Marcelo Caetano, herdara a fobia <strong>de</strong> Salazar por qualquer<br />

projecto <strong>de</strong> associação ou unida<strong>de</strong> europeia, que consi<strong>de</strong>rava “um absurdo histórico”, contra a “feição<br />

atlântica” do povo português. 394 Portanto, mesmo após a saída <strong>de</strong> Salazar do Governo, o lema<br />

“orgulhosamente sós” continua a conduzir o regime. Até 1976, os episódios <strong>de</strong> aproximação <strong>de</strong><br />

Portugal à Europa são meros actos <strong>de</strong> resposta conjuntural, são uma mera alternativa. A Europa não se<br />

apresenta, no i<strong>de</strong>ário do Estado Novo, como parte integrante <strong>de</strong> um projecto <strong>de</strong> futuro para o país. Para<br />

o regime, ela não é, sequer, uma referência política, significando antes uma intimidação aos seus<br />

valores.<br />

Por isto, não po<strong>de</strong>mos compartilhar da tese <strong>de</strong> que o pedido <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são <strong>de</strong> 1977 seguiu uma<br />

linha <strong>de</strong> continuida<strong>de</strong>, porque ainda que na prática o possa parecer, na sua essência i<strong>de</strong>ológica e na sua<br />

causa política, a iniciativa tinha em vista a mudança <strong>de</strong> paradigma político, <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento<br />

económico e social <strong>de</strong> Portugal, o que se vinha engendrando no pensamento <strong>de</strong> Soares muito antes da<br />

Revolução 25 <strong>de</strong> Abril. Estamos por isso, perante uma ruptura histórica do país, como também refere<br />

José Telo: “O pedido <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são <strong>de</strong> 1977, <strong>de</strong>ve pois, ser entendido como um corte com o passado, uma<br />

<strong>de</strong>cisão estratégica que coloca os objectivos <strong>de</strong> longo prazo longínquo à frente das dificulda<strong>de</strong>s<br />

conjunturais <strong>de</strong> curto prazo (…)” 395 Foi essa visão que Soares também chamou <strong>de</strong> “intuição,” 396 que<br />

contrariou a quase unanimida<strong>de</strong> dos economistas consultados, em <strong>de</strong>saconselhar o pedido <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são.<br />

Po<strong>de</strong>mos, ainda assim, colocar Soares numa linha <strong>de</strong> reminiscência das posições europeístas<br />

republicanas dos finais do século XIX, início do XX, mas a veemência com que foram postas em<br />

prática, a atitu<strong>de</strong> política e a consolidação da i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> unida<strong>de</strong> europeia no seio da própria Europa,<br />

391 I<strong>de</strong>m, ibi<strong>de</strong>m, p. 288.<br />

392 Salazar, “No almoço oferecido aos participantes da reunião ministerial da EFTA”, 20.05.1960, Discursos, Vol. VI (1959-1966),<br />

<strong>Coimbra</strong> Editora, 1967, pp. 78-79. Citado por António Martins da Silva, Portugal e a Europa, distanciamento […] cit., p. 388.<br />

393 Interview recueillie par Jean-François Chauvet, com o título “Tournés vers le grand large”, Le Fígaro, <strong>de</strong> 16.01.1970,<br />

AHD/EOI/682. Citado por António Martins da Silva, “Portugal e a i<strong>de</strong>ia Fe<strong>de</strong>ral Europeia”, in Maria Manuela Tavares Ribeiro,<br />

António Barbosa <strong>de</strong> Melo, cit., p. 93.<br />

394 António Martins da Silva, Portugal e a Construção Europeia, distanciamento […] cit., p. 392-397<br />

395 António José Telo, História Contemporânea <strong>de</strong> Portugal, do 25 <strong>de</strong> Abril à actualida<strong>de</strong> Vol II […] cit., p. 207.<br />

396 Revelação feita na conferência <strong>de</strong> abertura do I Encontro Nacional <strong>de</strong> Estudantes <strong>de</strong> <strong>Estudo</strong>s Europeus, no auditório da<br />

Reitoria da <strong>Universida<strong>de</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>Coimbra</strong>, em 14.04.2010.<br />

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